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Mas  a  Teoria  da  Modernização,  apesar  de  hegemónica,  não  dominou  incontestavelmente  o  campo  do  pensamento  sobre  o  desenvolvimento  durante  as  décadas de 1960 e 1970. Com efeito, com origem nos países do Sul, particularmente  na América Latina, uma outra corrente teórica emergiu e se consolidou durante este  período e adquiriu uma importância significativa nos países ditos subdesenvolvidos ou  que vinham de processos longos de colonização Ocidental: a Teoria da Dependência.  Aliás, se a Teoria e a Escola da Dependência foi, no início dos anos 1960, uma resposta  à  crise  do  Marxismo  ortodoxo  na  América  Latina,  o  seu  acolhimento  favorável  para  além das fronteiras da América Latina deveu‐se com certeza ao declínio que a Teoria  da Modernização vinha conhecendo, designadamente nos EUA (So, 1990). 

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  Brohman  (2001:23)  refere  que,  para  a  generalidade  dos  países  do  Sul,  a  Teoria  da  Modernização  conduziu a economias estagnadas, desigualdades agravadas e repressão política...

40 Nos últimos anos, de acordo com Brohman (2001:23‐25), há uma tentativa de recuperação em moldes  renovados da Teoria da Modernização, incorporando parte das críticas que lhe foram feitas durante os  anos 70, nomeadamente respondendo à crítica de i) desvio ideológico ocidentalista e à ii) adopção de  um evolucionismo determinista e formalista baseado na História ocidental. Neste sentido há tentativas  de  explorar  alternativas  conceptuais  à  dicotomia  tradicional‐moderno,  nomeadamente  alijando  o  conceito  de  modernização  do  seu  referente  formalista  e  do  conteúdo  ideológico  para  o  associar  à  capacidade de “transformação social” das diferentes sociedades (op. cit.: 25‐26).

A  sua  premissa  de  base  resulta  de  uma  ideia  desenvolvida  por  Paul  Baran  segundo a qual seria a participação na economia mundial capitalista – e, obviamente, o  modo  de  funcionamento  desta  –  o  factor  responsável  pelo  subdesenvolvimento  dos  países  periféricos,  e  que,  dentro  do  âmbito  da  economia  capitalista,  nenhum  país  periférico seria capaz de romper com a dependência que impede que se desenvolva de  modo similar aos países industrializados (Cendrero, 2008:49‐51). Daqui pode extrair‐se  uma segunda premissa, invariável apesar da diversidade de análises internas à Teoria  da Dependência, que é a de que são as influências externas que distorcem o processo  de desenvolvimentos dos países periféricos.   Na verdade, o contributo de Paul Baran, através de uma obra de 1959 que é  considerada  pioneira  da  teoria  e  da  escola  de  pensamento  da  dependência,  globalmente  permite  reabilitar  a  análise  marxista  do  desenvolvimento41,  salientando  que  esta  já  não  é  apenas  pertinente  para  descrever  as  consequências  do  desenvolvimento capitalista à escala mundial, o seu impacto no desenvolvimento das  forças produtivas e as suas implicações na construção de condições objectivas para o  advento  do  socialismo,  como  sustentavam  os  teóricos  marxistas  do  início  do  século  (Lenine, Rosa do Luxemburgo, Nikolai Bujarin ou Rudolf Hilferding, por exemplo), que  se tinham essencialmente debruçado sobre o desenvolvimento capitalista na sua fase  imperialista e sobre as suas repercussões na articulação e funcionamento da economia  mundial,  mas  que  a  análise  marxista  é  igualmente  pertinente  para  analisar  especificamente a condição de subdesenvolvimento que afectava designadamente os  países da América Latina. Este é verdadeiramente o grande contributo de Paul Baran  que em finais dos anos 1950 realiza, a partir de uma perspectiva económica marxista, a  análise da natureza dos países subdesenvolvidos e se envolve na busca das origens do  subdesenvolvimento.  Da mesma forma que pode afirmar‐se que a Escola da Modernização examina  o  desenvolvimento  do  ponto  de  vista  dos  EUA  e  de  outros  países  Ocidentais,  pode 

41  Outra  tradição  teórica  sob  a  qual  assenta  a  Escola  da  Dependência  principalmente  nas  suas  formulações dos anos 1960 e 1970, é o chamado neo‐marxismo uma vez que o sucesso das revoluções  chinesa (1949) e cubana (1959) ajudaram a disseminar uma nova forma de marxismo nas universidades  latino‐americanas,  dando  origem  a  uma  geração  de  “radicais”,  cujos  membros  se  designavam  a  si  mesmos de “neo‐marxistas”.

dizer‐se  que  a  Escola  da  Dependência  encara  o  desenvolvimento  a  partir  da  perspectiva  do  designado  Terceiro  Mundo  e,  como  pode  facilmente  perceber‐se,  a  atribuição  de  responsabilidades  ao  capitalismo  pela  condição  dos  países  subdesenvolvidos  implicou  necessariamente  que  a  perspectiva  desenvolvida  a  partir  destes países fosse no sentido de acentuar a necessidade de superação do capitalismo  como sistema económico e de ruptura com a economia mundial. Como sugere neste  sentido  Samir  Amin  (cit.  por  Cendrero,  2008:51),  o  desenvolvimento  desigual  a  que  estão sujeitos estes países impõe a interrupção da conexão com a economia mundial  como alternativa para que a periferia consiga alcançar um “desenvolvimento popular, 

nacional e autocentrado”, ou seja, primordialmente preocupado com a satisfação das 

necessidades  dos  sectores  populares,  “o  que  significa  ignorar  o  sistema  de  preços 

derivado  dos  intercâmbios  no  mercado,  capitalista,  mundial  e  estabelecer  outro  que  permita uma retribuição crescente dos produtores directos” (Amin, 1986 e 1988 cit. por 

Cendrero,  2008:51),  porque,  caso  contrário,  a  participação  na  economia  mundial  continuará a gerar a reprodução das disparidades entre centro e periferia capitalista.  Esta  análise,  que  supunha  a  ruptura  com  os  moldes  em  que  a  economia  mundial  estava estruturada, encontrava suporte na análise sócio‐histórica que mostrava como  os  processos  de  colonização,  a  partir  de  determinado  momento,  foram  também  processos  de  incorporação  das  periferias  na  economia  mundial  (e  de  constituição  verdadeiramente  de  uma  economia  mundializada)  e  de  como  o  subdesenvolvimento  havia sido uma consequência do modo como se havia procedido a esta incorporação.  Como  assinala  Cendrero  (2008:53),  esta  interpretação  é  marcada  por  um  certo  “determinismo mecanicista” que subjuga os factores internos dos países ao peso dos  factores externos, bem como, consequentemente, só possa ter como corolário lógico a  ideia de que a economia de alguns países (os periféricos) está dependente da evolução  e expansão da economia de outros (os centrais) e que a expansão e autosuficiência dos  países  periféricos  só  poderá  ocorrer  como  reflexo  da  expansão  e  autosuficiência  dos  países  centrais  e  nunca  como  um  caminho  próprio  ou,  nos  termos  em  que  o  coloca  Paul Sweezy (1968, cit. por Cendrero, 2008:54), “o desenvolvimento capitalista produz 

A  Teoria  da  Dependência  e  os  seus  arautos  emergem  na  América  Latina  no  início dos anos 1960 (cf. tb. Rist, 2001a) no momento que coincide com a resposta à  bancarrota  do  Programa  da  Comissão  Económica  das  Nações  Unidas  para  a  América  Latina (ECLA é o seu acrónimo anglosaxónico e CEPAL o seu acrónimo latino). E é sob a  égide  da  ECLA  que  alguns  teóricos,  de  forma  paralela  à  análise  marxista  do  subdesenvolvimento,  vão  trazer  contributos  importantes  para  a  Teoria  da  Dependência principalmente a partir da constatação das limitações das estratégias de  desenvolvimento ligadas à substituição das importações e de uma percepção cada vez  mais  céptica  acerca  da  natureza  do  desenvolvimento  capitalista  na  América  Latina.  Com  efeito,  a  formulação  de  uma  escola  de  desenvolvimento  distintivamente  latino‐ americana  está  intimamente  relacionada  com  a  ECLA.  Convém  recordar  que  nesta  época  a  doutrina  dominante  do  desenvolvimento  dos  países  não  industrializados  assentava  em  3  pilares:  i)  as  transferências  massivas  de  capital  nomeadamente  de  origem privada; ii) a exportação de matérias‐primas e iii) o livre jogo do mercado no  quadro da teoria das vantagens comparativas dos países (Rist, 2001a).  

 

Ora, os estudos da ECLA vêm mostrar que existe uma discrepância entre estes  princípios  e  as  situações  históricas  concretas,  nomeadamente,  i)  demonstrando  a  falácia  da  livre  troca  (e  da  teoria  das  vantagens  comparativas)  já  que  as  estruturas  económicas dos países industrializados são substancialmente distintas das dos países  com  economias  dominadas,  o  que  conduz  a  que  de  facto  a  troca  não  seja  livre,  mas  antes desigual, com claro favorecimento das economias centrais e, a longo prazo, com  uma  deterioração  dos  termos  das  trocas  em  prejuízo  dos  países  do  Sul  (idem, 

ibidem:185); ii) sugerindo que não seria necessário especializar os países periféricos no 

papel de exportadores de matérias‐primas, mas antes desenvolver aí algumas formas  de industrialização que permitissem substituir a grande dependência das importações  e do capital estrangeiro; iii) apelando a uma intervenção mais forte do Estado não só  para  prevenir  as  desigualdades,  através  por  exemplo  da  promoção  de  políticas  de  reforma agrária, mas também para coordenar a melhor repartição dos investimentos  e, ainda, iv) apelando a um reagrupamento económico regional. 

No  manifesto  da  ECLA,  Raul  Prebisch,  o  argentino  presidente  daquela  entidade que já havia sido criada em 1948, criticou o esquema de divisão internacional  do  trabalho,  acusando‐o  de  constituir  a  raiz  dos  problemas  de  desenvolvimento  da  América  Latina.  Na  sua  perspectiva,  a  estratégia  para  o  desenvolvimento  da  América  Latina  passava  por  acabar  com  a  lógica  de  produzir  apenas  alimentos  e  matérias‐ primas  e  receber  bens  transformados  dos  países  industrialmente  desenvolvidos  –  o  que  evidentemente  acarretava  implicações  negativas  na  acumulação  doméstica  de  capital – bem como por incentivar o processo de industrialização (o que não deixava  de  ser  uma  perspectiva  optimista  que  assentava  na  ideia  de  que  as  várias  características de uma sociedade subdesenvolvida desapareceriam com o processo de  industrialização).   A abordagem da ECLA, constituída essencialmente por economistas, é objecto  de críticas à direita – opondo‐se ao que julgavam ser um “socialismo camuflado” (Rist,  2001,a:186), isto é, à politização do económico e à redefinição do papel do Estado no  sentido de ser mais interventor, bem como, reagindo contra as críticas ao livre jogo do  mercado – e à esquerda, por parte dos sociólogos que haveriam de vir a constituir a  Escola da Dependência, em que as críticas acentuavam a ideia de que a ECLA “não se 

interessava senão  pelos  meios  de realizar  a  acumulação  de  capital  sem  se  preocupar  com as condições dessa acumulação” (op. cit.:186). 

Este não é exactamente o entendimento de Cendrero (2008) para quem estes  autores  ligados  à  ECLA  não  abandonam  como  matriz  da  sua  análise  a  noção  de  dependência  nos  termos  em  que  foi  formulada  na  génese  –  como,  aliás,  reforça  Rist  (2001,a:187) “a existência de uma dependência económica dos países periféricos face 

ao  capitalismo  central  constitui  certamente  um  postulado  partilhado  por  todos  os  dependentistas  –  incluindo  os  pesquisadores  da  CEPAL  –  mas  a  partir  daí  as  suas  pesquisas  procuram  compreender  de  forma  global  as  implicações  desse  fenómeno  geral  na  estrutura  social”  ‐,  pelo  que,  se  desenvolve  uma  análise  que  põe 

essencialmente  em  destaque  as  deficiências  do  desenvolvimento  capitalista  da  América  Latina,  impulsionado  pela  industrialização,  considerado  insatisfatório  na  medida em que se caracteriza por ser concentrado e excludente (Cendrero, 2008:54),  por outro lado, acentuam claramente que é insuficiente a transformação da estrutura 

produtiva  para  inverter  a  condição  de  subdesenvolvimento,  pelo  que  reclamam  transformações mais profundas na estrutura social e na ordem social vigente que não  se  prendem  necessariamente  e  apenas  com  a  eliminação  de  “barreiras”  ao  desenvolvimento  industrial.  A  título  de  exemplo,  Cendrero  (op.  cit.:54‐55)  refere  as  discussões a que neste contexto se assiste em torno da necessidade da reforma agrária  que  são  pautadas  por  argumentos  que  já  não  enfatizam  somente  o  seu  carácter  vantajoso  para  uma  política  de  industrialização  mas  que,  pelo  contrário,  são  argumentos em prol do seu carácter imprescindível no âmbito da discussão mais vasta  acerca da propriedade dos meios de produção. 

Tal como acontece com a Teoria da Modernização, os autores que se abrigam  sob  a  designação  de  teóricos  da  dependência  constituem  uma  realidade  profundamente heterogénea. Estes autores provêm de muitas disciplinas das Ciências  Sociais,  com  um  enfoque  nos  diferentes  países  da  América  Latina,  mas  também  em  outras  regiões  e  têm  orientações  ideológicas  e  compromissos  políticos  diversos.  No  entanto, como sugere Alvin So (1990), os membros da escola da dependência tendem  a partilhar as seguintes assunções básicas: i) a dependência é vista como um processo 

geral,  aplicável  a  todos  os  países  do  Terceiro  Mundo.  A  finalidade  da  escola  da 

dependência é delinear o padrão geral da dependência no Terceiro Mundo através da  história  do  capitalismo  desde  o  século  XVI  até  ao  presente;  ii)  a  dependência  é 

entendida  como  uma  condição  externa,  isto  é,  imposta  do  exterior.  Os  mais 

importantes obstáculos ao desenvolvimento dos países do Terceiro Mundo devem ser  procurados não no domínio da economia nacional mas antes na herança histórica do  colonialismo e na perpetuação de uma divisão internacional do trabalho desigual; iii) a  dependência é analisada essencialmente como condição económica; iv) a dependência  é tratada como uma componente da polarização regional da economia global: por um  lado o fluxo de mais‐valia que se escapa dos países do Terceiro Mundo conduz ao seu  subdesenvolvimento, por outro lado o desenvolvimento dos países Ocidentais decorre  precisamente  do  ingresso  dessas  mais‐valias  provenientes  daqueles  outros  países.  Assim,  o  subdesenvolvimento  na  periferia  e  o  desenvolvimento  no  centro  são  duas  faces do mesmo processo de acumulação de capital, conduzindo à polarização regional  da  economia  global;  v)  a  dependência  é  vista  como  incompatível  com  o 

desenvolvimento. Para a escola da dependência o desenvolvimento não é possível nos 

países da periferia ainda que alguns avanços menores possam ser alcançados durante  períodos de isolamento (como por exemplo os provocados por guerras ou depressões  económicas de âmbito global).  

 

Assim,  para  os  proponentes  da  escola  da  dependência  há  a  necessidade  de  redefinir  o  termo  desenvolvimento  no  sentido  de  que  deve  significar  mais  do  que  apenas mais indústria, mais produção ou incremento de produtividade. Pelo contrário,  o desenvolvimento deve ser definido em termos de melhoria do padrão de vida para  todas as pessoas na periferia.  

Nas palavras de Gilbert Rist (2001,a:187), e em termos de síntese, a Teoria da  Dependência  “interessa‐se  pelos  fenómenos  históricos  internos  dos  países  latino‐

americanos a fim de explicar a sua relação com o sistema capitalista internacional” ou, 

dito  de  outro  modo,  “trata‐se  de  pensar  a  relação  entre  «desenvolvimento»  e 

«subdesenvolvimento» de maneira global”. 

Mas é igualmente importante compreender quais são as implicações políticas  da Teoria da Dependência, sabendo de antemão, como nos alerta Alvin So (1990), que  as suas perspectivas são exactamente opostas às da Teoria da Modernização. De facto,  enquanto:  i)  a  Teoria  da  Modernização  propõe  que  a  periferia  deva  estar  disponível  para  maiores  contactos  com  os  países  Ocidentais  (mais  ajuda,  mais  tecnologia,  mais  valores  modernos),  a  Teoria  da  Dependência  argumenta  que  é  prejudicial  para  os  países  da  periferia  manter  mais  contactos  com  os  países  centrais.  De  facto,  para  a  Teoria  da  Dependência,  o  contacto  existente  já  é  suficientemente  danoso  dado  que  desde a era do colonialismo que a economia política da periferia tem sido totalmente  (re)estruturada  para  servir  os  interesses  do  centro,  conduzindo  assim  ao  desenvolvimento do subdesenvolvimento; ii) a Teoria da Dependência, pelo contrário,  sugere que os países periféricos devam atenuar os seus laços com os países centrais.  Em  vez  de  assentarem  na  ajuda  e  tecnologia  externa  os  países  periféricos  devem  adoptar  um  modelo  auto‐suficiente  (self‐reliance:  o  que  não  significa  o  completo  isolamento  dos  outros  estados‐nação,  mas  sim  evitar  ser  dominado  por  estes)  assentando  nos  seus  próprios  recursos  e  planeando  os  seus  próprios  percursos  de 

desenvolvimento de modo a alcançar a independência e um desenvolvimento nacional  autónomo; iii) como parte das elites dos países do Terceiro Mundo, para manter o seu  estatuto,  precisa  de  manter  relações  com  os  países  centrais,  o  corte  com  os  países  centrais proposto pela Teoria da Dependência não é aceite por aqueles, daí que alguns  pesquisadores  inscritos  na  escola  teórica  da  dependência  sugiram  a  necessidade  de  uma  revolução  socialista  –  à  moda  cubana  ou  chinesa  –  de  modo  a  que  os  países  periféricos se livrem das velhas elites e as substituam por um novo poder cuja missão  seja a de satisfazer as necessidades humanas dos camponeses e trabalhadores. 

 

A Teoria da Dependência manteve uma forte vitalidade durante as décadas de  1960  e  1970  mas,  essencialmente  a  partir  desta  última  década,  a  transformação  na  divisão internacional do trabalho provocada pelos movimentos de industrialização de  alguns  dos  países  até  então  considerados  periféricos  vieram  mostrar  como  o  juízo  absoluto  acerca  da  impossibilidade  destes  “ascenderem”  ao  patamar  dos  países  centrais  no  que  ao  desenvolvimento  capitalista  diz  respeito  pecava  por  excessivo,  o  que  principalmente  atingiu  a  credibilidade  dos  argumentos  das  primeiras  versões  da  Teoria da Dependência muito marcadas por um pensamento neo‐marxista que, como  já  vimos,  negavam  em  absoluto  esta  possibilidade.  Por  outro  lado,  como  salienta  Cendrero (2008:55), assiste‐se a uma crescente heterogeneização dos países ditos do  Terceiro  Mundo  ou  subdesenvolvidos  com  a  emergência  de  potências  económicas  periféricas de algum relevo no panorama internacional (novos países industrializados  ou  exportadores  de  petróleo,  por  exemplo)  o  que  vem  provocar  a  necessidade  de  reajustar  alguns  dos  conceitos  centrais  da análise  dependentista,  designadamente  os  que  se  prendem  com  a  relação  dicotómica  entre  centro/periferia.  Estes  factos  conduzem a que o foco de análise de um conjunto de novos autores que despontam  ou  que  reorientam  as  suas  grelhas  teóricas  deixe  de  ser  a  justificação  da  impossibilidade  de  desenvolvimento  dos  países  periféricos  a  partir  da  apreciação  da  relação  que  estes  estabelecem  com  os  países  centrais  e  da  posição  que  ocupam  no  sistema  capitalista  à  escala  mundial,  para  passar  a  centrar‐se  na  compreensão  da  natureza do desenvolvimento capitalista nos países periféricos que, obviamente, não  dispensa a análise do modo como as influências externas particularmente dos países 

centrais, ou o posicionamento no mercado capitalista global, moldam essa natureza e  contribuem  para  que  nos  países  periféricos  o  desenvolvimento  capitalista  sofra  distorções  e  desequilíbrios.  Não  cabe  na  economia  deste  trabalho  apreciar  devidamente  as  subtis  diferenças  internas  que  a  partir  da  década  de  1970  vão  marcando a teoria e a escola da dependência e que, aliás, estarão na origem de uma  outra corrente teórica e de uma outra escola do pensamento sobre o desenvolvimento  –  a  teoria  do  sistema‐mundo  –,  ainda  assim  importa  salientar,  com  Cendrero  (op. 

cit.:56‐57),  que  estes  movimentos  vão  procurar  renovar  e  actualizar  os  seus 

contributos  para  a  compreensão  do  desenvolvimento  e  do  subdesenvolvimento,  particularmente  dos  países  ditos  periféricos,  constituindo  “esforços  importantes  de 

compreensão,  de  escrutínio,  de  identificação  das  linhas  básicas  do  funcionamento  do  subdesenvolvimento e da própria economia mundial em cujo seio se gera e reproduz. O  resultado  serão  elaborações  com  altíssimos  graus  de  abstracção  e  memoráveis  esforços  de  conceptualização  e  identificação  da  lógica  de  funcionamento  de  grandes  agregados  económicos  que  pretenderão  compreender  a  realidade  social  no  seu  conjunto e não meramente a sua dimensão económica”. 

Uma outra linha de abordagem crítica  à Teoria e à Escola da Dependência é  avançada por Gilbert Rist (2001,a:190) sob o argumento de que estaremos perante um  novo  paradigma  mas  marcado  por  pressupostos  antigos.  O  seu  raciocínio  passa  por  reconhecer que enquanto conjunto de hipótese que durante um certo tempo fornece  a uma comunidade de pesquisadores uma série de problemas‐tipo e de soluções que  podem ser aplicáveis a situações diferentes, a teoria da dependência é claramente um  paradigma.  Para  além  disso,  independentemente  das  variações  internas,  a  teoria  da  dependência  construiu  um  conjunto  de  conceitos  e  uma  perspectiva  teórica  comum  que  se  opõe  a  e  põe  em  causa  seriamente  um  outro  paradigma:  a  Teoria  da  Modernização.  Com  efeito,  como  reconhece  Rist  (op.  cit.:190),  é  graças  à  teoria  da  dependência que o desenvolvimento e o subdesenvolvimento podem ser pensados a  uma  nova  luz  que  não  a  que  naturalizou  as  etapas  do  crescimento  das  sociedades,  designadamente incorporando uma visão histórica de longo prazo das transformações  sofridas  pelas  periferias  em  função  da  sua  inscrição  no  sistema  capitalista  mundial.  Outros argumentos em favor dos contributos da teoria da dependência podem ainda 

ser  aduzidos,  nomeadamente  o  facto  de  ao  raciocinar  em  termos  de  estruturas  internacionais  permitir  fazer  emergir  à  análise  os  mecanismos  nacionais  e  internacionais  de  apropriação  da  mais‐valia  em  proveito  das  economias  centrais,  assim,  demonstrando  que  o  regime  de  acumulação  que  prevaleceu  nos  países  de  industrialização precoce pode não se reproduzir nas periferias. Isto é, não é necessário  que  o  desenvolvimento  das  periferias  passe  inevitavelmente  pela  exportação  de  matérias–primas  e  podem  ainda  assim  industrializar‐se  e  modernizar‐se,  ainda  que  este desenvolvimento possa não vir a beneficiar a totalidade das suas populações por  razões que se prendem tanto com a estrutura política interna como com a dominação  externa.  Como  salienta  Rist  (2001b:191)  esta  argumentação  da  teoria  dependentista  ajuda  “a  réenchâsser  l’économique  dans  l’ordre  sócio‐politique,  plutôt  que  de  le 

considérer comme une variable indépendante” (Rist, op. cit.:191). 

No  entanto  para  além  destes  valiosos  contributos  ao  pensamento  sobre  o  desenvolvimento,  Rist  (2001b)  identifica  na  teoria  da  dependência  alguns  problemas