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Tutela preventiva como exigência de adequação do direito material

2. Tutela preventiva

2.2. Elementos para a construção de uma tutela preventiva

2.2.1. Tutela preventiva como exigência de adequação do direito material

Como já afirmamos anteriormente, há não muito tempo pensava-se ser demasiadamente invasivo que o Estado compelisse alguém a cumprir a obrigação por ele assumida em sua forma específica (fazer, não fazer ou dar coisa distinta de dinheiro), de modo que, nessas situações, contentar-se-ia o titular do direito violado com a mera conversão da pretensão obrigacional em perdas e danos.

Contudo, é necessário compreender e contextualizar historicamente o momento em que essa proposição foi construída e defendida, qual seja, logo após a ruptura com o absolutismo então vigente e a adoção de um regime que lhe era diametralmente oposto, o liberalismo, cujas premissas estavam fundamentalmente assentadas no Bill of Rights, de 1688, na Constituição dos Estados Unidos da América, de 1787, e na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, assim como nos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. Assim, se a ideia de intangibilidade e de incoercibilidade da vontade humana não é exatamente um pensamento justo sob a ótica do suum cuique tribuere, é forçoso admitir que se tratava de uma construção justificável para aquele momento histórico – falamos

aqui, novamente, em interpretação do ordenamento em conformidade com a ideologia e os valores vigentes.

Ocorre que mais a frente se percebeu que, em muitos casos e em relação a certas espécies de direitos, a tutela ressarcitória ou sancionatória mostrava-se nitidamente ineficiente, pois não tinha a aptidão de reparar, de forma minimamente adequada, o dano causado pela lesão já consumada.

A esse respeito, destaca José Carlos Barbosa Moreira que nem mesmo aqueles direitos em que se admite, em tese, a reintegração plena, são real e plenamente reparáveis. Diz ele:

Será difícil de atingir a perfeita coincidência entre a realidade e a norma, quando menos pela razão óbvia de que a atividade processual, por mais bem ordenada que seja, nos textos e na prática, sempre consome algum tempo, durante o qual fica o titular privado da utilidade a que fazia jus segundo o direito material. O proprietário pode recuperar a coisa de que outrem se apoderara, o credor pode receber a importância que lhe era devida, mas nem sequer nessas hipóteses será lícito dizer que o processo lhes assegurou, efetivamente, vantagem igual à que gozariam se não ocorresse a lesão190.

Isso fica ainda mais evidente quando se trata das prestações de fazer, de não fazer ou de dar, especialmente àquelas ligadas aos direitos que, por sua natureza ou por opção do direito positivo, são insuscetíveis de conversão ou de adequada e integral reparação em pecúnia.

Nesse sentido, Aldo Frignani, autor de diversos estudos e ensaios relacionados à tutela preventiva de direitos, com destaque, especialmente, para

“L’injunction nella common law e l’inibitoria nel diritto italiano” (Giuffrè, 1974) e para “Azione in cessazione”, publicado no Novissimo Digesto Italiano (UTET, 1979),

analisando o corpo legislativo então vigente na Itália, identificou uma série de direitos de natureza não patrimonial que estão sujeitos a uma tutela jurisdicional diferenciada e essencialmente preventiva, tais como a violação de direitos da

190 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Tutela sancionatória e tutela preventiva in Temas de direito processual, 2ª série. São

personalidade (por exemplo, o uso indevido do nome civil)191, em matéria de propriedade, direitos reais e possessórios, tais como a denúncia de obra nova, a inibição de turbação e a manutenção da posse e da propriedade192, assim como em questões relacionadas ao direito industrial, tais como aquelas que dizem respeito a concorrência desleal193 e as marcas e as invenções194. Ou, como ensina Jorge Walter Peyrano:

Las acciones preventivas tiendam a proteger derechos extrapatrimoniales como son los personalisimos (también conocidos como derechos de las personas, inviolables o esenciales) tales como la protección del nombre, de la imagen, de la intimidad y también de la honra, del cuerpo y de la salud; y a la disposición del cuerpo y circunstancias de las exéquias y a la dación de todo o parte del cuerpo com fines terapêuticos o de investigación. Igualmente, el daño ambiental, el tenor de publicidades ilícitas y llamada dignidade de la persona humana, han sido consideradas áreas aptas para la operatividad de tutelas preventivas195.

Em outras palavras, há que se observar a existência de um vasto rol de novos direitos verdadeiramente insuscetíveis de patrimonialização e, portanto, de tutela adequada e eficiente pela via do ressarcimento ou da simples indenização. Há que se ter, para esses direitos, uma tutela específica que se volte para evitar a lesão e que não se preocupe, essencialmente, com a reparação.

Nesse diapasão, sublinha Cristina Rapisarda:

Orbene, rispetto ai diritto indicati, assume particolare rilievo la possibilità di far ricorso ad uma tutela preventiva di tipo inibitorio. L’utilità del ricorso a tale forma di tutela deriva, soprattutto, dall’inidoneità della tradizionale tutela risarcitoria a garantire l’effetiva attuazione dei nouvi diritti. Come la più recente dottrina ha posto ampiamente in luce, tale inidoneità consegue al carattere non patrimoniale o comunque non monetizzabile dei beni che costituiscono oggetto dei nouvi diritti. La maggione funzionalità della tutela inibitoria rispetto ala tutela risarcitoria dipendi quindi dal fatto che essa, imponendo um divieto di continuazione o di comissione dell’illecito, ha carattere, oltreché preventivo, anche ripristinatorio del diritto in ipotesi violato o minacciato. Il contenuto non patrimoniale dei nouvi diritti determina, infatti, normalmente, l’irreparabilità della loro lesione, onde diviene essenziale privilegiare forme preventive di

191 FRIGNANI, Aldo. Azione in cessazione in Novissimo Digesto Italiano. Vol. I. Turim: UTET, 1979. p. 11. 192 FRIGNANI, Aldo. Azione... p. 12.

193 FRIGNANI, Aldo. Azione... p. 19. 194 FRIGNANI, Aldo. Azione... p. 22.

tutela, che consentano di evitarei l concretarsi dell’evento lesivo. D’altro canto, la non patrimonialità pone in luce anche l’esigenza di forme di tutela ripristinatorie o, più precisamente, reintegratorie, che mirino a garantire l’attuazione <<dell’interesse specifico per cui si invoca la tutela>>, anziché del diverso interesse alla restaurazione patrimoniale del soggesto leso, secondo il principio dell’equivalente monetario196.

Também na mesma senda, alerta Barbosa Moreira que:

A gravidade do problema sobe de ponto quando se pensa nas relações jurídicas de conteúdo não patrimonial, nas situações em que o ordenamento substantivo reconhece ou atribui à pessoa uma vantagem insuscetível de traduzir-se com propriedade em termos pecuniários, ou exclusivamente tais. Basta pensar em certas categorias, longamente negligenciadas em contexto sócio-cultural desfavorável, típico – se quisermos fazer eco à denúncia do filósofo – de uma civilização mais voltada para o ter que para o ser, mas que nos últimos tempos vêm atraindo, com intensidade crescentes, a atenção de juristas inconformados com as lacunas de uma visão puramente economicística do intercâmbio humano197.

Ou ainda, como simplesmente destaca Vittorino Pietrobon, “è un’evoluzione che può dirsi caratteristica dell’inibitoria in tutti i diritti di civil law, segnata dall’accennato mutamento subito dell’azione, che da azione a difesa della proprietà è divenuta un’azione a difesa della persona, da azione reale è trasformata in azione personale”198.

É importante, neste momento, investigar com mais profundidade as razões pelas quais certos direitos merecem (rectius: devem) ser tutelados de maneira específica e, além disso, por qual motivo a tutela preventiva é a mais adequada para salvaguardar uma gama de interesses juridicamente diferenciados e colocados em posição de destaque, seja pela sua natureza, seja por uma escolha consciente do Estado.

O ponto de partida dessa análise deve ser, sob a nossa ótica, a distinção existente entre a lesão ao direito e a ameaça de lesão ao direito, que veio a ser

196 RAPISARDA, Cristina. Profili della tutela civile inibitoria. Padova: Cedam, 1987, p. 109/110. 197 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Tutela sancionatória... p. 24.

consagrada expressamente pela Constituição de 1988, mas de que já se ocupava a doutrina muito antes disso199.

Nesse ponto, registre-se que, em tempos passados, inexistia, em nosso ordenamento jurídico, uma ferramenta processual própria a genericamente tutelar os direitos de forma preventiva, isto é, apta a impedir a lesão ou a reiteração da lesão do direito ameaçado e, com isso, satisfazer a pretensão substancial veiculada pelo titular do direito que se encontrava sob risco.

Havia, é bem verdade, situações jurídicas pontuais, para as quais existia a previsão legal para uma tutela com esse perfil e finalidade, tais como o mandado de segurança preventivo em caso de justo receio de ilegalidade ou de abuso de poder (artigo 1º, caput, da Lei nº 1.533/51) e as ações preventivas específicas insculpidas no Código de Processo de Civil de 1973 (interdito proibitório e nunciação de obra nova).

Observe-se que, na hipótese do interdito proibitório, a tutela preventiva era concedida mediante a simples demonstração do justo receio de que o possuidor fosse molestado, podendo-se, inclusive, cominar uma pena pecuniária para se evitar a ocorrência dessa lesão. Assim, fica claro que não havia preocupação com a existência ou não de dano irreparável ou de difícil reparação que justificasse a medida, mas, sim, fica evidente a preocupação com a existência de um ilícito causador de uma lesão ao direito de natureza possessória.

Na mesma linha de raciocínio, verifica-se que, na nunciação de obra nova, ressalvadas as hipóteses de risco de a edificação nova causar prejuízo ao prédio e de risco de execução de obra de condomínio causar prejuízo à coisa comum, também faria jus a tutela eminentemente preventiva o condômino que pretendesse simplesmente impedir a alteração da coisa comum, independentemente do risco de dano irreparável ou de difícil reparação, bem como o município que buscasse impedir as construções contrárias à lei ou aos regulamentos, sem se cogitar, novamente, de existência de risco de dano irreparável ou de difícil reparação. Trata-

se, pois, de uma tutela voltada contra a ilicitude da conduta, assim compreendida como o ato contrário ao direito.

Dado que tais formas de tutelas eminentemente preventivas eram restritas a hipóteses singulares, os demais conflitos que não envolviam pagamento de quantia certa se sujeitavam a disciplina do artigo 287 do CPC/73, que, em sua versão original, tratava das ações e das sentenças condenatórias e que se mostrava insuficiente para adequada e eficazmente tutelar uma vasta gama de direitos.

Isso porque, segundo leciona Fredie Didier Jr., a ação e a sentença condenatória “seria aquela sentença que, reconhecendo a existência de um direito a uma prestação e o respectivo dever de pagar, autorizava o credor, agora munido de um título, a, se quiser, promover a execução do obrigado. Havia a necessidade de dois processos para a obtenção da certificação/efetivação do direito”200.

Ocorre que a ação e a sentença condenatória do artigo 287 do CPC/73 tinham, em sua redação original, um escopo de atuação muito restrito e particular, na medida em que só tinham cabimento nas obrigações de fazer fungíveis e de não fazer, não se prestando a satisfazer obrigações de fazer infungíveis e de dar coisa201.

Note-se que o uso de uma ação condenatória para as questões relacionadas as obrigações de fazer, de não fazer ou de dar não era uma exclusividade do sistema processual civil brasileiro, mas, sim, refletia aquele momento histórico no cenário jurídico processual. Conforme ensina Chiovenda, tratando do direito processual italiano:

Del mismo modo que es muy vario el concepto de prestación, tanto puede serlo el contenido de una condena. Se puede ser condenado a todo lo que se puede estar obligado como prestación (ya sea dar, hacer, una abstención, la destrucción de cuanto fué hecho en contravención a la obligación de no hacer). Se puede ser condenado a una prestación no fungible, porque la manera de suplir a la

200 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. Vol. 1. 11ª edição. Bahia: Jus Podivm, 2009. p. 201.

201 Súmula 500 do Supremo Tribunal Federal: “Não cabe a ação cominatória para compelir-se o réu a cumprir obrigação de

dar”. Embora a súmula tenha sido publicada no DJ de 10.12.1969, na vigência do Código de Processo Civil de 1939, a ação condenatória vigente naquele Codex, prevista no artigo 302, inciso XII, possuía redação similar ao artigo 287 do Código de 1973.

imposibilidad de ejecución directa no es necesario se encuentre ya en la sentencia, aunque por regla general así suceda202.

Demais disso, a ação cominatória, tal qual prevista na versão original do CPC/73, limitava a aplicação da astreinte apenas ao descumprimento da sentença e mediante pedido do autor, não se aplicando à medidas de natureza antecipatória (que, genericamente, apenas passaram a existir com a reforma de 1994), nem tampouco possibilitando imposição da astreinte de ofício, cuja aplicação necessitava obrigatoriamente de requerimento na petição inicial da ação executiva203. Não se cogitava, evidentemente, da possibilidade de uso de outras medidas de apoio que não a acima referida multa e, se não bastasse isso, apenas seria possível a execução do julgado de mérito mediante a propositura de uma ação executiva para que, enfim, se pudesse efetivar o direito reconhecido e certificado na sentença condenatória204.

Diante da insuficiência do artigo 287 do CPC/73 para tutelar adequadamente um infindável número de situações e de realidades, especialmente aquelas vinculadas a necessidade de concessão de provimentos jurisdicionais de urgência, passou-se a utilizar, no cotidiano forense, de medidas cautelares inominadas, sobretudo requeridas e concedidas com base no poder geral de cautela previsto nos artigos 798 e 799 do referido código, para satisfazer pretensões de direito material e não meramente para acautelar, criando-se, então, a categoria das chamadas “medidas cautelares satisfativas”.

A esse respeito, vale a pena destacar o vastíssimo rol de medidas cautelares inominadas de índole satisfativa e passíveis de concessão com base no poder geral de cautela que foi apresentado por Galeno Lacerda, gizando-se apenas algumas

202 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituciones... p. 212.

203 Recurso Extraordinário nº 94.966/RJ, 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, Relator Ministro Moreira Alves, publicado no

DJ de 26.03.1982, disponível na Internet em <www.stf.jus.br>, arquivo capturado em 15.03.2012. Confira-se o seguinte trecho: “Com efeito, com a introdução no direito processual civil brasileiro (artigos 287, 644 e 645) das astreintes, a pena pecuniária que a esse título se comina não tem o caráter de indenização pelo inadimplemento de obrigação de fazer, mas, sim, o de meio coativo de cumprimento da sentença, como resulta expresso na parte final do artigo 287 do C.P.C: “...constará da petição inicial a cominação da pena pecuniária para o caso de descumprimento (arts. 644 e 645). Consequentemente, não pode a pena retroagir a data anterior ao do trânsito em julgado da sentença que a cominou”.

204 Recurso Especial nº 123.645/BA, 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira,

publicado no DJ de 18.12.1998, disponível na Internet em <www.stj.jus.br>, arquivo capturado em 15.03.2012. Consta do julgado o seguinte fundamento: “A multa diária somente pode ser cobrada a partir do descumprimento da sentença, o qual, por sua vez, requer instauração do processo de execução e sua regular formação, com a citação, impedindo entender-se que a condenação “a partir da citação” seja a citação do processo de conhecimento”.

situações específicas merecedoras de maior atenção para o tema objeto desta pesquisa.

Ao tratar do tema “poluição”, ensina o ilustre processualista:

Quando a ação administrativa exigir intervenções que ultrapassem os limites legais de iniciativa direta do poder de polícia, cabe ao ente público requerer ao Judiciário a cautela necessária, em função da demanda principal cabível. Entram aqui, por exemplo, as medidas contra a poluição, quando excederem a atuação direta defensiva, como a cominatória para obrigar mudança de fábrica instalada em zona residencial (RT 347/156) ou para impedir despejo de águas servidas por fábrica na via pública (RT 282/616) ou em outras situações análogas205.

Noutro giro, ao tratar do risco aos direitos da personalidade, diz Galeno Lacerda:

A atuação de poder cautelar geral, tanto do juiz penal quando do civil, apresenta-se particularmente fecunda, enérgica, pronta e eficaz, contra as lesões ou ameaças a tais direitos. Nesta matéria admitem- se, aqui, mandados liminares e decisões comissivas ou omissivas, consistentes na imposição provisória de um fazer ou de um não- fazer, em ação cautelar inominada, com base em demanda principal pertinente206.

Mais adiante, apreciando a questão sob a ótica dos direitos autorais, afirma o ilustre processualista que “onde não couber busca e apreensão, pode cogitar-se de cautela atípica, comissiva ou omissiva, quando urgente o fazer ou o não-fazer, para evitar-se o dano ou a sua agravação, por exemplo: para impedir plágio ou contrafação de obra arquitetônica, ou de escultura, ou de quadro, além das várias situações legais previstas...”207.

De igual modo, tratando da propriedade industrial e da concorrência desleal, ensina ele que são “passíveis de cautela inominada em tese: contra violador de patente de invenção, para obstá-lo desde logo à prática do ilícito (RT 277/341); contra o uso de invenção por terceiro, antes de declarada oficialmente a caducidade

205 LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil. Vol. VIII, Tomo I. 3ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 1987.

p. 195.

206 LACERDA, Galeno. Comentários... p. 201. 207 LACERDA, Galeno. Comentários... p. 223.

da patente (RT 354/251); contra o plágio ou contrafação de marca de indústria e comércio (RT 281/768, 354/198, 356/134, 358/320, 393/155) (...); para impedir uso indébito de nome ou de marca comercial ou industrial (RT 302/319, 303/688, 347/210, 372/162, 381/116, 494/46)”208, bem como “além destes casos, aplicáveis entre nós, como segurança preventiva de cominatória adequada, cabem todas as medidas possíveis contra a espionagem industrial, tão comum hoje em dia nas grandes empresas”209.

Exatamente no mesmo sentido, ressalta Álvaro Pérez Ragone:

Las nuevas necesidades y realidades indujeron al uso de la acción cautelar innominada como técnica de sumarización del proceso de conocimiento (pretendiendo de ella una alternativa procedimental flexible). Es evidente que se escogió la vía pensada para el resguardo de un resultado eventualmente útil del proceso principal para suplir la extralimitante necesidad preventiva. Ahora, esta técnica procesal no se condice ni con el derecho material “amenazado”, ni con la función propia de la tutela cautelar210.

Não há a mínima dúvida de que o uso das medidas cautelares inominadas para a segurança ou a satisfação de direitos sob risco de dano irreparável ou de difícil reparação é fruto de uma brilhante construção doutrinária e jurisprudencial que, naquele momento histórico, não dispunha de instrumentos eficazes para a tutela adequada de uma vasta gama de direitos. Trata-se, sem dúvida, de uma contribuição essencial a compreensão do atual sistema de tutela de direitos e que fora indispensável a construção do que atualmente concebemos como “exigência constitucional de uma tutela jurisdicional adequada, efetiva e tempestiva”.

Contudo, o uso da medida cautelar inominada de natureza satisfativa como meio de evitar os danos, as lesões ou as ameaças a direitos, desviando-se, assim, de seu leito originário e das finalidades para as quais fora concebida, além de ser imprópria para a tutela adequada desses direitos, provocou alguns problemas, de ordem ontológica, dogmática e prática, que somente vieram a ser resolvidos (ou, ao

208 LACERDA, Galeno. Comentários... p. 250. 209 LACERDA, Galeno. Comentários... p. 251.

210 RAGONE, Álvaro Perez. La tutela civil inhibitoria como técnica procesal civil de aplicación de los principios de prevención y

precaución in Revista de Derecho de la Pontificia Universidad Católica de Valparaíso. Tomo I, Vol. XXVIII. Valparaíso, 1º Semestre de 2007. p. 216.

menos, minimizados) mediante profunda evolução nos planos legislativo, doutrinário e jurisprudencial, conforme melhor se verá ao longo deste trabalho.

2.2.1.1 A distinção entre o ilícito e o dano e a criação de

mecanismos aptos a tutelar os novos direitos

O primeiro ponto que, sob a nossa ótica, determinou uma correção de rumos entre o uso da tutela cautelar para situações de ameaça, risco ou de perigo e para a criação no sistema de uma tutela satisfativa de natureza preventiva diz respeito a distinção entre o ato ilícito, assim concebido como o ato contrário ao direito que não contém o dano, o dolo ou a culpa como pressupostos e que se sujeita a tutela de prevenção, e o fato danoso, suscetível de responsabilização quando há dolo ou culpa e passível de recomposição por uma intermédio de tutela tipicamente