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2. Tutela preventiva

2.5 Sentença na ação preventiva

Destaca Peyrano que as sentenças que julgam as ações preventivas são condenatórias, pois “com fuerza definitiva, imponen un hacer o un no hacer a diferencia de las acciones mere declarativas que se limitan a dissipar una incertidumbre juridica sin forzar el culplimiento de prestación alguna”316.

Ocorre que, sob a nossa ótica, uma tutela jurisdicional caracterizada por ser preventiva ou inibitória (isto é, aquele que coíbe a ameaça ao direito e impede que a lesão anunciada ocorra ou, se já ocorrida, que se repita ou que continue produzindo seus efeitos), específica (ou seja, aquela que proporciona ao titular o próprio bem a que tem direito, como se a violação ou inadimplemento não houvesse ocorrido, sem a sua conversão ou monetização) e satisfativa (isto é, aquela que realiza concretamente o direito material do autor) não se enfeixa, adequadamente, a uma sentença essencial ou predominantemente condenatória, assim conceituada como aquela que “reconhecendo a existência de um direito a uma prestação e o respectivo dever de pagar, autorizava o credor, agora munido de um título, a, se quiser, promover a execução do obrigado”, exigindo-se “dois processos para a obtenção da certificação/efetivação do direito”317.

Nesse contexto, Ovídio Baptista é o primeiro a fornecer elementos para a desqualificação da sentença extraída de uma ação em que se veicula tutela preventiva, específica e satisfativa como condenatória. Diz ele que “o emprego do verbo concederá para referir-se à possibilidade oferecida ao juiz de outorgar a tutela específica da obrigação, na relação processual, supostamente de puro conhecimento (sem atividade executiva), é indício de que não se trata de sentença meramente condenatória”318.

E conclui, após a apresentação de uma série de sólidos argumentos (especialmente os motivos pelos quais não se pode cogitar de uma segunda demanda executiva após a suposta sentença condenatória proferida nesta espécie

316 PEYRANO, Jorge Walter. La acción... p. 71. 317 DIDIER JR., Fredie. Curso... p. 201.

318 BAPTISTA DA SILVA, Ovídio Araújo. Ação para cumprimento das obrigações de fazer e não fazer in Inovações do Código

de ação), que a norma que outorga ao magistrado poderes de efetivação das tutelas específicas elimina qualquer possibilidade de se tratar de uma ação e sentença condenatória. Afirma ele:

Este §5º confirma nossa conclusão de que as ações do art. 461 ou serão executivas, quando se peça o desfazimento de obras, tal como será executiva a ordem de demolição na ação de nunciação de obra nova (...) ou serão mandamentais se o juiz, atendendo ao pedido da parte, ordenar a cessação de atividades nocivas319.

Já Dinamarco assevera que o art. 461 admite todas as espécies de ações para a tutela das obrigações de fazer ou de não fazer, o que inclui aquelas obtidas por meio do processo de conhecimento (constitutivas, declaratórias e condenatórias) e as tutelas executiva e cautelar. Destaca ele que embora o referido dispositivo esteja topologicamente situado no livro do processo de conhecimento e no capítulo da sentença e da coisa julgada, “isso não afasta a influência que terá na tutela executiva relacionada às obrigações de fazer ou de não-fazer”320. Afasta, contudo, a eficácia predominantemente condenatória:

A chamada tutela condenatória não tem, por si só, capacidade de oferecer ao titular de direitos o resultado que ele veio a juízo buscar. Toda condenação só produzirá efeitos se acatada pelo obrigado mediante adimplemento superveniente ou se efetivamente mediante as atividades inerentes ao processo de execução. Em vista disso é que, para a efetivação dos resultados práticos ditados em sentença, os parágrafos do art. 461 dispõem uma série de medidas de apoio a esta, seja para motivar o obrigado (multas), seja para remover coercitivamente a resistência oposta (v. §5º)321.

Destaca Cristina Rapisarda, por seu turno:

La concezione tradizionale della condanna è di ostacolo alla sistemazione concettuale dell’inibitoria entro tale categoria di tutela anzitutto per il fato che l’eseguibilità forzata del provvedimento di tutela ai sensi del terzo libro del c.p.c. implica necessariamente che eso sai intervenuto dopo che la violazione si sai già verificata. In altre parole, la correlazione necessaria tra condanna ed esecuzione forzata è il frutto de una visione repressivistica di tale remédio, che non può non porsi in contrasto com una técnica di tutela, como quella inibitoria, che svolge una funzione preventiva anche nelle ipotesi in cui venga impiegata per impedire (non già la commisione, bensí) la

319 BAPTISTA DA SILVA, Ovídio Araújo. Ação... p. 180.

320 DINAMARCO, Candido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 152. 321 DINAMARCO, Candido Rangel. A reforma... p. 153.

ripetizione o la continuazione di una violazione in parte già comessa322.

Parece claro, então, que a sentença que concede tutela preventiva, específica e satisfativa está muito longe de ser puramente, quanto menos essencialmente, uma sentença condenatória. Daí surge a questão: de que espécie de sentença estamos tratando, afinal?

A superação, ou ao menos relativização, do binômio processo de conhecimento e processo de execução, causada pela necessidade de ampliação do acesso à justiça e de prestação jurisdicional mais adequada, efetiva e tempestiva, abriu caminho para que o acertamento e o cumprimento não mais ocorressem, necessariamente, em momentos e em processos separados. Daí porque se construiu a ideia de que são admissíveis ações e sentenças executivas lato sensu e mandamentais, cujo ponto em comum reside no fato de prescindirem de uma ação de execução autônoma, cuja existência pressupõe um título executivo formado em cognição exauriente e por sentença passada em julgado, para que tenham aptidão de provocar modificações no plano dos fatos.

Na tutela executiva lato sensu “não há a necessidade de um processo ou fase executiva para a implementação da eficácia da sentença”, de modo que “basta que o juízo determine a realização do ato em decisão sem conteúdo decisório, que pode mesmo acontecer ex officio ou ex lege”, ao passo que “na tutela mandamental a decisão prolatada implica a emissão de uma ordem que deve ser cumprida por seu destinatário”323.

É importante dizer, no ponto, que “as decisões proferidas sempre apresentam todas essas eficácias [referindo-se, além da executiva lato sensu e da mandamental, também à declaratória, constitutiva e condenatória]”, que não subsistem isoladamente”324. Ou, como diz Kazuo Watanabe, “deve-se ter em mente, sempre, sua eficácia predominante, e não eficácia exclusiva”325, sublinhando finalmente:

322 RAPISARDA, Cristina. Profili... p. 89.

323 NETO, Olavo de Oliveira; NETO, Elias Marques de Medeiros; OLIVEIRA, Patrícia Elias Cozzolino de. Curso... p. 177. 324 NETO, Olavo de Oliveira; NETO, Elias Marques de Medeiros; OLIVEIRA, Patrícia Elias Cozzolino de. Curso... p. 178. 325 WATANABE, Kazuo. Tutela... p. 27.

Nos artigos 273 e 461, o legislador teve em vista todos os cinco tipos de provimentos acima mencionados. Particularmente no art. 461, para a tutela específica da obrigação de fazer ou não fazer ou para a obtenção do resultado prático correspondente, valeu-se o legislador da técnica da combinação de todos eles para conceber um processo que realmente propiciasse uma tutela efetiva, adequada e tempestiva, como determina o princípio constitucional da proteção judiciária326.

De todo modo, é nossa opinião que a sentença que concede tutela preventiva, específica e satisfativa, a despeito de efetivamente mesclar e combinar todas as espécies de tutelas já anteriormente mencionadas, possui cargas preponderantes de mandamentalidade (diante da possibilidade de emissão de uma ordem ao réu, para que faça ou deixe de fazer algo sob pena de multa e de outras medidas coercitivas inominadas e atípicas que busquem refrear eventual recalcitrância) e de executividade lato sensu (diante do rol exemplificativo de medidas sub-rogatórias que deverá ser utilizado pelo magistrado, quando possível, para a efetivação da tutela sem a dependência de atos a serem praticados pelo réu).