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Sobre a evolução do gerenciamento do risco

CAPÍTULO 4 – VERIFICAÇÃO DA POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DA TEORIA DO CAOS NA ANÁLISE DA APLICAÇÃO DOS

4.1. SOBRE O CAOS

4.1.4. Sobre a evolução do gerenciamento do risco

No capítulo sobre o custeio da Seguridade Social, afirmou-se que o Plano de Custeio deve ser construído observando as exigências da Regra da Contrapartida e do equilíbrio econômico-financeiro, com base na experiência dos riscos transformados em sinistros, detectados no dia-a-dia da sociedade.

O fator risco é elemento fundamental para a compreensão da realidade da Seguridade.

Não cabe aqui fazer um relato histórico pormenorizado da evolução do gerenciamento do risco. Basta recordar que a humanidade iniciou sua jornada observando os fatos como um “capricho dos deuses”, e não pensava em controlar o futuro, agindo de forma

mais passiva ante a realidade. Com o passar dos séculos, os jogos de azar, que fascinaram o ser humano em todas as épocas, começaram a receber uma grande atenção de estudiosos, quanto às probabilidades de ocorrência deste ou daquele resultado, e por quais razões essas probabilidades eram definidas. A noção de sorte foi lentamente dando lugar ao desejo de

previsão e de expectativas de resultados.

A apresentação dos números arábico-hindus ao ocidente permitiu a evolução da matemática e, com ela, dos cálculos de probabilidades, que conduziriam ao desenvolvimento posterior da gestão de riscos. A probabilidade sempre envolveu dois sentidos, um relacionado à interpretação do passado, e outro voltado para os eventos futuros.

Em seguida, a amostragem revelou-se um instrumento importante para se enfrentar os riscos, a partir da reunião de dados estatísticos. Tal instrumento também sofreria críticas por suas inerentes limitações, como a quantidade de dados em cada pesquisa, e pelo fato de que os eventos passados não se repetem necessariamente da mesma forma que originou cada estatística.

Amostragem que, diga-se de passagem, é fator importante para a viabilização legal da Seguridade e mesmo para a fundamentação de princípios constitucionais, como o da seletividade150.

De modo que a evolução do gerenciamento dos riscos conduziu os cientistas às seguintes questões: que riscos devemos correr ou evitar, quais informações são relevantes? Qual é o grau de confiança em nossas crenças sobre o futuro? Como introduzir e aplicar uma eficiente gestão de riscos?

A decisão humana e suas conseqüências passaram a ser encaradas como determinantes na avaliação dos riscos, mais do que o próprio cálculo matemático das probabilidades da ocorrência de eventos.

Conforme afirma Peter L. Bernstein:

“A essência da administração do risco está em maximizar as áreas onde temos certo controle sobre o resultado, enquanto minimizamos as áreas onde não temos absolutamente nenhum controle sobre o resultado e onde o vínculo entre efeito e causa está oculto de nós”151.

O mesmo Bernstein, acima citado, penetrou no universo do mercado de ações – incluindo os derivativos152 -, verificando a desejabilidade de retorno nesse tipo de investimento, e que o risco de perda é, portanto, indesejável. No mundo da Bolsa de Valores, e do mercado em geral, a medição do risco fica ainda mais difícil, pois os parâmetros153 são fluídos – sofrem alterações contínuas -, e não estacionários.

Diversamente, a base legal da estrutura sistemática do Direito oferece maior estabilidade para a respectiva medição do risco a ela inerente.

Antonhy Giddens154 expôs a ligação entre o risco, o binômio seguro- seguridade, o welfare state e a globalização:

“Risco se refere a infortúnios ativamente avaliados em relação a possibilidades futuras.[...]. É por isso que, desde as suas origens, a noção de risco é acompanhada pelo desenvolvimento dos sistemas de seguro. Não deveríamos pensar somente em seguros pessoais ou comerciais aqui. O welfare state, cujo desenvolvimento pode ser retraçado até as leis de assistência social elisabetanas na Inglaterra, é essencialmente um sistema de administração de risco. Destina-se a proteger contra infortúnios que antes eram tratados como desígnio dos deuses – doença, invalidez, perda do emprego e velhice.

O seguro é a base a partir do qual as pessoas estão dispostas a assumir riscos. É a base da seguridade onde o destino foi desalojado por compromisso ativo com o futuro. [...]. Seguro é algo só concebível quando acreditamos num futuro humanamente arquitetado. É um dos meios de operar esse planejamento. Diz respeito à provisão de segurança, mas de fato é parasita do risco e das atitudes das pessoas

151BERNSTEIN, Peter L. Desafio aos deuses: a fascinante história do risco. Rio de Janeiro: Elsevier, 1997. 21ª

reimpressão, p. 197.

152 Sinteticamente, são contratos de compra e venda de ativos físicos ou financeiros, onde são especificados

pagamentos futuros cujo montante será calculado, no momento do vencimento da obrigação, com base no valor assumido por um fator variável, como o preço de outro ativo, a inflação, a taxa de juros etc. Por isso, são derivativos porque seu preço de compra e venda deriva do preço de outro ativo.

153 Como o conjunto de fatores internos de uma empresa em sua busca pelo lucro, ou o conjunto de fatores

externos do mercado que influenciam positiva ou negativamente na atualização do balanço patrimonial de uma Sociedade Anônima, por exemplo.

com relação a ele. Os que fornecem seguro, seja na forma de seguro privado ou dos sistemas estatais de seguridade, essencialmente estão apenas redistribuindo risco. [...]. Seja qual for nossa perspectiva, vemo- nos envolvidos num problema de administração de risco. [...]. Nossa época não é mais perigosa – nem mais arriscada – que as de gerações precedentes, mas o equilíbrio de riscos e perigos se alterou. Vivemos num mundo em que perigos criados por nós mesmos são tão ameaçadores, ou mais, quanto os que vêm de fora. Alguns são genuinamente catastróficos, como o risco ecológico global, a proliferação nuclear ou a derrocada da economia mundial”.

Giddens reporta-se ao problema de administração de risco155, o que para a Seguridade Social, em interpretação extensiva, pode estar relacionado ao problema de gestão dos recursos arrecadados.

Nesta dinâmica, a pessoa humana está sujeita a diversos tipos de risco (como a morte ou a doença). O sistema jurídico, debruçando seu colorido sobre os fatos, seleciona as hipóteses que serão contempladas pela proteção da Seguridade. Com o advento do sinistro, a proteção, devidamente custeada, é fornecida por meio de diversas prestações. Se a aplicação da arrecadação conforme a finalidade constitucional é feita com inobservância a algum princípio ou preceito legal, as necessidades sociais não são contempladas como deveriam. A natureza jurídica de seguro, da Seguridade, fica, assim, comprometida, ampliando a possibilidade da proliferação de riscos sem a devida cobertura.