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2.2 Comunicação

2.2.2 Principais teorias da comunicação

2.2.2.9 Teoria da Ação Comunicativa de Habermas

A teoria da Ação Comunicativa de Habermas nasce da necessidade de explicar alguns fenômenos da sociedade, como o processo de interação, sem o reducionismo da racionalidade científica. A racionalidade científica sempre se preocupou em explicar os fenômenos sem a interferência de valores e processos culturais, através da relação meio e fins e, portanto, acabou afastando da razão as questões sociais subjetivas (HABERMAS, 1989). Assim, o desenvolvimento científico e tecnológico tem alcançado grandes patamares de crescimento, enquanto as perspectivas humanas têm constatado um atraso nos estudos de algumas de suas questões essenciais. Essa seja talvez a causa de muitos problemas enfrentados pela sociedade de hoje (GONÇALVES, 1999). Diante deste cenário, Habermas, defendendo que a

racionalidade científica não consegue oferecer respostas completas a esse tipo de questão, criou o conceito de racionalidade comunicativa. A racionalidade comunicativa nasce da lógica que as relações sociais são resultado de uma negociação em busca de um consenso. Desta forma, o agir comunicativo, “significa a construção de uma estrutura comunicacional orientada para o entendimento e a busca de consenso” (CARDOSO e FOSSA, 2008).

Dentro dessa lógica, Habermas (1989) defende o uso da abordagem hermenêutica que considera a linguagem como a forma de chegar à compreensão conjunta sobre algo. Assim, a hermenêutica se preocupa com a análise de uma mensagem que pode servir tanto para a expressão da intenção de um falante ou para o estabelecimento de uma relação interpessoal como para expressar algo sobre o mundo. Logo, a comunicação possui três funções essenciais no meio social: “a) a função de reprodução cultural ou da presentificação das tradições; b) a função da integração social ou da coordenação do plano de diferentes atores na interação social, e c) a função de socialização da interpretação cultural das necessidades” (HABERMAS, 1989, p. 41). O foco da teoria do agir comunicativo de Habermas foi centralizado na função “b)”, onde a integração através da interação se torna o foco principal.

Para alcançar a relação dialógica baseada na argumentação proposta por Habermas, os integrantes da comunicação devem possuir uma atitude performativa. Atitude performativa significa uma participação ativa no processo de comunicação. Dessa forma, ao receber uma mensagem, o indivíduo com essa atitude tem por objetivo não somente analisar se está ou não de acordo com a mesma, mas sim tentar entender a verdade sobre os argumentos propostos pelo emissor. Devido a isso, o receptor sai do posto de observador para se envolver com o processo de negociação da verdade do assunto abordado. Nessa lógica, a comunicação não é dominada pelo emissor, mas sim construída pelo emissor e receptor que se envolvem através da argumentação crítica num processo de construção de consenso sobre a realidade. Afinal, “compreender o que é dito exige a participação e não a mera observação” (HABERMAS, 1989, p. 44). Logo, o emissor e o receptor se encontram num nível de igualdade, onde “não há nada que permita decidir a priori quem tem de aprender de quem” (HABERMAS, 1989, p. 43). Mas, como argumenta Habermas, na vida cotidiana, estamos, com mais frequência, de acordo ou em desacordo, do que realmente tentando encontrar a verdade sobre as preposições. Portanto, as pretensões de verdade, pretensões de correção e pretensões de sinceridade, são aspectos fundamentais da teoria da ação comunicativa. Elas podem ser alcançadas através da argumentação entre os participantes de um ato de comunicação. Uma vez que, a argumentação é fundamental para coordenar as intenções individuais e para chegar a uma decisão comum. Todos precisam se convencer que a decisão comum é igualmente boa para

todos. Por este motivo, o agir comunicativo deve evitar que alguns sugiram aquilo que é bom somente para seus interesses, neutralizando os desequilíbrios de poder para garantir a igualdade de opiniões a todos. Já que o discurso prático busca o equilíbrio e a conciliação entre interesses individuais e antagônicos. Porém, neste aspecto, parece haver um pouco de utopia do autor. É difícil imaginar um diálogo onde os indivíduos que possuem mais poder não consigam dar mais peso às suas opiniões ou sugestões. Assim como o cientista mais famoso será ouvido com mais atenção e credibilidade, o diretor da empresa também receberá mais destaque ao argumentar uma ideia. Concorda-se que esta não é a situação ideal, mas é como os grupos sociais costumam agir.

Ciente disso, Habermas (1989, p. 115) afirma que:

Visto que os discursos estão submetidos às limitações do espaço e do tempo e têm lugar em contextos sociais; visto que os participantes de argumentações não são caracteres inteligíveis e também são movidos por outros motivos além do único aceitável, que é o da busca cooperativa da verdade; visto que os temas e as contribuições têm que ser ordenadas, as relevâncias asseguradas, as competências avaliadas; é preciso dispositivos institucionais a fim de neutralizar as operações empíricas inevitáveis e as influências externas e internas evitáveis, de tal sorte que as condições idealizadas, já sempre supostas pelo participante de argumentação, possam ser preenchidas pelo menos numa aproximação suficiente.

Dessa forma, o autor defende que, embora a livre argumentação em busca da verdade nem sempre seja a realidade ativa dentro dos grupos organizacionais, devido a diversos outros interesses que interferem nesse processo, essa é a realidade que deve ser buscada e, para isso, alguns dispositivos organizacionais precisam ser criados. Tanto em empresas como em instituições, não há como não reconhecer a riqueza resultante de um diálogo baseado na boa argumentação, na igualdade de participação dos indivíduos e na busca do bem comum. Uma atitude nesse sentido auxilia todos os indivíduos do processo a se sentirem parte integrante e importante do grupo, além de produzir um amadurecimento dos temas mais relevantes que dizem respeito à organização. A busca pela igualdade não significa harmonia de vontades, mas abertura para o entendimento e a negociação sem recorrer a elementos de coesão. Para analisar esse processo dentro de empresas, nas quais não se pode ignorar a questão do poder, há a possibilidade de refletir que o incentivo para a criação desse ambiente de discussão democrática possa ser criado pela liderança, a qual, através de seu posicionamento, serve como exemplo e referência de ação. Assim, no momento em que a liderança abre espaço e incentiva todos a se envolverem em processos de tomadas de decisão, num ambiente orientado para a participação, isso pode passar a se concretizar como uma prática social ativa.

Diante disso, Cardoso e Fossa (2008) comentam que cada vez mais os processos comunicativos contribuem para o desenvolvimento de formas de relações mais participativas, dando flexibilidade às organizações para viverem processos de mudança e adaptações e facilitando sua interação social. Essa flexibilidade, no momento atual da sociedade, está se tornando peça chave para a sobrevivência das organizações no mundo globalizado. Nesse sentido, Cardoso (2006) alerta também para a prática do agir comunicativo na elaboração das estratégias das organizações, que, segundo ele, não devem mais ser um exercício de previsão conduzido por um pequeno grupo, mas sim um processo engajando todos os participantes da organização. Assim, através da comunicação “as pessoas e grupos expressam o sentido que querem dar a sua ação” (CARDOSO e FOSSA, 2008).

A teoria da Ação Comunicativa de Habermas suscita a lógica de que “o homem não reage simplesmente a estímulos do meio, mas atribui um sentido às suas ações e, graças à linguagem, é capaz de comunicar percepções e desejos, intenções, expectativas e pensamentos” (GONÇALVES, 1999). Esse raciocínio abandona a abordagem mecanicista do processo de comunicação que se praticava, onde o trabalhador possuía uma atitude de receptor-observador, sem a possibilidade de resposta e argumentação. Dessa forma, seus desejos, vontades e expectativas nunca eram expressos e se transformavam em sentimentos de desmotivação, desânimo ou revolta. Neste sentido, junto com a teoria da ação comunicativa surge a possibilidade de abordar o trabalhador de uma forma inteiramente nova, suprindo suas necessidades de interação e participação.