• Nenhum resultado encontrado

Se direito é decisão, conhecer o processo decisório é fundamental

Capítulo 6: Por um maior cuidado com o estudo das teorias da argumentação jurídica no

6.1 Se direito é decisão, conhecer o processo decisório é fundamental

Sumário: 6.1 Se direito é decisão, conhecer o processo decisório é fundamental 6.2 Direito – a questão do vazio ontológico 6.3 Conhecer o contexto hermenêutico-argumentativo é compreender melhor o fenômeno jurídico 6.4 Os limites das teorias da argumentação jurídica – uma porta aberta para novas investidas 6.5 Em tempo, e sobre o profissional de direito ... 6.6 Conclusões do autor

6.1 Se direito é decisão, conhecer o processo decisório é fundamental

Este capítulo, o último do trabalho, apresenta-se como uma conclusão geral de todas as idéias abordadas ao longo do texto. É fato que muitos aspectos conclusivos foram sendo tratados já nos capítulos anteriores, em face dos temas levantados, mas o arremate da dissertação é feito a partir deste tópico. Como não poderia deixar de ser, há uma certa sensação de retomada de idéias, em vários momentos desta parte conclusiva. Afinal de contas, é preciso explicitar uma concatenação de posicionamentos teóricos que vêm sendo salientados desde as primeiras linhas. Ademais, como já se disse no texto introdutório, a perspectiva de um tema transverso, a questão da preparação do profissional de direito, aflora nestas considerações últimas.

Em primeiro lugar, que se acentue o caráter decisório da experiência jurídica, em todas as suas formulações históricas. Em se apresentando como um conjunto ordenado de regras de conduta, regras de dever ser, o direito marca presença no contexto das ordens normativas que

esperam106 a observância dos preceitos integrantes do ordenamento. Não se está diante de um conjunto bem intencionado de conselhos afetivos, que podem ou não ser seguidos. Claro que a norma jurídica também pode não ser cumprida, mas para tal hipótese certamente existe uma conseqüência de natureza jurídica107. Então, a perspectiva é a de que, ao fim e ao cabo, uns cumpram as regras jurídicas e outros não as cumpram. Conclusão inevitável do raciocínio anterior é que alguém deverá “dizer o direito” para o caso concreto da não observância das regras.

Tudo isso assume um papel muito mais contundente na configuração do direito moderno, com seu viés dogmático estatal. As origens primeiras deste dogmatismo remontam ao início do segundo milênio, quando, em Bolonha, glosadores iniciaram o trabalho exegético de textos jurídicos romanos (WIEACKER, 1980, p. 38-67). A evolução do pensamento jurídico no rumo do fortalecimento de suas bases científicas moldou, de lá para cá, este que é o direito com o qual se convive hoje, especialmente nos países mais afinados com a tradição cultural e política européia. Apresenta-se o direito dogmático moderno, então, com duas características essenciais: a existência de pontos de partida, quais sejam os dogmas jurídicos (as normas), e a temática decisória como problema central.

Nesse sentido, não é exagerado dizer que tudo gira, no âmbito do direito moderno, em torno da questão da decisão. Os inúmeros elementos cognoscíveis, partes deste objeto de conhecimento maior que é o próprio fenômeno jurídico, são relevantes na medida em que apresentam-se como meios que, no campo da investigação dogmática, terão um fim: a decisão judicial. É preciso salientar, para que deduções inoportunas não floresçam, o fato de que não se está a querer afirmar, nem de longe, que as condutas juridicamente prescritas são todas inobservadas, gerando uma avalanche de processos judiciais, em que as decisões se manifestam. A maior parte da vida em sociedade se dá sob o pálio regulador do direito, com a

106 Sem qualquer conotação valorativa, já que a ordem jurídica não esboça posturas emocionais quanto ao seu

cumprimento ou descumprimento.

grande maioria das pessoas cumprindo as determinações jurídicas sem jamais tomar parte em processos judiciais108.

Nem por isso, entretanto, o espectro da decisão perde importância, pois que, a toda hora, em não havendo o cumprimento das regras jurídicas, o tema da exigibilidade ganha terreno. Alguém pleiteia o “seu direito” junto ao aparato judiciário do Estado e será inevitável a decisão. Também ao direito, como ordem exterior, não é elemento essencial a identificação das razões últimas que levam as pessoas a observarem ou não as suas regras. Há, e é isso que se está a acentuar, um onipresente manto a cobrir todo o ordenamento jurídico normativo – a perspectiva da decisão judicial.

O contexto decisório, na verdade, apresenta-se como um complexo processo, com várias facetas fenomênicas. Necessário se faz, assim, a busca permanente do conhecimento deste processo, para uma melhor compreensão do próprio direito. Nesse sentido, salta aos olhos todo o emaranhado de elementos que compõem o contexto hermenêutico- argumentativo, marca registrada, ainda que não de forma exclusiva, dos processos decisórios. Há que se buscar um melhor entendimento de todo o processo que culmina com a decisão judicial, sob a óptica da inter-relação entre os diversos procedimentos e de suas fundamentações.

Não é plausível admitir que o estudo do fenômeno jurídico não possua como referencial permanente a questão da decidibilidade, afinal, como já se disse, tudo gira em torno disso. Com isso não se está querendo defender a tese segundo a qual adotar tal postura significará reduzir a compreensão da experiência jurídica a meros formalismos procedimentais. Muito pelo contrário; identificar o elemento decisório como aspecto marcante do direito dogmático moderno é robustecer a perspectiva de um entendimento mais aprofundado deste. Afinal de contas, mergulhar no oceano da temática hemenêutico-

108 Ver, a propósito de tal posicionamento, as cinco teses fundamentais da teoria egológica (COSSIO, 1987, p.

argumentativa é conviver, a todo momento, com indagações de natureza filosófica, reforçando, então, o entendimento dos diversos elementos que integram o universo jurídico.