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2 PROFISSÕES DA INFORMAÇÃO Para Mueller (004, p 5),

2.1.1 Seleção e aquisição de materiais

Conforme Ramos (2004), a biblioteca deve cuidar para que o acervo esteja de acordo com as necessidades dos seus usuários, adotando critérios de seleção compatíveis com a importância dos materiais para a comunidade em que atua e tomando os devidos cuidados no processo de compra e administração de recursos.

O processo de seleção e aquisição de materiais para a biblioteca faz parte do que se denomina desenvolvimento de coleções – “uma divisão funcional da biblioteca, da mesma forma como são a catalogação, a referência, a aquisição e os departamentos de circulação”, (VERGUEIRO, 1993, p.15) – que passou a ser reconhecido como objeto da biblioteconomia

na chamada “exploração bibliográfica”20

dos anos 1960.

O desenvolvimento e a gestão de coleções abrangem tarefas como “determinação da política da coleção, a alocação de recursos, a avaliação das coleções, seja para descarte, como

para armazenagem em depósitos” (VERGUEIRO, 1993, p.15) e é considerado um dos

processos de mediação implítica do profissional bibliotecário (ALMEIDA JÚNIOR, 2009). Tal desenvolvimento tem caráter sistêmico, pois é preciso que os materiais estejam em sintonia com a comunidade dos usuários, a qual, por sua vez, deve estar refletida nos objetivos da biblioteca (VERGUEIRO, 1993; MIRANDA, 2007).

Segundo Miranda (2007), a coleção deve ser desenvolvida a partir de uma política de desenvolvimento de coleções, da política de seleção da coleção, do processo de aquisição, da avaliação da coleção e do desbastamento do material. Tal visão alinha-se com a de Vergueiro (1993), citando as oito funções da administração de coleções de Cosgwell21: planejamento e elaboração de políticas; análise de coleções; seleção de materiais; manutenção da coleção (decisão de descarte ou armazenamento); administração fiscal (controle de orçamento e alocação de recursos); contato com o usuário (para conhecer as necessidades e exigências dos usuários); compartilhamento de recursos e avaliação do programa (através de dados de utilização ou não dos recursos, de empréstimos interbibliotecários e estudos de usuários).

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Segundo Vergueiro (1993), entre 1950 e 1965 a produção industrial de livros duplicou – fenômeno conhecido como

“explosão bibliográfica” (VERGUEIRO, 1993; MATTOS e DIAS, 2009) - o que fez com que as bibliotecas ficassem mais

atentas ao que deveria ou não ser incorporado ao seu acervo, com vistas a evitar redundâncias. Para ele, foi nas décadas de

1960 e 1970 que o se “pode identificar nitidamente um movimento em direção ao desenvolvimento das coleções”

(VERGUEIRO, 1993, p.14).

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COGSWELL, James A. The organization of collection mangement functions in academic research libraries. Journal of Academic Librarianship, v. 13, n. 5, p. 269-271, 1987.

O desenvolvimento das coleções, segundo Vergueiro (1993) citando Evans22 exigirá constante avaliação dos recursos da biblioteca, através tanto do estudo das necessidades dos usuários quanto da comunidade a ser servida. Para Figueiredo (1994, p.72), o estudo da comunidade serve como ponto de partida para o estabelecimento das metas e objetivos da biblioteca e exige a abertura do bibliotecário a vivências fora dos espaços da biblioteca, o que justifica em parte o fato dos primeiros estudos terem sido conduzidos por peritos e não incorporados à prática dos bibliotecários. A partir do conhecimento da comunidade, é possível determinar as políticas da biblioteca, como as políticas de seleção, aquisição, descarte e os critérios para a avaliação dos serviços prestados.

Para saber das necessidades dos usuários, é recomendável a realização de estudos de usuários pelo bibliotecário os quais são

investigações que se fazem para saber o que os indivíduos precisam em matéria de informação, ou então, para saber se as necessidades de informação por parte dos usuários de uma biblioteca ou centro de informação estão sendo satisfeitas de maneira adequada.(...) Esses estudos são, assim, canais de comunicação que se abrem entre a biblioteca e a comunidade a qual ela serve. São estudos necessários também para a ajudar a biblioteca na previsão da demanda ou da mudança da demanda de seus produtos ou serviços, permitindo que sejam alocados recursos necessários na época adequada (FIGUEIREDO, 1994, p. 7).

Não somente no processo de seleção e aquisição de materiais são necessários estudos de usuários, pois eles auxiliariam, na visão de Bettiol (1990), também no processo de disseminação seletiva da informação e atendimento ao usuário, etapas do trabalho do bibliotecário que ainda serão caracterizadas nos próximos tópicos.

Não obstante, é difícil determinar, com precisão, o que é a necessidade de informação (BETTIOL, 1990; GONZÁLEZ TERUEL, 2005). Segundo Bettiol (1990), a

necessidade é “o que o indivíduo deve ter para o seu trabalho, pesquisa, instrução, recreação”

(BETTIOL, 1990, p. 62) e pode não ser notada, percebida ou formulada.

Neste sentido, a natureza das necessidades variará conforme a natureza do indivíduo e da biblioteca – a atividade de pesquisa pode ser a mais requisitada em uma biblioteca universitária, enquanto a de recreação pode ser mais requisitada em bibliotecas públicas. Conforme Vergueiro (1993), o perfil da clientela das bibliotecas públicas é mais dinâmico e diversificado, sendo essencial o estudo da comunidade atendida, já que “as alterações e diretrizes demográficas ocorridas nas cidades e áreas metropolitanas, o aumento dos níveis de conhecimento e especialização da população, ocasionando transformação na distribuição de

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renda e na capacidade de aumento de salários, são fatores que devem ser de interesse da

biblioteca” (FIGUEIREDO, 1994, p. 65). Para Vergueiro (1993), as atividades de

desbastamento e avaliação do acervo devem ser enfatizadas nas bibliotecas públicas, contando com a atitude crítica do bibliotecário em relação ao status quo.

Para Miranda (2007), as bibliotecas especializadas – como as bibliotecas setoriais ou de empresas industriais ou comerciais – contam com uma clientela limitada de usuários bem específicos, como pesquisadores, técnicos e funcionários. Segundo a mesma autora, a política de desenvolvimento de coleções deveria ser criada por meio de uma comissão composta pelo bibliotecário, por um representante da instituição e por um representante da área administrativa (como setor de compras). Neste tipo de biblioteca, Miranda (2007) menciona que a seleção de materiais é realizada através de instrumentos como catálogos de editores, de obras, bibliografias e listas de materiais, resenhas de editores qualificados, listas de reservas, sendo os usuários influenciadores no processo de seleção “não apenas como um dos fatores decisivos na preferência por títulos, mas também contribuem com suas sugestões (...) valendo ressaltar que os usuários tendem a ser parcial (sic), indicando, muitas vezes, publicações de

interesse predominantemente particular, em oposição ao interesse das instituições”

(MIRANDA, 2007, p. 90). No caso das bibliotecas especializadas com acesso restrito, não seriam realizados estudos de comunidade para desenvolvimento e avaliação de coleções, sendo necessário cuidado nos processos de “compra, doação e permuta” (MIRANDA, 2007, p. 40), pois é preciso, conforme Vergueiro (1993), enfatizar o atendimento às necessidades das organizações, exigindo grande esforço do bibliotecário em lidar com material não convencional (relatórios, preprints, entre outros). A avaliação das coleções de bibliotecas especializadas pode ser feita de maneira quantitativa (tamanho e crescimento) e de maneira qualitativa (julgamento por especialistas, análise de uso real) (MIRANDA, 2007, p.91) e o descarte deveria ser feito através de comissão formada por bibliotecário e especialista.

Já as bibliotecas de universidades teriam uma coleção com forte tendência ao crescimento, dados os objetivos de ensino, pesquisa e extensão de tais instituições, o que exige um volume significativo de recursos informacionais, devendo ser dada “ênfase no

desbastamento e avaliação constantes das coleções” (VERGUEIRO, 1993, p. 19). As

bibliotecas escolares, por sua vez, devem estar integradas ao processo educacional,

“pautando-se no currículo e bibliografias dos cursos, [sendo] (...) a avaliação e desbastamento enfatizados” (VERGUEIRO, 1993, p. 19).

Os trabalhos de Sepúlveda (2009, 2012) e Borba (2011a, 2011b) tocam aspectos do desenvolvimento de coleções de universidades. Os estudos de Borba (2011a, 2011b, 2011c) apresentam revisão de literatura acerca do desenvolvimento de coleções, apresentando a necessidade de criação de comissão para criação de política de desenvolvimento de coleções, demonstram o uso da estatística de empréstimos para avaliar o uso de coleções (BORBA, 2011a) – aspecto também presente em Sepúlveda (2012) – e apontam a carência de estudos de comunidade (BORBA, 2011b), bem como a importância de se observar as diretrizes do MEC para a criação da coleção, por meio da análise correspondência entre as citações das referências bibliográficas dos currículos e os itens do acervo (BORBA, 2011c; SEPÚLVEDA, 2012).

No processo de gestão das coleções, é importante avaliar o uso do acervo atual, o que ajudaria a estabelecer políticas de seleção, descarte, alocação de recursos. Para o bibliotecário avaliar o uso da coleção, que representaria apenas parcialmente o atendimento das necessidades e desejos dos usuários, algumas técnicas são indicadas, como as técnicas da bibliometria23. Dentre tais técnicas, Mattos e Dias (2009) destacam a análise de citações para avaliação de coleções de uma biblioteca universitária, embora reconheçam possíveis falhas dessa técnica, já que as citações não têm todas o mesmo peso e estão sujeitas a vieses, como aquelas que cumprem somente função fática.

As necessidades não ativadas dos usuários, as necessidades não expressas (que não se traduziram em demanda) e as necessidades expressas (de ordem intencional ou não) demandam ações do bibliotecário respectivamente: “participação da biblioteca no

desenvolvimento de necessidades não ativadas”; “promoção e direcionamento das necessidades expressas” e “satisfação das necessidades expressas” (BETTIOL, 1990, p. 64).

O gerenciamento do acervo das bibliotecas deveria levar em conta não somente a satisfação das necessidades expressas, ou das demandas realizadas, pois somente o estudo das demandas não seria suficiente para a criação de um bom acervo.

Na prática profissional em bibliotecas unversitárias e especializadas observadas por Sepúlveda (2012), não existe processo formal de detecção de necessidades informacionais, as quais são apreendidas por meio dos canais de comunicação, pelo trabalho de referência. “O processo para detectar as necessidades de informação dos usuários foi compreendido

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Segundo Vanti (2002), a palavra bibliometria teria sido cunhada em 1969 por Pritchard e refere-se ao campo do conhecimento da estatística bibliográfica. Algumas leis destacariam no campo da bibliometria, como a Lei de Lotka, a lei de Zipf e a lei de Bradford. Segundo Mattos e Dias (2009), a bibliometria investiga “o uso dos documentos, buscando padrões

pelos entrevistados como as solicitações que usuário faz e que são atendidas ou não”

(SEPÚLVEDA, 2012, p. 97), o que pode trazer implicações no desenvolvimento do acervo, voltando-se para as as demandas expressas dos usuários.

No sentido de estudar as necessidades e demandas de usuários da informação, desenvolveu-se um campo de estudos na área de Biblioteconomia e Ciência da Informação conhecido como campo de estudos de usuários, que será tratado em maior profundidade no capítulo 3, seção 3.1 dessa tese.