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DEFICIÊNCIA INTELECTUAL

Nos dias atuais, a discussão em torno da aprendizagem de alunos com deficiência intelectual tem despertado o interesse de alguns pesquisadores pelo fato de serem poucos os estudos que se debruçaram na tentativa de compreender esse processo que nos parece bastante complexo e polêmico. A dificuldade começa pelo sentido variado que define o conceito como podemos perceber no capítulo 1, dificultando a compreensão dos professores e consequentemente podendo (ou não) limitar a prática do educador juntamente ao aluno que apresenta deficiência intelectual.

Neste sentido, aqui temos como finalidade, apresentar algumas pesquisas que direcionaram seus olhares para esse processo na tentativa de analisá-lo e compreendê- lo dentro das diversas redes de significações que interagem no contexto escolar e que perpassam o processo de aprendizagem da criança com deficiência intelectual.

Faz-se necessário ressaltar que a importância da contextualização desses estudos está presente no fato de podermos refletir sobre a constituição do processo de aprendizagem desses sujeitos nos diferentes espaços/tempos, buscando destacar e compreender a importância de nosso estudo no contexto da Educação Infantil.

Dentro dessa lógica, estudos como os de Carvalho (2004), Luz (1999), Ferreira (1994) e Padilha (2000), buscam desvelar os caminhos ocultos que perpassam a aprendizagem do aluno com deficiência intelectual, desmistificando crenças, valores e métodos que inferiorizam esses indivíduos desclassificando suas possibilidades de aprendizagem, através da imposição de obstáculos que não existem em seu contexto. Todavia concordamos com Meirieu (2002) quando nos diz que, é necessário o “fazer diferenciado”, desobstruído pelos rótulos, valores, limites entre o dizer e o fazer do

professor encontrados na “coragem de começar...”. Segundo Meirieu (2002, p. 112), o ato de educar a criança supõe,

[...] O reconhecimento do sujeito na criança, sem pré requisito, sem esperar que ela tenha acesso a palavra, à “idade da razão” ou à maioridade civil. A educação consiste em estabelecer uma relação de escuta sem nenhum tipo de condição, em supor sistematicamente a intencionalidade, em atribuir sentido ao que se troca, ao menor gesto, ao menor grito, à menor transação afetiva e cognitiva [...].

O autor ainda nos faz refletir que a pedagogia diferenciada “não coloca a sondagem psicológica do aluno” para além de toda atividade pedagógica, pelo contrário essa pedagogia estabelece um encontro de variados dispositivos que permitiram ao aluno tornar-se sujeito de suas aprendizagens. Esse ato conscientizará o aluno que não é apenas importante fazer novas descobertas, mas enriquecer-se pelas trocas, sondagem, avaliação e atividade coletiva realizada na sala de aula.

Diante disso, faz-se necessário ao educador compreender o processo de desenvolvimento e aprendizagem da criança com deficiência intelectual através de uma pedagogia diferenciada atentando para os seus progressos e avanços. O fato de algumas limitações se fazerem presentes causados pela deficiência, não significam que a criança com deficiência intelectual não poderá aprender. As limitações devem ser trabalhadas no contexto da escola no sentido de que a criança através da superação de seus limites consiga adquirir conhecimento de uma forma diferenciada e mediada de acordo com sua capacidade intelectual e cognitiva.

Neste sentido, com o objetivo de compreender esse processo Carvalho (2004) desenvolve um estudo no qual investiga as possibilidades de relação com o conhecimento vividas por jovens e adultos com deficiência intelectual. De acordo com a autora que toma a abordagem histórico-cultural como dispositivo para desenvolver seus estudos, nos alerta para a dificuldade enfrentada pelos professores para atuarem com esses alunos frente a uma concepção de deficiência intelectual como condição

definidora da capacidade do indivíduo ocasionando obstáculos para o desenrolar da prática pedagógica.

Assim como nos é demonstrado pelos estudos de Carvalho (2004), nosso estudo também nos apontam que o educador que trabalha com alunos com deficiência intelectual ainda possuem uma concepção de deficiência que incapacita o aluno frente às possibilidades que poderia vir a ter no seu processo de aprendizagem. Esse fato nos alerta para a necessidade de um trabalho de formação continuada visando compreender o conceito e (re)significar a prática do educador no contexto da sala de aula.

Os resultados dos estudos de Carvalho (2004) apontaram para dificuldades vividas por deficientes intelectuais ao serem identificados como jovens e adultos, loucos, privado de viver a sexualidade e por outro lado demonstraram seus esforços na tentativa de superar tais denominações desejando ampliar sua participação na sociedade. Diante disso, Carvalho (2004) nos chama a atenção para o papel das práticas educativas que deveriam ser constitutivas de possibilidades dentro da complexa relação estabelecida por esses sujeitos em suas condições adversas de constituição da sua subjetividade.

Em perspectiva semelhante, Luz (1999) realiza um estudo em que tomando como base a perspectiva histórico-cultural, busca compreender como acontecem os processos de abstração3 do conhecimento em jovens com deficiência intelectual levando em consideração o desenvolvimento e aprendizagem. De acordo com a autora, a abstração em deficientes intelectuais tem sido caracterizada pela não manifestação. Neste sentido, a pesquisadora busca por meio do estudo, comprovar que este processo acontece se a esses indivíduos forem oferecidas possibilidades para que a abstração ocorra.

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De acordo com Luz (1999) a função da abstração é obter idéias gerais através de uma operação mental estreitamente ligada com a função semiótica da linguagem, e não com uma operação metafísica. Berkeley argumenta que não se pode ter uma “faculdade de abstração” sem levar em conta a percepção do real, “se pode imaginar algo que se move, porém não o movimento” (Mora, 1998).

Os resultados aferidos por Luz (1999) nos fazem refletir que o processo de abstração em indivíduos com deficiência intelectual será possível através do trabalho coletivo, pois segundo a autora é no coletivo que deficientes intelectuais podem conhecer, conceituar, elaborar e significar o mundo.

De acodo com Luz (1999), Vygotsky é bastante enfático ao falar do funcionamento mental destes sujeitos, sustentados pelo outro. Dessa forma, argumenta sobre os processos compensatórios, ou sobre os modos do sujeito se organizar, que “compensem” suas deficiências. De acordo com essa pesquisadora, o autor caracteriza dois modos principais dos sujeitos “enriquecerem o processo de desenvolvimento”: o primeiro é o sistema de mediação da linguagem e, o segundo, é a mediação do outro nas relações sociais. Neste sentido, conclui que no coletivo esses processos são ativados contribuindo para o desenvolvimento da abstração em alunos com deficiência intelectual.

Em uma perspectiva semelhante, buscando compreender os processos de aprendizagem de alunos com deficiência intelectual, Ferreira (1994) e Padilha (2000) desenvolvem estudos visando investigar perspectivas e possibilidades que perpassam o desenvolvimento cognitivo desses sujeitos e a constituição de sua subjetividade enquanto ser social inserido em uma sociedade.

Para Padilha (2000), a aprendizagem se constitui a partir de possibilidades e oportunidades. A inserção da aluna com deficiência intelectual nas atividades coletivas que se utilizavam da linguagem como jogos, narrativas, desenhos e dramatizações possibilitou seu desenvolvimento até então desacreditado pela gravidade de seus comprometimentos.

Já Ferreira (1994), nos diz que as conclusões aferidas a partir de sua pesquisa foi que a prática educacional do professor em relação à aprendizagem do aluno com deficiência intelectual se mostrou fragmentada e artificializada, enfatizando o treino de funções elementares que restringiam as possibilidades de formas culturais maduras de

atividade humana que acabavam por prejudicar o desenvolvimento cognitivo dos alunos que apresentavam deficiência intelectual.

Diante dos estudos expostos, podemos dizer ancorados na abordagem histórico- cultural que perpassa todas as pesquisas apresentadas que a aprendizagem da pessoa com deficiência intelectual de fato acontece se a eles forem oferecidos conteúdos mediados que levem em consideração sua limitação e seu desenvolvimento cognitivo.

O fato das pesquisas apresentadas já ter sido realizado há alguns anos, nos faz levantarmos alguns questionamentos, por encontrarmos ainda hoje idéias e práticas errôneas dentro do contexto da escola em relação ao aluno que apresenta deficiência intelectual tornando tais pesquisas bastante atuais.

Esse fato nos alerta para a necessidade de estudos mais centrados a fim de discutirem o papel da instituição educativa na educação desses sujeitos, buscando categorizar esses princípios através do (re)pensar o papel da escola e do professor perante esses alunos. Neste âmbito nosso estudo se coloca como dispositivo na tentativa de analisar refletir e categorizar os processos relacionados à aprendizagem da criança com deficiência intelectual no âmbito da Educação Infantil.

Levando em consideração os aspectos discutidos, nosso estudo levanta algumas indagações a respeito da criança com deficiência intelectual e seu processo de aprendizagem: Onde estaria a criança com deficiência intelectual no contexto da sala de aula da Educação Infantil? Seria este um sujeito presente, porém invisível para o professor diante de suas práxis e no espaço da sala de aula? Como o educador estaria compreendendo o desenrolar do seu processo de aprendizagem?

Neste sentido, baseado em algumas considerações feitas por Boaventura (2002) no que tange a sociologia das ausências e sociologia das emergências é que buscamos categorizar esta criança e sua aprendizagem.

De acordo com Boaventura (2002), a sociologia das ausências busca fazer com que os sujeitos que estão ausentes se tornem presença e façam parte do contexto do qual pertencem e que devidos aos processos de exclusão se encontram à margem dele. Neste sentido, Boaventura (2002, p. 20) assim define a sociologia das Ausências,

Trata-se de uma versão ampla de realismo, que inclui as realidades ausentes por via do silenciamento, da supressão e da marginalização, isto é, as realidades que são ativamente produzidas como não existentes.

Diante disso, nos concentramos no fato de fazer com que estas ausências que estão presentes na sala de aula se façam presenças, buscando trazer a criança com deficiência Intelectual que está presente na Educação Infantil para o contexto do real, através da reflexão da práxis pensando a aprendizagem dessa criança no contexto da Educação Infantil. Segundo Boaventura (2002, p. 20),

[...] O exercício da sociologia das ausências é contra-factual e tem lugar através de uma confrontação com o senso comum científico tradicional. Para ser levado a cabo, exige imaginação sociológica. Distinguo dois tipos de imaginação: a imaginação epistemológica e a imaginação democrática. A imaginação epistemológica permite diversificar os saberes, as perspectivas e as escalas de identificação, análise e avaliação das práticas. A imaginação democrática permite o reconhecimento de diferentes práticas e atores sociais. Tanto a imaginação epistemológica quanto a imaginação democrática tem uma dimensão desconstrutiva e uma dimensão construtiva.

Neste sentido, buscamos através de uma imaginação epistemológica e democrática, refletir sobre a aprendizagem da criança com deficiência intelectual, a postura e o envolvimento do professor no âmbito da diversificação de saberes no contexto da Educação Infantil priorizando as reais necessidades da criança com deficiência intelectual.

Diante disso, refletindo sobre o conceito de sociologia das emergências, poderíamos dizer que a compreensão do processo de aprendizagem da criança com deficiência

intelectual seria a investigação das alternativas que cabem no campo das necessidades concretas das oportunidades e esperanças a partir do fato de acreditarmos nas possibilidades de aprendizagem da criança. Segundo Boaventura (2002, p. 24),

A sociologia das emergências, consiste em proceder uma ampliação simbólica dos saberes, práticas e agentes de modo a identificar neles as tendências do futuro (o ainda-não) sobre as quais é possivel atuar para maximizar a probabilidade de esperança em relação a probabilidade de frustação. Tal ampliação simbólica é, no fundo, uma forma de imaginação sociológica que visa um duplo objetivo: por um lado conhecer melhor as condições de possibilidades da esperança, definir princípios de ação que promovam a realização dessas condições.

Nesse aspecto, partindo desses pressupostos, podemos ressaltar que o processo de reflexão-ação da prática pedagógica em nossa pesquisa, foi observada com mais intensidade no espaço da Educação Infantil especificamente no espaço da sala de aula, enviesada pelo movimento da construção de práticas pedagógicas através da formação continuada que favorecessem a aprendizagem da criança com deficiência intelectual na escola. De acordo com Meirieu (2002, p. 123),

[...] o professor deve investir , lançando mão do que chamamos várias vezes de uma salutar “obstinação didática”, prospeção incansável de formulações que permitam apreender aquilo que se quer transmitir. Ele deve inventar permanentemente novas situações de aprendizagem, investir sua energia na busca de demonstrações eficazes e mediações que permitam ao aluno ter acesso só a cultura que o livrará de seus preconceitos e que lhe oferecerá os meios de se pensar no mundo. (VEJA O ORIGINAL DA CITAÇÃO)

O autor ainda nos diz que é preciso que o educador transfira sua autoridade da relação direta para a organização de situações “pré-reguladas” de modo que a liberdade da criança seja ao mesmo tempo destituída e respeitada: a criança não poderá recusar o que lhe é proposto justamente porque a situação possibilitará agir “conforme suas próprias leis”. Neste sentido, a educação como apresentada a criança é preservada, da

mesma forma que o respeito pela criança realiza por si só, a sua maneira, as aprendizagens que lhe convém.

Neste âmbito, torna-se necessário que o professor permita a criança com deficiência intelectual desde o início de sua vida acadêmica, que o aluno se assuma como sujeito da produção do saber. A responsabilidade atribuída ao professor quanto à formação e aprendizagem da criança é muito grande ao passo que se faz necessário que a educação contemple as mudanças sociais, a criticidade e o exercício da cidadania.

Diante disso, acreditamos que nossa pesquisa é de extrema relevância para o contexto educacional, no tocante a parceria entre conhecimento e prática, objetivando suscitar a reflexão do processo de aprendizagem da criança com deficiência intelectual, pois como nos diz Jesus (2006) “(...) é a partir das pequenas ações que as grandes coisas são construídas”.

CAPÍTULO 5 – FORMAÇÃO CONTINUADA DE EDUCADORES DE

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