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2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.2 PRINCÍPIOS DA MECÂNICA DA FRATURA BIPARAMÉTRICA

2.2.2 Soluções de referência baseadas nos modelos BL e MBL

O conceito de restrição refere-se geralmente à evolução do nível de triaxialidade (ou, em outros temos, à capacidade de restrição ao início do escoamento plástico) das tensões atuantes nas proximidades da frente de trinca durante o aumento do carregamento remoto aplicado ao componente [127]. Há essencialmente duas abordagens para se avaliar as diferenças de restrição entre duas configurações10 distintas de trinca. A primeira delas consiste no uso de uma medida de triaxialidade mais direta (i.e., por meio de parâmetros que medem o grau de restrição, tais como os parâmetros ℎ, 𝑞, ℎ′, etc.) calculada em um ponto espacial específico à frente da ponta da trinca. A partir dessa medida é possível comparar, por exemplo, a evolução do nível de triaxialidade entre duas geometrias distintas de trinca [e.g.,

10 No contexto deste trabalho, entende-se por configuração uma dada geometria de corpo de prova trincado

C(T) vs. M(T)] contendo as mesmas propriedades mecânicas (i.e., 𝐸 𝜎⁄ 𝑦𝑠 e 𝑛) ou entre geometrias idênticas, porém associadas a diferentes propriedades mecânicas [143–145]. Já a outra abordagem [131,132,146], baseada em uma estimativa indireta, consiste no uso de uma solução de referência descritiva do campo de tensões à frente da trinca em condições SSY [87,114,140] para ser utilizada na análise comparativa entre tal solução e o campo de tensões característico de uma dada geometria específica de componente, esse comumente expresso pela expansão assintótica da solução elasto-plástica HRR.

Portanto, ao se comparar as diferenças de restrição que surgem entre duas configurações distintas de trinca, é importante definir um parâmetro adequado para a medição do nível de triaxialidade (e.g., ℎ, 𝑞, ℎ′, 𝐴

2, 𝑘2, 𝑄, 𝒯, 𝑀) e uma posição específica, 𝒫, à frente da trinca

para essa medição. Essa posição deve ser representativa para a zona de processo de fratura (ZPF) para que se possa analisar os efeitos de restrição sobre os micromecanismos de fratura e, consequentemente, sobre as medidas de tenacidade à fratura. Neste contexto, além da escolha do parâmetro para medir a triaxialidade em um dado ponto material 𝒫, comumente representado pela tripla ordenada em coordenadas cilíndricas (r, θ, 𝑧), a estratégia de análise pode envolver inicialmente a escolha de uma solução de referência para representar os campos tensão-deformação em condições SSY, conforme abordagem da próxima seção. Uma vez definido o parâmetro de restrição, a posição específica e a solução de referência (quando aplicável), é possível avaliar a influência dos efeitos geométricos e de carregamento, além das propriedades mecânicas, sobre o campo de tensões do sólido de interesse. De forma geral, o campo de tensões na ponta da trinca pode ser expresso por

𝜎𝑖𝑗𝑘 = 𝜎0𝑓𝑖𝑗𝑘(𝑟̂, 𝜃, 𝑧; Λ) (2.53𝑎)

em que 𝜎0 representa a tensão de referência (e.g., tensão de escoamento ou de fluxo), 𝑓𝑖𝑗𝑘 a função adimensional cujos subíndices 𝑖𝑗𝑘, no presente contexto, referem-se, nessa ordem, à distância normalizada 𝑟̂ à frente da ponta da trinca [e.g., 𝑟 (𝐽 𝜎⁄ ⁄ )0 ], ao ângulo 𝜃 em relação

ao plano da trinca (i.e., 𝜃 ≠ 0, sendo 𝜃 = 0 o plano da trinca) e à posição 𝑧 em relação à frente de trinca [i.e, posição em relação à espessura do corpo de prova ou componente dada por 𝑧 (𝐵 2⁄ ⁄ ) onde 𝐵 é a espessura e 𝑧 (𝐵 2⁄ ⁄ )= 0 corresponde ao plano de simetria em relação à espessura] e, por fim, Λ o termo parametrizado utilizado para quantificar a magnitude da triaxialidade local das tensões na ponta da trinca. A distância 𝑟̂ pode ser escalada em termos de (𝐾𝐼2⁄ )𝜎0 2, 𝐽 𝜎⁄ e 𝛿. Deve-se salientar que a posição específica 0

representada pela tripla ordenada 𝒫(𝑟, 𝜃, 𝑧) é definida em análises numéricas tridimensionais quando se deseja avaliar as diferenças de restrição no plano (in-plane) e fora do plano (out-of- plane), enquanto para as análises bidimensionais (i.e., em estado de deformação plana, plane strain) essa posição é simplificadamente representada pelo par ordenado 𝒫(𝑟, 𝜃), uma vez que a análise se dá exclusivamente no plano de simetria em relação à espessura [𝑧 (𝐵 2⁄ ⁄ ) = 0] de forma que a Eq. (2.53a) é simplificadamente representada por

𝜎𝑖𝑗 = 𝜎0𝑓𝑖𝑗(𝑟̂, 𝜃; Λ) (2.53𝑏)

Um dos primeiros parâmetros utilizados para avaliar o nível de restrição plástica foi proposto por Leevers e Radon [146] ao estabelecerem um parâmetro de biaxialidade, 𝛽, definido pela relação entre a tensão elástica 𝒯 (abordada em detalhes mais adiante) e o fator de intensidade de tensão 𝐾 por meio da expressão abaixo

𝛽 =𝒯√𝜋𝑎

𝐾 (2.54)

em que 𝛽 é um parâmetro dependente da geometria e do modo de carregamento aplicado à trinca de forma que a tensão 𝒯 aumenta na mesma proporção que o fator 𝐾. Dessa forma, os campos de tensões em condições SSY, representados pela tensão de abertura normalizada (𝜎𝜃𝜃⁄ ) em função da distância normalizada à ponta da trinca [𝑟 (𝐾 𝜎𝜎0 ⁄ )0 2], são

caracterizados por um regime estacionário independentemente do nível de carregamento. Valores positivos da tensão 𝒯 e, portanto, de 𝛽, conduzem a um estado de elevada triaxialidade, enquanto valores negativos promovem uma rápida perda de restrição plástica à frente da trinca [104,147]. Betegón e Hancock [104] e Kirk et al. [147] demonstram para diferentes níveis de carregamento em termos de 𝐽 de que o parâmetro 𝒯 𝜎⁄ fornece um meio 0

conveniente para investigar e parametrizar efeitos geométricos sobre o nível de triaxialidade próximo à ponta da trinca em condições SSY.

No que concerne às medidas diretas de triaxialidade, um dos parâmetros mais comumente utilizados para definir fisicamente o conceito de triaxialidade do estado de tensão na ponta da trinca é representado pelo parâmetro ℎ. Esse parâmetro é definido pela razão entre a tensão hidrostática 𝜎 (definida pelo primeiro invariante do tensor de tensões, 𝐼1, e também denominada de tensão normal média (𝜎𝑚) ou simplesmente pressão hidrostática uma vez que

o seu valor é igual em todas as direções), a qual não promove nenhuma deformação plástica (apenas variação de volume), e a tensão efetiva ou equivalente de von Mises, 𝜎𝑒, (também definida como a raiz quadrada do segundo invariante do tensor desviador de tensões, 𝐽2), essa responsável pelo escoamento plástico do material, conforme a seguinte expressão

ℎ(𝑟, 𝜃, 𝑧) =𝜎ℎ(𝑟, 𝜃, 𝑧) 𝜎𝑒(𝑟, 𝜃, 𝑧) = 𝑡𝑟[𝜎𝑖𝑗] 3⁄ (3𝑠𝑖𝑗𝑠𝑖𝑗⁄ )2 1 2⁄ = 𝜎𝑘𝑘⁄3 (3𝑠𝑖𝑗𝑠𝑖𝑗⁄ )2 1 2⁄ = √2𝜎𝑘𝑘 3√3√𝑠𝑖𝑗𝑠𝑖𝑗 (2.55)

em que 𝑟, 𝜃 e 𝑧 representam, nessa ordem, a distância entre o ponto material (𝒫) e a ponta da trinca, o ângulo entre o ponto 𝒫 o plano da trinca e a posição ao longo da frente da trinca. Brocks e Schmidt [143], ao compararem o nível de triaxialidade entre as geometrias C(T) e CCT [ou, equivalentemente, M(T)] por meio do parâmetro ℎ, observaram diferenças significativas de restrição ao longo do ligamento remanescente do corpo de prova (𝑏 = 𝑊 − 𝑎). Para uma mesma distância relativamente próxima à ponta da trinca, análises numéricas pelo MEF realizadas por Brocks e Schmidt [143], em condições de deformação plana, indicaram valores de ℎ da ordem de 1,8 para a geometria CCT. Já para a geometria C(T) os valores de ℎ foram aproximadamente iguais a 3 indicando, assim, uma maior triaxialidade para essa geometria em relação à geometria CCT. Detalhes adicionais do parâmetro ℎ podem ser encontrados em Brocks e Schmidt [143]. Outro parâmetro utilizado é o parâmetro 𝑞 (denominado por Roos et al. [144] de quociente de multiaxialidade) que, por sua vez, é definido como o inverso do parâmetro ℎ (i.e., 𝑞 = 𝜎𝑒⁄ ). Por meio do parâmetro 𝑞 é 𝜎 possível definir um critério de fratura local dependendo do seu valor em relação a um valor crítico 𝑞𝑐. Para valores de 𝑞 < 𝑞𝑐, o processo de fratura é caracterizado por uma pequena deformação, indicando uma fratura essencialmente frágil. Além disso, a partir do valor do parâmetro 𝑞 e da sua variação para uma posição específica em relação ao ligamento remanescente do corpo de prova (𝑏 = 𝑊 − 𝑎) é possível avaliar a propensão ao crescimento estável de trinca. Além desses parâmetros, há outros que podem ser utilizados para mensurar o grau de restrição. Roos et al. [144] faz breve revisão sobre os demais parâmetros destacando as situações mais convenientes para o uso de específico de um dado parâmetro.

Henry e Luxmoore [145] também definem um parâmetro de triaxialidade ℎ′ baseado na

relação entre a tensão hidrostática, 𝜎, e a tensão de equivalente de von Mises, 𝜎𝑒, conforme expressão a seguir

ℎ′ =𝜎ℎ 𝜎𝑒 = (𝜎1+ 𝜎2+ 𝜎3) 3⁄ √(𝜎1− 𝜎2)2+ (𝜎 2− 𝜎3)2+ (𝜎3− 𝜎1)2⁄√2 (2.56)

em que 𝜎1, 𝜎2 e 𝜎3 são as tensões principais. A diferença entre os parâmetros ℎ e ℎ′ está associada à inclusão das componentes cisalhantes (i.e., 𝜎𝑖𝑗 com 𝑖 ≠ 𝑗) no cálculo do nível de

triaxialidade. O cálculo de ℎ dado Equação (2.55) é baseado em uma formulação generalizada enquanto o cálculo de ℎ′ pela Eq. (2.56) é dado apenas pelas tensões principais. Apesar da

diferença, deve-se enfatizar que, tanto no regime elástico-linear quanto no regime elasto- plástico, a contribuição das componentes cisalhantes é praticamente desprezível de forma que ambas as equações tendem a fornecer valores de triaxialidade praticamente iguais. Embora o parâmetro ℎ′ seja usualmente utilizado na correlação com a fratura dúctil [145], Meshii et al.

[148] demonstraram com sucesso que o parâmetro ℎ′ possui sensibilidade o suficiente para monitorar a perda de restrição ocasionada pelos efeitos de espessura sobre valores críticos de 𝐽 (𝐽𝑐) medidos na RTDF.

De modo geral, a análise quantitativa dos efeitos de escoamento em larga escala sobre o campo de tensões requer frequentemente o uso de uma solução de referência representativa das condições de elevada triaxialidade e escoamento restrito para que possa ser estabelecida a diferença relativa entre os campos SSY e LSY. Diante do contexto das abordagens multiparamétricas, julga-se importante fazer uma breve descrição dos conceitos por detrás do modelo analítico da Camada Limite (Boundary Layer) proposto originalmente por Rice [77,86,149,150] e adaptado numericamente pelo MEF por diversos pesquisadores [71,87,114,140].

Apesar das análises elástica-lineares terem representado um enorme avanço na solução dos problemas elasto-plásticos, o fato dessas análises não levar em consideração os efeitos de escoamento na ponta da trinca faz com que surjam tensões demasiadamente elevadas, as quais tendem ao infinito quando 𝑟 → 0, devido à presença da singularidade 1 𝑟⁄ na solução elástica [12–14]. Embora matematicamente correta, análises puramente elásticas tendem a gerar inconsistências físicas do ponto de vista do real comportamento mecânico dos materiais elasto-plásticos, uma vez que tais análises não levam em consideração o fenômeno do escoamento plástico comum a esses materiais. Além disso, as diferenças físicas entre o EPT e o EPD, as quais são consideravelmente significativas na presença de escoamento plástico, são inadequadamente refletidas em tratamentos puramente elásticos [150].

Diante das considerações supracitadas, torna-se necessário estimar quantitativamente os limites de deformação e os limites paramétricos que assegurem a singularidade elástica (quantificada por 𝐾) e, ao mesmo tempo, o controle de uma deformação restrita, uma vez que efeitos de plasticidade em grande escala passam a afetar consideravelmente o campo elástico característico das condições SSY [150]. Portanto, uma descrição mais acurada e realística das distribuições das tensões e deformações atuantes em um material elasto-plástico propenso à separação na ponta da trinca exige, obviamente, uma formulação que incorpore os efeitos de escoamento sobre o campo das tensões [150] sem, no entanto, deixar de assegurar condições de elevada restrição plástica e, consequentemente, o princípio da similitude.

Visando sanar as deficiências com base nos argumentos expostos anteriormente, Rice [77,86,149,150] propôs um modelo analítico que incorporasse os efeitos da deformação plástica na ponta da trinca a fim de levar em consideração os efeitos do escoamento sobre os campos de tensão e deformação. No entanto, para que fosse possível analisar esses efeitos, inicialmente era necessário estabelecer as condições mínimas necessárias para assegurar uma solução baseada em condições SSY para que, a partir de então, pudesse ser feito uma análise comparativa com os campos em regime de escoamento mais acentuado. Dentre essas condições, Rice [150] propôs um limite para o tamanho da zona plástica na ponta da trinca de forma que esse valor deveria se manter desprezível em relação às demais dimensões geométricas da trinca (i.e, 𝑟𝑦 = 𝜚(𝐾2⁄ ) ≪ 𝑎, 𝑊, 𝐵, 𝑊 − 𝑎, em que 𝜚 é um fator 𝜎0 adimensional). Assim, na medida em que tais restrições são respeitadas, Rice demonstra analiticamente que a singularidade dominante na ponta da trinca a baixos níveis de carregamento em um material elasto-plástico pode ser caracterizada pelo fator 𝐾. Em outras palavras, independentemente da geometria do componente e do modo de carregamento a ele associado, o campo de tensões pode ser solucionado por meio de um problema de valor de contorno cujas condições de contorno são dadas pela extensão da validade do termo singular da solução elástica-linear do campo de tensões [12–14], conforme Eq. (2.1a) da Seção (2.1.1).

Os requisitos provenientes das análises de Rice [150] e de demais [17] contribuíram para que a primeira versão da E399, publicada em 1970, apresentasse um valor máximo permissível para 𝐾𝐼 baseado em um limite de deformação da zona plástica dado por um fator 𝜚 = 2,5 (i.e, 𝐾𝐼 ≤ 𝜎0√𝑎 √2,5⁄ ). Assim, para que esse requisito fosse satisfeito, a espessura (𝐵) dos corpos de prova deveria ser de aproximadamente 25 vezes o diâmetro da zona plástica (2𝑟𝑦) que em condições de deformação plana equivale a aproximadamente 2𝑟𝑦 = (𝐾𝐼⁄𝜎𝑦𝑠)2⁄ . 3𝜋

O modelo analítico proposto por Rice [77,86,149,150] para descrever as reais condições de contorno presentes em uma trinca contida em um sólido elasto-plástico de dimensões finitas e submetido a baixos níveis de carregamento, conforme indicado na Fig. 2.17 (a), é representado por meio de uma camada circular de raio 𝑅, Fig. 2.17 (b), que consiste em uma trinca semi-infinita contida em um sólido elasto-plástico de dimensões infinitas.

Figura 2.17 - (a) Representação esquemática da condição SSY próxima à ponta da trinca contida em um componente; (b) representação analítica e (c) numérica do modelo BL

Fonte: (a) e (b) Adaptado de Rice [16] e (c) Fractus 2D [151]

A representação ilustrada na Fig. 2.17 (c) incorpora as condições de contorno que asseguram o comportamento assintótico do campo elástico-linear das tensões desenvolvidas

(a) (b)

ao redor da trinca sob condições de escoamento em pequena escala. Dessa forma, a solução geral elástica, definida pela Eq. (2.1a) na Seção 2.1.1 e aqui expressa na forma expandida

𝜎𝑖𝑗 = 𝐾𝑟−1 2⁄ 𝑓

𝑖𝑗(𝜃) + 𝒯𝛿𝑖𝑥𝛿𝑗𝑥 + 𝑟−1𝐴𝑖𝑗(𝜃) + 𝑟−3 2⁄ 𝐵𝑖𝑗(𝜃)𝑟−2𝐶𝑖𝑗(𝜃) + ⋯ (2.57𝑎)

em que 𝐴𝑖𝑗, 𝐵𝑖𝑗 e 𝐶𝑖𝑗 definem alguns dos termos da expansão assintótica responsável por descrever completamente o campo das tensões elásticas em condições SSY, é dada somente pelo termo singular dominante, ou seja,

𝜎𝑖𝑗 𝑟→∞→ 𝐾𝑟−1 2⁄ 𝑓

𝑖𝑗(𝜃) (2.57𝑏)

em que 𝑟 e 𝜃 são as coordenadas polares centradas na ponta da trinca, 𝐾 é o fator de intensidade de tensão definido para um dado modo de carregamento e geometria de trinca (modo I, modo II, modo III), 𝑓𝑖𝑗 é o conjunto de funções adimensionais dependentes de 𝜃. Nesse caso, os carregamentos devem ser baixos o suficiente para que a dimensão da zona escoada na ponta da trinca seja pequena quando comparadas às dimensões geométricas características da trinca tais como, por exemplo, o seu comprimento e o seu ligamento remanescente. A respresentação esquemática ilustrada na Fig. 2.17 (b) refere-se ao modelo da Camada Limite (do inglês boundary layer e doravante abreviadamente designado pela sigla BL) que define rigorosamente as condições SSY, uma vez que as condições de contorno da sua camada são dadas pelo campo de deslocamento elástico [vide Eq. (2.1g) da Seção (2.1.1)]. A partir de então, o modelo BL passa a ser comumente utilizado nas análises numéricas utilizadas para representar as condições SSY [71,87,104,114,140].

A solução numérica SSY proveniente do modelo numérico BL é obtida a partir das condições de contorno atribuídas pelos deslocamentos impostos na borda da camada circular que delimita a malha de elementos finitos, conforme representação esquemática da Figura 2.17c. Nesse caso, os deslocamentos impostos estão associados somente à dependência assintótica do termo singular da solução elástica-linear referente a um campo externo de deslocamento em modo I de abertura da trinca. Embora a solução numérica SSY representatitiva da placa infinita seja baseada unicamente na contribuição do termo singular expresso em termos de 𝐾, é importante ressaltar que as soluções numéricas SSY para trincas estacionárias e não estacionárias são frequentemente expressas pela expansão da solução de Williams [13] até o segundo termo [neste caso até o termo representado por 𝒯 vide Eq.

(2.57a)]. Conforme abordado mais adiante, essa representação permite simplificar a geração de soluções numéricas em condições SSY a partir de diferentes níveis de restrição. Dessa forma, as soluções numéricas SSY para diferentes níveis de 𝒯 𝜎⁄ e sob condições de EPD 0

são expressas por

𝑢(𝑟, 𝜃) = 𝐾𝐼1 + 𝜈 𝐸 √ 𝑟 2𝜋cos ( 𝜃 2) [3 − 4𝜈 − cos(𝜃)] + 𝒯 1 − 𝜈2 𝐸 𝑟 cos(𝜃) (2.58𝑎) 𝑣(𝑟, 𝜃) = 𝐾𝐼 1 + 𝜈 𝐸 √ 𝑟 2𝜋sen ( 𝜃 2) [3 − 4𝜈 − cos(𝜃)] − 𝒯 𝜈(1 + 𝜈) 𝐸 𝑟 sen(𝜃) (2.58𝑏)

e sob condições de EPT por

𝑢(𝑟, 𝜃) =2𝐾𝐼 𝐸 √ 𝑟 2𝜋cos ( 𝜃 2) [1 + sen2 𝜃 2− 𝜈 cos2 𝜃 2] + 𝒯 𝐸𝑟 cos(𝜃) (2.58𝑐) 𝑣(𝑟, 𝜃) =2𝐾𝐼 𝐸 √ 𝑟 2𝜋sen ( 𝜃 2) [1 + sen2 𝜃 2− 𝜈 cos2 𝜃 2] − 𝜈 𝒯 𝐸𝑟 sen(𝜃) (2.58𝑑)

em que 𝒯 representa uma tensão elásica de comportamento não singular [i.e., uma tensão de magnitude constante e cujo valor pode ser positivo (tração) ou negativo (compressão)] aplicada paralelamente ao plano da trinca, o que explica a representação alternativa dada por 𝒯𝑥 (ou, em determinados casos, por 𝒯𝑠𝑡𝑟𝑒𝑠𝑠), definida como sendo igual a zero no modelo BL. Neste caso, observa-se que ao ser introduzida uma tensão elástica nula (𝒯𝑥 = 0), a Eq. (2.58)

retorna à solução elástica clássica do campo de deslocamento [vide Eq. (2.1g) da Seção 2.1.1] baseada somente no termo singular definido por 𝐾 da expansão assintótica [13] representada pela Equação (2.57a). Deve-se ressaltar que os valores 𝐾 e 𝒯 são aplicados como restrições de deslocamento no em torno da borda externa do modelo, em vez de tensões, para melhorar convergência da solução elástica-plástica (análise de plasticidade controlada por deslocamento).

Embora as análises numéricas conduzidas pelo modelo BL pudessem descrever bem as condições SSY em materiais elasto-plásticos (i.e., uma boa aproximação com a solução analítica HRR), as formulações iniciais [114,140] não eram capazes de descrever o fenômeno do arredondamento da ponta da trinca, uma vez que tais formulações eram basedas na

hipótese dos pequenos deslocamentos e das pequenas deformações (i.e., condições de linearidade geométrica, comumente referenciada na literatura como SGC, do inglês Small Geometry Change). Estudos anteriores [124,152] baseados em análises da TCLD já demonstravam a ocorrência desse fenômeno. Visando incorporar tais efeitos sobre a solução SSY das análises elasto-plásticos, McMeeking [87] propôs um procedimento similar ao adotado por Rice e Tracey [140], porém com novas condições de contorno sobre a superfície da trinca. Nesse caso, McMeeking [87] adotou condições de contorno livres de tensões externas (i.e., 𝑻 = 𝝈. 𝒏 = 𝟎) sobre a superfície da trinca e deslocamentos impostos ao contorno do modelo BL prescritos pela Eq. (2.57b). Nesses cálculos em elementos finitos, as soluções em estado estacionário se desenvolvem e persistem independentemente do nível de carregamento contanto que as zonas plásticas fiquem bem dentro dos contornos mais externos da malha [87] (i.e., em condições SSY) de forma que tais soluções possuem a seguinte forma

𝑢(𝑟, 𝜃) = (𝐾

2

𝐸𝜎0) 𝑓 (

𝑟𝜎02

𝐾2 ; 𝜃) (2.59)

em que 𝑟 e 𝜃 são as coordenadas polares centradas na ponta da trinca, 𝑢 é o deslocamento, 𝐾 é o fator de intensidade de tensão de Irwin [14], 𝐸 é o módulo de Young e 𝜎0 a tensão de

referência, definida nesse caso como a tensão de escoamento. A forma da função adimensional 𝑓, estabelecida por Rice e Tracey [140] e Tracey [114] próxima à ponta da trinca, possui a mesma singularidade do campo de deslocamento elástico fora da região modelada. O histórico de carregamento do raio externo da malha, vide Fig. 2.17(c), pode ser gerado a partir da definição de 𝑟 como sendo igual ao raio externo 𝑅 e por aumentos em 𝐾𝐼 a partir de zero [87]. Nesse caso, o carregamento do modelo é realizado impondo incrementos de deslocamento do campo singular elástico (Eq. 2.57) referente ao modo I sobre o contorno circular externo. As condições SSY são desenvolvidas mediante aumentos no valor de 𝐾𝐼 até que a zona plástica atinja ≈ 𝑅 10⁄ − 𝑅 15⁄ no ponto em que o valor de 𝐽 calculado pela relação 𝐾𝐼2(1 − 𝜈2) 𝐸⁄ seja ligeiramente inferior ao valor de 𝐾

𝐼 [57]. Para esse caso especial,

o parâmetro 𝐽 define a escala de tamanho sobre a qual grandes deformações se desenvolvem e descreve a magnitude das tensões próximas à ponta da trinca, mas fora da zona de deformação finita localizada imediatamente adjacente à ponta da trinca. O resultado da formulação BL associada à teoria das grandes deformações pode ser visto na Fig. 2.18 onde é possível observar a forte influência da zona de grandes deformações sobre as tensões que atuam nessa região.

Figura 2.18 - Análise comparativa entre o campo de tensões HRR e os campos de tensões obtidos via elementos finitos em condições de pequenas (SGC) e grandes deformações (LGC)

Fonte: Adaptado de Dodds et al. [127,137]

Além disso, McMeeking [87] demonstra que para regiões suficientemente distantes da zona de influência do blunting (𝑟𝜎0⁄ > 1), as tensões convergem para os mesmos valores 𝐽 das tensões obtidas por Rice e Tracey [140] via SGC. Entretanto, a solução baseada na formulação BL permanece acurada para descrever as condições SSY apenas enquanto a área afetada pelo arredondamento permanecer pequena em relação ao tamanho da malha [87].

Visando avaliar a validade da solução SSY fornecida pelo modelo BL para diferentes geometrias de corpos de prova [tais como as geometrias CCP, atualmente denominada de MT, DENT, SE(B) e C(T)] Larsson e Carlsson [71] constataram que o modelo BL não era adequado para representar as condições SSY, mesmo a níveis de carregamento inferiores ao limite máximo estabelecido pela E399 (i.e, 𝐾𝐼 < 𝜎0√𝑎 √2,5⁄ ). Essa constatação estava relacionada ao fato das análises numéricas revelarem que o início do escoamento na ponta da trinca (neste caso indicado pelo escoamento do primeiro elemento contido na ponta da trinca)

ocorria a valores distintos de 𝐾𝐼 para as diferentes geometrias. Dessa forma, ao se representar

o tamanho da zona plástica por uma expansão em série do tipo 2𝑟𝑦 = 𝜔1(𝐾𝐼⁄ )𝜎0 2+ ⋯, L&C