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Índice de tabelas do capítulo

Na literatura, as construções ditransitivas ─ quer sejam de duplo objecto (CDO)

3.2. Propostas no âmbito da Teoria de Princípios e Parâmetros 1 Questões centrais abordadas

3.2.1.9. Pylkkänen (2002)

Pylkkänen converge com Marantz (1993) quando este constata parecenças entre as LB e o inglês e propõe o tratamento da CDO em inglês como uma construção aplicativa, mesmo sem evidência morfológica do morfema aplicativo. Esta proposta afigura-se importante uma vez que reconhece que o âmbito dos núcleos aplicativos é muito mais amplo e complexo do que era suposto inicialmente. Esta perspectiva sugere igualmente a existência de CDO em variadas línguas como por exemplo o Búlgaro, o Coreano, o Espanhol, o Grego, o Japonês, o Romeno, etc. Também, este prisma, permite observar a existência de várias assimetrias na sintaxe e semântica das construções aplicativas, sendo importante para a sua identificação o facto de um dos DPs na estrutura dos argumentos do verbo ser introduzido por um núcleo aplicativo. Assim, de acordo com Pylkännen (2002) existem dois tipos de construções aplicativas semanticamente diferentes.

Em CDOIP, o DP-tema é inserido acima do PP. Na CDO, o DP-OI é inserido acima do DP-tema. Neste caso, segundo Marantz, o núcleo aplicativo é um verbo leve (vAppl) que toma um evento como argumento e licencia sintáctica e semanticamente o DP-OI no seu especificador, relacionando-o como participante do evento. Pylkkänen (2002) parece estar em sintonia com Marantz (1993) e Pesetsky (1995) quanto ao facto de o Inglês e as LB (Chaga, por exemplo) exibirem CDO com OI-beneficiário aplicativo, mas refere que há diferenças importantes nas propriedades semânticas e sintácticas nas duas línguas. Assim, em Kichaga, um beneficiário pode ocorrer com um verbo inergativo:

- Kichaga: beneficiário

(52)

N -a. -i. –lyì -í -à m.- kàk-élyá

FOC-1s-PR-eat-APPL-FV 1-wife 7-food ‘He is eating food for his wife’

[Pylkkännen (2002)]

- Chichewa: instrumental

(53)

Mavuto a-na-umb-ir–a mpeni mtsuko

Mavuto SP-PAST-mold-APPL-ASP knife waterpot ‘Mavuto molded the waterpot with a knife’

[Baker (1988b:300)]

Do mesmo modo, em Inglês não é possível um núcleo aplicativo relacionar um argumento aplicado a um evento. Uma interpretação em que o OI não estabeleça relação de posse (obrigatória) com o OD resulta agramatical em CDO (54b):

- Inglês: beneficiário

(54a)

*He ate the wife food. (b)

* I run him.

Deste modo, (52), não vai ser expressa em Inglês com a CDO (54a), mas com a CDOIP porque não parece normal estabelecer uma interpretação de posse entre wife e

food:

(55)

Igualmente, na construção aplicativa em Chichewa (53), faca mantém uma relação instrumental com o evento de moldar o pote, mas não uma relação directa, ou de posse, com pote. A mesma observação esclarece o fato de que apenas em Chaga um participante beneficiário pode ser adicionado a um verbo inergativo como correr (to

run).

Com base nos dados avançados, Pylkkänen (2002) sugere que o Inglês e o Chaga pertencem ao grupo de línguas que exibem uma tipologia universal dos núcleos aplicativos que introduzem argumentos. Propõe a existência de dois tipos distintos de núcleos aplicativos: o aplicativo alto, que denota uma relação temática entre um indivíduo e um evento descrito por V e o aplicativo baixo, em que o núcleo combina com o OD e que denota uma relação de transferência de posse entre dois indivíduos (OD e o DP-aplicado), sendo que os núcleos aplicativos altos são inseridos acima da raiz verbal ou VP e os núcleos aplicativos baixos, abaixo do VP, respectivamente, (56) e (57):

- Aplicativo alto [Chaga] (56) VoiceP He Voice ApplP wife APPL-ben VP eat food

- Aplicativo baixo [Inglês] (57) VoiceP He Voice VP baked ApplP Bill APPL a cake

As estruturas de (56-57) são similares no aspecto em que o DP-aplicado c- comanda assimetricamente o OD. O c-comando assimétrico é apenas uma das propriedades que definem as CDO/ aplicativas entre as diferentes línguas (Barss & Lasnik (1986), Marantz (1993)). Em relação à interpretação dos dois tipos de estruturas aplicativas, os aplicativos altos adicionam um participante ao evento descrito por V enquanto que os aplicativos baixos não estabelecem relação semântica com V, estabelecem uma relação de posse com o OD. Assim, de acordo com Pylkannen, os significados das CDO do Inglês de (58) são os seguintes:

- Aplicativo baixo – Inglês

(58a)

I wrote John a letter.

(Escrevi uma carta e a carta está na posse de John) (b)

I baked my friend a cake.

(Cozinhei/Fiz um bolo e o bolo está na posse do meu amigo) (c)

I bought John a new VCR.

(Comprei um novo VCR e o VCR está na posse do John)

Os significados propostos em (58) são diferentes dos sugeridos para as CDO como orações pequenas (Guéron (1986); Hoekstra (1988); Harley (2000) que consideram as CDO como construções causativas. O núcleo aplicativo baixo selecciona um DP-tema como seu complemento e o relaciona ao DP licenciado no seu especificador e seguidamente, a frase aplicativa (ApplP) combina com o verbo. O núcleo aplicativo baixo exprime uma relação dinâmica de transferência de posse na qual o DP mais alto se relaciona com o DP-tema mais baixo.

Em inglês, os núcleos aplicativos baixos modificam o OD, sendo interpretados como relações possessivas direccionais, to-thepossession-of, i.e., para a posse de, como expresso em John baked Bill a cake e John sent Mary a letter. A CDO do inglês está condicionada ao aplicativo baixo, no qual o argumento aplicado é interpretado como recipiente ou beneficiário.

Pylkkänen conclui que os núcleos aplicativos licenciam um argumento ao verbo nas LB e no Inglês. Marantz (1993) considera que os núcleos aplicativos são elementos que tomam um evento como argumento e introduzem um elemento tematicamente relacionado com o evento. A teoria dos núcleos aplicativos proporciona uma estrutura ditransitiva na qual quer o vAPPL quer voice – o núcleo introdutor do argumento externo – são elementos funcionais acima de VP. Pylkkänen argumenta que a estrutura proposta por Marantz não é universal porque não considera núcleos aplicativos altos e núcleos aplicativos baixos.

Neste prisma, na representação da CDO em Xitshwa poderíamos adoptar a proposta de Pylkkänen (2002), que representa um contributo importante para a elaboração de uma tipologia universal dos núcleos aplicativos (45). O núcleo aplicativo alto adiciona em Xitshwa um argumento ao verbo.

Resumindo as propostas avançadas pela TPP, na sua generalidade muito consistentes, ressalva-se o facto de colocarem a centralidade das suas descrições em línguas não Bantu o que torna a sua adequação a estas línguas insuficiente. Assim, tendo em consideração as características estruturais do Xitshwa, os aspectos que se seguem parecem não obter explicação:

(i) não ocorrendo CDOIP em Xitshwa, as análises da TPP a privilegiar são as que não fazem apelo a um núcleo preposicional e referem antes um morfema aplicativo;

(ii) qualquer das análises apresentadas não parece captar a existência de um parâmetro interno às línguas Bantu, que distingue o comportamento das línguas chamadas simétricas das assimétricas;

(iii) Na TPP as propostas centram-se na alternância CDOIP vs CDO, e não abordam as alternâncias possíveis entre os DPbenef DPtema/pacque podem ou não ocupar a posição de objecto, consoante a língua Bantu envolvida.

3.3. Propostas no âmbito da Gramática Lexical Funcional