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Capítulo 1. Introdução

1.2. Relevância do estudo e questão da investigação

Desde Cohen (1972) o interesse académico pelo turismo backpacker tem sido crescente evidenciado pelo aumento significativo do número de publicações científicas nas últimas décadas (Gráfico 2, p.46). Mas apesar dos 200 milhões de viagens internacionais (Tourism Research and Marketing, 2013) e das receitas de 286 mil milhões de US$ geradas em 2014 com o turismo jovem (World Tourism Organization, 2016) é ainda incipiente o número de estudos neste domínio.

Os turistas backpacker, definidos como turistas que viajam com mochilas às costas, com um orçamento diário reduzido, sendo predominantemente jovens, com preferência por alojamento económico e itinerários informais e flexíveis (Pearce, 1990 citado por Ooi & Laing, 2010) constituem uma parte significativa deste diversificado e fragmentado mercado. Associados no passado, aos turistas hippies, sendo ignorados e até indesejados pelas autoridades de muitos países (Hampton, 1998), sobretudo países em desenvolvimento, o quadro concetual e trabalho empírico realizado por Loker-Murphy & Pearce (1995), na Austrália, revelou a importância económica deste segmento. No entanto, tem sido dada mais atenção ao seu impacte económico nos países em desenvolvimento (Hampton, 1998; Rogerson, 2007; Ooi & Laing, 2010; Daldeniz & Hampton, 2013), faltando investigação empírica e quantitativa que contribua, por um lado, para um melhor conhecimento do impacte dos backpackers e seus subsegmentos na economia local (Richards & Wilson, 2004a) e por outro, para a compreensão do seu comportamento espaciotemporal intradestino, nomeadamente, na forma como os backpackers consomem e experienciam os lugares que visitam.

2 A existência de várias atrações turísticas no interior de um destino urbano, como acontece na cidade do Porto,

justifica a utilização do conceito “multiatração”, empregue por Caldeira (2014) na sua investigação. Esta autora (2014, p.11) define “viagem multiatração” como “viagem dirigida a múltiplas atrações no interior do destino durante um único dia (adaptado de Hunt & Crompton, 2008)”.

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Tal como acontece com os turistas em geral, em que estes se movimentam, quer numa macroescala, quer numa microescala, durante um determinado período de tempo, as suas escolhas encontram-se determinadas por restrições relacionadas com o espaço e com o tempo. Autores, como Grinberger et al. (2014), apoiados no quadro concetual da Geografia Temporal e trabalho seminal de Hägerstrand (1970), distinguiram diferentes tipos de comportamentos de visitantes baseados nas suas decisões, suportadas pelos seus recursos espaciotemporais. Vários estudos têm incidido sobre as escolhas do destino, a segmentação dos turistas, o modo como o destino é espacialmente consumido, nomeadamente, a sequência e que atividades são escolhidas (Grinberger, Shoval, & McKercher, 2014) reconhecendo-se a influência de vários fatores, com especial enfoque para a origem cultural dos turistas (Dejbakhsh, Arrowsmith, & Jackson, 2011); o tipo de viagem (Lew & McKercher, 2006); a localização do alojamento (Shoval, McKercher, Ng, & Birenboim, 2011); o primeiro e último dia da visita (Lew & McKercher, 2006); se visitam ou não o destino pela primeira vez (Caldeira & Kastenholz, 2018b; McKercher, Shoval, Ng, & Birenboim, 2012; Oppermann, 1997), as características sociodemográficas (Dejbakhsh et al., 2011; Caldeira, 2014) ou a distância percorrida desde o país de origem (Caldeira & Kastenholz, 2015).

A revisão da literatura efetuada revelou que o comportamento espaciotemporal intradestino do segmento backpacker não foi ainda devidamente analisado, pelo que se pretende desenvolver uma linha de investigação inovadora no sentido de compreender os seus padrões de comportamento espacial num destino urbano multiatração, ou seja, a forma como estes visitantes, verdadeiros nómadas globais da era digital (Richards, 2015) consomem e experienciam os destinos urbanos, examinando as suas motivações, experiências e comportamentos. Serão ainda analisados os padrões de movimento possíveis num contexto intradestino durante um dia de visita (Lew & McKercher, 2006; Grinberger et al., 2014; Shoval et al., 2011), procurando identificar diferentes padrões espaciotemporais na visita multiatração (Caldeira, 2014) tendo em conta as atrações, configuração espacial do itinerário, distância percorrida, meios de locomoção, localização do alojamento, entre outros.

Esta análise contribuirá para uma melhor adequação do destino à visita turística, maximizando a oferta de oportunidades junto dos mesmos e incrementando a sua satisfação relativamente a atrações, serviços turísticos, espaços públicos, sinalização e informação estratégica (Caldeira, 2014). Simultaneamente, vai ao encontro das áreas de estudo mais importantes a incluir em investigações sobre Turismo Urbano, identificadas

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por Edwards, Griffin, & Hayllar (2008, p.1043): i) a forma como os turistas utilizam a cidade e a identificação dos seus padrões de comportamento; ii) a compreensão dos impactes ambientais dentro dos destinos urbanos; iii) a identificação dos benefícios do turismo para as comunidades locais; iv) a definição da capacidade de carga da área urbana; v) a análise das relações espaciais, como a influência dos transportes urbanos na mobilidade dos turistas; vi) e as ligações existentes entre atrações e como estas dispersam os turistas dentro dos destinos turísticos urbanos.

No seguimento destas importantes linhas de investigação, esta pesquisa une três áreas de estudo que têm gerado crescente interesse em investigações na área do Turismo:

1) o comportamento espaciotemporal dos turistas;

2) o segmento backpacker enquanto fenómeno em crescimento;

3) e o território [urbano], enquanto suporte das atrações e elemento estruturante da atividade turística.

Dada a relevância económica da atividade turística na economia mundial (UNWTO, 2018),

nomeadamente o crescimento das viagens internacionais entre os mais jovens (World Tourism Organization, 2016), onde se destacam os turistas backpackers, considerou-se pertinente estudar este complexo e heterogéneo segmento de mercado onde têm sido identificados vários subsegmentos. Para efeitos desta investigação, um turista backpacker é uma pessoa que passa uma ou mais noites num alojamento para backpackers ou hostel, tal como é definido pelo Tourism Research Australia (2009). Por conseguinte, torna-se relevante conhecer melhor as suas motivações e comportamentos.

Quadro 1. Tipologia de alojamento escolhida pelos turistas de visita ao Porto (%). Alojamento 2011 2012 2013 Hotel 61.2 63.7 51.1 Hostel 4.1 7.7 10.9 Residencial 6.1 3.9 7.9 Pensão 5.3 3.1 8.6 Apartamento turístico 0.9 0.6 13 Casa de familiares/amigos* 14.9 11.3 12.3 Casa alugada 3.2 6.1 3.1 Casa própria 2.9 3.0 3.8 Barco 0.9 0.2 0.3 Turismo rural 0.1 0.2 0.4 Outros 0.4 0.1 0.3

* Alojamento não registado. Fonte: Costa et al., (2014).

Nos últimos anos, um dos destinos turísticos que mais tem crescido em Portugal é a cidade do Porto/Norte. Uma vez que os dados estatísticos oficiais sobre o número de dormidas contemplam o total de dormidas no alojamento local, não especificando o número de

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dormidas em hostels, a informação mais atualizada que existe foi publicada pelo IPDT (2012) e Costa, Moreira, & Vieira (2014). De acordo com o relatório dos resultados do turismo de 2014 do Turismo de Portugal (Silva, 2015), o número de dormidas na cidade foi superior a 5.4 milhões o que representa um crescimento de 11% em relação ao ano anterior. Em 2017, o sítio de internet Pordata.pt revela que o número de dormidas ultrapassou os 5.8 milhões. A maioria destes turistas optam por ficar alojados em hotéis ou em casa de familiares/amigos, no entanto, tem vindo a crescer o número de turistas que optam por ficar alojados em alojamentos de custo mais reduzido, como os conhecidos hostels, pensões, residenciais ou albergues como revelam Costa, Moreira, & Vieira (2014): em 2013, 10.9% dos turistas de visita ao Porto ficaram alojados em hostels o que reflete um aumento significativo em comparação com o ano de 2011, em que os hostels foram escolhidos por 4.1% dos turistas. Em conjunto, os hostels, as pensões e as residenciais representaram em 2013, 27.4% das dormidas (quadro 1).

A modernização do Aeroporto Francisco Sá Carneiro e o elevado número de voos realizados por companhias low cost3, como a Easyjet ou a Ryanair, contribuíram para esse crescimento, que se refletiu também no aumento da capacidade hoteleira, em especial de alojamentos que praticam preços reduzidos e, por isso, designados por alojamento low cost, como, por exemplo, os hostels ou os budgetHotels. Uma pesquisa efetuada no conhecido sítio de internet www.hostelworld.com, em fevereiro de 2017, revela a existência de 39 estabelecimentos de alojamento inscritos como hostels, registando um aumento de 34.5% em relação ao mês de fevereiro do ano anterior. No total, o mesmo sítio de internet tinha registados 91 propriedades entre hostels, pensões, residenciais, albergues, hospedarias ou guesthouses e apartamentos. Os valores apresentados anteriormente reforçam a importância crescente deste tipo de alojamento e, por conseguinte, o peso que este segmento representa no total da atividade turística.

A questão de investigação que servirá de ponto de partida e que ajudará a estruturar toda a proposta de investigação é a seguinte:

Como o segmento de turistas backpackers consome e experiencia o destino urbano Porto?

3 Em 2012, as companhias aéreas de baixo custo transportaram aproximadamente 45% do total de

passageiros do aeroporto Sá Carneiro (Costa, et al., 2014). No primeiro trimestre de 2019, segundo o Boletim Estatístico Trimestral da Autoridade Nacional de Aviação Civil, as companhias aéreas de baixo custo transportaram aproximadamente 61% do total de passageiros do aeroporto Francisco Sá Carneiro (ANAC, 2019).

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