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Grafico 5 Ranking sobre Educação – UNESCO 2011

4.4 TEMAS GERADORES

Uma concepção metodológica voltada para a formação inicial e continuada, principalmente a rural, alicerçada em uma organização curricular integradora pode possibilitar uma reestruturação no tempo e no espaço educativo. A pedagogia da alternância, metodologia essa utilizada na organização curricular do curso de FIC-PPCO, parece potencializar esse processo de formação, uma vez que no planejamento pedagógico são contemplados temas

geradores que trazem questões da vida da comunidade pesqueira, contribuindo para que os pescadores entendam e atuem sobre quem eles são, sobre o que pensam, o que falam e como agem.

É importante observar que o Projeto de Curso de FIC-PPCO, ao apresentar como instrumento metodológico a pedagogia da alternância, leva em consideração que o aluno terá pelo menos um dia de aula presencial (teórica ou prática) e os dias restantes da semana terá para efetuar as pesquisas exigidas para cada tema tratado em cada alternância, ao longo do curso. Sendo assim, os temas contemplados são: “o jovem e a pedagogia da alternância: comunidade pesqueira”; “saúde e segurança do trabalho na atividade pesqueira”; “agregação de valor na atividade pesqueira”; “boas práticas de fabricação”; “conservação, congelamento e armazenamento”; “embalagens”; “manipulação de peixes”; “manipulação de camarões”; “elaboração de produtos”; “aproveitamento de resíduos e subprodutos”; “tratamento de resíduos e efluentes”; “legislação”; “cooperativismo e associativismo”; “empreendedorismo e gestão de negócios”; bem como “mercado (‘marketing’)”. Todos os temas apresentados são pertinentes ao fazer pesqueiro e à convivência comunitária do grupo de pesca. Interessante notar que com o método da alternância, além da sala de aula, as aulas ocorrem também fora da escola, e dentro da comunidade pesqueira. Dessa maneira, o cotidiano, a família, o tempo, o espaço comunitário são fatores que influenciam na produção do conhecimento e contribuem para a aprendizagem.

Para Alves ([2001] 2008), a educação deve ser vista como um caminho e como um percurso. Assim, o caminho segregado das experiências de vida de quem o percorre é apenas “uma proposta de trajeto, não um projeto, muito menos o nosso próprio projeto de vida.” (ALVES, [2001] 2008, p. 10). Ao que se acrescenta, somente por meio do estudo do discurso pode-se abarcar a exterioridade da língua, permitindo assim que os olhares se voltem de fora para dentro, mas também de dentro para fora, indissociavelmente. E nessa ação, histórias são construídas, sujeitos se historicizam.

Sabe-se do papel social da escola e os profissionais que nela atuam se esforçam para que o conhecimento seja fomentado. Porém, elas são tecidas por programas de ensino, burocraticamente formulados por uma maneira quase engessada. O Projeto Cambira, ao apresentar um Projeto de Curso voltado para temas geradores leva em consideração o conhecimento crescendo a partir das experiências da comunidade pesqueira.

O Plano de Curso do Projeto Cambira foi elaborado pensando-se também na convivência diária entre os membros de uma mesma comunidade e no aprendizado em conjunto que esse grupo pode adquirir. Em outras palavras, a aprendizagem tem que fazer sentido para

os alunos. É justamente isso que o curso de FIC-PPCO busca executar, por meio dos temas geradores, isto é, uma formação que seja voltada à realidade dos alunos e que produza saberes, técnicos ou não, que possam ser somados aos saberes adquiridos ao longo da vida. É o relacionamento diário, a convivência mútua, também na escola, que abre espaço para o novo e para a aquisição de novos saberes. Não que todo o conhecimento adquirido tenha que perpassar os programas curriculares. O que se entende aqui é que para além dos programas escolares, os estudantes têm conhecimentos que também devem ser levados em consideração no processo de ensino e aprendizagem. É importante lembrar que o encantamento que os seres humanos têm em aprender pode estar estritamente ligado ao interesse que neles é despertado sobre determinado assunto. Assim, há o que a comunidade pesqueira já faz no seu cotidiano e há aquilo que ela não sabe, mas que a convivência com o outro pode contribuir para que ela aprenda.

Nessa ótica, há os saberes que a comunidade pesqueira já domina no fazer diário, mas há ainda “as coisas a saber36”, que ela ainda desconhece e por consequência disso, não aplica no seu dia-a-dia. Com efeito, o que ainda não é executado é que pode abrir para a possibilidade do novo. Em outras palavras, aquilo que, nessa convivência entre as pescadoras, tanto na comunidade pesqueira, quanto no âmbito escolar, com seus pares, com aqueles que partilham do mesmo ambiente, pode ser trocado em forma de experiências.

Partindo dessa linha de raciocínio, pergunta-se para que se aprende aquilo que se aprende na escola? Qual é a origem do estatuto da legitimidade da aprendizagem que ocorre em sala de aula? Será que sempre se ensinou dessa maneira é uma resposta apropriada? Existe um dizer recorrente no âmbito pedagógico de que a escola toma o sujeito como alguém com grau zero de conhecimento e que deve frequentar os bancos escolares para receber o saber legitimado e então transformar-se em alguém que sabe, somente após o contato com o professor.

Porém, o Projeto Cambira expõe uma proposta que, ao apresentar os temas geradores, leva em consideração os saberes das pescadoras. Os temas abordados não são alheios à realidade do aluno, ou seja, não desconsideram o aluno, ao contrário, enaltecem o conhecimento da comunidade envolvida. Assim, o material pedagógico é pensado a partir do sujeito que aprenderá um tema de seu interesse, o que pressupõe um processo de inscrição e em efeito de deriva do funcionamento autoritário do discurso, para um efeito, pelo menos polêmico,

36 Termo formulado por Pêcheux (1990) na obra O discurso: estrutura ou acontecimento que se refere a “(...) descrições de situações, de sintomas e de atos associados às ameaças multiformes de um real do qual ‘ninguém pode ignorar a lei’”. Ou seja, um já-lá interdiscursivo: conhecimentos gerais, situações, ações, personagens e comportamentos que podem ser seguidos ou devem ser evitados, que visam homogeneizar o mundo.

uma vez que continua sendo um material pedagógico. O tema já é constituinte do sujeito que frequentará a sala de aula.