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CAPÍTULO 4. METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO

4.3. Estudo 2

4.3.2.2. Recolha documental

De modo a fazer emergir dados complementares às entrevistas levou-se a cabo a recolha documental (Albarello, Digneffe, Hiernaux, Maroy, Ruquoy, & Saint-Georges, 1997; Merriam, 1988; Patton, 1990). Concretamente, a recolha documental foi operacionalizada tendo em conta um dos objetivos das entrevistas, (a) conhecer a trajetória dos jovens participantes antes e durante a institucionalização. Esta pesquisa baseou-se no dossiê tutelar individual para onde confluem todos os outros documentos oficiais relativos a cada caso. Nomeadamente, foi possibilitado acesso a: (a) Relatórios Periódicos (RP, artigo 154.º, LTE); (b) Processos Educativo Pessoal (PEP, artigo 164.º, LTE) e (c) Processos Tutelares Educativos (PTE, artigo41.º, LTE); (d) Relatórios de

121 Perícia sobre a Personalidade (RPP, artigo 68.º e 69.º, LTE); (e) Projeto de Intervenção Educativa (PIE, artigo 162.º, LTE) e (f) Relatórios Sociais com Avaliação Psicológica (RSAP, artigo 71.º, n.º 5, LTE).

4.3.3. Procedimento

A vertente qualitativa deste estudo iniciou-se com as entrevistas e a pesquisa documental. Numa investigação que engloba a vertente qualitativa, a recolha de documentos escritos é um dos procedimentos enriquecedores do trabalho empírico, uma vez que muitos dos documentos contêm informação importante e rica, que de outra forma se perderia o seu conteúdo (Merriam, 1988).

De acordo com alguns autores (e.g., Albarello et al., 1997; Maykut & Morehouse, 1994), esta recolha documental pode ser utilizada em simultâneo com outros procedimentos. Em sequência à vertente quantitativa, a vertente qualitativa foi pensada para a aplicação das entrevistas semiestruturadas e da recolha documental. Esta última, por sua vez, por questões éticas da investigadora, foi levada a cabo após a realização das entrevistas, não só por uma questão de ordem de complementaridade, mas, essencialmente, pelo facto de que os jovens participantes tinham cometido variados crimes, e, desta forma, procura-se ter uma postura isenta de valores pessoais, bem como de salvaguardar o direito à privacidade dos jovens participantes. Deste modo, todos os documentos foram consultados nos centros educativos nas versões originais. A informação recolhida dos documentos, junta-se à análise de conteúdo com o objetivo de enriquecer a informação discursiva dos jovens relativa à sua caracterização.

A opção de realizar as entrevistas num formato semiestruturado decorreu do interesse em permitir que os jovens entrevistados pudessem estruturar o pensamento mais livremente, focalizando a entrevista no campo de interesse. Neste sentido, sempre que necessário, durante as entrevistas foi solicitado aos jovens participantes o aprofundamento de ideias, que de outro modo estes não teriam espontaneamente explicitado (Albarello et al., 1997).

Antes da realização das entrevistas os jovens participantes foram informados da importância da sua participação e das condições necessárias para a realização das mesmas. Neste processo, procura-se assegurar um conjunto de procedimentos éticos face aos participantes, tal como o consentimento informado, o direito à privacidade e à

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proteção do dano (Bogdan & Bilken, 1994). A proteção do dano ficou salvaguardada perante qualquer sinal de desconforto manifestado pelos participantes. Optou-se em todas as ocasiões reforçar o facto da não obrigatoriedade de resposta. Com efeito, perante o esclarecimento dos pormenores éticos, a autorização de participação foi concedida pelos participantes de forma escrita, através de um compromisso assinado pelos participantes e pela investigadora (Anexo I).

Deste modo, as entrevistas foram realizadas entre os meses de julho 2012 e março de 2013. Tentou-se sempre que decorressem em locais mais reservados e calmos, assegurando o sigilo das informações. Posteriormente, todas as entrevistas foram transcritas na íntegra (Anexos J, K, L, M, N).

Após a leitura atenta das respostas às questões das entrevistas semiestruturadas, procedeu-se à análise de conteúdo dos dados com segmentação e posterior categorização (Bardin, 2011). Deste modo, um dos aspetos que se privilegiou foi a organização das informações recolhidas com vista à orientação da análise dos dados recolhidos, tendo presente os pressupostos que orientaram o estudo e o quadro teórico que o envolve. De acordo com a opinião de Bogdan e Bilken (1994):

os dados recolhidos são em forma de palavras ou imagens e não de números. Os resultados escritos da investigação contêm citações feitas com base nos dados para ilustrar e substanciar a apresentação. (...) Na sua busca de conhecimento, os investigadores qualitativos (…) tentam analisar os dados em toda a sua riqueza, respeitando, tanto quanto o possível, a forma em que estes foram registados ou transcritos. (p. 48)

Deste modo, como já referido, a análise dos dados, nesta vertente, foi realizada numa perspetiva interpretativa (Patton, 1990) e de um modo indutivo (Merriam, 1988), baseado na análise de conteúdo, uma vez que não se tentaram testar hipóteses pré- construídas, mas sim a compreender as questões de estudo.

De acordo com Bardin (2011), o processo da análise de conteúdo organiza-se em três fases sequências: “1) a pré-análise; 2) a exploração do material; 3) o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação” (p. 121). Sucintamente, de acordo com a autora a fase da pré-análise, consagra “a fase da organização propriamente dita. Corresponde a um período de intuições, mas tem por objectivo tornar operacionais e sistematizar ideias iniciais (…). Recorrendo ou não ao computador (…)” (p. 127). A fase da exploração de material refere-se à “aplicação sistemática das decisões tomadas.”, a qual é caracterizada como uma fase “longa e fastidiosa, consiste

123 essencialmente em operações de codificação (…)” (Bardin, 2011, p. 127). A terceira e última fase, a fase de tratamento dos resultados obtidos e interpretação, corresponde a fazer emergir os dados “falantes” que são significativos e válidos, “condensam e põem em relevo as informações fornecidas”, através de operações estatísticas simples, como por exemplo as frequências ou percentagens (Bardin, 2011, p. 127).

Os dados obtidos decorrentes das entrevistas serão indubitavelmente “descritivos na linguagem do próprio sujeito, permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma ideia sobre a maneira como os sujeitos interpretam aspectos do mundo.” (Bogdan & Biklen, 1994, p. 134).

A análise de conteúdo conduzida indutivamente traduz-se num método adequado à produção de descoberta a partir dos significados expressos pelos jovens participantes. Assim, o processo de codificação decorrerá através das unidades de registo, às respostas dos jovens, das quais se encontraram as categorias emergentes. Neste processo, adotou- se um critério semântico, de semelhança de conteúdo, para a identificação das unidades de registo, tomando como unidade de contexto a entrevista individual de cada participante (Bardin, 2011).

A unidade de enumeração foi a frequência de ocorrências, isto é, a contagem do número de unidades de registo, por semelhança de conteúdo, para o agrupamento em categorias. Este processo foi, numa primeira fase, realizado através do recurso ao programa informático Nvivo na versão 10. Apesar das potencialidades reconhecidas a este, entre outros programas, para o tratamento de dados de natureza qualitativa, admite- se que não se explorou todas as suas possibilidades6. De acordo com a opinião de alguns autores (e.g., Azevedo, 1998; Valles, 1997) optou-se apenas por recorrer ao programa para auxílio na organização dos dados conseguidos nas entrevistas semiestruturadas.

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Em relação às potencialidades e limitações dos programas informáticos para tratamento qualitativo de dados salienta-se a partilha de informação nas conversas com equipas de investigação no descurso do estudo, nomedamente no âmbito do projeto FITE e do programa ERASMUS, que a investigadora desenvolveu, bem como, no recurso de alguma literatura sobre este assunto. Neste sentido, com base na opinião de Valles (1997) e Azevedo (1998) há algumas vantagens na utilização de programas informáticos, especialmente nas análises de dados qualitativos, como por exemplo: (a) no auxílio na segmentação de texto e consequente codificação, permitindo maior facilidade no registo de ideias e conceitos emergentes; (b) facilitação na interação entre diferentes documentos; (c) darem acesso no ecrã do computador a todos os segmentos de texto codificados na mesma categoria, facilitando a sua visualização e análise. Contudo, os mesmos autores referem que os investigadores deverão ter em consideração que um programa informático não pode substituir o trabalho intelectual do investigador na análise de dados, constituindo apenas uma análise mecanizada e simplista e contrariando “as tendências pós-estruturalistas e pós-modernistas actuais que enfatizam a celebração da diversidade.” (Azevedo, 1998, p. 153).

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Em termos gerais, a análise de conteúdo foi organizada de acordo com um conjunto de categorias, algumas delas subdivididas em subcategorias que foram emergindo ao longo da análise dos dados. Conjuntamente, com o método de seleção dos participantes e a informação documental recolhida, caracteriza-se o procedimento utilizado nesta vertente qualitativa como triangulação de fonte de dados, tentando almejar a melhor resposta à principal questão de estudo (Coutinho, 2008).

A identificação dos jovens, tal como referido anteriormente, é feita de acordo com o código que a investigadora lhes atribuiu, tendo em conta o centro frequentado.

Síntese

Neste capítulo, enquadra-se teoricamente o paradigma de investigação e os métodos que se abordam no processo metodológico, tendo em consideração os aspetos éticos de garantia, nomeadamente da confidencialidade e anonimato dos jovens participantes, bem como dos centros educativos que os acolhiam. De acordo com o problema de investigação e com as questões de estudo, considera-se pertinente seguir um paradigma de investigação interpretativo com recurso a uma metodologia mista. Por outras palavras, o design da investigação constituiu-se de duas vertentes empíricas distintas, sendo num primeiro momento realizada a vertente quantitativa e em seguida a qualitativa. Embora constituindo dois campos de análise diferentes, as vertentes metodológicas estão intrinsecamente relacionadas e as metodologias de investigação escolhidas são complementares (Coutinho, 2011).

Com efeito, a vertente quantitativa, ou seja o Estudo 1 deste trabalho de investigação, foi pensada para caracterizar os jovens participantes e avaliar os modos de resolução de identidade vocacional dos mesmos. Recorre-se à utilização da escala DISI-O adaptada à população portuguesa (Taveira, 1986) para a seleção dos 36 jovens participantes na segunda vertente empírica, a vertente qualitativa.

Na vertente qualitativa, isto é o Estudo 2, pretende-se recolher dados através de entrevistas semiestruturadas e de pesquisa aos documentos oficiais de institucionalização dos jovens participantes selecionados. As fases de tratamento e análise dos dados foram realizadas como previstas (4.3.3), de forma descritiva e interpretativa, através de um sistema de categorias e subcategorias emergentes do discurso dos jovens e dos documentos consultados (Bardin, 2011).

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CAPÍTULO 5. APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS