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Participante Opiniões expressas pelo participante a respeito da temática disparadora

Expressão verbal (R1) Maria

Para mim deficiência é a falta de alguma coisa no corpo ou na mente. Por exemplo a audição, as pernas, os braços, a visão, o pensamento racional.

Ana deficiências. Lógico que umas deficiências são complicadas porque precisam de adaptações Fico pensando se todos nós não somos deficientes. Eu também tenho as minhas limitações, diferentes da que eu precisaria. E na boa? A sociedade limita muito as pessoas porque não ajuda, não dá acesso e condições. Daí me pergunto se a pessoa é deficiente ou a sociedade que é

Carol

Deficiência não é apenas a ausência de algo. É também a limitação. No deficiente físico que é amputado pode faltar a perna, mas se ele tiver recursos essa falta será menor e se ele não tiver será limitado

Sofia

Concordo com o Paulo, mas nós também temos os deficientes mentais. Opa! Aprendi semana passada que não é mais deficiência mental e sim intelectual. Então, esse tipo de deficiênicia afeta a mente, o pensamento

Paulo

Deficiência é quando a pessoa é cega, surda, tem dificuldades para se locomover, como um cadeirante. Na verdade, deficiência é a falta de algo no corpo. O cego falta a visão, o surdo a audição, o cadeirante os movimentos das pernas e assim vai

QUADRO 8 – Conceitos de deficiência dos participantes do Programa de Formação Continuada Informei aos participantes que para Omote (2008) a maneira como a deficiência é concebida e tratada se constitui em uma importante condição para a compreensão do próprio fenômeno das deficiências. Uma limitação ou dificuldade, que pode não ser intrinsicamente determinada pelas características inerentes da pessoa, pode ser tratada como uma deficiência. É necessário que se tenha em vista a concepção que orienta a pesquisa e as práticas de intervenção, a produção do conhecimento e sua aplicação.

Existem muitos modelos que podem ser identicados nas práticas em relação ao estudo das deficiências e ao atendimento das pessoas com deficiência. Esses modelos baseiam-se em

duas tendências bastante distintas: a abordadem centrada na pessoa deficiente e a abordagem centrada no meio. Na abordagem centrada na pessoa deficiente (modelo médico), considera-se que fatores orgânicos como lesões e malformações congênitas ou adquiridas se constituem em causas primárias da deficiência. Na abordagem centrada no meio (modelo social), os fatores ambientais como pobreza e miséria, estimulação e tratamentos inadequados e outras condições desfavoráveis para o desenvolvimento normal são tratados como sendo as causas primárias das deficiências (GOFFMAN, 1988; AMARAL, 1998; OMOTE, 2008).

Após este meu comentário Ana se manifestou dizendo: “eu sabia que a culpa não era só da pessoa, o meio interefere também”. Comentei que Carol também havia apontado isso e que as duas estavam respaldadas por vários pesquisadores que discutem o modelo social da deficiênica. Relatei, ainda, que a maioria dos estudos/pesquisas sobre deficiência adota tanto o modelo médico quanto o modelo social, uns com mais enfâse em causas orgânicas e outros com mais enfâse nas causas ambientais e sociais.

Para exemplificar como estes dois modelos são vivenciados nas práticas, busquei referência em Diniz (2007, p. 09).

O modelo médico de compreensão da deficiência assim pode catalogar um corpo cego: alguém que não enxerga ou alguém a quem falta à visão – esse é um fato biológico. No entanto, o modelo social da deficiência vai além: a experiência da desigualdade pela cegueira só se manifesta em uma sociedade pouco sensível à diversidade de estilos de vida.

Diniz (2007, p. 19), ainda, cita outro exemplo sobre entendimento do modelo social: “minha deficiência não está em não poder andar. Minha deficiência está na inacessibilidade de pegar o ônibus”. Diante desses exemplos, expliquei que para o modelo social a deficiência não é apenas a ausência ou a disfunção de uma estrutura psíquica, intelectual, fisiológica ou anatômica da pessoa ou no caso do nosso aluno. Deficiência é um conceito complexo que reconhece a ausência e a disfunção causada pela deficiência, mas denuncia a estrutura social que oprime a pessoa deficiente.

Sobre isso, Sofia comentou que “as pessoas não pensam que a deficiência é algo do social, os professores não pensam assim. Na escola se olha só a deficiênica do aluno, a limitação. Então tá todo mundo no modelo médico, só no modelo médico”. Comentei que, talvez, este entendimento de deficiência pautada algumas vezes apenas no modelo médico seja decorrente das conceituações existentes em vários documentos da área da saúde e da educação, mas principalmente, no proposto pelo Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CONADE, 2015).

O CONADE (2015) é um órgão superior de deliberação colegiada, criado para acompanhar e avaliar o desenvolvimento das políticas nacionais para inclusão da pessoa com deficiência e das políticas setoriais de educação, saúde, trabalho, assistência social, transporte, cultura, turismo, desporto, lazer e política urbana dirigidos a esse grupo social132.

Como os participantes haviam mencionado que gostariam de conhecer um pouco mais sobre os conceitos e tipos de deficiências, exibi por meio do Programa Power Point o conceito de deficiência do CONADE (2015). Segundo este órgão deficiência é toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividades, dentro do padrão considerado normal para o ser humano; e deficiência permanente como sendo aquela que ocorreu ou se estabilizou durante um período de tempo suficiente para não permitir recuperação ou ter probabilidade de que se altere, apesar de novos tratamentos.

Assim, é considerada pessoa com de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias:

- deficiência física: alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções;

- deficiência auditiva: perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz;

- deficiência visual: cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60o; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores;

- deficiência intelectual: funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito (18) anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como: comunicação, cuidado pessoal, habilidades sociais, utilização dos recursos da comunidade, saúde e segurança, habilidades acadêmicas, lazer; e trabalho;

- deficiência múltipla: associação de duas ou mais deficiências.

Comentei com os participantes que algumas expressões utilizadas pelo CONADE (2015) como anormalidade, impedimento e incapacidade são consideradas pejorativas e criticados por muitos estudiosos, como por exemplo, Sassaki (2006). Este autor afirma que a construção de uma verdadeira sociedade inclusiva passa também pelo cuidado com a linguagem. Na linguagem se expressa, voluntariamente ou involuntariamente, o respeito ou a discriminação em relação às pessoas com deficiências. Durante os encontros do Programa observei que os participantes não utilizavam expressões consideradas pejorativas para se referir às com deficiência e nem aos seus alunos, geralmente citavam os nomes dos mesmos. No que se refere à categorização apresentada pelo CONADE (2015), notei que todos os participantes a utilizaram para definir as deficiências que conhecem, mas apresentaram dificuldades para descrever e tipificar as deficiências de seus alunos, além de ficarem surpresos sobre como e quem pode realizar os diagnósticos dos alunos com deficiência, sobretudo em relação a deficiência intelectual. Expliquei que, segundo Milanez (2008), o diagnóstico da deficiência intelectual deve ser feito por uma equipe multiprofissional (psicólogos, professores, terapeutas ocupacionais, médicos, dentre outros) com condições de avaliar o aluno em sua totalidade e definir condutas (habilidades adaptativas) a serem tomadas e os encaminhamentos necessários.

Os participantes também delimitavam seus alunos com deficiência como “mais fáceis e mais difíceis” de trabalhar. Eles foram unânimes em mencionar que preparar atividades nas aulas de Educação Física para os alunos com deficiência intelectual “é bem mais fácil” devido a não precisarem adaptar as atividades, os materiais e os espaços; precisam apenas explicar com calma, retomar algumas explicações e demonstrar alguns movimentos. Consideraram ser “mais difícil e complicado” preparar atividades visando à inclusão dos alunos com deficiência física e visual, pois, a Educação Física prima pela movimentação, fazendo-se necessárias adaptações metodológicas à efetiva participação destes alunos em especial, o que torna difícil incluí-los.

Santos (2006) afirma que os professores tendem a usar discursos da impossibilidade de algumas práticas, devido à inflexibilidade de atuação, em que nem o aluno e nem o professor conseguem estabelecer diálogos para a efetivação do processo em que estão inseridos. É importante que se discuta com todos os alunos, indiferente de apresentarem ou não deficiência, o conteúdo programático e o porquê da construção destes saberes e/ou conhecimentos.

Mencionei isto aos participantes e reforcei que as práticas pedagógicas da Educação Física por si são difíceis de serem efetivadas, principalmente pelo contexto histórico a que foram subordinadas que constantemente selecionavam os perfeitos, os sadios, os fortes, os hábeis (concepção higienista, militarista e esportivista). No entanto, é necessário superar a ênfase no discurso das dificuldades e buscar alternativas para que os alunos com deficiência também participem das propostas; afinal a inclusão educacional não é uma escolha, é uma necessidade. Necessidade esta, infelizmente, entendida por muitos profissionais da área da educação como obrigatoriedade.

Acrescentei, ainda, que se existir a necessidade de realizar adaptações relativas à didática, espaço, materiais, conteúdos, objetivos e avaliação para efetivar a inclusão do aluno com deficiência, é importante que os demais alunos compreendam os motivos da existência dessas adaptações, para que servem, como podem colaborar e qual a importância tanto na vida do colega com deficiência quanto nas suas próprias vidas.

Aproveitando o enredo, disse que nos próximos encontros estaríamos justamente abordando conteúdos práticos para a inclusão e alunos com deficiência. Os participantes se mostraram bastante animados. Enquanto os participantes comentavam entre si o que gostariam de vivenciar nas práticas, Maria me perguntou se era importante para as aulas de Educação Física que os alunos com deficiência tivessem diagnóstico.

Lancei a pergunta para os demais participantes, enfatizando se os alunos com deficiência apresentavam tanto diagnósticos clínicos e psicológicos quanto pedagógicos e, se nestes constavam restrições quanto à participação dos alunos nas atividades proporcionadas nas aulas de Educação Física.

Quanto à existência de diagnósticos, os participantes responderam que a maioria dos alunos com deficiência não tem diagnósticos clínicos, psicológicos ou pedagógicos. As informações que sabem sobre estes alunos são repassadas pelas direções e coordenações das escolas, pelo próprio aluno ou por sua família e, de posse dessas informações é que eles sabem se o aluno pode, ou não, participar das aulas de Educação Física.

Isto pode ser evidenciado em algumas das falas dos participantes coletadas por meio do R1.

Eu sei que meus alunos não têm nenhum tipo de diagnóstico. O que sei deles é convivendo, perguntando para eles e lá de vem em quando para os pais. Mas que tem um monte de deficientes intelectuais lá tem (Maria).

Deveria ter sim porque tem alunos tem umas coisas que a gente não sabe. Mas na minha escola, diagnóstico é igual Papai Noel, não existe (Paulo).

Na minha escola não tem diagnóstico. Suspeitamos que uns alunos têm autismo, outros tem deficiência intelectual. Mas ninguém sabe de nada, os professores fazem as avaliações dos alunos, mas como conversamos eles não dão diagnóstico. E, no caso, dos meus alunos até conseguimos encaminhamentos com o psicólogo, mas adivinha? A família não levou (Carol).

Na minha escola tem do meu aluno com deficiência intelectual, só que não diz nada demais. Só que ele é Down. Isso ajuda em que? (Ana).

As falas das participantes Maria e Carol chamam atenção, pois acreditam que em suas escolas existem muitos alunos com deficiência intelectual. Novamente, lembrei que o diagnóstico da deficiência intelectual deve ser feito por uma equipe multiprofissional com condições de avaliar o aluno em sua totalidade e definir condutas a serem tomadas e os encaminhamentos necessários. Com essa sistemática de trabalho em equipe, é bem mais fácil a orientação da família que, após entender as potencialidades do filho e suas necessidades, poderá participar e cooperar nos tratamentos propostos e também das atividades desenvolvidas na escola ou nas aulas de Educação Física (MILANEZ, 2008).

As discussões sobre a questão de diagnósticos entre os participantes do Programa provocaram grandes reflexões e questionamentos, uma vez que os diagnósticos requerem estudos sistematizados do aluno, com uso ou não de instrumentos específicos, geralmente realizados por médicos, psicólogos, terapeutas, professores, fisioterapeutas, assistentes sociais, dentre outros. Estes diagnósticos consistem numa série de inferências que precisam ser cuidadosamente formuladas. Tais inferências estão condicionadas à forma pela qual os profissionais organizam e estruturam os diagnósticos, que influenciarão, positiva ou negativamente, na vida do aluno, da família e da escola.

Assim, surgiram alguns novos questionamentos: o que a escola entende por diagnóstico? Como está acontecendo os diagnósticos dos alunos com deficiência nas escolas? Quais profissionais estão envolvidos? Os alunos que tem deficiências visíveis não precisam de diagnósticos clínicos, psicológicos ou pedagógicos? Quais as consequências na vida de um aluno com diagnósticos errôneos no ambiente escolar? Os diagnósticos baseados no modelo médico são imprescindíveis ou influenciam nas práticas pedagógicas dos professores?

Estas questões relatadas pelos participantes ficaram sem respostas, mas comentei que podem ser sinais para construção de pesquisas, busca de respostas e ações que modifiquem

um pouco nossos entendimentos sobre os diagnósticos como “salvadores”133 ou responsáveis pelas nossas práticas. Lembrei-os da fala de Ana ao relatar que seu aluno tem diagnóstico de Síndrome de Down, mas que isso não auxilia em suas práticas. O diagnóstico auxilia que os alunos com deficiência tenham seus direitos garantidos, ainda mais depois da delimitação do PAEE, auxilia que as famílias, as escolas e os professores saibam a especificidade que o filho/aluno tem e busquem informações a respeito, mas isso, necessariamente, não garante que as ações cotidianas das pessoas e dos professores sejam inclusivas.

Destaco que para as discussões sobre os conceitos e tipos de deficiências versus diagnósticos, o horário do quarto encontro foi estendido a pedido dos próprios participantes do Programa, que se mostraram dispostos e empolgados em finalizar está temática naquele dia. Deste modo, o quarto encontro em vez de ser finalizado as 21h, como de costume, foi finalizado as 22:30h.

Como havíamos finalizados os quatro encontros correspondentes a fase 2 do Programa (fase de discussões e reflexões sobre inclusão), no encontro subsequente já iniciaríamos a fase 3 referente as vivências de práticas para alunos com deficiências nas aulas de Educação Física.

Todavia, os participantes pontuaram que seria interessante primeiramente discutir o que deve ou não ser modificado nas aulas de Educação Física visando atender as simultâneas demandas dos alunos com e sem deficiências, bem como quais conteúdos devem permanecer, quais conteúdos devem ser introduzidos ou ainda alterados, de forma a contemplar as necessidades de todos os alunos envolvidos no processo educativo.

Estas novas aspirações dos participantes do Programa me pareceram muito pertinentes e, mesmo modificando a estrutura inicial proposta para o Programa de Formação Continuada (Quadro 2) não alteraria os objetivos iniciais traçados, contribuir para a construção de saberes sobre inclusão de alunos com deficiência nas aulas de Educação Física.

Desta maneira, para o quinto encontro, decidimos que conversaríamos sobre as estratégias de ensino que devem ou não ser modificadas de forma a atender os alunos com deficiências nas aulas de Educação Física, sem, no entanto, comprometer o envolvimento/participação dos demais alunos. Logo após estas discussões, realizaríamos vivências de algumas práticas pedagógicas inclusivas nas aulas de Educação Física.

4.5 FASE 3: DISCUTINDO E VIVENCIANDO PRÁTICAS PARA ALUNOS COM E SEM DEFICIÊNCIA NA EDUCAÇÃO FÍSICA

Para balizar as discussões do quinto encontro lancei o seguinte questionamento: o que o professor de Educação Física deve fazer para que os alunos com deficiência sejam incluídos nas aulas de Educação Física?

As respostas dos participantes estão expressas no Quadro 9.