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Os discursos sobre interdisciplinaridade que pairam sobre o ambiente escolar ainda são considerados um grande desafio. Nesse sentido, é seminal salientar algumas fases importantes dos primeiros estudos da interdisciplinaridade. Fazenda (2003) pontua que a partir de 1970 destacam-se as questões epistemológicas para explicação do conceito de interdisciplinaridade; a partir de 1980 destaca-se, por meio de uma diretriz sociológica, a tentativa de explicar um método para a interdisciplinaridade; a partir de 1990, a criação de uma nova epistemologia, priorizando uma teoria para a interdisciplinaridade. Vale sublinhar ainda que por volta de 1960 ocorreram, na Europa, precisamente na França e Itália, movimentos estudantis que solicitavam um novo modelo de universidade e escola.

Ao término dos anos 60, a interdisciplinaridade era vista como uma possibilidade de transformar o período de crise pelo qual passavam as teorias, modelos e paradigmas da ciência que tinha apoio do positivismo, o qual havia deixado em segundo plano as

humanidades e estabelecido o regime departamental nas universidades. E ainda, promovendo a extensão às especializações e também as divisões entre disciplinas.

A partir do contexto histórico da interdisciplinaridade, ressaltamos que a definição sobre interdisciplinaridade chegou ao Brasil pelos estudos de Georfes Gusdorfe e, em seguida, por Piaget. A obra de Gusdorfe foi a inspiração para Japiassu, no campo da epistemologia; e para Fazenda, no campo da educação. Japiassu (1976, p.74) argumenta que “a interdisciplinaridade caracteriza-se pela intensidade das trocas entre os especialistas e pelo grau de interação real das disciplinas no interior de um mesmo projeto de pesquisa”. O pensamento de Japiassu define como pode ser trabalhada a interdisciplinaridade em sala de aula, enfatizando uma interação entre as disciplinas em um mesmo projeto de pesquisa.

Nessa direção, o termo interdisciplinaridade é trabalhado por inúmeros autores não somente como um conceito, mas como uma prática a ser vivenciada. Para tanto, nas discussões realizadas em 1970, precisamente no seminário da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), Japiassu e Fazenda concordaram com as considerações divulgadas nesse seminário acerca dos benefícios da interdsciplinaridade. Assim, Fazenda (1992, p. 44-48) destaca alguns mais importantes:

1) Meio de conseguir uma melhor formação gral; 2) Meio de atingir uma formação profissional; 3) Incentivo à formação profissional;

4) Condição para uma educação permanente; 5) Suspensão da dicotomia ensino/pesquisa; 6) Forma de compreender e modificar o mundo;

Esses benefícios apresentados por Fazenda (1992) referiam-se à interação e integração das disciplinas. Entretanto, mesmo com inúmeros benefícios, a autora chama a atenção para os obstáculos que podem surgir diante das etapas da interdisciplinaridade no âmbito de sala de aula.

Nesse contexto, compreendemos o quanto é necessário o professor romper com a fragmentação de conteúdos e assumir uma postura interdisciplinar, como afirma Fazenda (2001, p.18) “o que caracteriza a atitude interdisciplinar é a ousadia da busca, da pesquisa: é a transformação da insegurança num exercício do pensar, num construir”. A autora nos convida a refletir sobre a atitude interdisciplinar e que por meio da pesquisa é possível uma transformação, uma troca de experiências, um dialogar na prática pedagógica.

muitos professores e instituições escolares devem superar, como podemos destacar: o medo de trabalhar com algo diferente da rotina de sala de aula, acomodação, resistência a mudanças ou mesmo a falta de entendimento a respeito de interdisciplinaridade. Para tanto, Duarte e Pinho (2014, p. 309) expõem alguns obstáculos que interferem na prática da interdisciplinaridade na escola: “hierarquização das disciplinas, a ausência de planejamentos efetivos em conjunto e a falta de diálogos entre os saberes”.

Dentro dessa vertente, percebe-se que muitos professores, tanto na área do ensino de LE como em Língua Portuguesa, não aceitam a interdisciplinaridade devido à compreensão do próprio conceito e /ou acabam interpretando-o de forma errônea, fora do contexto, deixando de realizar trabalhos significativos. A respeito disso, Fazenda (2012) ressalta: “em todos os professores portadores de uma atitude interdisciplinar encontramos a marca de resistência que os impede a lutar contra a acomodação, embora em vários momentos pensem em desistir da luta” (FAZENDA, p.31, 2012). Pelas palavras de Fazenda observamos que há sempre professores que suscitam mudanças, mas às vezes encontramos resistência.

Fazenda, desde os anos de 1970, vem apresentando reflexões e pesquisas acerca da dimensão pedagógica da interdisciplinaridade. A autora esclarece que, para desenvolver a interdisciplinaridade, é primeiramente necessária:

uma formação adequada que suponha um treino na arte de entender e esperar, um desenvolvimento no sentido da criação e da imaginação. A importância metodológica é indiscutível, porém é necessário não fazer dela um fim, pois interdisciplinaridade não se ensina nem se aprende, apenas vive-se, exerce-se e, por isso, exige uma nova pedagogia, a da comunicação (FAZENDA, 2011, p. 11).

Assim, no final da década de 90, houve um aumento sobre as pesquisas da interdisciplinaridade no âmbito pedagógico. Isso ocorreu também pela publicação dos PCN Parâmetros Curriculares Nacionais, e em 1999 as Orientações Educacionais Complementares aos PCN em 2002 destacam os fundamentos da contextualização e da interdisciplinaridade na prática educativa. Cabe ressaltar que a interdisciplinaridade tem sua origem na palavra disciplina. Para tanto, disciplina “(...) é uma maneira de organizar e delimitar um território de trabalho, de concentrar a pesquisa e as experiências dentro de um determinado ângulo de visão” (SANTOMÉ, 1998, p. 55). Nessa perspectiva, a interdisciplinaridade nos conduz à interação entre esses territórios, os saberes, as percepções e as ações dos participantes.

Pelo exposto, podemos refletir que uma formação interdisciplinar requer “não apenas na forma como ela é exercida, mas também na intensidade das buscas que empreendemos enquanto nos formamos, nas dúvidas que adquirimos e na contribuição delas para nosso

projeto de existência” (FAZENDA, 2012b, p. 14). Nesse sentido, para que a interdisciplinaridade aconteça é necessário um diálogo de reconhecimento do que realmente falta para contribuir no processo de ensino e aprendizagem.

Abordadas essas questões interdisciplinares, na próxima seção apresentaremos o percurso metodológico.