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Mapa 27 Presença Presbiteriana no Estado do Acre

2. ORIGENS HISTÓRICAS DO PRESBITERIANISMO BRASILEIRO

2.5 Simonton

O momento era muito favorável e influenciou de maneira significativa as igrejas, levando, em especial os presbiterianos, a se interessarem por missões estrangeiras e vários missionários foram enviados para diferentes partes do mundo, inclusive para o Brasil. E, sendo assim, no dia 12 de agosto de 1859, chegou a nossa pátria o Rev. Ashbel Green Simonton missionário presbiteriano e plantador da Igreja Presbiteriana do Brasil.

Entretanto, antes de tudo, é necessário conhecer um pouco mais deste personagem e quais foram as suas motivações. Matos descreve de maneira sucinta, porém, suficiente para o nosso trabalho, as origens de Simonton:

Ashbel Green Simonton, o missionário fundador da Igreja Presbiteriana do Brasil, era membro de uma das inúmeras famílias de origem escocesa-irlandesa que viviam no Estado da Pensilvânia. Simonton nasceu em 20 de janeiro de 1833 na localidade de West Hanover, no sul daquele estado. Era o filho mais novo do Dr. William Simonton, um médico que também abraçou a carreira política, tendo sido eleito duas vezes para o Congresso dos Estados Unidos. A mãe de Simonton, Martha Davis Snodgrass, era filha do Rev. James Snodgrass, que durante 58 anos foi pastor da Igreja Presbiteriana local. Após a morte do seu pai e do avô materno em 1846, Simonton, então com treze anos, e sua família mudaram-se para a cidade de Harrisburg, no mesmo estado, onde ele concluiu os estudos secundários. Desde cedo Simonton recebeu as melhores influências morais, intelectuais e espirituais da fé presbiteriana em que foi criado82.

Simonton foi formado, sendo trabalhado desde a sua infância, com

82 MATOS, Alderi Souza. História Da Igreja: Simonton E As Bases Do Presbiterianismo No Brasil. Disponível em: < http://cpaj.mackenzie.br/historiadaigreja/pagina.php?id=88>. Acesso em: 15 maio abril 2017.

uma consciência muito convicta da importância do caráter cristão. O próprio Simonton testemunha acerca disso quando, em seu registro semanário, datado de 13 de agosto de 1855, ele escreve citando o escritor John Foster:

[...] o que se deve registrar em um diário particular não são incidentes, mas sim a história do desenvolvimento do caráter, bem como as causas, influencias e acidentes que acompanham cada passo desse desenvolvimento e determinam seu rumo e resultados [...].83

O que se conhece sobre o caráter e o trabalho que Simonton, já no Brasil, desempenhou é algo marcante e extremamente positivo, entretanto, isto se deu como resultado de um progresso pessoal pautado por uma atividade responsável de crescimento e amadurecimento intelectual e espiritual. Tratando sobre este assunto, César relata que: “Ninguém aperfeiçoa o caráter de uma hora para outra. Trata-se de um processo contínuo, com mudanças menores e

maiores, formando uma corrente de experiências sucessivas que vão moldando a vida”8479

Neste processo, Simonton se deparou em diversos momentos com inquietudes que diziam respeito à escolha de sua carreira profissional ou vocacional, questões de foro íntimo ou sentimentais, questões políticas de seu país e, até mesmo, quanto ao seu fervor religioso. Matos descreve este período da seguinte maneira:

Ao concluir os seus estudos em Princeton, em 1852, Simonton, então com dezenove anos, empreendeu uma longa viagem pelo sul dos Estados Unidos em busca de experiência na área do ensino. Por um ano e meio dirigiu uma academia para meninos em Starkville, no Mississipi. A detalhada descrição dessa viagem forma a parte inicial do seu interessante Diário, em que ele registra observações perspicazes sobre uma grande variedade de assuntos, desde suas próprias lutas interiores nas áreas vocacional e sentimental até suas reflexões sobre temas candentes da época, como a escravidão, os problemas políticos e as tensões entre o

83 SIMONTON, Ashbel Green. Ashbel Green Siminton Diário 1852 – 1867. Tradução de D. R. De Moraes Barros. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1982. p. 102.

84 CÉSAR, Elben M. Lenz. Mochila nas Costas e Diário na Mão: A Fascinante História de Ashbel Green Simonton. Viçosa: Ultimato. 2009. p. 26,27.

norte e o sul do país [...] Voltando a Harrisburg em meados de 1854, Simonton debateu-se mais uma vez com o problema da escolha de uma carreira. Deixando de lado o interesse pelo magistério, optou pelo estudo do Direito, embora reconhecendo certas dificuldades éticas quanto ao exercício da advocacia. Uma das principais considerações que tinha em mente era que, qualquer que fosse a vocação a seguir, ele devia exercê-la com um forte senso de responsabilidade social85.

Entretanto, o seu retorno a Harrisburg caracterizou-se como um divisor de águas em sua vida. Embora, inicialmente, ele expresse o seu incomodo quanto as definições quanto aos seus propósitos de vida, conforme expressa em seu diário na data de 20 de janeiro de 1855: “[...] a verdade é que chego aos vinte e dois anos, e ainda não fixei o objetivo de minha existência”.86

Uma das coisas que, talvez, estivesse mal resolvida na vida de Simonton era a questão de seu compromisso formal com a igreja visível. Conforme relata César:

Mesmo tendo sido batizado e consagrado a Deus na infânc ia, e mesmo em meio a todo esse ambiente religioso, em casa, na igreja, na Academia e em Princeton, Simonton não fazia o que todos esperavam dele: deixar de ser membro não-comungante para ser membro comungante por livre escolha e pública profissão de fé87.

Contudo, o divisor de águas na vida de Simonton no seu retorno a Harrisburg, começa poucos meses depois desta sincera declaração, pois, no domingo à tarde do dia 6 de maio de 1855, ele escreve em seu diário:

Hoje com mais de vinte e duas pessoas, fiz pública aliança com Deus, para ser Seu no tempo e na Eternidade; essa aliança jamais será quebrada. Cheguei a este ponto através de muitas dúvidas e desalentos mas agora a maioria desapareceu. Penso que começo a ver e sentir que é meu grande privilégio sentar à Sua mesa, em memória de seu grande amor com o qual Ele amou até mim88.

85 MATOS, Alderi Souza, op. cit.

86 SIMONTON, Ashbel Green, op. cit., p. 87. 87 Ibid. p. 17.

Deixando registrado também, o conteúdo de seus votos solenes:

Deliberei no temor a Deus cumprir todos os deveres expressos em Sua Santa Palavra, e estudar essa Palavra em oração sincera para que seja guiado ao bom entendimento dela. Renunciei a qualquer outra esperança da salvação e declarei minha confiança na livre Graça de Deus revelada no Evangelho de Jesus Cristo; minha obrigação para com Ele por todas as aspirações vindas Dele e minha dependência Dele em cada novo passo da vida consagrada. Assumi os votos feitos por meus pais em minha infância “para ser do Senhor”, e fazer do Seu serviço o supremo objetivo da vida. Para que todo caminho que eu tomar seja marcado por Sua Palavra e Sua Providencia, jamais me deixarei afastar do caminho que Ele indicou; especialmente se Sua Vontade clara me indicar o ministério, para lá irei com alegria e zelo. E para descobrir Sua Vontade orarei e esperarei por Ele com coração sincero. Mas se por Sua providência essa estrada estiver fechada, aceitarei e lembrarei que em qualquer posição na vida Sua glória deve ser objetivo supremo “pois fomos comprados por preço: o precioso sangue de Jesus89.

Estas palavras já nos revelam a sua inclinação para o ministério pastoral, ainda que, possivelmente, esta ainda não fosse a sua decisão naquele momento. Entretanto, em algumas semanas subsequentes, mais precisamente em junho de 1855, Simonton decidiu ingressar no Seminário de Princeton. Matos comenta que: “Esse seminário havia sido fundado em 1812, nos moldes das melhores tradições calvinistas, a fim de dar uma sólida preparação intelectual e teológica aos futuros ministros presbiterianos”.90

Simonton inicia mais esta etapa de sua vida com dedicação e grandes expectativas. O seu objetivo é se preparar da melhor maneira para servir com excelência e da maneira como Deus o quiser usar. Inicialmente, o seu objetivo não era necessariamente ir para um campo missionário, entretanto, o seu coração estava disposto a fazer o que o Senhor o direcionasse e, no dia 14 de outubro de 1855, através de um sermão do Dr. Hodge91, os seus olhos foram abertos e o

89 SIMONTON, Ashbel Green, op. cit., p. 97, 98. 90 MATOS, Alderi Souza, op. cit.

91 Dr. Charles Hodge (1797-1878), eminente teólogo e professor do seminário e que viria a se tornar o mais notável teólogo do século 19.

seu coração despertado para esta possibilidade.

Ouvi hoje um sermão muito interessante do Dr. Hodge sobre os deveres da igreja na educação. Falou da necessidade absoluta de instruir os pagãos antes de poder esperar qualquer sucesso na propagação do Evangelho e mostrou que qualquer esperança de conversões baseada em obra extraordinária do Espírito Santo comunicando a verdade diretamente não é bíblica. Esse sermão teve o efeito de levar-me a pensar seriamente no trabalho missionário no estrangeiro. [...] que os pagãos devem ser convertidos a deus está claramente revelado nas Escrituras, e estou convencido de que o dia deles se aproxima rapidamente/. [...] Eu nunca havia considerado seriamente a alternativa de trabalhar no estrangeiro; sempre parti do princípio de que minha esfera de trabalho seria em nossa país, tão vasto, e que cresce tanto. Pois estou agora convencido de que devo

considerar a possibilidade seriamente; e se há tantos que preferem ficar, não será meu dever partir?92

Doravante, a sua busca por conhecer mais sobre a obra missionaria estrangeira se intensifica, porém, sempre com cautela quanto a qualquer decisão. O seu compromisso com Deus e a maneira tão séria como ele tratava a obra missionária não lhe permitia cogitar uma decisão equivocada, por isso, todo o seu zelo em conhecer mais e orar sempre para que Deus o dirigisse os passos:

Acabo de voltar de uma reunião de oração missionária semanal de interessados em missões estrangeiras, que querem saber seus deveres com elas. Ja fui duas vezes e achei as reuniões tão agradáveis e úteis que irei sempre no futuro. Quanto a tomar agora minha decisão para o futuro, não acredito que seja aconselhável. Posso apenas me colocar nas mãos do Senhor, desejando fazer consagração total de mim mesmo a Seu serviço, e confiar que Ele no tempo certo guiará meus passos93.

Aproximadamente dois anos depois, já próximo de concluir o seu curso, as dúvidas em seu coração quanto a decisão que deveria tomar sobre os

92 SIMONTON, Ashbel Green, op. cit., p. 106, 107. 93 Ibid. 107.

rumos de seu ministério, estão dirimidas possibilitando uma decisão segura e madura. Ele escreve em seu diário, no dia 10 de outubro de 1857 a seguinte reflexão:

Por mais de um ano tenho resolvido na mente a possibilidade de vir a ser missionário. Quando a ideia surgiu, resolvi pensar seriamente, orar, e adiar a decisão até perto do fim do curso. [...] O Dr. Wilson (das missões Estrangeiras) esteve em meu quarto hoje, e falamos sobre as missões; dei-lhe fortes razões para crer que eu formalmente me ofereceria para trabalhar com a junta. Meus sentimentos a respeito desse trabalho já são menos inquietos agora do que quando a decisão estava longe. No que depende de mim, estou pronto para partir; e sinto, mais que nunca, ser este o caminho de meu dever94.

A sua decisão, embora tenha sido difícil, foi confirmada em seu coração e apoiada por pessoas em quem ele confiava e que o acompanhava em meio a orações. Em seu diário, na data de 19 de outubro de 1887, Simonton transcreve uma carta carregada de emoções que recebeu de sua mãe:

É difícil separar-se daqueles que talvez não vejamos mais na terra. Mas quando penso no valor das almas imortais que se estão perdendo pela falta do evangelho puro – o conhecimento do Salvador Bendito – considero ter alguém que queira sacrificar tanto e devotar-se todo ao serviço do Mestre. Recomento você com orações e lágrimas ao Senhor que tudo faz para o bem95.

Tendo, em seu coração, a confirmação de seu chamado para missões estrangeiras, o desafio agora era saber pra onde deveria prosseguir. Parece-nos que a América do Sul era alvo de suas pretensões e, inicialmente, cogitou a Bolívia como seu país destino, entretanto, por razões que não foram anunciadas, porém, é possível que tenha sido motivado pelos livros de Daniel Parish Kidder

(Reminiscências de Viagens e Permanência no Brasil) e James Cooley Fletcher (O

94 SIMONTON, Ashbel Green, op. cit., p 123. 95 Ibid. p. 123.

Brasil e os Brasileiros), Simonton apresentou o Brasil como sua opção para dedicação missionária. Matos relata este fato da seguinte maneira: “Inicialmente, Simonton parece ter considerado a Bolívia como provável campo de trabalho. Todavia, em novembro de 1858, ao candidatar-se formalmente para a obra

missionária no exterior, citou o Brasil como o campo de sua preferência”.96

No dia 27 de novembro de 1858, Simonton relata em seu diário a sua decisão em vir para o Brasil:

Finalmente o passo decisivo foi dado. No dia 25 mandei minha proposta formal à Junta de Missões Estrangeiras. Mencionei o Brasil como o campo no qual estaria mais interessado, mas deixei à Junta a decisão final. Irei só. Assim, a incerteza que vem me oprimindo há um ano finalmente terminou. A mão da Providência pode ser evidentemente vista nisto. A Ti, ó Deus, confio meus caminhos na certeza de que o Senhor dirigirá meus passos retamente97.

Portanto, em 14 de abril de 1859, Simonton foi ordenado ao ministério pastoral pela Igreja Presbiteriana e iniciou os preparativos para a sua viagem rumo ao Brasil, embarcando rumo ao seu novo lar no dia 18 de junho deste referido ano. Aproximando-se do seu destino final, à poucas milhas de seu desembarque no porto do Rio de Janeiro, Simonton transparece a sua ansiedade e vislumbre quanto ao novo lar:

Quinta-feira,11 de agosto, 9 da noite. Sem vento, e à entrada do porto do Rio. Os montes famosos, Pão de Açúcar e Corcovado, estão bem visíveis diante de nós, iluminados pela luz da lua cheia a dez ou doze milhas; o pesado som das ondas batendo nas pedras da praia enche o silêncio da noite; subi a uma verga, justamente quando o sol se punha a trás do Corcovado, e fiquei quase uma hora vendo o dia morrer. Sentiria dificuldade em descrever a emoção que tomou conta de mim ao ver aqueles picos dos quais tinha ouvido falar tanto e lido também, que diziam que eu havia terminado a viagem e chegado ao novo lar e campo de trabalho. Eram emoções em conflito, e não seria possível descreve-las com fidelidade. Os sentimentos predominantes eram o contentamento pelo fim da longa viagem temor pela grande responsabilidade e

96 MATOS, Alderi Souza, op. cit.

pelas dificuldades do trabalho que esperava por mim. Minhas razões de alegria são fáceis de entender; mas a incerteza do futuro pesa solene e temivelmente, a ponto de moderar as expressões de contentamento.”

Enfim, no dia 12 de agosto de 1859, o navio aportou no Rio de Janeiro e Simonton pisa em terras brasileiras para desenvolver o seu ministério. O Brasil tem o seu primeiro contato com a missão presbiteriana da igreja Americana e Simonton demonstra as suas expectativas quanto à obra missionaria neste novo e vasto campo, expressando-as da seguinte maneira: “Rio de Janeiro, 31 de agosto de 1859. Sinto-me encorajado pelo aspecto das coisas e esperançoso com o futuro.

Existem indicações de que um caminho está sendo aberto aqui para o Evangelho”.98

Embora, no começo tenha sido difícil, principalmente por causa de sua falta de fluência na língua portuguesa, o trabalho foi avançando e alcançando os objetivos que iam sendo estabelecidos, de sorte que, outros missionários se sentiram motivados a vir para o Brasil unir forças com Simonton, intensificando o avanço da obra missionária presbiteriana em solo brasileiro. E assim, se inicia o trabalho presbiteriano no Brasil.