• Nenhum resultado encontrado

Devido à diferença no processamento de informações, as pessoas com TEA lidam com o meio ambiente de uma maneira única, o que influencia sua experiência espacial e sua interação com o mundo envolvente (KINNAER; BAUMERS; HEYLIGHEN, 2015). As crianças com TEA representam um grupo heterogêneo com certos sintomas em comum, um dos quais a dificuldade na percepção sensorial (AYRES; TICKLE, 1980; WIGGINS et al., 2009), também descrita como Disfunção de Integração Sensorial (ANDRADE, 2012). A integração sensorial é o processo pelo qual o cérebro organiza as informações de modo a dar uma resposta adaptativa adequada, para organizar as sensações do próprio corpo em relação ao ambiente (AYRES; TICKLE, 1980; HOOGSLAG; BOON, 2016; ORNITZ, 1974). As crianças com dificuldade de integração sensorial podem: apresentar hipersensibilidade, hipossensibilidade (ou ambos) para os sentidos auditivo, visual, tátil, olfativo, gustativo, vestibular e proprioceptivo (AYRES; TICKLE, 1980); não ter sensibilidade alguma em relação a algum aspecto do ambiente e ter dificuldade em mudar de um modo sensorial para outro, criando uma sobrecarga sensorial (HEBERT, 2003).

A entrada sensorial, não é processada isoladamente, é cumulativa na medida em que adiciona à sensação que veio antes dela. Essa informação sensorial combinada é processada até ativar o sistema nervoso central. Quando isso acontece, o limiar sensorial do indivíduo é afetado. O limiar de uma pessoa irá modular entre os intervalos médio, baixo e alto, dependendo do nível de excitação no momento, experiências sensoriais e afetivas anteriores e expectativas do indivíduo. A maioria dos indivíduos manterá seu limiar sensorial no intervalo médio da escala. No entanto, algumas crianças podem permanecer nos intervalos extremos da escala (baixa ou alta) que podem indicar disfunção (HEBERT, 2003).

2.6.1 Sistema auditivo

Muitas crianças com TEA têm a sensibilidade alterada aos estímulos sonoros. As diferenças no processamento auditivo são uma das deficiências de processamento sensorial mais comumente relatadas, com toda a gama de respostas atípicas observadas (TOMCHEK; DUNN, 2007). Nas crianças com hiperacusia, hipersensíveis ao som, há um bombardeio sensorial e ruídos cotidianos comuns se tornam angustiantes e podem desencadear ações inadequadas, causar frustração, impedir a aprendizagem e afetar a capacidade de se concentrar.

A hiperacusia pode ser identificada quando as crianças reagem com a cobertura das orelhas, teimosias, ecolalia, perseverança, tremores, aumento do tônus muscular, hiperventilação, dilatação da pupila, auto ferimento sob a forma de golpes nos ouvidos, ou abandonando o local ao serem expostas a televisão, jogos, conversação, chamadas telefônicas, utensílios domésticos (aspirador de pó, máquina de lavar roupas, liquidificador etc.), passeios de carro e mesmo na escola (KANAKRI et al., 2017a; SANCHEZ; PEREIRA, 2019).

Os níveis de som gerais (decibéis de sistemas de som e reverberação acústica dentro de um espaço), bem como o ruído branco (produzido por sons de frequências diferentes que se juntam) podem afetar negativamente as crianças com TEA que têm dificuldades auditivas. Além disso, o ruído branco dos sistemas mecânicos e elétricos pode interferir com a capacidade de uma criança para processar o som adequadamente (KANAKRI et al., 2017b).

2.6.2 Sistema visual

Evitar o contato visual e o uso ineficiente do olhar foram descritos como características sociais precoces do autismo. “Vários autores teorizaram que esses recursos são mecanismos autorregulatórios que compensam as dificuldades de modular a entrada visual” (TOMCHEK; DUNN, 2007). Algumas crianças com TEA têm fortes habilidades visuais e parecem se lembrar das coisas por sua localização no espaço. Isso pode explicar por que elas precisam fazer as coisas da mesma maneira e seguir a mesma programação dia após dia, caso contrário, elas ficam confusas. Como por exemplo,

colocar os livros sempre na mesma ordem e na mesma prateleira ou usar sempre a mesma cor de toalha de banho. Devido a excelentes habilidades visuais, alguns podem se destacar em atividades como desvendar enigmas ou em desenho (BAUMINGER; SHULMAN; AGAM, 2003). Outros inspecionam objetos de uma maneira incomum com sua visão periférica (TOMCHEK; DUNN, 2007), ampliam um objeto principal e o entorno fica desfocado (REEVES, 2012). Crianças com TEA aprendem melhor de modo visual e podem ter sobrecarga sensorial se receberem muita informação auditiva (HEBERT, 2003).

2.6.3 Sistema tátil

O sistema tátil fornece ao indivíduo informações sobre o meio ambiente. Apresenta um componente de proteção tátil que registra mudanças de temperatura, toque leve e contato geral com a pele, e um componente discriminativo tátil que permite diferenciar entre várias texturas e contornos por toque. O componente discriminativo é usado para planejar movimentos, manipular objetos e adaptação ao meio ambiente (HEBERT, 2003).

Tal como acontece com a entrada auditiva, indivíduos com autismo podem relatar serem hipersensíveis aos estímulos táteis, enquanto outros podem relatar ser hipossensíveis aos estímulos táteis. (REEVES, 2012). Por exemplo, algumas crianças não suportam andar com os pés descalços em carpetes, enquanto outras tem alta tolerância a dor e não percebem a areia quente da praia.

O toque tem sido descrito como um sentimento intenso que pode ser avassalador e confuso (TOMCHEK; DUNN, 2007). Crianças com níveis mais altos de hipersensibilidade tátil em um estudo também tinham maior probabilidade de exibir comportamentos inflexíveis, verbalizações repetitivas, estereotipias visuais e atenção focalizada anormal (TOMCHEK; DUNN, 2007). A hipo-responsividade aos estímulos táteis pode expor a criança a risco de se machucar (BARANEK et al., 2006).

2.6.4 Sistema olfativo

A memória mais persistente é a olfativa, processo de cheirar demora mais para chegar ao cérebro, porém quando atinge o cérebro dura mais que os outros estímulos (REEVES, 2012). As pessoas respondem aos cheiros de acordo com as ligações entre aromas e experiências, assim os espaços são seguidamente lembrados pelo o seu cheiro.

Embora os odores fortes possam ser desagradáveis para os indivíduos neurotípicos, muitas crianças com TEA são particularmente sensíveis a uma variedade de odores presentes no ambiente (CHERRY, 2012). Portanto, elas podem não tolerar certas fragrâncias, o cheiro de couro em um estofado ou o cheiro da comida sendo preparada na cozinha (HEBERT, 2003). Da mesma forma, elas podem não perceber certos cheiros que indicam que alguma coisa está errada, como por exemplo, o cheiro de quando pisa no coco do cachorro.

2.6.5 Sistema gustativo

Crianças com TEA podem exibir sistemas gustativos alterados, hipersensíveis ou hipossensíveis. Estas crianças podem ter dificuldade de alimentação ou comer coisas que não são alimentos (terra, grama, tecidos, etc.) (REEVES, 2012). Por exemplo, algumas crianças se alimentam apenas com frango, mas, se tiverem a possibilidade, comem o enchimento das almofadas.

2.6.6 Sistema vestibular

O sistema vestibular, situado no ouvido interno, fornece informações sobre a localização do corpo no espaço, sua velocidade, direção. Assim, o sistema vestibular é responsável pelo equilíbrio e postura das pessoas (REEVES, 2012).

Uma criança com o sistema vestibular subestimado pode apresentar busca sensorial através de movimentos repetitivos das mãos, da cabeça ou do corpo inteiro (REEVES, 2012). O sistema vestibular também regula a coordenação mão-olho, quem tem alteração neste sistema pode apresentar dificuldades de coordenação do corpo ou das mãos (HEBERT, 2003).

A hipersensibilidade vestibular pode dificultar a realização de atividades que incluem movimento (subir ou descer escadas, esportes, dança), bem como dificuldade para parar rapidamente ou durante uma atividade (REEVES, 2012). Tarefas ou atividades que exigem movimentos excessivos de cabeça podem ser limitantes e desconfortáveis (HEBERT, 2003).

2.6.7 Sistema proprioceptivo

O sistema proprioceptivo permite reconhecer a localização espacial do corpo, sua posição e orientação, a força exercida pelos músculos e a posição de cada parte do corpo em relação às demais (BRAND; GHEERAWO; VALFORT, 2010; HEBERT, 2003). Ao lidar com crianças com um baixo sentido proprioceptivo, sua "falta de jeito" deve ser levada em conta. Essas crianças têm dificuldade em estimar as distâncias entre si e os outros e, quando armadas com objetos grandes que podem pegar e balançar, como uma vassoura, podem causar situações indesejáveis (SCHAAF; LANE, 2015).

A propriocepção ajuda a desenvolver a consciência das partes do corpo, como elas se relacionam com o todo e como o corpo se move pelo espaço, afetando diretamente a maneira pela qual as pessoas percebem o ambiente construído (REEVES, 2012). O sistema proprioceptivo é responsável por planejar, organizar, aprender e lembrar dos movimentos. As dificuldades correspondentes apresentam-se como uma falta de expressão geral, mas também podem influenciar as tarefas de autoajuda, como sair da cama quando acorda, se vestir ou permanecer sentado para uma refeição (HEBERT, 2003).