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A Teoria do Ciclo de Vida Organizacional aborda a concepção dos estágios de maturidade de uma empresa (MILLER E FRIESEN, 1984), viabilizando-se como alternativa para melhor compreender as escolhas das fontes de financiamento pelas pequenas empresas em seus respectivos estágios.

Os estudos relacionados à estrutura de capital possuem pressupostos voltados a um processo de continuidade da empresa, muitas vezes ignorando as diversas fases que as organizações possuem em seus ciclos de vida (MAC AN BHAIRD, 2010). Desconsideram, igualmente, que essas empresas podem permanecer por muito tempo como pequeno negócio, sobretudo diante de problemas financeiros (CABRAL E MATA, 2003; ANGELINI E GENERALE, 2008).

A teoria prediz que as empresas possuem fases durante sua existência, e cada fase requer diferentes características para tomada de decisão. Não se opõe às abordagens clássicas, como a static trade-off e pecking order, mas, sim, como uma que contempla características inerentes à estrutura de capital, às teorias econômicas e, até mesmo, ao ciclo biológico de amadurecimento.

A Teoria do Ciclo de Vida afirma que as decisões financeiras tomadas cumulativamente dão robustez à definição da estrutura de capital das organizações, adequando-se ao contexto das micro e pequenas empresas em função de estas, muitas vezes, não possuírem objetivo de tomar recursos para realização de investimentos, mas, sim, de financiamento de curto prazo ou capital de giro, a fim de manter sua sustentabilidade.

Embora seja sabido que a quantidade de estágios pode variar de acordo com a literatura (D’AMBOISE E MULDOWNEY, 1988; POUTZIOURIS, 2003; MAC AN BHAIRD, 2010), é comumente verificada a classificação das organizações quanto ao seu ciclo em quatro estágios: (1) Criação/Nascimento; (2) Crescimento; (3) Maturidade e (4) Declínio ou Renascimento (STEPANYAN, 2012). Em cada uma dessas fases, a literatura apresenta quais as fontes de recursos mais comuns. A obra de Weston e Brigham (1981) apresenta cada estágio com as respectivas origens de financiamento, conforme Tabela 1.

Tabela 1 - Ciclo de Vida Financeira da Firma

Estágio Fontes de Financiamento Início Recursos dos Proprietários

Crescimento 1 Recursos listados acima, mais: Lucros Retidos, Crédito do Mercado, Empréstimos Bancários e Cheque Especial

Crescimento 2 Recursos listados acima, mais: Financiamentos de Longo Prazo de Instituições Financeiras

Crescimento 3 Recursos listados acima, mais: Emissão de Títulos em Mercado

Maturidade Todos os recursos disponíveis

Declínio Retiradas de financiamento: Recompra de Ações, Liquidação.

Fonte: Adaptado de Weston e Brigham (1981)

É possível observar que, a cada estágio de crescimento, a empresa possui alternativas de financiamentos que são crescentes quanto ao grau de exigibilidade de transparência das informações. Quanto mais jovem a empresa, mais opaca é a evidenciação das informações, tornando-se arriscado para instituições e outros atores fornecerem recursos a baixo custo. Logo, uma empresa que inicia seu negócio possui dificuldades em obter financiamentos devido à sua falta de transparência (HUYGHEBAERT E VAN DE GUCHT, 2007). Tal fato pode corroborar a ideia de que o principal problema das empresas, quando de seu início, é a existência da assimetria de informação, como discutido por Akerlof (1970).

Berger e Udell (1998) apresentam de forma ilustrada uma generalização das características de financiamento das empresas ao longo de seus estágios (Figura 2).

Figura 2 - Fontes de Recursos e Continuidade das Empresas

Fonte: Berger e Udell (1998).

Apercebe-se ser comum o início das pequenas empresas com recursos do proprietário e de seus conhecidos, como parentes e amigos, e que, ao longo do tempo, tais fontes passem a ser gradualmente menos utilizadas. Embora os autores expliquem que essa representação é genérica e não pode ser aplicável a todas empresas, ela expressa uma contextualização do que é comum ocorrer. Afinal, não é raro que empresas venham a obter fontes de financiamento diferentes das previstas para o estágio às quais pertencem. Essa sintetização, ainda de acordo com os autores (BERGER E UDELL, 1998), dá apenas ênfase às fontes que podem tornar-se mais importantes ou obterem mais destaque a cada fase.

As fontes iniciais caracterizam-se pelos recursos internos, podendo ser compostas por família e amigos; posteriormente, recorre-se a recursos externos, que podem ser de dívidas (debt), como oriundos de bancos e demais instituições financeiras, ou de capital próprio (equity), como venture capital.

Mac an Bhaird (2010) assevera que, nas empresas analisadas, é possível verificar uma tendência a Pecking Order Theory, haja vista que, ao longo do tempo, as empresas procuram usar, de forma prioritária, os lucros retidos. Secundariamente, vê-se que a fonte de recurso oriunda de empréstimos de curto prazo também se apresenta de forma significativa, novamente corroborando a Pecking Order.

A fim de identificar os resultados encontrados pelo autor, observe-se a Figura 3. Figura 3 - Ciclo Financeiro das Organizações

Fonte: Mac an Bhaird (2010)

No gráfico, a fonte inicial das empresas é comumente recursos de conexões próximas ao proprietário. As fontes costumam apresentar-se mais robustas à medida que os ciclos mudam. Tal assertiva foi testada nesse estudo e está contemplada na hipótese 3 (ver item 2.5).

Berger e Udell (1998) sustentam que, por causa da opacidade da informação contábil e da dificuldade de obtenção dos recursos externos (consequência da própria opacidade), as empresas recorrem aos recursos pessoais e de seus próximos no primeiro estágio. Esse período

é representado pela fase “bem inicial”, geralmente quando a empresa ainda está desenvolvendo o produto ou o conceito do negócio. No entanto, o resultado da pesquisa realizada por Mac an Bhaird (2010), demonstrado na Figura 3, expõe a utilização desta fonte ao longo do tempo, inclusive em empresas com mais de 30 anos, sendo ela representante, quase que de forma constante, de 10% dos recursos utilizados. O presente estudo analisa tal situação aplicada ao seu objeto, por meio da hipótese 3.

A Teoria do Ciclo de Vida, além de abordar os aspectos financeiros ao longo de suas fases, aborda os aspectos gerenciais, como a própria gestão e estratégia das empresas.

Assim como há uma tendência de utilização de fontes de financiamento mais robustas e formais à medida que a organização cresce, a teoria prediz uma tendência similar para as práticas gerenciais de contabilidade. Embora a classificação das abordagens do ciclo de vida organizacional varie significativamente, a mais conhecida é a de Miller e Friesen (1984), denominada Modelo Tradicional do Ciclo de Vida Organizacional (nascimento, crescimento, maturidade, renascimento, declínio). Abordagens alternativas, como o Modelo de Evolução Corporativa do Ciclo de Vida (Corporate Evolution Life Cycle Model), vêm surgindo a fim de suprir lacunas do modelo tradicional.

A relação do modelo tradicional às práticas gerenciais de contabilidade teve destaque através do trabalho de Moores e Yuen (2001), que comprovou ocorrer uma maior formalização das práticas gerenciais de contabilidade quando as organizações vão ficando mais maduras, ou quando ocorrem as mudanças de estágios (a hipótese 1 desse estudo testa a relação entre o tamanho e a adoção das práticas gerenciais de contabilidade – ver item 2.5). Sandino (2007), por exemplo, identificou que a escolha para adoção das práticas de gestão e controle está associada à estratégia seguida pela organização e também à sua estrutura. Não somente, o aumento do nível de utilização das práticas gerenciais de contabilidade pode estar associado às demandas surgidas pelas próprias escolhas de financiamento (ou mudanças nessas escolhas), Instituições financeiras tendem a exigir mais informações ou mesmo melhor gestão das organizações. Por isso, as práticas estariam associadas ao estágio em que a empresa se encontra e à escolha de financiamento (LOPEZ E HIEBL, 2015). Essa assertiva é testada por esse estudo na hipótese 7 (ver item 2.5).

Já o modelo disseminado por Victor e Boyton (1998), o Corporate Evolution Life Cycle Model, divide os estágios segundo as seguintes características: trabalho manual (craft work) no estágio inicial da organização; produção em massa (mass production); melhoria de processos (process enhancement); personalização/customização em massa (mass customization); co-

configuração e renovação (co-configuration and renewal). Os estágios evolutivos preditos nesse modelo são mais aplicáveis para empresas consideradas new economy firms (NEF) ou empresas de nova economia, como start-ups, empresas de tecnologia, empresas dot.com e da área biomédica. Segundo Granlund e Taipaleenmäki (2005), as chamadas NEFs costumam crescer numa velocidade maior se comparadas às empresas tradicionais, e passam por processos de amadurecimento mais rapidamente, inclusive nos processos de controle e planejamento da organização, como evidenciado pelos autores.

Figura 4 - Comparação entre Modelos de Ciclo de Vida

Fonte: Granlund e Taipaleenmäki (2005).

Apesar das variações do modelo do ciclo de vida das organizações, o presente estudo foca na abordagem tradicional, tendo em vista que seu objeto é composto por empresas que possuem processo produtivo no setor de confecções, campo de atuação tradicional, sem a predominância de características inovadoras.