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Capítulo 2 – Abordagem teórico-metodológica

2.4 Segunda etapa da coleta de dados

2.4.1 Seleção da segunda escola e da segunda professora

Em busca de outro perfil de escola, o critério utilizado para a seleção foi que a escola integrasse o grupo daquelas com avaliação de baixo nível de desenvolvimento, indicado pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).51 Fizeram parte desse grupo 33 escolas em Belo Horizonte, e a escolha de uma, para essa pesquisa, foi pragmática: selecionamos aquela que se mostrou favorável e receptiva à realização da pesquisa.

Uma vez agendada a visita, apresentei o roteiro da pesquisa, informei sobre possíveis entrevistas, inserções no cotidiano e observações em sala de aula. O relato das observações feitas está registrado no Diário de campo, e as entrevistas foram filmadas e transcritas, tal como aconteceu na primeira etapa da pesquisa com a professora Rosa.

Nessa segunda etapa, a ida ao campo e a coleta de dados não tiveram o objetivo de realizar estudo aprofundado da rotina realizada pela professora. As questões que a orientaram foram específicas: contrastar os dados da primeira coleta, mais objetivamente, a percepção da professora sobre a Coleção e possíveis condicionantes para seu uso, ou não, dentro desse novo contexto.

O primeiro contato com a escola aconteceu em 10 de março de 2009, em encontro previamente agendado por telefone com a supervisora Sheila. Reunimo- nos em sua sala, onde estava também a professora do 1º ano, Fátima, preparando atividades. Ela se interessou pela conversa e juntou-se a nós. Apresentei minha pesquisa e mostrei o termo de consentimento. A supervisora se dispôs a colaborar com a pesquisa e logo foi relatando:

51 <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=180&Itemid=447> O

Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) foi criado em 2007 para medir a qualidade de cada escola e de cada rede de ensino. O indicador é calculado com base no desempenho do estudante em avaliações do Inep e em taxas de aprovação. Assim, para que o Ideb de uma escola ou rede cresça, é preciso que o aluno aprenda, não repita de ano e frequente a sala de aula.

Pesou muito fazer parte das 33 escolas com Ideb baixo. Os professores se culparam. Mas dentro da escola são muitas questões que os professores não conseguem resolver. Por isso, a avaliação pesou muito na formação. Foi um tema muito discutido. Nós anotamos e achamos bacana muitas outras coisas. Mas em grande parte, o encontro (o curso de formação) serviu para os professores desabafarem.

Virou o grupo das 33.

Isso foi muito prejudicial para o grupo e para a formação. Tivemos reuniões interessantes, que ajudou muito. Mas outras muito chatas. O curso foi bacana. Revimos muita coisa. Mas é muito cansativo. O professor não ganha nada, não recebe, não ganha dia. É difícil. Três professoras nossas desistiram (Fragmento de transcrição de Entrevista Filmada, supervisora Sheila).

A professora Fátima também se posicionou:

Ficou muito batendo na tecla de leitura, alfabetização e avaliação. O que precisava ser aprofundado, a prática, não teve tempo para isso.

No curso não deu tempo de ver todos os cadernos (volumes da Coleção). Na parte da manhã, os temas alfabetização e letramento ficaram muito repetitivos. Falavam só nas capacidades sem parar e porque tem que avaliar. A parte de aprofundar no Material não aconteceu (Fragmento de Transcrição de Entrevista Filmada, professora Fátima).

Sheila completa: É, podia ter aprofundado mais em materiais práticos e nos cadernos.

Após conversa com o diretor da escola e autorização cedida, voltei na semana seguinte para conversar com Fátima. Ela me acolheu prontamente e, nesse mesmo dia, ficou combinado que eu a observaria na aplicação de avaliação enviada pela Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte (SMED/BH).

Nesse segundo encontro, estava presente também Teca, a outra professora do 1º ano do 1º ciclo, que deu seu depoimento sobre a Coleção:

Eu já tenho muito tempo de Rede, sou meio viciada. De tempo em tempo vem um tsunami e fala que é diferente ou o que eu faço tem outro nome. Tenho certeza que trabalho todas as capacidades, mas não faço aquele tipo de registro. Ele é detalhista e não temos tempo para fazer esse registro. Tenho alguns questionamentos em relação à divisão entre introduzir, trabalhar e consolidar (conceitos apresentados na Coleção). Tenho

resistência com a palavra consolidar para o 1º ano, mas trabalho quase todas as capacidades.

Acho que mais uma questão de mudança de nomenclatura.

Eu não dou muita importância para trabalhar diferentes textos no início do ciclo. Trabalho bilhete, histórias, receitas, letra de música, convite, poesia. Mas, reportagem, folder, não dou não, não atrai a criança. Textos que têm a ver com a faixa etária da criança. Texto científico não é interessante. Eu introduzo mal e porcamente. Tem coisas que para criança de 6 anos não é necessário.

Tem uma parte do material que monta atividade que é muito interessante. Mas seguir o planejamento do Ceale, a gente vai ficar só escrevendo. Eu e a Fátima não temos tempo nem para planejar!

Fazemos registro das crianças, temos fichas de acompanhamento. Porém, não fico presa na escrita dos objetivos. Por exemplo: uso social da escrita, tem um tanto de sub-objetivo. Mas tenho certeza que trabalho.

O Ceale é para escola de primeiro mundo, e o nosso é um mundo em desenvolvimento. Não temos nem estrutura, nem salário, nem tempo, nem alunos para isso.

Se você pega um objetivo para falar das crianças, não dá tempo nem de falar de todas elas no mesmo dia.

Às vezes, um determinado objetivo sobressai para uma criança e não para outra. Nisso a tabulação ajuda: o que uma criança sabe e a outra não (Fragmento de Transcrição de Entrevista Filmada, professora Teca).

Teca se mostrou interessada, perguntou detalhadamente sobre a pesquisa e disse que eu poderia ver a aplicação da avaliação também em sua sala. Tais avaliações seriam realizadas no mesmo dia, e a minha observação já havia sido agendada com a professora Fátima.

Semanas depois, as aulas foram paralisadas devido à epidemia causada pela Influenza A H1N1 (comumente conhecida como Gripe Suína). Fátima estava grávida, o que significa fazer parte do grupo de risco, e tirou licença antecipada. Com isso, enfoquei minha coleta no trabalho da professora Teca, o que ocorreu principalmente ao longo do segundo semestre de 2009, em encontros previamente agendados.