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Tentativas de ensinar a escrever na graduação

Currículo e ensino da escrita

3. Tentativas de ensinar a escrever na graduação

Como já mencionado neste texto, o currículo atual vem sendo objeto de estudos sistemáticos na Faculdade de Educação, com vistas à sua reformulação. No que se refere ao objeto específico da minha pesquisa – a relação dos licenciandos de Pedagogia com a escrita e o seu ensino – trabalho com o pressuposto de que as intervenções necessárias dar-se-iam fundamentalmente no âmbito da experiência dos estudantes com a escrita. Antes, porém, de buscar soluções para além da oferta de disciplinas que têm como objeto o domínio da escrita por parte dos licen- ciandos, considero relevante apresentar investigação que realizei sobre tal estratégia.

Tomo por base estudo de Camargo (2009), em que analisa programas de disciplinas voltadas para a superação de dificuldades de escrita de estu- dantes universitários. Nos termos do autor:

[...] buscou-se mapear a oferta de Língua Portuguesa por diferentes

IES7; verificar as razões que levam à oferta da disciplina em curso

não específico da área da linguagem; examinar as propostas de ensi- no, identificando o caráter predominante e suas concepções de lingua- gem e de formação acadêmica. (CAMARGO, 2009, p.7)

Com base nas tabelas de classificação de áreas de conhecimento do CNPq8 e da FAPESP9, o autor trabalhou com o seguinte universo de áreas e cursos: Ciências Sociais Aplicadas (Administração, Ciências Contábeis, Ciências Econômicas, Direito e Arquitetura e Urbanismo); Engenharias (Engenharia Civil, Engenharia Elétrica e Engenharia Mecânica), Ciências Humanas (Ciências Sociais, História, Geografia e Psicologia) e Ciências da Saúde (Medicina, Enfermagem, Farmácia e Odontologia). As IES foram classificadas em públicas, privadas com fins lucrativos e privadas sem fins lucrativos.

Valendo-se da análise de conteúdo dos programas e/ou ementas das disciplinas, o autor as classifica de acordo com três vertentes: (a)

reparadora, que busca suprir déficits da formação básica dos estu-

dantes; (b) instrumental, voltada para a preparação específica para 7 Instituições de Ensino Superior.

8 Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. 9 Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.

as práticas textuais da área profissional dos cursos; e (c) discursivo-

textual, com ênfase no discurso e no texto em seus dimensionamentos

acadêmicos e sociais.

Duas conclusões do estudo merecem destaque: a de que a oferta tende a ser maior nas universidades privadas do que nas públicas e a de que, embora haja superposições de vertentes, a de cunho instrumental predo- mina, com 58.7% de incidência nos programas analisados.

Para o presente estudo, considerei apenas as universidades públicas e seus cursos de Pedagogia. Trabalhei com as seguintes informações sobre as disciplinas: nome, carga horária, periodização na grade e caráter obrigatório/eletivo. Excluí do universo disciplinas cujos nomes apontassem inequivocamente para o estudo da didática da Língua Portuguesa.

Levantamento realizado nos sítios eletrônicos das IES10 registrou um total de 77 unidades que oferecem curso de Pedagogia, das quais 42 (54,5%) oferecem disciplinas, conforme quadro a seguir:

QUADRO 1 - DISTRIBUIÇÃO DAS DISCIPLINAS POR REGIÃO GEOGRÁFICA

Região IES IES que têm disciplinas Percentual por região Disciplinas por região Percentual do total nacional Obrigatórias Percentual do total regional Optativas Percentual do total regional Centro -oeste 8 4 50% 5 9,6% 5 100% 0 0 Nordeste 25 16 64% 17 32,7% 7 41% 10 59% Norte 9 5 55% 5 9,6% 5 100% 0 0 Sudeste 23 13 56% 20 38,5% 14 77,7% 6 22,3% Sul 12 4 30% 5 9,6% 2 40% 3 60% Total 77 42 54,5% 52 100% 33 63,5% 19 36,5%

Chama atenção o fato de que praticamente a metade das IES (44,5%) não oferece qualquer disciplina, percentual que varia mais no Sudeste, onde apenas 30% (-14,5%) oferecem disciplinas, e no Nordeste, com oferta em 64% (+19,5%).

No caso das disciplinas de caráter obrigatório, que representam em média 63,5%, vale observar que o percentual é construído por dois blocos: de um lado, Centro-Oeste (100%), Norte (100%) e Sudeste (77%), e, de outro, Nordeste (41%) e Sul (40%).

A partir dos nomes das disciplinas, constituí quatro categorias de classificação - (1) Estudos de Língua Portuguesa; (2) Produção textual; (3) Leitura e Produção textual; e (4) Leitura -, assim distribuídas.

QUADRO 2 – DISTRIBUIÇÃO DAS DISCIPLINAS POR OBJETO DE ESTUDO

Disciplinas Total Percentual Obrigatórias Percentual Optativas Percentual (1) Estudos de Língua Portuguesa 25 48% 17 68% 8 32% (2) Produção Textual 6 11,5% 3 50% 3 50% (3) Leitura e Produção textual 20 38,5% 12 60% 8 40% (4) Leitura 1 2% 1 100% 0 0

Embora sejam classificações generalizadoras e demandem cautela com as inferências que nelas se apoiem, sua distribuição aponta para um investimento maior em estudos de Língua Portuguesa, o que sugere um alinhamento com a vertente reparadora (CAMARGO, 2009) em 48% do total, sendo 68% delas de caráter obrigatório, ou seja, 32% do total.

A seguir, vem a opção pela abordagem de leitura e produção textual, que remete a uma denominação frequente na vertente à qual Camargo chamou de discursivo-textual, mas que pode também representar uma escolha lexical mais adequada à defesa do chamado letramento acadêmico.

Por fim, temos apenas seis disciplinas, metade de caráter optativo, que adotam nomes que remetem exclusivamente ao ensino da escrita, o que representa 11,5% do total geral e apenas 9% do total de obrigatórias.

Na grade do curso de Pedagogia da UFRJ não há nenhuma disci- plina obrigatória que possa ser enquadrada em alguma das classificações aqui adotadas. Dentre as optativas, há Atualização de Conteúdo em Língua

Portuguesa, a indicar um alinhamento com o primeiro tipo, e Leitura e produção de Textos em Educação, classificável no segundo e no terceiro.

Nas versões curriculares anteriores, existia a disciplina Português Instru-

mental, cuja ementa apontava para um trabalho específico e formal com os

hoje chamados gêneros acadêmicos. Na segunda versão curricular (1992- 2007), havia Construção do Conhecimento em Língua Portuguesa I e II, destinadas a discutir o ensino e a aprendizagem de língua materna.