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Sobre o advogado e a custas processuais

Em relação a gratuidade, inicialmente é relevante anotar que, em princípio, os juizados atendem às necessidades da terceira “onda” de movimentos em prol do acesso à justiça, concebidos como uma nova alternativa de justiça, onde a própria pessoa tem a oportunidade de promover sua reclamação.

Também é importante colocar que, em conformidade com pesquisa realizada pela Universidade de Brasília, hoje no Brasil o reconhecimento do Poder Judiciário população ocorre em grande parte devido aos juizados, haja vista que 61,6% dos entrevistados conhecem ou já ouviram falar dos juizados, sendo a instituição mais bem votada nessa referência.121

Nesse sentido, ainda que esse órgão tenha atendido ao que pretendia a terceira “onda” de movimentos, não se pode negar que ele também contribuiu em relação aos outros movimentos; exemplo disso é o fato de não haver necessidade de advogado para as causas de até vinte salários mínimos, sendo desnecessária a participação de advogados da assistência judiciária, pelo menos no que se refere à fase inicial do processo.

Verifica-se que o fato de os juizados terem os seus serviços gratuitos, em relação ao processo comum aparentemente traz uma grande contribuição às

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121 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Pesquisa realizada por universidades. Disponível em:<http://www.stf.gov.br/seminario/pdf/dataunb.pdf.>. Acesso em 29 nov. 2005.

pessoas mais pobres, já que para iniciar um processo judicial na justiça comum é necessária a assistência de advogado e, ainda, o pagamento de custas processuais.

Assim, para os processos da justiça comum é necessário à parte estar assistida de advogado, considerando-se os termos do artigo 133 da Constituição Federal, afirmando a indispensabilidade do advogado à administração da justiça e, nesse sentido, o disposto no artigo 36 de Código de Processo Civil, normatizando que a parte será representada em juízo por advogado legalmente habilitado, através do instrumento de mandato.

Nesse sentido, outra inovação surge com a Lei 9099/95, visto que no processo do juizado, para o valor limite de até vinte salários mínimos, a própria parte pode fazer a sua reclamação, estando a obrigatoriedade do profissional apenas para as causas acima de 20 e até 40 salários mínimos.

No processo comum a parte interessada em buscar a tutela jurisdicional está obrigada, já no início, a pagar as custas processuais que, conforme já abordado, corresponde no estado de São Paulo a 1% do valor da causa, existindo um valor mínimo que não pode ser inferior a 5 UFESP, conforme Lei Estadual de nº. 11608, de 29 de dezembro de 2003.

Quanto às custas, verifica-se que a Lei 9099/95 trouxe grande contribuição às pessoas, levando-se em conta que um dos obstáculos do acesso à justiça envolve o aspecto econômico.

No que tange a assistência de advogado, é um significativo avanço permitir à própria parte reclamar diretamente ao Judiciário, levando-se em consideração que o primeiro movimento de acesso à justiça não foi tão satisfatório.

A insatisfação com os advogados gratuitos surge na medida em que eles não inspiram total confiança aos clientes, é constrangedor ao agente relatar os seus

problemas a um desconhecido e, por último, o fato de o profissional focar o seu trabalho apenas para o problema, não buscando outro meio de solução para o conflito.122

Nesse sentido, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, de forma geral contrário aos princípios norteadores do juizado, distribuiu junto ao Supremo Tribunal Federal uma ação direta de inconstitucionalidade, sob nº. 1539-7, em face do Presidente da Republica e do Congresso Nacional, objetivando a declaração de inconstitucionalidade da primeira parte do artigo 9º da Lei 9099/95, que permite a parte postular, em juízo, sem assistência de advogado.123

A ação foi fundamentada no sentido de que tal lei estaria em dissonância com o artigo 133 da Constituição Federal, que consagra a imprescindibilidade do advogado à administração da justiça.

Chama a atenção verificar a preocupação da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB no sentido de buscar decisão judicial em defesa da ordem constitucional, principalmente se considerarmos a importância do advogado no dever constitucional de assegurar aos cidadãos o acesso à jurisdição, promovendo em sua integralidade o direito de ação e de ampla defesa.

O que não é interessante é o fato de que, ao buscar essa decisão judicial, a OAB não pensou somente na ordem constitucional, mas na perda dessa fatia de mercado, que tanto os advogados reclamam, haja vista que é comum encontrar advogados dizendo que antes do juizado essas causas de pequenos valores eram resolvidas extrajudicialmente, conseguindo o advogado a manutenção de seu _______________

122 CAOVILLA, Maria Aparecida Lucca. Acesso à justiça e cidadania. Chapecó: Argos, 2003. p.103. 123 Supremo Tribunal Federal. <Disponível em <http://www.sft.gov.br/jurisprudencial>. Acesso em 27 mar 2006.

escritório através dos honorários recebidos de acordos celebrados.

Aliás, a respeito do assunto Luciana Nanci aborda em seu artigo essa reclamação de advogados e, ainda, a inconformidade por parte de juizes argumentando que a ausência de advogado impede as partes de litigarem em igualdade de condições técnicas, provocando um desequilíbrio na balança da justiça.124

O que percebe-se é que os advogados não querem abrir mão dessa fatia do mercado e, por parte da magistratura, envolve a questão de um trabalho mais voltado para a questão social, o que de certa forma dificulta o trâmite do processo.

No entanto, tanto advogados como juizes parecem não atentar ao fato de que o juizado foi criado com objetivos claros de garantir acesso de todos à justiça, em vista de seus princípios, da gratuidade e da não dispensabilidade de representação por advogado, uma vez que essas necessidades têm historicamente gerado obstáculos de acesso à justiça, sendo impedimentos para a efetivação da mesma.

Por sua vez, o Supremo Tribunal Federal - STF125, em consonância com o problema social existente em relação ao acesso à justiça, julgou improcedente a ação do Conselho Federal da OAB, fundamentando o julgamento no fato de a parte ter a faculdade para demandar ou defender-se pessoalmente em juízo, sem assistência de advogado e, assim, considerou inexistente qualquer ofensa à Constituição Federal e, ainda, que em razão da Lei 9099/95, em vista de seus princípios da oralidade e informalidade, viabilizou o acesso à justiça com maior _______________

124 Revista Consultor jurídico. Disponível em <http://conjur.estadão.com.br/static/text/36798> Acesso em 27 mar. 2006.

celeridade e menor ônus ao agente menos favorecido.

Exemplo de resgate da cidadania foi essa decisão do STF, pois aqueles que criticam o sistema da Lei 9099/95 deveriam se unir para pensar e agir no sentido de melhorar a estrutura dos juizados, com o fim de cada vez mais se cumprir a promessa constitucional de garantir o efetivo acesso à justiça a toda a sociedade brasileira.

Por outro lado, infelizmente existem políticos que apoiam atitudes de combate aos obstáculos de acesso à justiça, tendo-se como exemplo o caso do Deputado Ivo José (PT-MG), que propôs, através do Projeto de Lei nº. 5396/2005, alteração do artigo 9º da Lei 9099/95, para fazer constar que a dispensa de advogado, em vez de vinte, seja reduzida para cinco salários mínimos, correndo o risco de contrariar grande parte do trabalho já realizado para a efetivação da justiça.126

É certo que ainda existe a necessidade um aperfeiçoamento no atual sistema, pois nele também ocorrem problemas. Um deles é que no juizado a pessoa é atendida por funcionário da justiça que não possui necessariamente formação jurídica universitária, tendo adquirido conhecimento técnico e profissional após anos de trabalho, em função única e exclusiva da prática.

Esse é um problema que, comparado aos advogados gratuitos, também gera desconfiança por parte das pessoas e facilmente encontra-se pessoas confrontando-

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se com funcionários por não acreditarem na informação que estão recebendo.127 Assim nota-se que o problema do acesso à justiça ainda persiste, já que envolve não só a questão econômica, mas principalmente a questão sócio-cultural.