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Proteção Penal Absolutamente Dependente do Direito Administrativo

3 DA RELAÇÃO ENTRE O DIREITO PENAL E O DIREITO ADMINISTRATIVO

3.6 Das modalidades de relacionamento entre o Direito Penal e o Direito Administrativo: da

3.6.2 Proteção Penal Absolutamente Dependente do Direito Administrativo

O segundo modelo de relacionamento entre o Direito Penal e o Administrativo na Proteção do Meio Ambiente se verifica quando o primeiro é absolutamente dependente em relação ao segundo ramo jurídico. Neste sentido, o conteúdo do injusto penal apenas determina que se tenha observância quanto à normativa administrativa, a fim de garantir que os padrões por esta ditados sejam fielmente cumpridos pelo agente522.

Neste parâmetro, o direito penal incrimina a mera ―desobediência administrativa‖, ou seja, a pura infração às disposições do ordenamento administrativo, sem se tomar consideração das efetivas incidências ecológicas de tais infrações523.

521 PARDO BUENDÍA, Mercedes: Protección penal y accesoriedad administrativa en la nueva regulación para la

protección del medio ambiente, In: BERBEROFF (dir.) Incidencia medioambiental y Derecho sancionador, Madrid: Consejo General del Poder Judicial, 2007, págs. 123 y 124

522 CARVALHO, Érika Mendes de. Op. cit., p. 305. De acordo com a autora, no Brasil é possível se perceber

este modelo de relacionamento nos crimes previstos nos artigos 68 e 69 da Lei 9.605/98. Esta estrita dependência, segundo ela, pode se representar em dois casos: o primeiro, quando o injusto se dá quando o agente pratica uma infração prévia administrativa; e, segundo, quando o Direito Administrativo sancionador fixa ―valores-limites‖ para que se possa iniciar uma intervenção penal (Ibidem, p. 305).

523 HEINE, Günther. Op. cit., p. 58; MATA BARRANCO, Norberto Javier. Protección penal del ambiente y

accesoriedad administrativa. Tratamiento penal de comportamientos perjudiciales para el ambiente amparados en una autorización administrativa ilícita. Barcelona: Editorial Cedecs, 1996, p. 73.

Com base neste modelo, configuram-se claramente os aspectos negativos e contrários à ―administrativização do direito penal‖, já que a transgressão do ato ou normativa administrativa é conditio sine qua non para a configuração dos delitos ambientais. É como se o Direito Penal relegasse ao Direito Administrativo todos os contornos dos princípios que lhe são inerentes, tais como: legalidade, ofensividade, exclusiva proteção de bens jurídicos, e, passasse a analisar o injusto típico, tão qual e exatamente traçado pela via Administrativa524.

Assim, conforme se pode aferir criticamente, o Direito Penal e os fins que este ramo pretende cumprir, neste aspecto, confunde-se totalmente com a função do Direito Administrativo para a proteção ambiental. Em outras palavras, o injusto penal serviria meramente de reforço das sanções administrativas. Deste modo, assim como ressalva Giunta, o Direito Penal converte-se em ―Direito Penal Administrativo‖525, onde não há tutela de

funções ligadas à exclusiva proteção de bens jurídicos, reforçando-se as duras críticas da Escola de Frankfurt quanto à função meramente simbólica526.

A remissão legislativa em matéria ambiental impõe a exigência de violação das disposições extrapenais juntamente com o requisito de se atuar sem ou contra a autorização administrativa, que, na visão de Basoco527, isso tem fundamento direto num ―delicado equilíbrio de interesses‖: quer se conciliar a proteção ambiental ao desenvolvimento de atividades econômicas que são úteis à vida social. Deste modo, relega-se, muitas vezes a órgãos administrativos ambientais quase que a decisão integral acerca da lesão ou exposição de perigo suportável pelo bem jurídico tutelado pelas normas penais. E mais: esta constante remissão possibilita, de certa forma, a entrada no sistema penal, de princípios e considerações que muitas vezes lhe são alheios528.

Em suma, conforme sustentado por Teradillos Basoco, este modelo de acessoriedade absoluta ou de dependência absoluta, peca em dois sentidos: reduz a seleção e hierarquização de bens jurídicos que o Direito Penal deve realizar, e, por outro lado, diminui o efeito esperado de prevenção geral positiva inerente a este ramo punitivo529. Sobre este aspecto, Blanca Buergo afirma que existem duas questões diferentes relacionadas entre si: a primeira tem a ver com a crescente adoção de regras de tipificação que mais tem a ver com o

524 Neste ponto reside a preocupação de: SCHÜNEMANN, Bernd. Op. cit., p. 206 e ss.

525 GIUNTA, Fausto. Il diritto penale dell'ambiente in Italia: tutela di beni o tutela di funzioni? In: Rivista

Italiana di Diritto e Procedura Penale, Milano, v. 40, n. 4, pp.1097-1123, out./dez. 1997.

526 CARVALHO, Érika Mendes de. Op. cit., p. 306. 527 Cf. TERRADILLOS BASOCO, Juan. Op. cit., p. 47. 528 Cf. TERRADILLOS BASOCO, Juan. Ibidem, p. 47. 529 TERRADILLOS BASOCO, Juan. Ibidem, p. 313.

Direito Administrativo do que com o Penal, e que este ramo acaba por acolhê-las. Depois, estaria a chamada ―acessoriedade administrativa‖, da qual vários problemas surgem530.

Segundo Buergo, o primeiro dos problemas da acessoriedade administrativa surge, justamente, sob um prisma da dependência absoluta do Direito Penal Ambiental: consubstancia-se no fato de que a necessária existência de um setor administrativo de amplitude e transcendência torna praticamente inevitável a contínua referência, remissão e dependência da proteção penal às normas administrativas531.

Além dos problemas levantados pela controvérsia relacionada com a natureza incidental da regulamentação criminal em relação à administrativa, é claro que isso tem implicações para a dimensão técnico-jurídica na formulação de seus próprios tipos penais, não apenas para o uso de infrações penais em branco, mas em outras ocasiões, a depender da existência de uma violação criminal prévia administrativa ou falta de (ou da infração) um ato ilícito532.

Desta forma, como para a realização do tipo penal básico da proteção penal ambiental, depende da violação das normas administrativas relacionadas, há uma limitação do conteúdo da ação típica, como forma de impor uma exigência adicional, para delimitar o âmbito das ações penalmente relevantes. Esta é uma consideração que adota uma perspectiva de dependência absoluta do Direito Penal em relação às regulações administrativas, outorgando-se a estas a competência para estabelecer que determinados perigos não são relevantes penalmente e a que determina, em definitivo, os limites do risco permitido em matéria penal ambiental533.

Há que se considerar que o fato de o indivíduo transgredir o Direito Administrativo no que tange às questões ambientais, por si só, não impõe a sanção penal, já que para a aplicação de uma pena, considerada a mais gravosa das penalidades no ordenamento jurídico, há critérios específicos de valoração acerca da proteção de bens jurídicos relevantes, que só incidem sobre as condutas mais gravosas.

530 MENDOZA BUERGO, Blanca. El delito ecológico y sus técnicas de tipificación. Disponível na Internet em:

http://www.ecoiurislapagina.com/biblio/articulos/art125.htm. Acesso em: mar.2012, p. 1 e ss.

531 Cf. MENDOZA BUERGO, Blanca. Ibidem, p. 1 e ss. 532 Cf. MENDOZA BUERGO, Blanca. Ibidem, p. 1 e ss.

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