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QUANDO CONSTROEM A IDENTIDADE PROFISSIONAL

No documento QUANDO ENGENHEIROS TORNAM-SE PROFESSORES (páginas 161-164)

Para Pimenta e Anastasiou279, os professores da educação superior, isto é, os engenheiros, advogados, médicos, arquitetos, economistas, dentre outros, quando têm que preencher uma ficha de identificação, com mais freqüência se identificam profissionalmente de acordo com as suas graduações, ou seja, como engenheiros, médicos, arquitetos e economistas. As narrativas dos professores participantes desta pesquisa não estão de acordo com a afirmação dessas autoras, pois todos se apresentam como professores, fato que me surpreendeu. Na minha narrativa conto que o meu entendimento sobre a minha identidade profissional mudou com a formação na área de Educação; antes, eu me identificava como engenheira civil e, atualmente, me identifico como professora. A professora Marilda conta que, na maior parte das vezes diz que é professora. O professor Irineu se identifica como

professor, apresentando como justificativa a sua situação trabalhista. O professor Pedro Paulo, distingue duas fases: antes e depois de se aposentar na CEMAT, e conta que antes de se aposentar nessa instituição dizia que era engenheiro e professor e, a partir de quando ficou trabalhando apenas na UFMT, passou a dizer que é professor dessa instituição.

Contudo, percebi que a questão da identidade profissional não está bem esclarecida para os professores envolvidos nesta pesquisa. Eu declarei que mesmo quando me identificava como engenheira civil, não me sentia muito segura sobre isto. Falei também que a experiência como coordenadora de curso, e o conseqüente envolvimento maior com as questões pedagógicas, suscitaram em mim dúvidas que, somente agora, com a formação no Mestrado em Educação, estão sendo sanadas, ou seja, hoje tenho um entendimento mais esclarecido sobre essa questão. A fala da professora Marilda “a profissão é de engenheira, mas eu sempre exerci a profissão de professora de engenharia” denota indefinição; e a fala do professor Irineu: “Sinto que, como professor, estou exercendo a Engenharia Sanitária a todo o momento”, me leva a crer que ele tem o mesmo entendimento que eu tinha antes da minha formação na área de Educação, ou seja, entende a sua atividade docente como o exercício de uma das atribuições profissionais do engenheiro. O Congresso Nacional, em 24 de dezembro de 1966, decretou a Lei n. 5.194, que regula o exercício das profissões de Engenheiro, Arquiteto e Engenheiro-Agrônomo, e dá outras providências. Na Seção IV dessa lei, lê-se: “Art. 7º. – As atividades e atribuições profissionais do engenheiro, do arquiteto e do engenheiro-agrônomo consistem em: [...] d. ensino, pesquisas, experimentação e ensaios;”280 Daí deriva o entendimento de muitos engenheiros-professores de que, como professores dos cursos de engenharia, estão exercendo uma das atribuições dos engenheiros, regulamentadas por lei.

Percebi que a atuação profissional fora da universidade leva o professor a crer que tem duas identidades profissionais, como o caso do professor Pedro Paulo antes de se aposentar na CEMAT, e do professor Irineu que, mesmo sendo contratado em regime de dedicação exclusiva, realiza alguns trabalhos como engenheiro sanitarista fora do horário de expediente da UFMT. Baseada nas narrativas dos professores, concluo que o regime de dedicação exclusiva contribui de forma significativa, mas não é suficiente para que o professor da educação superior se identifique profissionalmente como professor. O professor Pedro Paulo diz que após ter passado para o regime de dedicação exclusiva, pode dedicar-se mais à carreira de professor e que, atualmente, quando lhe perguntam sobre a sua profissão, diz que é

280

CONSELHO FEDERAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA. Leis – Decretos e Resoluções. 3. ed. Brasília: 1987.

professor da UFMT. Também diz que, hoje, se considera mais professor. Essas afirmações do professor Pedro Paulo levam-me a questionar se esse esclarecimento quanto à sua identidade docente não é, principalmente, conseqüência da sua formação no Mestrado em Educação.

Dos quatro professores participantes desta pesquisa, apenas o professor Pedro Paulo já foi professor sem dedicação exclusiva à Universidade e, baseado no que ele diz, nessa situação, o professor se considera mais engenheiro que professor, e esta concepção deve refletir de forma negativa na sua prática como docente. Complementa esta observação a declaração do professor Pedro Paulo de que quando passou para o regime de dedicação exclusiva na universidade, pôde se dedicar mais à carreira docente.

O meu relato e o relato do professor Pedro Paulo mostram que os cursos de pós- graduação, lato sensu e stricto sensu, na área de Educação, contribuem de forma muito significativa para melhor compreensão desta questão e para o conseqüente assumir da identidade docente.

Conforme Pimenta e Anastasiou281, quando os professores do nível superior também exercem atividades como profissionais autônomos, nos seus escritórios, consultórios, costumam se identificar como professores universitários, o que sinaliza clara valorização social do título de professor. No entanto, como relatei, antes de eu realizar os cursos da área de Educação, dizia que era engenheira civil porque achava que este título era mais valorizado socialmente. Os outros professores não abordaram esta questão, o que me leva a pensar que, talvez, nos dias de hoje, já não exista essa diferença de prestígio social entre essas duas profissões, o que não quer dizer que a sociedade esteja valorizando mais o professor universitário, pois acredito que o prestígio do engenheiro é que diminuiu.

Pimenta e Anastasiou282 também fazem a ressalva de que os professores universitários não usam o título de professor sozinho, pois essa forma sugere uma identidade menor, do ponto de vista de valorização social, pois parece referir-se aos professores secundários ou primários. Essa ressalva é atestada pela professora Marilda que, além de dizer que é professora do Ensino Superior, sempre faz questão de firmar que é professora de engenharia. Concorda, também, com as falas do professor Pedro Paulo, que todas às vezes que se declara professor, usa a designação de professor da universidade.

A fala do professor Irineu: “Quando sou apresentado para alguém, digo que atualmente sou professor, mas sou engenheiro sanitarista,” é um indicador de que o curso de

281 PIMENTA E ANASTASIOU, 2005. 282

graduação compreende vivências que marcam a pessoa, de modo que, mesmo exercendo outra profissão, ela continua se identificando profissionalmente também, de acordo com a sua formação do nível de graduação. Penso que isto é mais freqüente entre os professores que realizam trabalhos das suas áreas profissionais fora do âmbito da universidade, no entanto, eu nunca atuei como engenheira e, como declaro na minha narrativa, “não relego para um segundo plano a minha formação de base, que é a Engenharia Civil, pois eu não seria professora se não fosse engenheira.”

No que se refere à identidade profissional, concluo que, mesmo se identificando como professores, os engenheiros não relegam a segundo plano a formação em engenharia, o que mostra que o curso de graduação é mais do que uma habilitação para uma profissão; é um conjunto de vivências que deixam marcas na pessoa, que contribuem de forma fundamental para o processo de tornar-se profissional na área específica da engenharia, e também na área da docência do nível superior.

No documento QUANDO ENGENHEIROS TORNAM-SE PROFESSORES (páginas 161-164)