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1. Importância das LMELT

1.2. Modelos explicativos da etiopatogénese das LMEMSLT

1.2.4. Teoria da Sobrecarga

A aplicação de força implica a existência de um exercício físico, de uma carga de trabalho, enquanto o termo sobrecarga pressupõe uma aplicação de força que excede o limite de tolerância interna do tecido ou dos seus componentes. Todas as actividades físicas requerem que seja gerada ou aplicada força na passagem de uma posição (postura) a outra (movimento) durante um determinado período de tempo (duração). Assim, a sobrecarga é uma função da força, da duração, da postura e do movimento. Estas variáveis constituem entidades complexas que podem ser apresentadas com maior detalhe:

a) Força

Existem alguns estudos dos quais se destaca o de Silverstein e outros (Silverstein; Fine; Armstrong, 1987) que demonstram inequivocamente uma forte associação entre a aplicação de força e a presença de LMELT. Os dados estatísticos, por exemplo do Canadá no ano de 1991, referem que, de todas as LMELT, cerca de 48% são devidas a aplicações de força consideradas elevadas (CCOSH, 1991).

As LMELT, por exemplo a nível da região cervical e dos ombros, estão associadas às exigências de contracção muscular proveniente de imposições do trabalho. Em particular lesões como a tendinite do supraespinhoso e as síndromes miofascial e do desfiladeiro torácico são referidas pela presença de fortes associações com situações de aplicação de força (Kumar, 1991).

A associação é suportada por dados objectivos, designadamente provenientes de intervenções nas situações de trabalho que, ao diminuírem as necessidades de aplicação de força, quer através da reconcepção, quer por alterações de ferramentas e utensílios, reduzem, igualmente, a incidência e a gravidade das LMELT a nível cervical e dos ombros (Kumar, 1991).

Um estudo de Silverstein e outros (Silverstein; Fine; Armstrong, 1986) evidenciou que, em actividades industriais, os postos de trabalho com baixas exigências de força e de repetitividade são os que apresentam a menor taxa de LMELT, enquanto os postos de elevadas exigências de força e de repetitividade apresentam índices de morbilidade por LMELT cerca de 30 vezes superiores. Esta constatação permitiu afirmar a relação com a exposição a estes factores de risco. Todos os restantes postos de trabalho, nomeadamente os que apresentam exigências, por exemplo de força elevada e baixa

repetitividade ou elevada repetitividade e baixa força, têm taxas de morbilidade entre os extremos referidos.

A aplicação de forças estáticas ou com contracção muscular repetitiva tem efeitos correspondentes de extensão ou alongamento a nível das microestruturas dos tendões, com compressão do epitendão, do peritendão e do endotendão (destaca-se a nível do peritendão a possível compressão da estrutura vascular). Como consequência verifica-se frequentemente isquémia, rotura das fibrilhas musculares e um processo inflamatório agudo consequente. Mais tarde ocorre a instalação crónica da doença.

Também o atrito existente entre as estruturas (tendão e bainha sinovial), quando a repetitividade é elevada, pode aumentar a probabilidade de génese de lesões a nível das bainhas dos tendões (tenossinovites).

As posturas fora dos ângulos intersegmentares de conforto, quer sejam estáticas ou repetidas, contribuem para a existência de degenerescência dos tendões e eventuais processos inflamatórios, o que determina uma cascata de compressão das microestruturas e ocasiona o aumento das exigências de força na realização da actividade. Estes factos apontam para a importância da resistência dos tecidos e a reforçá-lo sabe-se que as lesões ocorrem com maior frequência em situações de solicitação máxima.

Diferentes níveis de aplicação de força condicionam diferentes exigências fisiológicas. Rohmert (Rohmert, 1973a) demonstrou que as possibilidades de manutenção da contracção muscular dependem do nível de aplicação de força. Aplicações de força de nível inferior a 20% da força máxima voluntária (FMV) podem ser mantidas indefinidamente. Níveis de força mais elevada vão impedir que o afluxo normal de sangue se mantenha e, consequentemente, o aporte de nutrientes e oxigénio necessários às diferentes estruturas para a realização do trabalho. Por outro lado, esta oclusão também impede que se removam os catabolitos, o que pode por acumulação, por exemplo de ácido láctico, originar dor (Rohmert, 1973b).

Chaffin e outros (Chaffin; Herrin; Keyserling, 1978) verificaram que à medida que a exigência de força aumenta nos postos de trabalho, a incidência de casos de LMELT também aumenta. Apesar disso o conhecimento sobre esta matéria continua insuficiente para se determinar qual o nível de força que pode ser considerado “aceitável” ou de baixo risco.

Foi sugerido por Kumar e Mital que a percepção humana de um nível aceitável de trabalho pode permitir encontrar um equilíbrio entre os factores físicos e psicológicos a favor da manutenção de um equilíbrio a nível do organismo (Kumar; Mital, 1992b). Kumar e Simmonds (Kumar; Simmonds, 1992c) também referem que as pessoas subestimam as exigências de precisão, de força e de trabalho muscular abaixo dos 40% da FMV e sobrestimam as exigências de força acima desse valor. Desta forma é possível que a existência de um nível aceitável de trabalho (força), baseado na percepção individual, possa dar origem a um nível de aplicação de força cujo risco seja mínimo.

b) Duração do “trabalho” ou da aplicação de força:

A importância de uma variável aplicação de força que pode manter-se ou alterar-se ao longo do tempo de trabalho, está dependente dos tipos de contracção muscular existentes, da magnitude das contracções, dos períodos de recuperação e da repetitividade da actividade em questão.

Em qualquer actividade física existe um processo anaeróbio com depleção de ATP, fosfocreatina e glicogénio a partir das reservas musculares. Dependendo das circunstâncias pode iniciar-se de seguida o processo de glicólise aeróbia. Desta resposta metabólica verifica-se a produção e por vezes a acumulação de ácido láctico.

No período seguinte a um trabalho de intensidade elevada existe um reabastecimento de cerca de 70% das reservas em fosfocreatina e uma remoção de ácido láctico que se efectua em cerca de 30 segundos, enquanto o reabastecimento completo das reservas energéticas pode demorar cerca de 5 minutos (Astrand; Rodahl, 1986).

As situações de aplicação de força na realização da actividade de trabalho devem respeitar os tempos de actividade e de recuperação muscular no sentido de permitir a manutenção da capacidade de trabalho o que determina sempre a necessidade de avaliação do nível de força aplicada.

c) Postura e movimento na aplicação de força

A relação geométrica dos músculos, tendões e ossos numa articulação variam com o ângulo articular. Nos extremos da amplitude articular encontram-se as mais elevadas desvantagens mecânicas e fisiológicas. Os ângulos em que se verifica a proficuidade mecânica e fisiológica variam de articulação para articulação e situam-se, habitualmente, na posição mediana dessa amplitude que se designa zona neutra e à qual habitualmente corresponde a menor intensidade de aplicação de força.

Kumar (Kumar, 2001) considera que existe uma amplitude de aproximadamente 20º em torno da zona média articular que pode ser considerada a zona de conforto articular. Os afastamentos articulares da zona de conforto implicam um aumento da aplicação de força e um consequente aumento da probabilidade de ocorrer sobrecarga. De forma semelhante, gestos efectuados fora desta zona podem ser considerados de risco crescente devido à aplicação subjacente de força acrescida.