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Educadora Especial, Especialista em Psicopedagogia, Mestre em Inovação e Sistema Educativo, Doutora em Educação. Professora do Programa de Pós-

Identificação das necessidades de apoio à aprendizagem no ensino superior 30

Ingressar em uma Instituição de Ensino Superior é uma grande conquista. Enfrentar os desafios que esse espaço de ensino, pesquisa, extensão, aprendizagens e socialização apresenta é outro êxito.

Nesse cenário de grandes possibilidades de crescimento pessoal e profissional, também se encontram grandes dificuldades, e

O modo como os alunos se integram ao contexto do ensino superior faz com que eles possam aproveitar melhor (ou não) as oportunidades oferecidas pela universidade, tanto para sua formação profissional quanto para seu desenvolvimento psi- cossocial (TEIXEIRA et al., 2008, p. 186).

É preciso compreender como são essas escolhas feitas pelos estudantes, como eles estão se reconhecendo nos cursos, nas relações interpessoais e no processo de ensino e aprendizagem e, assim, poder contribuir com seu desenvolvimento.

Ressalta-se que cada ser humano tem uma forma de aprender, seu estilo, interesses, recursos, oportunidades. Entretanto, é válido reconhecer aquilo que caracteriza a essência de ser um ser humano. Seu modo de aprender as coisas no mundo responde aos processos da senso-percepção. Decorre desse constructo que, para aprender, depende-se da linguagem, afetividade, pensamento, motivação, cognição entre outros. Estudos de natureza didática e psicológica recomendam tacitamente que “partir daquilo que o aluno possui, potencializá-lo e conotá-lo positivamente é sinal de respeito por sua contribuição, o que, sem dúvida, favorece sua autoestima (COOL et al., 2001, p.53).

Nesse âmbito, o sujeito, ao sentir-se parte do processo de aprendizagem pode, com maior eficiência, manifestar interesse pelo conteúdo a ser aprendido e, logo, obter um bom desempenho nas atividades acadêmicas.

Considerando essas questões e entendendo o rendimento e desempenho acadêmico como resultado de um árduo investimento dos estudantes cotidianamente, em cada dia de aula, trabalho realizado

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e apresentado, nos estágios curriculares, na realização de provas e relações sociais, e buscando atender e orientar os estudantes nesse caminho rumo à potencialização de sua aprendizagem e sucesso acadêmico, o Ânima - Núcleo de Apoio à Aprendizagem na Educação criou um formulário online a fim de identificar as necessidades de apoio especializado e dificuldades mais comuns apresentadas pelos estudantes universitários. Nesse contexto, desenvolveu-se este artigo tendo por objetivo analisar o formulário proposto e conhecer as percepções dos estudantes acerca de seu desempenho e dificuldades acadêmicas.

O Ânima, um Núcleo da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), tem trabalhado principalmente na área da Pedagogia, Psicopedagogia, Psicologia e Educação Especial, desenvolvendo ações voltadas à promoção, potencialização, qualificação e ressignificação da aprendizagem a partir de avaliações, atendimentos, programas, oficinas, seminários e orientações (UFSM, 2015a), acreditando na prevenção como melhor alternativa para as dificuldades enfrentadas pelos estudantes universitários.

Afinal, não basta apenas possibilitar o acesso à universidade. É imprescindível acompanhar o estudante e desenvolver ações que corroborem para que ele permaneça na instituição e conclua o curso no qual está matriculado. Saravali (2005, p. 100) complementa afirmando que

[...] o verdadeiro ensino democrático é aquele que não so- mente garante o acesso, mas sobretudo a permanência do alu- no, enfocando a formação integral e não somente o preparo profissional. Portanto, quando esse aluno chega à instituição superior e não consegue usufruir do ensino que ela e seus mestres promovem, acompanhar suas leituras e exercícios, desenvolver habilidades, aprender a acessar o conhecimento, a educação está longe de atingir seu ideal democrático.

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ser efetivadas a fim de minimizar as dificuldades enfrentadas pelos estudantes e contribuir para o seu sucesso na universidade.

METODOLOGIA

No ano de 2014, 62 estudantes de Cursos Técnico, Graduação e Pós-Graduação da UFSM responderam um formulário online. Os estudantes concordaram que estavam participando por vontade própria, cientes de que não seriam identificados e de que os dados fornecidos poderiam ser utilizados para melhorar o serviço oferecido pelo Ânima, assim como, servir de base para conhecer as dificuldades enfrentadas pelos acadêmicos da UFSM em relação ao seu curso.

O formulário foi disponibilizado na página do Ânima em maio de 2014 e permanece em 2015. No entanto, os dados discutidos neste artigo representam apenas a participação no ano de 2014 (de maio a dezembro).

O formulário apresenta a seguinte organização:

 Aceite de preenchimento do formulário por vontade própria;  Curso;

 Semestre;  Idade;

 Questão principal, de múltipla escolha, correspondente à realidade do estudante:

 Tenho faltado aula nos últimos dias sem justificativa plausível.

 Chego atrasado nas aulas.

 Não falto aula, mas não tenho interesse pelos conteúdos desenvolvidos.

 Deixo os trabalhos para serem realizados no último momento, chegando, inclusive, a entregá-los fora do prazo.

 Obtive notas abaixo da média no semestre.  Tenho dificuldades em acompanhar os conteúdos.

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 Penso em trocar de curso.

 Estudo bastante mas, mesmo assim, não vou bem nas avaliações.

 Não tenho amigos na sala de aula. Eles não me aceitam no grupo.

 Tenho reprovações por nota ou frequência.  Nenhuma das opções anteriores. Não tenho

dificuldades e tenho bom rendimento acadêmico.  Questão de fechamento, que solicita que o estudante conte quantas alternativas marcou na questão anterior e avalie as possibilidades apresentadas por elas:

 Se você marcou até 3: Continue atento ao seu dia a dia, utilize o Plano de estudos disponível em nossa página para se organizar, se planeje, estabeleça metas e confie em suas escolhas.

 Se você marcou entre 4 e 6: Recomendamos a busca por apoio, seja com colegas ou professores do curso. Converse sobre suas dificuldades. Utilize o Plano de estudos disponível em nossa página para se organizar, se planeje, estabeleça metas e trabalhe em grupo.

 Se você marcou 7 ou mais: Procure o apoio psicopedagógico oferecido pelo Ânima, que auxiliará na sua organização, rotina de estudos, dificuldades e potencialização da aprendizagem.

A partir das respostas dos estudantes que responderam o formulário é possível compreender melhor a realidade enfrentada por eles e, futuramente, propor alternativas para minimizar as dificuldades apontadas.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

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identificar a necessidade de um atendimento especializado tinham entre 17 e 59 anos. Abaixo é possível observar o número de estudantes em cada faixa etária, obtendo maior número no grupo de estudantes mais jovens:

Figura 01: Faixa etária dos estudantes, 2014.

O número de estudantes que respondeu o formulário foi maior entre os mais jovens, possivelmente, o maior público dentre os estudantes da Instituição. Além disso, observou-se a participação de estudantes do 1º ao 10º semestre, a maioria cursando os primeiros anos do Curso e em Nível de Graduação, como é possível verificar na Figura 02.

Figura 02: Estudantes distribuídos em Níveis de Ensino, 2014.

A maior participação entre os estudantes da Graduação está diretamente relacionada ao fato de que esse Nível de Ensino possui

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o maior número de matriculados na UFSM, como comprovado nos dados da Instituição (UFSM em Números), que informam que, em março de 2015, estavam matriculados 20.327 estudantes em Nível de Graduação (Presencial e a Distância), 4.856 estudantes da Pós- Graduação (Presencial e a Distância) e 3.077 de Nível Médio, Pós- Médio e Técnico (Presencial e a Distância), em um total de 28.260 estudantes (UFSM, 2015b).

Se foi constatado que o público mais participativo foi composto por estudantes no início de seus Cursos, é preciso reforçar, principalmente em relação ao grupo mais jovem, o entendimento de que

A vida acadêmica traz muitas mudanças que exigem um es- forço de adaptação do indivíduo, seja no sentido de corre- sponder às exigências de desempenho, mais altas do que no ensino médio, seja no sentido de se adaptar a novas regras da instituição e a novas pessoas, como colegas, professores ou funcionários. A mudança de um ambiente familiar conhecido (a escola) para outro desconhecido (a universidade) parece gerar inicialmente uma sensação de atordoamento, que sugere a perda de referências anteriores (TEIXEIRA et al., 2008, p. 192).

Se todas estas mudanças já são conturbadas por si só, é ainda pior pensá-las em relação aos estudantes que não conseguem acompanhar o Curso no qual estão matriculados, não adaptam-se à turma, não estabelecem relações com os professores e estão desestimulados. Esses apontamentos podem ser observados em grande número no tabelamento dos dados da questão principal, referente à realidade enfrentada pelos participantes:

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ALTERNATIVAS QUANTIDADE DE PARTICIPANTES

Tenho faltado aula nos últimos dias sem

justificativa plausível. 22

Chego atrasado nas aulas. 19

Não falto aula, mas não tenho interesse pelos

conteúdos desenvolvidos. 18

Deixo os trabalhos para serem realizados no último momento, chegando, inclusive, a

entregá-los fora do prazo. 30

Obtive notas abaixo da média no semestre. 20

Tenho dificuldades em acompanhar os

conteúdos. 27

Penso em trocar de curso. 25

Estudo bastante, mas, mesmo assim, não vou

bem nas avaliações. 8

Não tenho amigos na sala de aula. Eles não

me aceitam no grupo. 12

Tenho reprovações por nota ou frequência. 20

Nenhuma das opções anteriores. Não tenho dificuldades e tenho bom rendimento

acadêmico. 10

Tabela 01: Respostas referentes à realidade do estudante na

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Foi possível observar uma reação em cadeia nas respostas dos participantes. Quem afirmou que faltava aulas ou chegava atrasado, em sua maioria, apontou ter dificuldades para acompanhar os conteúdos, ter reprovação por nota ou frequência e obter notas abaixo da média no semestre. Provavelmente, a ausência nas aulas colaborou para que os estudantes não conseguissem acompanhar os conteúdos e, consequentemente, não fossem bem nas avaliações e reprovassem.

Esses dados comprovam que conhecer como o estudante percebe-se frente ao contexto universitário (relações interpessoais, assiduidade, organização, avaliações, pontualidade, motivação) é essencial para compreender suas dificuldades no processo de aprender. Afinal, o aprender “´[...] vem constituído de fatores internos e externos que incrementam tanto a sua possibilidade de avançar, como a de não poder ir adiante” (PEREIRA, 2010, p. 117).

É preciso considerar, ainda, que 10 dos 62 estudantes afirmaram não ter nenhuma dificuldade e ter um bom desempenho acadêmico. Essa informação é importante ao analisar todos os dados, já que as dificuldades apontadas referem-se, então, a 52 participantes.

Considerando esses 52 estudantes que apontam dificuldades, alguns números impressionaram bastante:

 78,85% falta aula ou chega atrasado;

 57,7% deixa os trabalhos para serem realizados no último momento, chegando, inclusive, a entregá-los fora do prazo;  51,93% tem dificuldades em acompanhar os conteúdos;  48,07% pensa em mudar de curso;

 38,46% tem reprovação por nota ou frequência.

O item “Não tenho amigos na sala de aula. Eles não me aceitam no grupo” foi um pouco menos visado, alcançado 23,07% dos participantes, mas não se pode esquecer, conforme Teixeira et al. (2008), que os vínculos afetivos são essenciais para a adaptação do estudante, possibilitando o compartilhar de experiências, o apoio nos momentos difíceis, sem contar o sentimento de pertencer a um

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grupo. Sendo assim, “A inserção social do estudante possibilita a este construir um sentido partilhado acerca das suas experiências no curso – positivas e negativas – ajudando-o a desenvolver estratégias de ajustamento na universidade” (TEIXEIRA et al., 2008, p. 198).

Todos os motivos apontados são preocupantes, pois podem levar o estudante a abandonar o curso, evadir. Afinal, reprovar muitas vezes, não ser responsável com os prazos estabelecidos e estar desmotivado a ponto de querer mudar de curso, comprovam o descontentamento do estudante com sua atual situação na universidade e em seu curso, seja de nível Técnico, Graduação ou Pós-Graduação, prejudicando, assim, a sua aprendizagem.

Não se pode esquecer que a evasão ainda é um grande desafio para as instituições, pois é influenciada por muitos fatores, dentre eles: dificuldade em se relacionar com colegas e/ou professores, problemas financeiros que impedem a continuidade dos estudos, dificuldade em compreender o conteúdo, reprovações frequentes, estar matriculado em um curso que não é do seu interesse, frustrações de expectativas relacionadas ao curso ou à universidade como um todo. Considerando esses motivos é preciso considerar, ainda, que

[...] em qualquer situação de aprendizagem, o sujeito dispõe de capacidades cognitivas, motriz, de relacionamento inter- pessoal, possui estratégias de ação, habilidades que poderão permitir certo nível de compreensão e realização da atividade que está sendo desenvolvida. São enfoques que variam de acordo com o sujeito, com a sua motivação, o seu interesse pela tarefa, a metodologia aplicada, o grau de afetividade que envolve esse processo, o vínculo estabelecido entre o que se aprende e o desejo e prazer de aprender (PEREIRA, 2010, 126).

Considerando esses fatores e as respostas apresentadas pelos estudantes que preencheram o formulário, percebeu-se ser ainda mais importante conhecer a realidade enfrentada pelos universitários, suas necessidades e percepções em relação ao seu desempenho acadêmico,

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para, a partir destas informações, propor ações que auxiliem na minimização das dificuldades e trabalhe em uma perspectiva de prevenção.

CONCLUSÃO

A função da universidade remete a um processo de transformação social por meio do exaustivo trabalho com valores, crenças, relações sociais na direção da democratização. Essa transformação demanda ações articuladas dos sujeitos e contextos. No entanto, a universidade brasileira, considerando a forma como organiza a maior parte dos trabalhos pedagógicos, pode produzir o fracasso dos fins educacionais caso não atente para a necessidade de adequações pedagógicas que visem diminuir as dificuldades apresentadas pelos estudantes em torno da aprendizagem.

Ao propor a ferramenta analisada neste artigo pretendia- se conhecer melhor o estudante da UFSM e apontar a necessidade de um acompanhamento especializado. Contudo, os resultados encontrados reforçaram não só a importância de um acompanhamento individualizado, mas de ações de maior impacto na instituição, que trabalhem principalmente a motivação, as relações interpessoais, os problemas voltados à aprendizagem e organização; podendo minimizar as dificuldades mencionadas pelos estudantes e, possivelmente, contribuir para a redução dos índices de repetência e evasão.

REFERÊNCIAS

COOL, C. et al. O construtivismo em sala de aula. São Paulo: Ática, 2001

PEREIRA, Débora Silva de Castro. O ato de aprender e o sujeito que aprende. In: Construção Psicopedagógica, São Paulo-SP, v. 18, n.16, p. 112- 128, 2010. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S1415-69542010000100010>. Acesso em: 19 mar. 2015.

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SARAVALI, Eliane Giachetto. Dificuldades de aprendizagem no Ensino

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TEIXEIRA, Marco Antônio Pereira et al. Adaptação à universidade

em jovens calouros. Revista Semestral da Associação Brasileira de

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Jan./Jun. 2008.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA. Ânima - Núcleo de

Apoio à Aprendizagem na Educação, Santa Maria, 2015a. Disponível em: <http:// http://coral.ufsm.br/anima/>. Acesso em: 12 mar. 2015.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA. Universidade

Indicadores, Santa Maria, 2015b. Disponível em: <http://portal.ufsm.br/

Canto-mão: de que corpo