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20 Folha de São Paulo (14/2/12) Deslocamento a pé ganha espaço em Denver, EUA Tradução de

2.2.6 Redescobrindo as trilhas

Caminhar em meio à mata é parte inquestionável de uma herança ancestral herdada dos antepassados do ser humano, uma prática carregada de sentimentos e significados que transcendem ao próprio ato. Trata-se de um fenômeno da natureza humana que diz respeito à sobrevivência da espécie e de sua evolução social ao longo de sua existência. Mas, atualmente, a caminhada na mata recebe a denominação de ‘caminhada em trilhas’, ‘caminhada ecológica’ ou algo similar, e diz respeito a uma atividade de aventura em uma natureza já domesticada pelo homem. Trata-se, assim, de uma das atrações do ecoturismo27, ou seja, um passeio a pé pelas trilhas que perpassam áreas naturais e que, muitas vezes, servem como vias de comunicação entre os habitantes de determinado lugar. Mas as trilhas na natureza, muito mais que atrativos turísticos, constituem-se em um sistema viário

se exercitem por pelo menos trinta minutos diários. Embora a preferência seja pela prática da caminhada, deve prevalecer o que se denomina como cidadania ativa, isto é, a realização de atividades como passear com o cachorro ou cortar grama que geram benefícios à saúde orgânica e não necessitam de exames clínicos ou o acompanhamento de especialistas (Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0404200433.htm. Acesso em: 20 Jan. 2014).

26 Segundo uma reportagem apresentada no noticiário do jornal televisivo SPTV, da TV Globo,

algumas pessoas estão deixando de lado o carro para percorrer a pé o trajeto entre a casa e o trabalho ou a universidade. A matéria cita o caso de um estudante que, para se livrar das inconveniências do trânsito, optou por caminhar 22 km, diariamente, entre sua casa, em Taboão da Serra e o local onde realiza seus estudos, na zona sul da cidade, gastando a pé as mesmas duas horas que faria de ônibus (Cf. Paulistas decidem se deslocar a pé para fugir do trânsito. Disponível em: http://g1.globo.com/sao-paulo/anda-sp/noticia/2013/07/paulistas-decidem-se-deslocar- pe-para-fugir-do-transito.html. Acesso em: 15 Jul. 2013).

27 Conforme Ceballos-Lascuráin (apud BODSTEIN, 1992), o ecoturismo pode ser definido como uma

forma de turismo responsável no que diz respeito ao ambiente natural e a cultura local, constituindo- se em uma iniciativa que tem como foco teórico principal a preservação do lugar (sua natureza e cultura) que é proporcionado pelo baixo impacto das atividades socioeconômicas e ambientais ali desenvolvidas. Em tese, trata-se de um modo menos agressivo de convidar os estranhos aos deleites dos prazeres locais.

que reflete os estilos de vida de uma região. São percursos abertos, ao longo de muitos anos, por moradores locais ou por animais que fazem a travessia do local e que é parte indissociável da totalidade do ambiente natural e cultual explorado pelos caminhantes ecoturistas.

Esta atividade, entretanto, provoca impactos ambientais decorrentes do uso excessivo e inapropriado das trilhas e provocam, dentre outros prejuízos, a compactação do solo, ou seja, a alteração da sua capacidade de sustentar a vida animal e vegetal e, como consequência, a destruição e extinção de plantas devido as constantes batidas dos pés no solo (modificam-se os parâmetros da biodiversidade, pois somente as plantas mais resistentes persistem à ação predatória indireta), e a redução do número de animais de cada espécie que por ali circulam, pois nem todos são tolerantes à presença humana (PAGANI et al., 2001). Além do aspecto utilitário relacionado ao deslocamento e busca de alimentos, o conjunto de trilhas que se distribuem ao longo do território de uma comunidade (geralmente indígena ou quilombolas), serve, aos locais, a propósitos educativos. Conforme Aguiar (2010) é nas caminhadas pelas trilhas que as pessoas (adultos e crianças) apreendem as coisas do mundo natural circundante e isto repercute na formação do saber tradicional comunitário. Nas trilhas, individualmente ou em grupos, é possível estabelecer relações entre a natureza e a cultura local, em um processo educativo que transcorre naturalmente, sem formalidades e que garante a perpetuação do saber comum, a existência da coletividade e as singularidades de seus modos de viver.

Ao longo das trilhas, a fauna e a flora típicas do ambiente natural local, apresentam- se em sua riqueza e diversidade, para ser explorada, porém, não destruída. Flores, frutos, animais silvestres e insetos são as matérias-primas que formam o conteúdo adequado às exigências educacionais da cultura local. Essa caminhada ao longo das trilhas é uma prática social e um elemento da cultura local de relevância considerável para a construção da autonomia do indivíduo

Assim, caminhar nas trilhas representa, pois, um espaço de interação com a natureza, local de aprendizado, surpresas e descobertas. Tal atividade pode “levar cada pessoa a vários tipos de saber, ao inusitado, ao desconhecido (...) uma maneira de atentar para o mundo (...) buscando identificar novos parceiros para a

vida na natureza, novas explicações para a dureza do cotidiano (...) respostas a tantas indagações que rodeiam as mentes” (AGUIAR, 2010, p. 41).

A caminhada nas trilhas, revestida de atração turística, todavia, deve ser compreendida pelos ecoturistas como algo que transcende o percurso demarcado de um caminho no solo. As trilhas devem ser preservadas e respeitadas, pois elas são fundamentais para a sobrevivência da comunidade local, tanto em relação aos seus aspectos utilitários, quanto aos processos educacionais que nelas se estabelecem. É a natureza, sobretudo, que evoca o saber comum local, e desse, emerge a cultura de um povo e a caminhada como uma de suas expressões mais concretas.

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