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PARTE II – DIMENSÃO PASSIVA DA RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA

3. Da pluralidade passiva

3.3. Da pluralidade a posteriori

3.3.4. Responsabilidade solidária (sentido próprio)

3.3.4.4. Regime atual do CPPT

Atualmente constata-se que o artigo 153.º do CPPT mantém o regime do diploma precedente quanto ao chamamento dos responsáveis subsidiários à execução fiscal, omitindo qualquer meio de efetivação da responsabilidade solidária. Assim, resulta igualmente deste código que o processo de execução fiscal pode ser originariamente instaurado contra o responsável solidário, interpretação aparentemente reforçada pelo artigo 9.º, nº 2 do CPPT que dispõe que “a legitimidade dos responsáveis solidários

resulta da exigência em relação a eles do cumprimento da obrigação tributária ou de quaisquer deveres tributários, ainda que em conjunto com o devedor principal”. Em

sentido oposto, o disposto no número 3 do mesmo preceito272 sobre a legitimidade do

269Cfr. LOPES DE SOUSA, Jorge, Código de Procedimento e de Processo Tributário - Anotado e Comentado, 6ª Edição, Volume III,

Áreas Editora, 2011, Lisboa, pág. 72.

270A respeito do regime civil da solidariedade passiva V. ponto 4.2.3 desta parte do presente trabalho. 271Cfr. artigo 239.º do CPT.

94 responsável subsidiário, estabelece que a sua legitimidade deriva de ter sido contra ele ordenada a reversão da execução fiscal. Ademais, repara Jorge Lopes de Sousa que, a expressão “ainda que” ínsita no número 2 do artigo 9.º do CPPT “in fine”, permite supor por um lado que, o chamamento dos responsáveis solidários independe da prévia verificação da impossibilidade de obter o pagamento do devedor ou devedores originários e, por outro, é desnecessária a exigência coerciva do débito tribuário face ao devedor originário, podendo a exigência em relação aos responsáveis solidários ser efetuada sem, tão pouco, ser em conjunto com o devedor originário273.

Para finalizar, há que fazer menção que nos termos do artigo 22.º, nº 5 da LGT o responsável solidário pode ser notificado para pagamento voluntário do débito tributário previamente à instauração da execução fiscal nos mesmos termos do devedor originário274, pese embora, entendemos que, em princípio, tal deverá ocorrer em

momento posterior ao terminus do prazo de pagamento voluntário por parte do devedor originário275. Sem prejuízo de, à luz dos princípios da eficiência, praticabilidade

e simplicidade (artigo 46.º do CPPT), aventar-se a possibilidade de a autoridade tributária proceder à notificação simultânea da liquidação do tributo ao devedor originário e responsável solidário, porém o mesmo apenas tornar-se-á exigível relativamente a este se decorrido o prazo para pagamento voluntário, o devedor

273Cfr. LOPES DE SOUSA, Jorge, Código de Procedimento e de Processo Tributário - Anotado e Comentado, 6ª Edição, Volume III,

Áreas Editora, 2011, Lisboa, pág. 72.

274A este propósito Jorge Lopes de Sousa refere: ”como a exigência de pagamento da dívida em relação ao responsável subsidiário é sempre feita através de “citação” no processo de execução fiscal (art. 23.º, n.ºs 1 e 4 da LGT), pelo que a referência à “notificação” contida naquele n.º 4 do art. 22.º só pode reportar-se aos responsáveis solidários. Por outro lado, como o chamamento ao processo de execução fiscal daqueles a quem é exigido o pagamento da dívida se faz através de citação, aquela referência a “notificação” terá de reportar-se à exigência de pagamento antes da instauração do processo de execução fiscal”, Cfr. LOPES DE SOUSA, Jorge, Código de Procedimento e de Processo Tributário - Anotado e Comentado, 6ª Edição, Volume III, Áreas Editora, 2011, Lisboa, pág.

72.

275Nesta mesma lógica Sérgio Vasquez refere que a responsabilidade se verifica logo que se dê falta de pagamento, Cfr. VASQUES,

Sérgio, Op. Cit, pág. 29. O que faz subsumir que a responsabilidade solidária apenas pode ser acionada após o incumprimento do devedor originário no prazo de pagamento voluntário do tributo. Ademais, esta interpretação parece-nos a mais conforme com o disposto pelos artigos 86.º, n.º 2 e 88.º, n.º 1 e n.º 2 al. j) do CPPT. Com efeito, no que toca à possibilidade de pagamentos por conta após o termo do prazo de pagamento voluntário, o número 2 do artigo 86.º do CPPT é inequívoco ao referir expressamente que o contribuinte pode requerer o pagamento em prestações, não fazendo qualquer referência a outros devedores, nomeadamente a responsáveis solidários. A nosso ver, tal redação permite entrever que a notificação para pagamento voluntário da dívida tributária é comunicada primeiramente ao(s) devedor originário (contribuinte) para efeitos de pagamento voluntário. Que por sua vez, ao excluir os responsáveis solidários dessa faculdade, é porque a estes ainda não foi exigido o débito tributário, caso contrário careceria de sentido lógico, à luz do artigo 22.º, n.º 5 da LGT, vedar-lhes esse direito.

Por outro lado, o artigo 88.º, n.º 1 e n.º 2, al. j) preceitua que “findo o prazo de pagamento voluntário estabelecido nas leis tributárias,

será extraída pelos serviços competentes certidão de dívida com base nos elementos que tiverem ao dispor”, sendo que entre outros

elementos, a certidão de dívida deverá conter o nome e morada dos responsáveis solidários e subsidiários. O que, a certo modo, também faz subsumir, que a liquidação e o respetivo prazo para pagamento voluntário, serão primariamente notificados ao devedor originário para cumprimento voluntário nos termos do artigo 84.º do CPPT, após o qual poderá ser imediatamente exigível ao responsável solidário.

95 originário não haja satisfeito a prestação tributária276. Caso contrário277, estaríamos a

distorcer a natureza jurídica da responsabilidade solidária inserindo-a, erroneamente, no campo da solidariedade passiva no mesmo plano jurídico do devedor originário278.

Transmutando o responsável solidário, via procedimental, em contribuinte direto sem capacidade contributiva279. Contudo, deve o responsável solidário ser notificado dos

elementos essenciais da liquidação, uma vez que não tendo realizado o facto tributário, não se encontra condições de igualdade cognoscitiva tributária com o devedor originário, pelo que apenas assim poderá estar em condições de reagir ao ato tributário nos mesmos termos deste.

276No fundo, valem aqui razões atinentes ao princípio da economia procedimental previsto pelo artigo 5.º do CPA, subsidiariamente

aplicável ao procedimento tributário ao abrigo do artigo 2.º, al. d) do CPPT. Também à luz do princípio da celeridade procedimental (artigo 57.º, n. º 1 da LGT) se pode cogitar tal possibilidade, a este respeito Joaquim Freita da Rocha leciona que tal princípio comporta a simplicidade e economia procedimental, traduzidas através das atuações desburocratizadas e da proibição de atos inúteis ou dilatórios, Cfr. ROCHA, Joaquim Freitas da, Op. Cit., pág. 90.

277Como parece defender Jorge Lopes de Sousa. No mesmo sentido anda Serena Cabrito Neto e Carla Castelo Trindade, com efeito

referem as autoras que a legitimidade dos responsáveis solidários resulta da exigência, em relação a estes, do cumprimento em conjunto com o devedor principal. Porém, acrescentam e bem, que a legitimidade (dos responsáveis solidários) não se verificará durante a pendência do procedimento tributário de liquidação do tributo pelo qual pode ser responsável solidário, só passando a existir após a decisão final de liquidação, exceto se tiverem sido ordenadas ou requeridas providências cautelares contra estes responsáveis, cfr. NETO, Serena Cabrito, TRINDADE, Carla Castelo, Contencioso Tributário, Volume I, Almedina, 2017, Coimbra, pág. 100. Efetivamente, os responsáveis solidários não são tidos nem achados durante o procedimento de liquidação (liquidação aqui no seu sentido lato), pois que o lançamento e a liquidação dos tributos haverão de laborar e ser feitos em nome de quem preenche o elemento subjetivo do facto tributário que esteve na sua origem, ou seja o devedor originário, vulgo contribuinte ou devedores solidários. Porém, e por isso mesmo, entendemos que a decisão final do procedimento de liquidação apenas deverá produzir efeitos em termos de exigibilidade imediata do tributo, num primeiro momento, em relação a essas pessoas que constam do citado procedimento, pois é em relação a elas que, primária e funcionalmente, o sistema fiscal visa a tributação (pois são os titulares da capacidade contributiva), isto é, visa obter o seu contributo na ideia de solidariedade do contribuinte na satisfação das necessidades da comunidade social que ele integra. Sendo necessário, posteriormente a essa decisão, um ato de notificação (não da liquidação em sentido próprio, mas da exigência do pagamento do tributo em causa) aos responsáveis solidários na medida em que aqueles não hajam satisfeito voluntariamente prestação tributária. Na verdade, e neste sentido, somos do parecer que a responsabilidade solidária opera também ela num plano subsidiário face ao devedor originário, embora apenas exija como pressuposto de facto o incumprimento no prazo de pagamento voluntário atribuído ao devedor originário, contrariamente à responsabilidade subsidiária em sentido próprio. Em apelo desde modo de encarar as realidades em questão, Soares Martinez refere que “a responsabilidade

tributária depende sempre de uma certa conexão com a falta de cumprimento do devedor originário”, cfr. SOARES, Martinez, Op.

Cit., pág. 251, e “a responsabilidade tributária corresponde sempre a um dever de pagamento subsidiário”, cfr. SOARES, Martinez, Op. Cit., pág. 252.

Assim não se entendendo, julgamos que estar-se-á a correr o risco de outorgar um poder discricionário de tal ordem à autoridade tributária, que esta vê-se na disponibilidade eleger e alterar originariamente a incidência pessoal dos tributos por via de efetivação liquidações (tributações) contra pessoas externas a qualquer facto tributário e isentas de qualquer manifestação de capacidade contributiva, formulação de ideias que em nosso entender padece de um duvidoso enquadramento constitucional, nomeadamente no que ao princípio da igualdade e legalidade tributária diz respeito.

278A este respeito, vale lembrar as palavras de Ana Paula Dourado. Segundo a autora, a responsabilidade solidária parece ter um

significado diferente, se atentarmos nos regimes de responsabilidade do Códigos de Processo, desde o Código de Execuções Fiscais de 1913 incluindo o CPT, podemos concluir que, na verdade, o legislador nunca estabeleceu o chamamento simultâneo do contribuinte e do responsável solidário nem atribuiu discricionariedade à Administração Fiscal quanto ao chamamento de um ou de outro em primeiro lugar, Cfr. Ana Paula, Substituição e Responsabilidade Tributária, Ciência e Técnica Fiscal n.º 391, Centro de Estudos Fiscais, Direção-Geral das Contribuições e Impostos, Ministério das Finanças, Lisboa, 1998, pág. 58. Julgamos que este é o sentido mais apropriado da responsabilidade solidária, isto é, ela só opera mediante o incumprimento no prazo de pagamento voluntário do devedor originário. Podendo, após o referido prazo, ser exigível, conjuntamente ou independentemente do devedor originário, a satisfação da prestação tributáriaao responsável solidário. Indo-se, assim, ao encontro da natureza de fiança legal (sem benefício da excussão prévia) da responsabilidade solidária. De facto, não podemos esquecer que o responsável solidário é, mutatis

mutandi, um fiador legal desprovido do direito da excussão prévia, ora tal como sucede no domínio das relações de fiança civil, ao

responsável só pode ser exigido o cumprimento da obrigação tributária, na medida em que o devedor principal incumpriu no seu cumprimento voluntário.

279O que se nos assemelha uma solução de constitucionalidade duvidosa, pois, sob esta perspetiva, pode-se vir a exigir o pagamento

em pé de igualdade com o devedor originário, a alguém que além de não ser titular do pressuposto da tributação (mormente da capacidade contributiva fiscal) também não estava em condições de o efetuar e assegurar.

96 Ora aqui chegados, podemos compreender que a distinção entre responsável solidário e subsidiário não se sustenta na relação que cada um detém com o débito tributário (como os devedores solidários do artigo 21.º, n.º 1 da LGT), pois é alheio a ambos, mas no momento temporal em que cada um pode ser chamado ao cumprimento da obrigação tributária e pelo valor do débito tributário que cada um é responsabilizado. O responsável solidário pode ser chamado ao cumprimento da obrigação tributária antes de instaurada qualquer execução fiscal (momento N), contra si ou contra o devedor originário ou solidário, ao passo que o responsável subsidiário apenas responderá num segundo momento em instância executiva (momento N+1). Por outro lado, contrariamente ao responsável subsidiário, o responsável solidário (dada a sua natureza obrigacional) responderá solidariamente (in solidum) pela totalidade da dívida tributária, sem prejuízo do posterior exercício do direito de regresso contra o responsável originário (no âmbito operacional da responsabilidade vertical) e contra os eventuais corresponsáveis solidários (no âmbito operacional da responsabilidade horizontal).

3.3.4.5. A efetivação da responsabilidade solidária no ordenamento jurídico