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Acadêmico do Curso de Educação Especial da UFSM. rafaelmenezesalves@hotmail.com

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A universidade pode ser entendida como espaço de aprendizagem, cultura, conhecimento, preparação profissional e pessoal; oferecendo mais do que uma simples formação técnica, e podendo ser entendida, ainda, como agente de mudança da/na sociedade. Na visão de alguns autores é “[...] a instituição social que articula o ensino, a pesquisa e a extensão nos níveis mais elevados da política educacional de um país” (WANDERLEY, 2003, p. 9).

A Educação Superior tem suas finalidades descritas na Lei de Diretrizes e Bases – LDB 9.394/96, em seu capítulo IV, Art. 43:

I - estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo;

II - formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a partic- ipação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colabo- rar na sua formação contínua;

III - incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica [...];

IV - promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humani- dade [...];

V - suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional [...];

VI - estimular o conhecimento dos problemas do mundo pre- sente [...];

VII - promover a extensão [...] (BRASIL, 1996, p. 16-7).

Muito mais do que apenas possibilitar o ensino, a pesquisa e a extensão, e formar profissionais em distintas áreas, a Educação Superior tem como propósito estimular o pensamento crítico do estudante e o seu contínuo aperfeiçoamento, assim como colaborar para que o profissional formado possa refletir sobre a sociedade e seus desdobramentos, contribuindo para o seu desenvolvimento.

É considerando esse contexto da Educação Superior que se propôs escrever este artigo, tendo por objetivo discutir alguns aspectos da educação inclusiva na universidade. Para isso, utilizou-se como

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metodologia uma pesquisa bibliográfica de natureza qualitativa, em que a coleta de dados ocorre através de documentos para empreender uma análise, geralmente crítica (TOZONI-REIS, 2006).

Segundo Gil (2008, p. 50), a pesquisa bibliográfica trata-se de pesquisa “desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos”. Tal escolha explica-se pelo fato “de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente” (GIL, 2008, p. 50). Assim, pensando na diversidade de fontes que a pesquisa bibliográfica proporciona aos pesquisadores, optou-se por realizar estudos em livros, artigos e documentos legais/ políticas públicas para a educação que discutem a universidade e a educação inclusiva.

EDUCAÇÃO INCLUSIVA: ASPECTOS HISTÓRICOS, LEGISLAÇÃO E ACESSIBILDADE

Ao pensar em inclusão ou educação inclusiva, muitas vezes, retoma-se apenas a legislação e discussões mais atuais, principalmente, a partir da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, de 2007. Contudo, para compreender melhor o contexto da pessoa com deficiência na sociedade e no sistema educacional, acredita-se ser importante salientar alguns aspectos históricos.

Pode-se afirmar, brevemente, que na Antiguidade, as pessoas com deficiência eram desamparadas, perseguidas e mortas. Na Idade Média, as concepções predominantes em cada comunidade determinavam o tratamento dado à pessoa com deficiência, podendo estar voltado à caridade ou punição. Já na Idade Moderna, preocupava- se com a socialização e a educação desses sujeitos (MIRANDA, 2008). No Brasil, foi no período do Império que se iniciou o atendimento às pessoas com deficiência, partindo da criação de duas instituições:

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[...] o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em 1854, atual Instituto Benjamin Constant – IBC, e o Instituto dos Surdos Mudos, em 1857, hoje denominado Instituto Nacional da Educação dos Surdos – INES, ambos no Rio de Janeiro. No início do século XX é fundado o Instituto Pestalozzi (1926), instituição especializada no atendimento às pessoas com defi- ciência mental; em 1954, é fundada a primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE; e, em 1945, é criado o primeiro atendimento educacional especializado às pessoas com superdotação na Sociedade Pestalozzi, por Helena An- tipoff (BRASIL, 2007, p. 02).

Jannuzzi (1992) salienta que, a partir do século XX, o atendimento inicial para as pessoas com deficiência se dava pelas vertentes médico- pedagógica - que tinha uma preocupação higienizadora e acreditava que a educação deveria ser realizada em escolas hospitais, e a vertente psicopedagógica - que defendia a educação dos “anormais”, buscando identifica-los a partir de testes psicológicos e escalas de inteligência.

A partir de 1930 a sociedade

[...] começa a organizar-se em associações de pessoas preocu- padas com o problema da deficiência: a esfera governamental prossegue a desencadear algumas ações visando à peculiar- idade desse alunado, criando escolas junto a hospitais e ao ensino regular, outras entidades filantrópicas especializadas continuam sendo fundadas, há surgimento de formas diferen- ciadas de atendimento em clínicas, institutos psicopedagógi- cos e outros de reabilitação (JANNUZZI, 2004, p.34).

Era frequente observar que as situações organizadas para o atendimento às pessoas com deficiência tinham um caráter mais voltado ao cuidado do que à educação (MAZZOTTA, 2005). A partir de 1990, com influência de eventos internacionais, dentre eles a Conferência Mundial de Educação para Todos, de Jomtien (1990) e a Conferência sobre as Necessidades Educativas Especiais, em Salamanca (1994), evidenciou-se no Brasil uma preocupação e um

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olhar mais aguçado para a participação das pessoas com deficiênciano sistema educacional.

Dentre as políticas públicas para a educação destaca-se, neste artigo, a LDB 9394/96 e a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2007) como importantes marcos para se pensar a inclusão de pessoas com deficiência.

A LDB 9394/96 apresenta, em seu Art. 59, que os sistemas de ensino assegurarão aos estudantes com necessidades especiais:

I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organi- zação específicos, para atender às suas necessidades; II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamen- tal [...];

III - professores com especialização adequada em nível mé- dio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;

IV - educação especial para o trabalho [...];

V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular (BRASIL, 1996, p. 21-22).

Evidencia-se, principalmente, uma preocupação com a adaptação do currículo e dos métodos de ensino de acordo com as especificidades dos estudantes com deficiência, assim como a exigência de formação adequada para os professores. Santos (2003, p. 82) complementa afirmando que, ao se tratar do atendimento às necessidades de qualquer estudante,

[...] as atitudes de uma instituição educacional inclusiva en- fatizam uma postura não só dos educadores, mas de todo o sistema educacional. Uma instituição educacional com orien- tação inclusiva é aquela que se preocupa com a modificação da estrutura, do funcionamento e da resposta educativa que se deve dar a todas as diferenças individuais, inclusive as as-

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sociadas a alguma deficiência – em qualquer instituição de ensino, de qualquer nível educacional.

Entende-se, assim, que a inclusão tem grande importância no cenário educacional à medida em que busca assegurar a participação de todos e reconhecer a diversidade, exigindo que se reconfigure o espaço, o tempo, o conhecimento, os valores, as relações que constituem a instituição e a formação dos professores a fim de minimizar a exclusão.

A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva segue essa perspectiva, reforçando que

O movimento mundial pela educação inclusiva é uma ação política, cultural, social e pedagógica, desencadeada em def- esa do direito de todos os alunos de estarem juntos, apren- dendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação. A educação inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que con- juga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à idéia de eqüidade formal ao contextu- alizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola (BRASIL, 2007, p. 01)

Desta forma, acredita-se que para além de um discurso a favor da inclusão, é preciso oferecer condições para que a pessoa com deficiência se sinta incluída e seja respeitada nas suas diferenças. A educação inclusiva tem o objetivo de inserir esses sujeitos no contexto educacional, mas é importante considerar que apenas possibilitar o acesso e esquecer todos os fatores que envolvem a presença desse estudante na escola ou universidade, acaba reforçando a exclusão presente na constituição histórica da pessoa com deficiência no cenário social e educacional.

Pode-se afirmar que a Educação Superior enfrenta as mesmas inquietações referentes à inclusão na Educação Básica. Preocupa-se, principalmente, com o ingresso, pelo sistema universal ou de cotas para pessoas com deficiência; e com a acessibilidade (arquitetônica,

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urbanística e pedagógica).

Em 2004, o Decreto Nº5.296/04 regulamentou a Lei Nº10.048/00 e a Lei Nº10.098/00, estabelecendo normas e critérios para a “[...] promoção de acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida” (BRASIL, 2004, p. 01). No Art. 8, inciso I, apresenta-se a acessibilidade como:

[...] condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dis- positivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida (BRASIL, 2004, p. 03).

Considerando a acessibilidade urbanística e arquitetônica, destaca-se a necessidade de vagas prioritárias para pessoas com deficiência; rampas de acesso às calçadas e prédios; elevadores; banheiros, mesas e cadeiras adaptados; mapa tátil para localização em edificações; dentre outros.

Em relação à acessibilidade pedagógica pode-se ressaltar que o estudante com deficiência tem direito a materiais e avaliações adaptadas à sua necessidade. O estudante surdo precisa contar com Intérprete de LIBRAS, assim como um estudante com baixa visão precisa ter acesso a materiais com letra ampliada e/ou uso de lupa, e um estudante cego carece de materiais impressos em Braille ou computador com leitor de tela. Ao mesmo tempo em que são ofertados recursos relacionados à acessibilidade pedagógica, torna-se necessário que os professores, como mediadores do conhecimento, adaptem seus métodos de ensino e conheçam a especificidade de cada estudante, principalmente daqueles com deficiência.

Todos esses aspectos precisam ser considerados ao se pensar a inclusão na Educação Superior, acreditando que

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cação, na perspectiva da inclusão, não necessita modificar seus objetivos fundamentais, mas reorientar-se a partir dos mesmos; na busca da garantia das necessidades básicas essen- ciais ao desenvolvimento e aprendizagem e da construção do conhecimento de forma significativa, por meio das relações que estabelece com o meio. Promover a oportunidade de con- vívio com a diversidade e singularidade, exercitando suas funções de forma aberta, flexível e acolhedora (SANTOS, 2003, 83).

A partir das discussões apresentadas, é possível compreender que o ingresso das pessoas com deficiência na universidade tem ressaltado a importância de repensar a inclusão e a acessibilidade no cenário da Educação Superior, possibilitando, ao estudante com deficiência, permanecer na universidade com condições adequadas de locomoção, estudo, avaliação, socialização e possibilidades de conclusão de curso.

CONCLUSÃO

A inclusão é um processo que ainda não está totalmente consolidado, mas que tem ganhado espaço a cada dia, tanto nas instituições de Educação Básica quanto na Educação Superior.

Nesse artigo evidenciou-se, brevemente, a trajetória das pessoas com deficiência na sociedade, desde o período em que eram excluídas do convívio social, marginalizadas e abandonadas; até a atualidade, em que estão conquistando condições mais igualitárias em distintos espaços.

No contexto educacional, reforçou-se a importância de considerar as especificidades das pessoas com deficiência, sua permanência na universidade e sucesso na conclusão de seu curso. Além disso, algumas políticas públicas educacionais foram apresentadas a fim de reafirmar a Educação Especial e a inclusão nas instituições de ensino. Enfim, os aspectos abordados nesse artigo (contextualização das pessoas com deficiência na sociedade, políticas públicas para

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a educação, educação inclusiva e acessibilidade) corroboram para reforçar a importância da inclusão social e a efetivação da proposta de uma educação inclusiva que possibilite condições de permanência das pessoas com deficiência nos espaços educacionais.

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial.

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planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5296.htm.> Acesso em: 30 mar. 2015.

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