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5 SISTEMA NACIONAL DE AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR

5.3 SINAES-ENADE: futuro pretérito da avaliação formativa

Com a definição da nova orientação da avaliação, o processo de aperfeiçoamento do ENADE continua com a substituição do exame por amostragem pelo exame realizado com todos os concluintes e ingressantes a partir de 2009 para atender a demandas de IES particulares. Já no Governo Dilma Roussef, em 2011, a mudança seguinte na operacionalização do ENADE exclui os ingressantes da realização do ENADE, embora devessem ainda ser inscritos no certame. Essa mudança poderá eliminar a possibilidade de estabelecer o valor agregado do curso na formação do estudante, embora o MEC afirme que

esse valor poderá ser calculado com base nas informações contidas no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) (MOLCK, 2013).

Também em 2011, foram criadas duas secretarias para lidar com os processos de avaliação, regulação e supervisão da ES: Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior, para cuidar do cumprimento da legislação da ES, de sua supervisão e regulação nas modalidades de ensino presencial e EaD; e a Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino, para articular os diferentes sistemas de ensino e estabelecer cooperação entre os demais entes federados no desenvolvimento das políticas educacionais (MOLCK, 2013).

Esse rearranjo institucional parece vir no bojo de mudanças na própria ideia do papel da gestão do Estado, que, no segundo governo Lula e ganhando contornos mais definidos no Governo Dilma, retoma concepções do Governo FHC, notadamente de seu ministro Luís Carlos Bresser Pereira, então à frente do Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE). Dessa perspectiva, a gestão pública é reorientada por uma lógica eficientista, produtivista e focada em resultados mensuráveis. Assim, segundo Molck (2013), a partir do elencamento de diretrizes gerenciais no documento Carta de Brasília24, elaborado pelo Ministério do Planejamento em parceria com o Conselho Nacional de Secretários de Estado da Administração (CONSAD) em 2008, o Estado brasileiro deveria adequar sua organização institucional, procedimentos operacionais e processos gerenciais para alcançar a eficácia de organizações privadas com o intuito de melhorar os resultados e serviços prestados ao cidadão. Assim, a simplificação de processos do SINAES, que é tragado pelo ENADE, parece visar à conformação do papel de avaliador do Estado brasileiro a essas novas diretrizes.

E, se levarmos em consideração as proposições para o novo Plano Nacional de Educação 2011-202025 (PNE) quanto à extensão do ENADE para mais cursos e alunos, ao aprofundamento do SINAES quanto aos aspectos atinentes à melhoria da qualidade da ES e a

24 A Carta de Brasília sobre Gestão Pública, documento elaborado e firmado entre o Ministério do

Planejamento, Orçamento e Gestão e o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Administração em 2008, elencou um conjunto de tópicos considerados elementos estruturantes para a modernização e aperfeiçoamento do funcionamento da Administração Pública. Esses tópicos abordam a gestão de pessoas com enfoque na profissionalização e capacitação dos servidores públicos, os modelos de gestão, os instrumentos do ciclo de gestão, os mecanismos de coordenação e integração das ações governamentais, o uso das tecnologias da informação, as revisões na legislação, a prevenção e combate à corrupção e a realização de estudos e pesquisas para subsidiar as políticas e diretrizes para a modernização do Estado e da gestão pública.

25 Segundo o MEC, “o projeto de lei que cria o Plano Nacional de Educação (PNE) para vigorar de 2011 a 2020

foi enviado pelo governo federal ao Congresso Nacional em 15 de dezembro de 2010. O novo PNE apresenta dez diretrizes objetivas e 20 metas, seguidas das estratégias específicas de concretização. O texto prevê formas de a sociedade monitorar e cobrar cada uma das conquistas previstas” (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, s/p).

proposição de criação do Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior26 (INSAES), podemos prever a continuação do processo de simplificação da avaliação da ES a partir da concepção gerencialista de controle e supervisão sobre a educação com foco no atendimento às demandas do “mercado educacional”. Por esse caminho tomado pelo SINAES, resumindo-se ao ENADE, temos, portanto, que

A qualidade é, então, conformidade a padrões previamente estabelecidos por especialistas e pelos membros de órgãos que definem os critérios e padrões através dos quais são controlados os setores acadêmicos e efetuadas as medidas. Como tendência geral, se observa que, quando a avaliação e o conceito de qualidade estão determinados pelos especialistas externos e as autoridades governamentais, em geral, se limitam a controlar, medir, certificar e regular, em detrimento dos processos participativos e formativos de reflexão e debates da comunidade acadêmica e científica, com prejuízo, portanto, ao exercício da autonomia universitária (DIAS SOBRINHO, 2008b, p. 818).

Desse ponto de vista, a educação superior, então aparentemente reduzida à ideia de bem, sob a ótica governamental, com certificação de qualidade pelo Estado, seria conformada ao atendimento de necessidades de clientes consumidores, que, pelo privilegiamento atual, é o alunado. Assim, seu potencial para construir as imagens dos cursos e das IES, embora delimitado à realização de apenas uma única prova, tem condições para influenciar o desempenho destes em todo o processo avaliativo e regulatório e, por conseguinte, na construção dos rankings entre os cursos e as instituições.

Nesse sentido, o papel da avaliação se desvincula da preocupação, pelos gestores acadêmicos, com o diagnóstico, o debate nos cursos e na instituição sobre o desenvolvimento e aperfeiçoamento institucional para focar-se no “esclarecimento” dos discentes quanto ao correto preenchimento dos questionários do ENADE e da realização “compromissada”, pelos estudantes, do exame para a melhoria dos indicadores externos da instituição. Dessa forma, a preocupação com os indicadores externos atribuiria nova conformação ao ENADE nas instituições e todo o processo avaliativo proposto pelo SINAES é reinterpretado para essa nova conformação. Com isso, os demais instrumentos avaliativos perdem validade ou são enfraquecidos e se tornam apêndice da análise dos resultados do ENADE, que se tornou efetivamente a própria avaliação institucional, como veremos a seguir.

26 O INSAES, conforme o projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados, será responsável pelas

atividades de avaliação e supervisão das instituições de educação superior e dos cursos de graduação no sistema federal de ensino e também pela certificação das entidades beneficentes que atuem na área de educação superior e básica. Esse instituto substituirá o INEP nos processos de avaliação in loco das IES, federais e privadas, e de seus cursos de graduação. O ENADE continuará sob a responsabilidade do INEP e a pós-graduação stricto sensu continuará sendo avaliada pela CAPES.