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Para compreendermos o que é um gênero televisivo, tomamos a definição proposta por Machado57, que a partir da teoria do gênero de Mikhail Bakhtin, destaca que o gênero é o que orienta o uso da linguagem no âmbito de um determinado meio. Machado ressalta ainda que o gênero não é necessariamente conservador, as tendências observadas num gênero não são ad infinitum, ao mesmo tempo em que buscam uma estabilização, estão em constante transformações.

Os gêneros são categorias fundamentalmente mutáveis e heterogêneas (não apenas no sentido de que são diferentes entre si, mas também no sentido de que cada enunciado pode estar “replicando” muitos gêneros ao mesmo tempo.

A riqueza e a diversidade dos gêneros discursivos são ilimitadas, porque as possibilidades de atividade humana são também inesgotáveis e porque cada esfera de atividade contém um repertório inteiro de gêneros discursivos que se diferenciam e se ampliam na mesma proporção que cada esfera particular se desenvolve e se torna cada vez mais complexa. (MACHADO, 2005: pág.71)

Para Machado, os gêneros televisuais são tantos que temos dificuldade em compreendê-los em sua totalidade, mas o autor aponta para aqueles que melhor testemunham a diversidade: as diferentes formas fundadas no diálogo, as narrativas seriadas, as transmissões ao vivo, o telejornal, o videoclipe, entre outros.

Para Temer58 o telejornal é um gênero consolidado dentro da grade de programação das emissoras de TV brasileiras, mais do que isso, é um gênero facilmente identificável pelo telespectador, com um linguagem audiovisual reconhecida.

                                                                                                                57

MACHADO, Arlindo. A televisão levada a sério. 4a Ed. São Paulo: Editora Senac, 2005. 58

TEMER, Ana Carolina Rocha Pessoa. A mistura dos gêneros e o futuro do telejornalismo. em VIZEU, Alfredo; PORCELLO, Flávio e COUTINHO, Iluska. (Orgs) 60 anos de telejornalismo

Mas afinal, o que é o telejornal? Como o próprio nome diz, o telejornalismo é o jornalismo na televisão. Isto significa que o telejornalismo deve manter os mesmos princípios éticos e valorativos do jornalismo, atividade que consiste em lidar com notícias, com a divulgação de informações factuais. Em uma linguagem bem simples, o telejornalismo é a prática de coletar informações sobre eventos atuais, redigir, editar e publicar estas informações de forma adaptada aos limites ou possibilidades da televisão. (TEMER, 2010: pág. 102)

Temer ressalta ainda que quando analisamos o telejornalismo enquanto gênero, podemos fazê-lo de duas maneiras: analisar o telejornalismo como gênero televisivo, inserido num conjunto de programas que constroem a programação televisiva; ou analisar o telejornalismo como uma extensão da categoria do jornalismo, que abriga em seu interior diversos gêneros jornalísticos.

Neste trabalho, optamos por analisar o telejornalismo enquanto gênero televisivo, suas características de linguagem e suas transformações em decorrência dos avanços tecnológicos.

Arlindo Machado observa ainda em sua obra Televisão levada a sério que o telejornalismo possui uma morfologia técnica que descreve as principais características desse gênero: um telejornal, segundo Machado, é composto de uma mistura de diferentes fontes de imagens e som (gravações em fita, filmes, material de arquivo, fotografia, gráficos, mapas, textos, além de locução, música e ruídos), e fundamentalmente, o telejornal consiste em tomadas em primeiro plano (posição stand-up) o que possibilita que pessoas falem diretamente para a câmera, sejam elas jornalistas ou protagonistas (apresentadores, âncoras, correspondentes, repórteres, entrevistados, entre outros).

Toda essa mistura de imagens e sons, apontada por Machado, é organizada com o objetivo de que o telejornal apresente um enunciado em que o telespectador e também o internauta, possa compreendê-lo de forma clara e direta. Esse sintagma audiovisual, que é a linguagem do telejornal, já está tão codificado para o telespectador que ambos os autores, Temer e Machado, concordam: o telejornal é um gênero televisual facilmente codificado.

A consolidação do telejornal enquanto gênero televisual no Brasil ao longo de décadas, deu ao telejornal uma responsabilidade política e social imensa, que segundo Temer, se mantém até os dias atuais. Para a autora, o

telejornalismo ainda pauta a agenda de notícias apresentadas ao público, através da formulação clássica da agenda-setting ou teoria da agenda.

No Brasil o telejornalismo tem uma responsabilidade social e política imensa, já que o baixo acesso a educação formal e a tradição da cultura oral levaram uma relação extremada entre público e a televisão, o que levou o telejornalismo à condição de uma importante – em alguns casos, a única – via de acesso às notícias para grande parte da população. No entanto, a visão estratégica do telejornalismo pelas emissoras de televisão brasileiras sobrepõe-se a uma visão social do jornalismo. (TEMER, 2010, pág: 109)

Como já destacamos, a televisão brasileira, em canal aberto, possui uma grade de programação consolidada à décadas. Juntamente com as telenovelas, o telejornalismo é um gênero televisual que se destaca na televisão brasileira desde de sua implementação nesse veículo de massa, a TV.

Aqui, quando o Jornal Nacional estreou, em 1969, estava firmada uma receita que resultaria no formato global da televisão brasileira: “ensaduichar” o telejornal em meio às novelas. O que significa pegar uma carona no hábito do público com a ficção e, nessa carona, entrar com o jornalismo (que, na época, precisa ser um jornalismo governista, de integração nacional). Foi assim que o telejornalismo se tornou um hábito: não como uma estrela de luz própria, mas como um entretenimento a mais na rotina do público. (BUCCI, 1997: pág. 30)

A crítica aqui apontada por Bucci, na construção desse gênero televisivual, o telejornalismo, se dá pelo seu caráter de melodrama: o telejornalismo, assim como a novela, tem que entreter e para isso todos os recursos, sejam de linguagem e tecnológico, são necessários para garantir a atenção do telespectador. Por isso o autor destaca a necessidade de construir um telejornal que tenha cor, movimento, que seja retumbante. Bucci destaca ainda a importância do apresentador no telejornal: é através do apresentador, ou apresentadores, que se cria vínculos familiares com o telespectador, que o vê como um ator, um astro, semelhante aos das telenovelas.

Machado aponta que o telejornal não pode e não deve ser encarado como um simples dispositivo de reflexão dos eventos, ou como um mero recurso de aproximação daquilo que acontece em outro lugar. Para Machado a principal virtude do telejornal está no seu efeito de mediação. E essa mediação é construída, além da função básica desse gênero televisual que é informar, por uma certa desmontagem dos discursos a respeito dos acontecimentos.

Num certo sentido podemos dizer que o telejornal é uma colagem de depoimentos e fontes numa sequência sintagmática, mas essa colagem jamais chega a constituir um discurso suficientemente unitário, lógico ou organizado a ponto de poder ser considerado “legível” como alguma coisa verdadeira ou falsa. As informações veiculadas nesse gênero televisual constituem antes de mais nada, um processo em andamento. O telejornal, não o esqueçamos, é um programa realizado ao vivo, ainda que utilize material pré-gravado ou de arquivo, e em geral é “fechado” poucos minutos antes de entrar no ar, ainda com as últimas notícias chegando à redação. (MACHADO, 2005: pág.110)

A característica aqui destaca por Machado, a do telejornal ser um gênero televisual onde o ao vivo se faz presente, é importante porque reafirma a função do telejornal: que é a de noticiar os acontecimentos do dia através da construção de uma narrativa que revele, que dê luz ao fatos que foram destaques numa cidade, num estado, no país e no mundo, dependendo da abrangência desse telejornal. O ao vivo é uma importante característica do telejornal pois permite que a regularidade enunciativa, essa colagem de depoimentos, muitas vezes sofra alterações, surpreendendo o telespectador .

Esse gênero televisual já consolidado na TV brasileira e mundial possui em sua gênese, características que compõem uma linguagem própria: que surge da linguagem audiovisual, mas que vai além dela.