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CAPÍTULO 2. PROCESSO DE PROJETO

2.1 CONCEITOS

2.1.2 Projeto enquanto produto gráfico

Há consenso em relação ás diferenças entre os esboços ou “croquis” e o desenho técnico. O “croqui” é uma forma de representação entendida enquanto técnica para o desenvolvimento de idéias21, que parte de uma abordagem prática da cognição humana (GEDENRYD, 1998:11), dinâmica tradicionalmente individual (ver figura 2.6). O desenho técnico é uma forma de representação para transmitir informações necessárias á realização do objeto idealizado, resultante de um contexto de divisão funcional e social do trabalho de construção. Isto significa à princípio, que quanto maior for a fragmentação em tarefas e disciplinas especializadas, tanto maior será a necessidade e a sofisticação do desenho técnico (CAMPOS, 2002:14). Como lembrado por LAWSON (1997), na época do fazer artesanal, a produção de representações é reduzida ou até inexistente. As vantagens e desvantagens provenientes da separação entre o projeto e a execução são também mencionadas por ele, do ponto de vista das solicitações atuais.

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Figura 2.6 – “Croqui” de concepção de projeto.

21 “Para o arquiteto o desenho ainda é importantíssimo.” Notas: Seminário “Pós-Graduação e Projeto de

O desenho técnico formaliza a capacidade de comunicação entre indivíduos envolvidos, em atividades ou partes distintas do mesmo empreendimento. Como informação compartilhada deve ter critérios de qualidade que levem ao controle de desenvolvimento e entendimento de um grupo. Isto justifica os padrões adotados para sua confecção22. Segundo FRENCH e VIERCK (1995), a habilidade de executar desenhos ortográficos à mão livre deve ser essencial a habilitação de todo profissional envolvido com a concepção do artefato. Um desenhista tem habilidade e rapidez mecânica na execução de desenhos técnicos, mas os projetistas devem ser capazes de esboçar idéias á mão livre. Por outro lado, há dificuldades provenientes do nível de abstração dos desenhos de engenharia e arquitetura, consideradas formas privilegiadas de comunicação. Há destaque para o que FRENCH e VIERCK (1995) chamam de “desenho rápido”, proveniente de uma abordagem de produção do desenho, com economia de alguns recursos de representação e especificação. Se analisarmos o desenho técnico em sentido amplo, ou seja, como informação, o quesito apresentação pode ser visto como um dos parâmetros de avaliação. Podemos discutir aspectos do desenho técnico, fundamentados nos quesitos propostos para a informação, por ALTER (1999), como ilustrado no quadro 2.3. I I I I$I I C 0 ; 7'- $ < 0

Quadro 2.3 – Quesitos da informação

Fonte: ALTER (1999)

Os quesitos de avaliação expostos são aplicáveis a qualquer forma de comunicação formalizada: escrita (memoriais, especificações técnicas), tabelada (orçamentos, receita, listas, planilhas), gráfica (desenhos técnicos). Uma eventual avaliação do projeto, do ponto de vista do produto gráfico, faz sentido para o desenho técnico. Por outro lado, devem ser elaborados indicadores ou procedimentos que possam permitir uma avaliação, verificação e controle dos quesitos da informação no documento, destacado por SIMON (1992) como artefato suporte da informação. O que interessa é a informação necessária a execução e desempenho projetado. Quesitos de qualidade da informação devem orientar a

22 Há diversas metodologias para descrever e qualificar a informação provenientes de organismos de

normalização (padrões de nomenclatura: AIA (The American Institute of Architects); IAI (International Alliance

Interoperability); NIBS (National Institute of Building Sciences); Padrões da AsBEA. Neste contexto, a forma de

representação e qualificação da informação é determinante da interoperabilidade do sistema de gestão. Para uma conversão da informação de forma associada, assim como, o estabelecimento de padrões de informação, há necessidade de entender a semântica dos objetos presentes nos documentos digitais.

caracterização da documentação que tem necessidades de pré-requisitos, contém e transfere esta informação para alguém ou alguma outra atividade23.

O desenho técnico é uma forma de representação, com adoção de padrões de desenho, para facilitar a transmissão de informação entre agentes de projeto. Um desenho de execução deve fornecer as informações necessárias para a construção completa da edificação. A especificação técnica, para produzir um edifício, deve conter descrição de forma (representação gráfica), descrição dimensional (tamanho), descrição material (tipo, tratamento, acabamento, outros), textos e notas explicativas, legendas descritivas ou explicativas. Os aspectos citados constituem o que podemos chamar de especificação de produto. A especificação técnica pode ainda descrever relações entre elementos e/ou componentes (locações relativas, tolerâncias, interferências) e ainda, listas de materiais, o que chamamos de especificação de conjunto de “montagem”, termo extraído do projeto mecânico. Na tentativa de tornar o projeto, em sua dimensão gráfica, o mais compreensível para a execução (hoje, espacial e temporalmente separada), BECHKY (1999) apud HEATH e STAUDENMAYER (2000)24 destaca que a engenharia tenta incorporar “inteligência” aos desenhos, ignorando outros meios de tradução da informação. A figura 2.7 ilustra os produtos gráficos, por fase do processo, de forma esquemática.

Figura 2.7 – Evolução do produto gráfico no processo de projeto.

23 A completeza da informação é determinada pelo consumidor ou atividade consumidora desta, conforme fase

de amadurecimento, dependente da realização de pré-requisitos necessários e uma adequada transferência.

24 O produto gráfico transita de esboços de concepção, para desenho técnico de especificação, para desenho

técnico de produção, para cartilhas de frente de trabalho; cultura popular, tipo “gibi”. C L 7.4 @\ 7< 4 L <0< ?DE4 C L 7.4 @\ 7< 4 ;4CBDE4 ?;@<=.? 0; 7@ L C @;?"?=.4

A “prancha” enquanto documento técnico deve mostrar a especificação técnica material e física do objeto e, refletir o processo e os agentes responsáveis pelo seu desenvolvimento e confiabilidade25 das informações contidas (NBR 10068/87, NBR 10582/88, outras

). Em relação aos agentes, o documento deve conter a empresa responsável pelo desenvolvimento do projeto, cliente, projetistas, coordenador, desenhistas, consultores, responsáveis por revisões, espaço para eventuais aprovações por órgãos competentes; a identificação do empreendimento (obra), com código de identificação da especialidade técnica, fase de desenvolvimento (concepção, formalização, detalhamento, implementação), estado do conteúdo (em estudo, em desenvolvimento, em análise, em validação, em verificação, aprovado para próxima fase de projeto, aprovado para outra especialidade de projeto, aprovado para execução, outros); natureza e data das revisões, notas, data de emissão inicial, versão da informação presente, conteúdo, escala, número do documento no conjunto (n/n total). O quadro 2.4 organiza as principais características atribuídas aos artefatos de projeto. Segundo PERRY e SANDERSON (1998), os artefatos são objetos de interação. Os artefatos de projeto representam o raciocínio sobre um projeto: planos, modelos, protótipos, visualizações; enquanto os artefatos procedimentais comportam antecipadamente o processo, auxiliando na orientação das pessoas no contexto do projeto: requisições de mudança, memoriais, cartas, fluxogramas, diagramas de Gantt.

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Quadro 2.4 – Caracterização de artefatos de projeto.

Conclui-se que o projeto enquanto produto gráfico tem o papel de intermediar o desenvolvimento de linhas de raciocínio sobre o problema (ferramenta cognitiva) e comunicar a informação gerada (ferramenta de comunicação à qual podem ser aplicadas as dimensões de utilidade da informação). Enquanto ferramenta cognitiva deve ser flexível e rápida, capaz de lidar a imprecisão característica de raciocínios iniciais e comunicar a

25 A confiabilidade pode ser ancorada em questões hierárquicas da organização (coordenador, gerente) ou por

nível de conhecimento da questão (projetista especializado, consultor).

relevância da questão, mediante uma troca de resultados parciais27. A oralidade é outra forma de comunicação que comporta imprecisão. Enquanto ferramenta de comunicação pura deve ser capaz de transferir informação de um emissor para um receptor. A representação gráfica estabelece uma relação de produção e aparente consumo de informação: um desenho deve ser produzido, transferido e deve ter utilidade para quem o recebe. O modo de desenvolvimento das atividades de projeto tem reflexos diretos sobre a qualidade da representação gráfica (trabalho fragmentado gera informação incompleta e soluções inadequadas ou insuficientes). A qualidade da documentação é fruto do processo. Pode haver a tentativa de estabelecer uma ordem inversa (a qualidade do processo como fruto da documentação), porém isto gera um pesado processo compulsório, com oportunidades para ludibriar e ofuscar a visão clara do processo. Às vezes tentar implementar uma melhoria isolada de desenho integrado entra em conflito direto coma as atividades de um projeto seriado. O desenho reflete o processo, principalmente o desenho técnico. Quanto mais fragmentado o processo, maior a necessidade de sofisticação do detalhamento.