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PARTE I ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2. CONTABILIDADE PÚBLICA VERSUS CONTABILIDADE PRIVADA

2.4. Elementos das demonstrações financeiras

2.4.5. Resultado líquido

O POCP e os planos sectoriais públicos impõem a elaboração da demonstração de resultados45 por natureza de custos e proveitos por parte das entidades que ficam sujeitas à sua aplicação. Este mapa financeiro, similar ao do POC, faz aparecer no meio da contabilidade pública uma nova grandeza - o resultado líquido do exercício (RLE).

De acordo com Freitas (2000), o RLE é normalmente considerado como a medida de desempenho das organizações inseridas no âmbito das actividades lucrativas46. Tem a mesma opinião Vela Bargues (1991a:587), ao referir que “...num ambiente de concorrência e tendo o

lucro como objectivo, este funciona como uma medida natural de êxito da gestão efectuada.”.

As empresas incorrem em custos com a esperança de vir a gerar proveitos posteriores, de forma a obter um resultado positivo, isto é, a actividade e o resultado das vendas orientam-se para a obtenção de fluxo de caixa positivo como forma de permitir o contínuo financiamento das operações da empresa (Simões, 1998).

Freitas (2000:17) considera ainda que, através do RLE, podemos conhecer outras informações como, o retorno do investimento ou os ganhos por acção, o que “...torna esta grandeza das de

maior dificuldade de definição no âmbito das organizações sem fins lucrativos...”.

Na contabilidade privada, são tidas em consideração, na determinação do RLE, duas perspectivas, activo versus passivo e proveitos versus custos. Solomons (1997:22) considera estas perspectivas como “…abordagens rivais à contabilidade empresarial.”. Da mesma opinião são Storey e Storey (1998:76), que afirmam que estas duas perspectivas são

“…essencialmente incompatíveis…” uma vez que a primeira perspectiva vê “…o resultado como um aumento da riqueza ou domínio sobre recursos económicos…”, enquanto a segunda

vê “…o resultado como indicador do desempenho de uma empresa e da sua agência.”. No § 21 da SFAC 6, o FASB põe em evidência o sistema de «articulation» entre os elementos que compõem as perspectivas, acima referenciadas, e afirma que os elementos da segunda perspectiva dependem dos da primeira. Assim, somos conduzidos a concluir que este organismo internacional atribui o primado conceptual aos activos e passivos, em que “…o

resultado é visto como a alteração no valor atribuído pela subtracção dos passivos aos

45 Os resultados, segundo o POCP e os restantes planos, “…são classificados em correntes e extraordinários, desdobrando-se os primeiros em operacionais e financeiros.” (ponto 2.2).

No caso do POC-Educação, é ainda exigida a elaboração da demonstração de resultados por funções (ponto 2.2.2). Sendo, neste plano, desenvolvida a contabilidade analítica (ainda que, não seja apresentado um quadro de contas) torna-se importante a elaboração desta demonstração, na medida em que permitirá “…a análise dos custos por funções, produtos, serviços e dos instrumentos de análise colocados à disposição dos utentes.”. Esta obrigatoriedade é defendida por vários autores, que vêem este mapa como uma peça fundamental para a análise da relação custos e proveitos por cada serviço da entidade.

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De acordo com o estipulado no parágrafo 69, da estrutura conceptual do IASB (1989), o lucro “…é frequentemente usado como medida do desempenho ou como a base para outras medições…”.

activos no início e no fim do período e os custos são vistos como resultados de alterações no valor dos activos e passivos.” (Castelo Branco, 2000:197).

Na perspectiva proveitos versus custos, a determinação do resultado de um período “…faz-se

através da identificação dos proveitos e dos custos desse período e do seu correcto balanceamento e os activos são considerados como resíduos que devem ser transportados para períodos futuros em ordem a assegurar um balanceamento adequado e a evitar distorção dos resultados.” (Belkaoui, 1992:190).

No §70 da SFAC 6, o FASB define resultado líquido como “…a alteração nos capitais

próprios da empresa durante um período resultante de transacções e outros acontecimentos ou circunstâncias, excepto os que resultem das distribuições aos e dos investidores.”.

O IASB na sua estrutura conceptual (1989, §69) define resultado líquido como “…medida de

desempenho do retorno de um investimento ou dos ganhos por acção.”.

Nas entidades sujeitas a contabilidade pública, o termo RLE tem uma interpretação diferente das anteriores. As entidades públicas, apresentam uma lógica completamente inversa à das empresas dado não terem como objectivo a formação de resultados (Simões, 1998). Segundo Correia (2002b:275), o “...resultado nas entidades públicas tem pouco significado, não sendo

um output tangível, mas apenas o cumprimento de objectivos de prestação de serviços à comunidade, a fim de aumentar o bem-estar social.”.

O RLE não é uma grandeza que permite a avaliação dos objectivos de uma entidade pública (Freitas, 2000). Para Simões (1998) a ausência de fins lucrativos das entidades públicas não é um impedimento a que a gestão das mesmas seja efectuada. Vela Bargues (1995:97) afirma que, na contabilidade pública, a interpretação de resultado líquido “...será mais conveniente

incidir na utilidade da posição financeira real (balanço) do que no resultado económico.”.

Montesinos Julve (1993:708) assinala que o montante e os componentes do resultado líquido das entidades sem fins lucrativos constitui um “…importante indicador para avaliar a

actuação da entidade e a sua eficiência e bem assim para permitir prever a sua capacidade de gerar fluxos de tesouraria.”. Por sua vez, Pina Martínez (1993) refere que a “…classificação dos custos por natureza é totalmente insuficiente para medir a economia, a eficácia e a eficiência das entidades públicas, uma vez que ela permite estabelecer a eficiência global da entidade mas não a dos serviços que presta.”47.

Segundo Carvalho et al. (1999:22), “…para qualquer estudo de eficiência económica

comparada ou simplesmente para avaliar a eficiência na gestão em termos de rentabilidade, os proveitos e custos próprios da actividade económica da entidade deveriam corrigir-se...”

com os efeitos das decisões da política económica “...a não ser que já estejam compensados

via financiamento.”.

Na NICSP 1, o termo RLE foi substituído por excedente ou défice líquido, o qual inclui o excedente ou défice das actividades ordinárias e das rubricas extraordinárias (§6). De acordo com este normativo, entende-se por excedente ou défice das actividades ordinárias “...a

quantia residual que fica após os custos provenientes das actividades ordinárias terem sido deduzidas do rédito provenientes de actividades ordinárias.”; e considera-se que as rubricas

extraordinárias são “…réditos e gastos que provêm de acontecimentos ou transacções

claramente distintos das actividades ordinárias das entidades, que não se espera que recorram com frequência e estejam fora do controlo da entidade.” (§6). O POCP e os planos

sectoriais públicos designam excedente ou défice das actividades ordinárias e das rubricas extraordinárias por resultados correntes e resultados extraordinários. Os primeiros resultam da diferença entre proveitos e custos correntes e, os segundos, da diferença entre proveitos e custos extraordinários.

Como tivemos oportunidade de verificar, o desempenho das entidades públicas não deve ser medido através do resultado líquido. Mas então que importância terá a sua determinação para a contabilidade pública?

De acordo com a perspectiva de Menoyo e González (in Vela Bargues, 1992), o resultado líquido no domínio da contabilidade pública pode ser visto segundo três abordagens distintas, a saber:

Perspectiva financeira - traduz a capacidade ou necessidade de endividamento e

viabilidade financeira;

Perspectiva económica - reflecte a variação no património resultante da actividade

corrente da entidade;

Perspectiva orçamental - evidencia o excedente/défice orçamental.

Para Anthony (in Benito López, 1995:148), o resultado líquido, entendido como a diferença entre proveitos e custos, permite medir se as entidades públicas “...viveram dentro das suas

capacidades.” e se os elementos aí considerados “…fornecem informação acerca de como se formou o resultado.”.

Em termos conclusivos, somos de opinião que a designação do elemento conceptual «resultado líquido» deve ser alterada para «resultado económico» de acordo com a perspectiva de Menoyo e González (in Vela Bargues, 1992).