• Nenhum resultado encontrado

7.3 – EM BUSCA DE INDÍCIOS DA APRENDIZAGEM DA CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL: ANALISANDO OS EPISÓDIOS

EU TAMBÉM SEI FAZER, É SÓ ME ENSINAR

Terminou o horário do lanche, as crianças subiram com a professora. Carolina subiu depois com a estagiária, pois ainda não tinha terminado de lanchar. Ao chegar à sala de aula, a professora entregou os cadernos e passou uma atividade com o seguinte título: Dê nome às frutas. Após a

professora explicar o que era para ser feito, sentei do lado de Carolina e me dispus a ajudá-la na condução da atividade. Durante a realização da atividade, notei que Carolina não conseguia compreender o que era para ser feito, e a atividade não condizia também no momento com sua capacidade intelectual. Tentei desenvolvê-la de outra forma, comecei a perguntá-la quais eram os nomes da frutas que estavam no desenho. Então, Carolina respondeu prontamente, acertando quase todos os nomes das frutas. Notei que ela não acertou os nomes de algumas frutas. Isso aconteceu, porque algumas frutas desenhadas estavam um pouco apagadas, o que dificultou o entendimento, sobre que fruta estava desenhada ali. No entanto procurei mostrar essas frutas em revistas, que estavam disponíveis no ambiente da sala de aula. Durante a atividade, além de auxiliar Carolina, ajudei também as demais crianças que estavam na mesa. Quando apontava para uma das crianças a fruta que era para ela escrever o nome, olhei para o quadro e apontei, pois estava escrito lá. Carolina, prontamente, levantou da mesa e foi mostrar para o amiguinho o que eu estava apontando. As crianças começaram a rir de Carolina, eu prontamente falei: “Gente olha a Carolina, ela está mostrando o nome”. Mas as crianças não pareciam dar muita atenção a ela. Carolina voltou à mesa, sentou-se e começou a pintar as frutas da atividade. A atividade teve fim, a professora recolheu os cadernos e levou as crianças para o pátio. Ao chegar ao pátio Carolina queria tirar os sapatos. Apesar da vontade de tirar os sapatos da aluna, eu disse que antes de tirá-lo era melhor que ela pedisse a professora, pois as demais crianças estavam calçadas. Porém, a professora vendo nossa empolgação disse rapidamente: “Carolina você nunca tira os sapatos, porque que hoje você quer tirar meu bem”! Os sapatos de Carolina não foram tirados, ela continuou a insistir até que enjoou e começou a brincar, brincou muito até que chegou a hora de jantar. Terminado o jantar, voltamos para a sala onde outra atividade foi proposta pela professora, Carolina também não conseguiu compreender está atividade. Novamente tentei fazer de forma diferenciada, colocando na folha os números e utilizando material concreto. Repetimos os números de 1 a 10, mostrando para Carolina as quantidades dos números com as mãos e depois com peças de jogos de montagem. Está atividade foi realizada com muita empolgação pela criança que demonstrava estar compreendendo a partir do uso do material concreto e da atividade diferenciada abstrair a noção de números.

Percebemos neste episódio que Carolina desenvolve a mesma atividade da turma. Isso seria muito interessante se essas atividades fossem preparadas para atender as especificidades da criança. O que se percebe no contexto da sala da aula é que as atividades são entregues a Carolina e nada é trabalhado no sentido de que a aluna realmente desenvolva a atividade junto com a professora e a turma.

Neste sentido, quando Carolina recebe a folha da professora pedindo que ela escreva o nome das frutas desenhadas, a aluna não consegue compreender o que deveria ser feito na atividade. Nossa intervenção nos mostrou que a visualização das frutas nas revistas despertou a curiosidade da aluna e, conseqüentemente, aguçou o seu processo de aprendizagem. Tal fato, nos prova que a atividade diferenciada e a mediação do conhecimento como nos alerta Vygotsky (2001, 2004) são fundamentais para o desenvolvimento da criança com deficiência intelectual presente no espaço da Educação Infantil.

Outra questão que deveria ser trabalhada pela professora no contexto da sala de aula é a diversidade presente nesse espaço, alertando os alunos para a questão da diferença, pois a partir do momento que essas idéias forem trabalhadas com a turma abre se um horizonte para compreender o porquê da presença de Carolina no contexto da sala de aula pelas crianças e a importância da participação dela no desenvolvimento coletivo da turma.

No entanto a necessidade do trabalho com atividades diferenciadas que de fato possibilitassem o desenvolvimento da criança com deficiência intelectual naquele contexto se tornavam de fundamental importância visto que o uso de atividades que não condiziam com a capacidade intelectual da criança ou que dificultavam sua compreensão era constantemente aplicado pela professora como podemos perceber no episódio abaixo,

EPISÓDIO II MARÇO DE 2009

NOSSA!!! ELA PODE APRENDER!!!!!!

Quando cheguei à sala de aula, a professora estava solicitando que todos se sentassem para que pudesse passar a atividade no quadro. A atividade era a seguinte: a professora passou um texto no quadro que as crianças tinham que ler com ela e depois copiar o texto no caderno. O texto era o seguinte: “Cara quadrada tem dois olhos, tem boca e no meio um nariz”. Depois a

professora desenhava o texto, cantando uma música com as crianças e desenhando um quadrado botando olhos, boca e nariz. As crianças repetiram o texto várias vezes, juntamente com a professora. Porém esta atividade não era apropriada para Carolina, fiz com ela de forma diferente, perguntando o nome dos membros do corpo para ver se ela sabia. Primeiro eu mostrei o que era um olho, a boca, o nariz e depois perguntei para Carolina que respondeu, prontamente, no entanto, às vezes confundia boca com nariz. Carolina me fez uma pergunta: “Tio a nossa cara é quadrada?” Diante da pergunta da criança, expliquei que não, mostrando os rostos das demais crianças e seu próprio rosto através de um espelho e mudei o texto para cara redonda. Na aula anterior, havia ensinado à Carolina que quando ela pegasse a canetinha, colocasse a tampa na superfície de cima para que não perdesse, pois tinha o costume de tirar a tampa e jogá-la em qualquer lugar. Notei que ela já tinha aprendido isso. Quando pegou a canetinha tirou a tampa e ao invés de largá-la jogada virou para mim e disse: “Tio tem que botar aqui?” Nesse momento, a professora que estava a nós observar se Aproximou e disse: “Ela aprendeu mesmo, olha! Parabéns, Carolina!” Depois virou para mim e disse: “Eu vi você ensinando isso, mas eu sempre pensei que ela nunca pudesse aprender, por isso não ensino às vezes as coisas pra ela. Mais uma vez eu ensinei, mas menino parece que ela não aprende! No outro dia faz a mesma coisa (rsrsrs)”. Pra dizer a verdade, também me sinto meio culpada por não ensinar as coisas pra ela. Mas, são tantas crianças às vezes a gente não da conta né?” (Professora Regente). Neste momento, falei sobre as possibilidades de aprendizagem de Carolina. A professora concordou plenamente e voltou para o quadro e continuou a aula.

Notamos no episódio, que a atividade não foi compreendida por Carolina que olhava para a professora, durante o momento que estava cantando a música, completamente desnorteada, mas ao mesmo tempo tentando, entender o que acontecia no contexto da sala de aula. O interessante é que durante a ocorrência desse fato, tentamos explicar para Carolina o que a professora estava fazendo, no entanto, a criança não queria compreender o fato a partir de nossa explicação. Carolina continuava olhando a professora na esperança de que ela pudesse explicá-la a atividade e inseri-la na cantiga junto com as demais crianças. No entanto isso não aconteceu.

Após o fim da cantiga, percebendo que Carolina não havia compreendido a atividade proposta, intervimos no contexto, objetivando tornar a atividade o mais clara possível para Carolina facilitando seu processo de aprendizagem. O fato era que a atividade não estava confusa apenas para Carolina, pois as crianças também não compreendiam. Por

que cantar cara quadrada se a nossa cara era redonda? Diante disso, a mudança que realizamos na letra da música, fez com que os processos de compreensão da atividade por parte de Carolina e das demais crianças fossem desencadeados.

Outro avanço importante em relação à aprendizagem de Carolina, evidente nesse episódio, é o fato da criança ter aprendido a utilização correta da canetinha já que pegava as tampas e jogava por todo o ambiente da sala. A surpresa da professora ao notar que Carolina aprendeu o uso da canetinha nos mostra que, apesar de trabalharmos nos grupos de formação continuada a compreensão da aprendizagem da criança através da reflexão e análise de alguns episódios que ocorreram no pátio e até mesmo no contexto da sala de aula, a aprendizagem dessa criança ainda causava estranhamento à professora.

Outro episódio muito interessante em que fica evidente o desenvolvimento e aprendizagem de Carolina ocorre durante a contação de histórias como podemos observar abaixo,

EPISÓDIO III ABRIL DE 2009

Documentos relacionados