• Nenhum resultado encontrado

2.3 Desempenho organizacional

2.3.2 Responsabilidade Social Corporativa (CSR)

Responsabilidade Social Corporativa (CSR), entre outras definições, descreve a relação entre as empresas e a sociedade, de uma forma geral, no curto e no longo prazo, buscando maximizar os impactos positivos sobre os stakeholders e minimizar os negativos.

Ao adotar a proposta de Marrewijk (2003), que considera a Responsabilidade Social Corporativa como uma etapa intermediária na direção da Sustentabilidade Empresarial, vale a pena retomar a evolução do conceito de CSR, assim como os estudos quantitativos que tentaram relacionar o desempenho social corporativo (CSP) com o desempenho econômico-financeiro das empresas (CFP).

Carroll, em 1999, publicou uma ampla revisão da evolução do conceito de CSR desde os anos 50, quando foi reconhecida pela primeira vez a importância e o poder das corporações e seus gestores sobre os vários aspectos da vida das pessoas. Nos anos 70 a CSR foi percebida como um meio para o alcance do objetivo econômico-financeiro de maximização dos lucros no longo prazo. Em 1971, após pesquisa pública de opinião junto a membros do meio empresarial e educadores, o Committee for Economic Development (CED) articulou uma definição composta de três círculos concêntricos. O círculo interno representava a responsabilidade da empresa com a execução da sua função econômica básica; o círculo intermediário representava a responsabilidade econômica, incluindo uma conscientização das mudanças nas prioridades e nos valores sociais e ambientais; e o círculo externo representava a responsabilidade relativa ao envolvimento mais amplo das empresas na melhoria da sociedade.

Como a Responsabilidade Social Corporativa vinha sendo definida de várias maneiras, abrangendo ampla gama de atividades empresariais e abordando inúmeras questões, Carroll (1979) sugeriu um modelo de desempenho social corporativo com três aspectos articulados e interrelacionados: a própria definição de responsabilidade social, as questões sociais envolvidas e o processo gerencial de resposta, denominado Corporate Social Responsiveness. Para contemplar a definição de CSR ele apresentou quatro categorias, que refletem as expectativas da sociedade: responsabilidades econômicas, legais, éticas e discricionárias. As categorias não são mutuamente excludentes, nem representam um contínuo, assim como não são aditivas nem cumulativas, mas cada uma faz parte de um conjunto que melhor descreve o que a sociedade espera das empresas. As categorias são apresentadas pela sua importância em termos cronológicos, já que a ênfase primeira permanece sendo a responsabilidade econômica, de acordo com as exigências legais, e mais recentemente surgiu a preocupação com os aspectos éticos e discricionários. Este modelo tem como objetivo auxiliar os gestores a priorizar e

sistematizar as questões sociais, melhorando o planejamento e o controle do desempenho social corporativo. É interessante observar que naquele momento, fim dos anos 70, a responsabilidade pelo desempenho econômico já está embutida no conceito de CSR e não em conflito com ele.

Nas décadas de 80 e 90 houve vários estudos com tentativas de medição do conceito e a CSR passou a dialogar com outros temas relacionados, como a teoria dos stakeholders e a ética empresarial. Em 1983 o próprio Carroll alterou o modelo de 1979, substituindo a categoria responsabilidade discricionária por voluntária ou filantrópica.

Com base no trabalho de Carroll (1979), Wartick e Cochran (1985) publicaram um modelo que consideraram como orientador do desempenho social corporativo, que busca integrar os três aspectos do modelo de Carroll em uma estrutura composta de princípios, processos e políticas. A relação das empresas com a sociedade baseia-se em princípios motivadores da responsabilidade social corporativa, em processos gerenciais de resposta e em políticas e programas para atender às questões sociais.

Wood (1991) reformulou o modelo de Wartick e Cochran (1985), tornando-o mais abrangente e apresentando evoluções conceituais, como a identificação de processos específicos de resposta e a ênfase nos resultados do comportamento empresarial, além de propiciar uma melhor compreensão das relações das empresas com a sociedade.

Para que a definição de CSR contemplasse todas as expectativas impostas pela sociedade sobre as empresas, Carroll (1991) desenhou uma nova estrutura denominada “Pirâmide da Responsabilidade Social Corporativa”. De acordo com esta estrutura e suas categorias – econômica, legal, ética e filantrópica – a sociedade espera que as empresas sejam geradoras de lucro, obedeçam às leis, tenham um comportamento ético em situações não previstas nas leis e contribuam para a comunidade no sentido de melhoria da qualidade de vida. Neste mesmo artigo, o autor destaca a ligação entre a responsabilidade social corporativa e a teoria dos stakeholders. Ao questionar por quem a empresa é responsável, ele sugere que o conceito de stakeholder personaliza a responsabilidade social, esclarecendo os grupos que as empresas devem considerar na definição de seus objetivos e atividades. O desafio da administração é decidir quais grupos terão suas expectativas prioritariamente atendidas, como parte do processo de

gestão dos stakeholders. A visão da responsabilidade corporativa perante os stakeholders é totalmente consistente com o ambiente atual, complexo e multifacetado, onde as empresas atuam.

Figura 7: Pirâmide da Responsabilidade Social Corporativa Fonte: CARROLL, 1991, p. 42

Posteriormente, Carroll e Schwartz (2003) desenvolveram, a partir das limitações da estrutura da Pirâmide da CSR (CARROLL, 1991), uma abordagem alternativa denominada Três Domínios da Responsabilidade Social Corporativa, onde as áreas de responsabilidade são: econômica, legal e ética. Entre as críticas apresentadas para a estrutura da Pirâmide destacam-se: que a filantropia não deve ser considerada uma responsabilidade da empresa, passando a ser inserida no domínio ético ou no domínio econômico, em função das motivações subjacentes; que não deve existir hierarquia entre os domínios, o que poderia ser inferido pela forma da pirâmide; e que a relação entre os três domínios precisa ser mais bem descrita. O Modelo dos Três Domínios é apresentado como um diagrama de Venn e as superposições que surgem geram sete categorias ou segmentos. Esta estrutura facilita a categorização das atividades de CSR, assim como a compreensão das relações entre empresas e sociedade nos aspectos econômicos, legais e éticos.

Figura 8: Modelo dos três domínios da Responsabilidade Social Corporativa Fonte: CARROLL; SCHWARTZ, 2003, p. 509

Segundo os mesmos autores, houve duas grandes linhas de pensamento orientando a formação da definição de Responsabilidade Social Corporativa (CSR): a primeira afirma que as empresas têm obrigação apenas de maximizar os lucros e o valor para o acionista, cumprindo a lei e restrições éticas mínimas; a segunda sugere que as empresas têm um amplo leque de obrigações com a sociedade.

Fisher (2004) afirma que a falta de consenso sobre o significado da Responsabilidade Social Corporativa vem do fato de não haver concordância sobre os objetivos das empresas ou sobre quem tem direitos legítimos em relação a elas. Os objetivos e as responsabilidades das empresas mudam em função das expectativas da sociedade. Como a atuação das empresas tem uma importância cada vez maior no desenvolvimento das sociedades, seus objetivos e responsabilidades aumentam também.

O papel das empresas na sociedade é objeto de estudo e discussão há várias décadas e duas são as visões principais: a clássica e a socioeconômica. A visão clássica, mais focalizada, é associada a Friedman (1970), que afirma que a responsabilidade social da empresa é maximizar os lucros, de acordo com as “regras do jogo”, ou seja, com as leis e as normas da sociedade. A visão socioeconômica, mais ampla, diz que as obrigações da empresa vão além da maximização dos lucros, incluindo a proteção e a melhoria da sociedade. Na verdade, a definição de Friedman já abordava as responsabilidades econômica, legal e ética ao relacionar a geração do maior lucro possível de acordo com as regras básicas da sociedade, tanto as previstas em lei quanto as implícitas nos

preceitos éticos. A polêmica em torno da afirmação de Friedman permanece para aqueles que levam em consideração apenas a parte que se refere à responsabilidade econômica.

Friedman (1970) afirma que as empresas, como pessoas jurídicas, não têm responsabilidades. Quem as têm são as pessoas que fazem a sua gestão, as quais devem agir no sentido de atender aos interesses e expectativas dos proprietários, como seus agentes. Destas afirmações pode-se concluir que, se os interesses dos proprietários mudam no sentido de incluir preocupações com o ambiente e com a qualidade de vida, além do resultado econômico-financeiro, os administradores atenderão a esses interesses e a empresa estará naturalmente exercendo a Responsabilidade Social Corporativa no sentido abrangente, socioeconômico.

Para ajudar a entender as percepções e atitudes dos investidores Teoh e Shiu (1990) apresentam um estudo focalizando: a) a importância dada às informações sobre o desempenho social em comparação com as informações financeiras; b) a postura dos investidores em relação ao envolvimento das empresas nas práticas de CSR; c) a importância dos métodos de divulgação utilizados e d) as práticas adotadas pelas empresas. A pesquisa, realizada com 200 instituições financeiras australianas, mostrou que as informações sobre CSR apresentadas nos relatórios anuais não impactam as decisões de investimento, exceto, para um grupo pequeno, no caso da divulgação de informações negativas. Por outro lado, a forma de apresentação é importante, ou seja, os investidores preferem informações quantificadas, financeiras. Algumas práticas como melhorias de produto, atuação comercial justa, gestão de pessoas e preocupação com o ambiente são consideradas mais relevantes nos processos de decisão. Finalmente, os investidores institucionais não se opões necessariamente ao envolvimento das empresas em atividades de CSR.

Dada a relevância crescente da CSR nas decisões gerenciais, a relação entre as atividades sociais e o resultado econômico-financeiro tornou-se um tópico importante. Nas últimas três décadas, em vários países, mais de cem estudos foram realizados tentando relacionar o desempenho social e o desempenho econômico-financeiro das empresas, mas seus resultados são inconclusivos e até contraditórios (MAROM, 2006). Os vários estudos realizados utilizaram tanto indicadores contábeis quanto indicadores

de mercado para representar o desempenho econômico-financeiro. Quanto ao horizonte de tempo, alguns estudos foram prospectivos e outros retrospectivos em relação ao momento da divulgação do desempenho social corporativo (McGUIRE; SUNDGREN; SCHNEEWEIS, 1988).

Tanto a CSR quanto a teoria dos stakeholders, através de suas próprias definições e premissas, reforçam a proposição de que a responsabilidade social deve afetar o desempenho econômico financeiro. As duas hipóteses são: 1) as várias responsabilidades englobadas sob o título CSR levam a uma atuação que melhora o desempenho econômico-financeiro, através da mediação de fatores como a redução do risco, melhoria na reputação e na competitividade, a atração de investidores e 2) para melhorar o desempenho nas várias áreas da CSR a empresa arcará com custos adicionais que reduzem sua lucratividade e a colocam em desvantagem diante de empresas não socialmente responsáveis.

Aupeerle, Carroll e Hatfield (1985) avaliaram dez estudos sobre a relação entre a CSR e a lucratividade, mapeando as metodologias e os indicadores financeiros utilizados, os resultados obtidos e as limitações detectadas e propuseram um instrumento para medir o grau de orientação da empresa na direção da Responsabilidade Social Corporativa, com base no modelo de pirâmide de Carroll (1991). Seu estudo não foi conclusivo, mas sua principal contribuição foi a criação de uma proposta de métrica para a CSR.

Em 2001, Hillman e Keim perceberam que dois aspectos associados ao desempenho social corporativo, gestão dos stakeholders e envolvimento em questões sociais, apresentam correlações opostas com o desempenho financeiro medido pelo MVA (Market Value Added). A gestão dos stakeholders contribui para a geração de valor para o acionista e o uso de recursos em questões sociais, não relacionadas aos stakeholders primários, não contribui para a geração de valor para o acionista. Esta pode ser uma explicação parcial para as ambiguidades encontradas nos resultados de outros estudos que não fizeram a separação aqui proposta.

Outros trabalhos apontaram resultados diferentes. Por exemplo, Verschoor (2003) estudou quatro grupos de empresas consideradas responsáveis, utilizando como critérios a participação no DJSI, no USA FTSE4Good, no Best Citizens da revista Business

Ethics, além da publicação e do comprometimento com o uso de um código de conduta. Os grupos foram comparados com o resto das empresas presentes no S&P500 não participantes dos quatro grupos anteriores. A métrica usada para avaliar o desempenho financeiro foi o Market Value Added (MVA). Nos quatro grupos de empresas responsáveis o valor médio do MVA foi aproximadamente três vezes maior do que o valor médio do MVA das empresas não classificadas como responsáveis.

Outra forma de abordar o estudo das relações entre CSR e desempenho financeiro é avaliar se o desempenho financeiro é que impulsiona as atividades de CSR ou se as atividades de CSR é que direcionam um melhor desempenho financeiro. McGuire, Sundgren e Schneeweis (1988) compararam os retornos de mercado ajustados ao risco e as medidas contábeis tradicionais de empresas classificadas como de melhor reputação na divulgação anual da revista Fortune1 (1983 apud MCGUIRE; SUNDGREN; SCHNEEWEIS, 1988), antes e depois da divulgação. Seus resultados indicam que é mais promissor considerar o desempenho financeiro como a variável que influencia o desempenho social do que o inverso. Waddock e Graves (1997) estabeleceram as duas hipóteses e concluíram que a relação de causa e efeito pode ter os dois sentidos. É possível, no entanto, especular onde este círculo virtuoso começa: se com os recursos disponíveis do bom desempenho financeiro ou com a preocupação da empresa com aspectos sociais.

Tentando dirimir as dúvidas que permanecem após mais de três décadas de pesquisa sobre o assunto, Lee, Faff e Langfield-Smith (2009) investigaram a relação entre o desempenho social corporativo (CSP) e o desempenho financeiro, usando uma metodologia mais rigorosa. Entre as limitações metodológicas identificadas nos estudos anteriores destacam-se: o uso de filtros negativos, que excluem alguns setores para a definição da amostra, a falta de variáveis de controle, o número limitado de medidas de desempenho financeiro, amostras de tamanho reduzido e pequenos intervalos de tempo. Segundo os autores, para medir o desempenho social podem ser utilizadas proxies mais específicas (exemplo: qualidade da governança corporativa) ou mais amplas, que foram preferidas por considerar o desempenho através de um conjunto de atividades da empresa e por serem consistentes com a teoria dos stakeholders (exemplo: participação no DJSI). Foram comparadas empresas líderes e retardatárias em CSP, conforme dados

1

do DJSI, que adota uma metodologia que valoriza as empresas com melhor desempenho e prioriza critérios setoriais (abordagem best-in-class), sem filtros negativos. Os indicadores de desempenho financeiro foram classificados em contábeis e de mercado e testados separadamente. Não foi encontrada evidência estatística de uma associação positiva entre CSP e desempenho financeiro, independente do tipo de indicador financeiro utilizado.

Outra tentativa de organizar os conceitos nas áreas de sustentabilidade e responsabilidade social corporativa foi feita por Steurer et al (2005). Os autores consideraram que o desenvolvimento sustentável é um conceito macroeconômico, como um modelo orientador de longo prazo, enquanto a sustentabilidade corporativa direciona o desempenho das organizações, no curto e no longo prazo, considerando as dimensões econômica, social e ambiental. Já a responsabilidade social corporativa foi considerada uma abordagem gerencial, que depende da estratégia e da vontade da empresa no atendimento das expectativas de stakeholders específicos, também adotando as dimensões econômica, social e ambiental. A diferenciação dos conceitos também é feita em função do tempo, pois, de forma simplificada, a responsabilidade social corporativa refere-se ao atendimento dos stakeholders atuais e a sustentabilidade refere-se aos impactos das atividades da empresa em um horizonte intergeracional. A Figura 9 a seguir apresenta uma visão geral dos três conceitos, em níveis, com as atividades de gestão do relacionamento com os stakeholders atravessando todos os níveis.

Figura 9: Visão geral dos conceitos de Desenvolvimento Sustentável, Sustentabilidade Empresarial, Responsabilidade Social Corporativa (CSR) e Gestão dos Relacionamentos com os Stakeholders (SRM) Fonte: adaptado de STEURER, 2005, p.275.

Ao adotar uma abordagem ampla do conceito de CSR, buscando atender aos interesses dos stakeholders e acompanhando seu desempenho em termos sociais, ambientais e econômicos, as empresas contribuem para o objetivo geral da sustentabilidade empresarial. Por este motivo, empresas com atuação socialmente responsável no sentido socioeconômico também são chamadas de empresas sustentáveis (VAN DE VELDE, 2005).