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5. O ESTUDO DOS CASOS

5.3 Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

Implantação/formalização/objeto

No TJRS a incorporação da Recomendação nº31 do CNJ quanto ao assessoramento técnico se deu de forma bastante diferente dos Tribunais analisados anteriormente. Isto porque, apesar de existir um termo de cooperação entre o Tribunal e outras instituições com objetivo de amenizar o fenômeno da judicialização (ANEXO B), o foco não está no assessoramento técnico, mas na gestão sistêmica e intersetorial da política de saúde principalmente quanto a organização da dispensa de medicamentos e padronização dos procedimentos de solicitação dos serviços de saúde.

Enfrentar os problemas da Saúde Pública do Rio Grande do Sul é uma questão complexa: emergências lotadas, falta de leitos hospitalares, o crack fazendo cada vez mais vítimas, ―judicialização da saúde‖, baixa aplicação de recursos em saúde, longos períodos de espera por consultas, medicamentos fora do alcance da população,...

Nesse contexto, surgiu um entendimento de que os problemas na área somente poderiam ser enfrentados mediante a congregação dos órgãos envolvidos em torno de pontos convergentes, de forma a fomentar o diálogo por meio de um contato mais próximo entre seus integrantes. O projeto nasceu da certeza de que seria possível iniciar-se a construção de uma rede visando a área de saúde, mas que seria necessário eleger-se um assunto em que houvesse o maior número de concordâncias relativas à atuação dos órgãos, que permitisse o conhecimento inicial entre os atores envolvidos, para que, paulatinamente, os demais assuntos pudessem ser tratados com abrandamento de idéias preconcebidas. Assim, com base na experiência bem- sucedida da rede desenvolvida em Rio Grande, optou-se pela utilização da metodologia de Planejamento e de Gestão Sistêmicos - PGS na área de Fornecimento de Medicamentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para a realização dos primeiros passos da Rede Estadual. (MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, 2017)

Assim é que no TJRS a responsabilidade pelos pareceres e assistência técnica aos magistrados se encontra sob a responsabilidade do próprio Tribunal. Existe, para tanto um departamento médico judiciário que realiza as perícias judiciais e emite os pareceres aos magistrados sobre as demandas judiciais de beneficiários de planos de saúde e de usuários do SUS (FEDERAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2016).

Identificou-se, na pesquisa realizada, que a instauração de uma câmara técnica para assessoramento dos magistrados foi solicitada pelo Comitê Estadual de Saúde em 21/03/2012 por meio do Ofício Circular da Corregedoria Geral de Justiça nº 18/2012-CGJ cujo teor segue:

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OFÍCIO-CIRCULAR Nº 018/2012-CGJ Expediente n.º 10-12/000604-6 Porto Alegre, 21 de março de 2012.

Recomendação nº 31/2010 do CNJ – Proposta de Câmara Técnica - Demandas judiciais envolvendo a assistência à saúde. Apoio técnico composto por profissionais da saúde para auxiliar Magistrados das Varas Judiciais, Cíveis e da Fazenda Pública. Senhor Magistrado:

CONSIDERANDO o contido na Recomendação nº 31, de 30 de março de 2010 do Conselho Nacional de Justiça;

CONSIDERANDO ser de notório conhecimento a instituição, junto ao mencionado Conselho, do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde, com o objetivo de analisar as causas da judicialização da saúde e de propor medidas tendentes à redução dessas demandas;

CONSIDERANDO a proposta apresentada pelo eminente Coordenador do Comitê Estadual do RS do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde do CNJ, Dr. Martin Schulze, no sentido da criação de uma Câmara Técnica composta de profissionais da saúde, para servir de apoio aos Magistrados como ferramenta ágil, isenta e tecnicamente capacitada;

CONSIDERANDO a relevância da avaliação e das sugestões dos Magistrados com vista à regulamentação e à estruturação desse promissor instrumento de auxílio à jurisdição,

ENCAMINHO em anexo minuta da proposta de criação da Câmara Técnica para que Vossa Excelência a avalie e manifeste concordância, discordância ou dúvidas, bem como sugestões de aprimoramento.

INFORMO que as avaliações e sugestões devem ser encaminhadas ao referido Magistrado através do e-mail: mschulze@tj.rs.gov.br, no prazo de 10 dias.

Atenciosas saudações.

DESA. LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO,

Corregedora-Geral da Justiça, em exercício (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL, 2012a).

Tratava-se naquele de ofício de uma recomendação judicial aos magistrados para que implantassem o sistema de assessoramento judicial em suas jurisdições. Entretanto, apesar da recomendação de implantação das Câmaras Técnicas o Ofício Circular nº 72 de 2012, informa aos mesmos em 13/07/2012 que os processos que versassem sobre demandas de saúde pública e suplementar deveriam ser submetidos para pareceres do Departamento Médico Judiciário deste Tribunal de Justiça – DMJ, como uma forma inclusive de avaliar a necessidade e viabilidade da instalação de Câmaras Técnicas.

OFÍCIO-CIRCULAR Nº 72/2012-CGJ

Expediente nº 10-12/000604-6 Porto Alegre, 13 de julho de 2012.

Ações relativas à área da saúde. Orienta que os pedidos de pareceres técnicos ao Departamento Médico Judiciário (DMJ) sejam realizados por meio eletrônico. Senhor (a) Magistrado (a):

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Visando atender ao disposto no item 1.a da Recomendação nº 31/2010, do Conselho Nacional de Justiça, no sentido de que sejam criadas pelos Tribunais de Justiça dos Estados as denominadas ―Câmaras Técnicas‖, com o objetivo de disponibilizar apoio técnico para auxiliar os magistrados na formação de um juízo de valor quanto à apreciação das questões clínicas nas ações relativas à saúde; bem como em face da necessidade de se realizar um levantamento quanto ao número de demandas onde se faz necessária a realização desse tipo de parecer, para o fim de avaliar a efetiva repercussão financeira da constituição da chamada ―Câmara Técnica‖.

Oriento Vossa Excelência que, em todas as ações judiciais relativas à saúde tanto as direcionadas ao Sistema Único de Saúde – SUS, quanto às direcionadas à medicina suplementar – Planos de Saúde em geral, nas quais, antes de proferir decisão liminar, seja necessária a realização de pareceres técnicos especializados pelo Departamento Médico Judiciário deste Tribunal de Justiça – DMJ, especialmente nos processos em que forem postuladas liminares para fornecimento de medicamentos, órteses, próteses, terapias e outros, sejam os pedidos encaminhados ao DMJ pelo endereço eletrônico dmj@tjrs.jus.br, para avaliação e orientação técnica por aquele Departamento.

Cordiais saudações.

Des. Voltaire de Lima Moraes

Corregedor-Geral da Justiça, em exercício (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL, 2012b)

Informação divulgada na página do Conselho Nacional de Justiça em 2015 faz concluir que a responsabilidade pelos pareceres técnicos não fora alterada, tendo em vista o relato de que o Departamento Médico Judiciário é que tem auxiliado nos pareceres que ainda não havia sido criada uma Câmara Técnica específica.

O departamento médico do TJRS tem auxiliado, por meio de um canal de internet, os magistrados de todo o Estado fornecendo pareceres sobre as demandas, exceto em questões de alta complexidade que fogem ao domínio daqueles profissionais.‖ ―Estamos estudando a criação de uma câmara técnica para auxiliar nas decisões‖, diz Schulze [Juiz coordenador do Comitê Estadual de Saúde] (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2015b). .

Atores institucionais/organizações envolvidas

Considerando o exposto na categoria anterior, no modelo de assessoramento adotado pelo TJRS, a instituição responsável pelos pareceres técnicos é o próprio tribunal através do Departamento Médico Judiciário. Um Grupo formado por médicos concursados que trabalham com dedicação exclusiva ao Judiciário, em horário integral.

Entretanto, quando a análise sai da estrutura de assessoramento técnico, percebe-se o envolvimento de atores diversos em um momento anterior a existência do processo judicial. Isto é, no TJRS a articulação dos saberes institucionais não é percebida durante o curso da

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ação, mas em momento anterior. Daí porque poderíamos afirmar que a interação neste caso é preventiva, o que será demonstrado como uma especificidade do caso.

Funcionamento/dinâmica

Dada a dificuldade de contato33 e identificação dos responsáveis pelo Departamento Médico Judiciário não foi possível compreender em detalhes a dinâmica de funcionamento do assessoramento técnico, sabendo-se apenas que o pedido é realizado diretamente ao Departamento por meio de Correio Eletrônico.

Portanto, não foi possível identificar prazo ou requisitos para a emissão dos pareceres.

Especialidades relevantes/destaques

De acordo com balanço realizado pelo CNJ em 2011, tramitavam à época, no Judiciário brasileiro, 240.980 processos judiciais, sendo que, no Rio Grande do Sul, o TJRS concentrava quase metade de todas as demandas do país: 113.953 ações judiciais sobre saúde, quase a metade das ações contabilizadas em todo Brasil. (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2015b).

Ocorre que como divulgado pelo CNJ, a partir do trabalho realizado pelo Comitê Estadual da Saúde coordenado pelo tribunal, foi possível reduzir as demandas sobre assistência à saúde para aproximadamente 82 mil processos que tramitam atualmente no Estado (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2015b).

É relevante o fato de que um dos focos da atuação do comitê estadual do Rio Grande do Sul foi a elaboração de uma cartilha denominada ―Ação de planejamento e de gestão sistêmicos com foco na saúde: otimização da rede de fornecimento de medicamentos‖ por onde os magistrados do Estado, incluindo comarcas do interior, recebem sugestões, exigências e critérios mínimos para ingressar com ações pleiteando assistência à saúde como, por exemplo, um formulário unificado de justificativa médica para o tratamento pleiteado; um modelo de negativa de fornecimento e um fluxograma de fornecimento de medicamentos (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2015b; TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL, 2016).

33 Não no site do TJRS não há informações públicas sobre o quadro de servidores ou funcionamento do

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Na apresentação daquele projeto de Gestão sistêmica da distribuição de medicamento é divulgada a concepção de que, ―em algumas ocasiões, quando se elabora o planejamento e a gestão das políticas públicas, não se percebe a importância da integração, também, com o Sistema de Justiça‖ (COMITÊ EXECUTIVO DO RIO GRANDE DO SUL, 2015) ficando exaltado nos documentos examinados a capacidade que tem o judiciário de interferir nessa política tanto de forma positiva quanto negativa.

Sem dúvida os seguintes fatores interferem na inefetividade das políticas públicas e no aumento da judicialização: a dificuldade de se pensar e atuar de forma sistêmica e multidisciplinar, bem como, a falta de sinergia entre os diversos órgãos que interferem no Sistema de Justiça e no Sistema de Saúde. Esses fatores podem ser revertidos em havendo planejamento e execução coordenados, sob o pressuposto de que a responsabilidade é de todos e de que há muito a construir e aprimorar(COMITÊ EXECUTIVO DO RIO GRANDE DO SUL, 2015).

A ação proposta fomenta a criação de Comitês Municipais para discussão da melhoria da dispensa de medicamentos, encaminha cartilhas de instrução para os membros das instituições envolvidas, realiza eventos e cursos de educação a distância que visam o aperfeiçoamento do aparato burocrático, incluindo workshops internos aos funcionários dos órgãos judiciais e das Secretarias de saúde (COMITÊ EXECUTIVO DO RIO GRANDE DO SUL, 2015).

A ―Cartilha‖ formulada, não apenas divulga entre os órgãos os objetivos do projeto, mas fornece modelos de workshops, de formulários de solicitação de medicamentos e de pareceres médicos, sugestões de quesitos para diagnóstico do fenômeno da judicialização nos municípios dentre outras informações que buscam padronizar e dar suporte de atuação tanto aos órgãos e funcionários do Executivo Judicial e Municipal quanto aos órgãos do Sistema de Justiça: Ministério Público, Poder Judiciário, Defensoria Pública e Ordem dos Advogados do Brasil.

Há inclusive a instituição de um ―Protocolo Mínimo para Ações de Saúde‖ onde são listados os documentos necessários bem como os requisitos ponderados para uma decisão favorável.

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