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Um enfoque do desenvolvimento a partir das teorias da liberdade e das necessidades humanas

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 DAS INICIATIVAS DE DESENVOLVIMENTO LOCAL PARA O CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

2.1.1 Um enfoque do desenvolvimento a partir das teorias da liberdade e das necessidades humanas

O enfoque do desenvolvimento na liberdade e nas necessidades humanas contrasta com as visões reducionistas como as que identificam desenvolvimento apenas como crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), isto é, a partir do aumento de rendas pessoais, industrialização, avanço tecnológico ou modernização social. A opulência global nega liberdade elementar a um significativo número de pessoas, por privá-las, através da pobreza econômica, de serviços públicos ou ainda de assistências sociais e de outras oportunidades importantes (SEN, 2000).

Então, além do aumento da liberdade das pessoas, o desenvolvimento depende também da sua livre condição de agente. Em outras palavras, o que as pessoas conseguem realizar (individualmente) de positivo é influenciado pelas liberdades políticas, pelas facilidades econômicas, pelas oportunidades sociais, pelas garantias de transparência, pela segurança protetora. Segundo Sen (2000), cada um desses direitos e oportunidades auxilia na promoção da capacidade geral

de uma pessoa, pois, com isso, orientadas a serem agentes e não pacientes, as pessoas conseguem efetivamente moldar seu destino e ajudar umas às outras.

E o apoio social para expandir a liberdade das pessoas pode ser considerado um argumento em favor da responsabilidade individual. Entretanto, não é apenas papel do Estado, mas também das outras instituições e agentes. Torna-se papel do Estado a natureza das disposições sociais, as quais podem ser cruciais para liberdade individual. E desta responsabilidade, sim, o Estado e a Sociedade não podem escapar. A análise do desenvolvimento requer, então, uma compreensão integrada dos papéis respectivos dessas diferentes instituições e suas interações, consistindo na remoção dos diversos tipos de restrições que deixam às pessoas pouca escolha e oportunidade para exercerem sua ação racional. Desta forma, o desenvolvimento é um compromisso muito sério e, por isso, não deve ser orientado a objetos, mas sim às pessoas (MAX- NEEF, 2012).

O melhor processo de desenvolvimento é, portanto, aquele que permite qualidade de vida das pessoas. E a qualidade de vida depende das possibilidades que as pessoas têm de satisfazerem suas necessidades humanas fundamentais.

Todavia, é preciso diferenciar necessidades humanas de “satisfatores”, ou agentes de satisfação dessas necessidades. Para isso, segundo Max-neff (2012), as necessidades devem ser percebidas como um sistema, isto, é inter-relacionadas, interatuantes e sem hierarquia. Na visão do autor, as necessidades são finitas, poucas e classificáveis e mudam muito lentamente, tais como a evolução humana. O que muda de cultura para cultura ou com o tempo não são as necessidades, mas sim as formas ou meios de satisfazê-las, isto é, os satisfatores dessas necessidades.

Para melhor se fazer entender, o autor exemplifica que comida e abrigo não são necessidades, mas sim satisfatores da necessidade de subsistência. Da mesma forma a educação é um satisfator de entendimento, e o plano de saúde é um satisfator de proteção.

Importa destacar que cada necessidade pode ser satisfeita em níveis e intensidades diferentes, dependentes do tempo, do lugar e da circunstância: a) com relação ao próprio indivíduo; b) com relação ao grupo social; c) com relação ao meio ambiente.

No contexto da proposta de Max-neef (2012), as necessidades não indicam apenas privações, mas também e simultaneamente, o potencial humano individual e coletivo. Por outro lado, os satisfatores são formas individuais e coletivas de ser, ter, fazer e estar que visam à realização das

necessidades. E, por fim, os bens econômicos são objetos que afetam a eficiência de um satisfator.

Neste sentido, é preciso estimular processos sinérgicos voltados ao desenvolvimento da escala humana nos níveis, local, territorial e nacional, e este é o papel que o Estado pode assumir. Já o papel das pessoas é o de protagonistas do desenvolvimento.

Outro ponto relevante é que o desenvolvimento social não é dissociado do desenvolvimento pessoal. Assim, a articulação entre essas dimensões pode ser atingida através de níveis crescentes de autodependência, que, sobretudo em âmbito social, fortalece a capacidade de gerar maiores espaços de liberdade coletiva, devendo ser encorajada em nível, local, territorial e nacional.

Portanto, as necessidades humanas, a autodependência e as articulações orgânicas são pilares em que se apoia o desenvolvimento à escala humana. Esse desenvolvimento motiva não somente a preocupação atual, mas também futura pela realização das necessidades humanas. Assim, advoga-se um conceito essencialmente eco-humanista, que busca perceber o que é positivo ou negativo e usar tecnologias que possam fornecer um desenvolvimento sustentável. É esse o enfoque do item 2.1.2. 2.1.2 Um enfoque do desenvolvimento na sustentabilidade

Com o cenário atual, complexo e globalizado, percebe-se a necessidade de compreender o desenvolvimento a partir de uma visão holística dos problemas da sociedade, e não apenas focar na gestão de recursos naturais (GUEDES, 2011).

Neste sentido, a percepção da sustentabilidade como oportunidade de negócio foi iniciada em torno dos anos 1980, a partir do reconhecimento de alguns problemas ambientais globais, como o aquecimento global, a destruição da camada de ozônio, a poluição da água e o desmatamento. Com isso, as instituições e os indivíduos passaram a buscar soluções imediatas (CHENG; SHIU, 2012) que possibilitassem alcançar desenvolvimento econômico em uma perspectiva de conhecimento e respeito à dependência em relação ao meio ambiente (CARRILLO-HERMOSILLA; GONZALEZ; KONNOLA, 2009).

Desde então, a sustentabilidade se tornou um chavão para uma variedade de causas sociais e ambientais. No meio empresarial, ela foi introduzida pelo conceito de gestão sustentável, especificamente em como as empresas produzem seus bens e serviços e como mantêm e melhoram os recursos humanos e naturais (SARTORI; LATRÔNICO; CAMPOS, 2014). Na mesma linha de raciocínio, Hart e Milstein (2004)

enfatizam que a sustentabilidade, no mundo dos negócios, denota uma ideia poderosa de que uma empresa sustentável é a que cria o lucro para seus acionistas, protegendo o ambiente e melhorando a vida daqueles com quem interage.

Logo, compreende-se o desenvolvimento sustentável a partir de uma das definições mais utilizadas nos debates internacionais, apresentada pelo relatório Brundtland (WCED, 1987): um modelo de desenvolvimento que permite às gerações presentes satisfazer as suas necessidades sem que com isso ponha em risco a possibilidade de as gerações futuras virem a satisfazer as suas próprias necessidades.

Esta preocupação com o futuro, a qual congrega uma composição de coalizações, vai ao encontro da definição mais operacional de desenvolvimento sustentável de Buarque (1996, p. 8):

o processo de mudança social e elevação das oportunidades da sociedade, compatibilizando, no tempo e no espaço, o crescimento e a eficiência econômicos, a conservação ambiental, a qualidade de vida e a equidade social, partindo de um claro compromisso com o futuro e a solidariedade entre as gerações.

Neste sentido, é oportuno considerar que três são as dimensões clássicas do processo de desenvolvimento sustentável: eficiência econômica, prudência ecológica e, justiça social. Além destas, Sachs (1993) considera ainda a abrangência das dimensões espacial e cultural, apresentando cinco dimensões da sustentabilidade. Todavia, revisitando sua proposta, o autor evolui das cinco dimensões para oito, as quais são assim definidas:

social: que se refere ao alcance de um patamar razoável de homogeneidade social, com distribuição de renda justa, emprego pleno e/ou autônomo com qualidade de vida decente e igualdade no acesso aos recursos e serviços sociais.

cultural: referente a mudanças no interior da

continuidade (equilíbrio entre respeito à tradição e inovação), capacidade de autonomia para elaboração de um projeto nacional integrado e endógeno (em oposição às cópias servis dos modelos alienígenas) e autoconfiança, combinada com abertura para o mundo.

ecológica: relacionada à preservação do potencial do capital natural na sua produção de recursos renováveis e à limitação do uso dos recursos não renováveis.

ambiental: trata-se de respeitar e realçar a capacidade de autodepuração dos ecossistemas naturais.

territorial: refere-se a configurações urbanas e rurais balanceadas (eliminação das inclinações urbanas nas alocações do investimento público), melhoria do ambiente urbano, superação das disparidades inter-regionais e estratégias de desenvolvimento ambientalmente seguras para áreas ecologicamente frágeis.

econômica: desenvolvimento econômico intersetorial equilibrado, com segurança alimentar, capacidade de modernização contínua dos instrumentos de produção, razoável nível de autonomia na pesquisa científica e tecnológica e inserção soberana na economia internacional. política (nacional): democracia definida em termos de apropriação universal dos direitos humanos, desenvolvimento da capacidade do Estado para implementar o projeto nacional, em parceria com todos os empreendedores e um nível razoável de coesão social.

política (internacional): baseada na eficácia do sistema de prevenção de guerras da ONU, na garantia da paz e na promoção da cooperação internacional, Pacote Norte-Sul de co- desenvolvimento, baseado no princípio da igualdade (regras do jogo e compartilhamento da responsabilidade de favorecimento do parceiro mais fraco), controle institucional efetivo do sistema internacional financeiro e de negócios, controle institucional efetivo da aplicação do Princípio da Precaução na gestão do meio ambiente e dos recursos naturais, prevenção das mudanças globais negativas, proteção da diversidade biológica (e cultural), gestão do patrimônio global, como herança comum da humanidade, sistema efetivo de cooperação científica e tecnológica internacional e eliminação parcial do caráter commodity da ciência e tecnologia, também como

propriedade da herança comum da humanidade. (SACHS, 2002, p. 85-89).

Ao enfatizar estas dimensões, Sachs (1993, 2002) deixa claro que, para alcançar a sustentabilidade, é necessário valorizar as pessoas, seus costumes e saberes. Assim, o autor propõe à ordem econômica internacional a importância de modelos locais de desenvolvimento baseados em tecnologias apropriadas, buscando reduzir a dependência técnica e cultural (JACOBI, 2007). Assim, a região deixa de ser contemplada simplesmente como uma unidade econômica, passando a ser mais valorizada por suas relações entre os atores sociais, o meio ambiente e a mobilização social/cultural (OLIVARES; DALCOL, 2010).

Neste sentido, o fenômeno da inovação – não só em uma perspectiva econômica, mas também social – emerge como um importante vetor nos processos de desenvolvimento territorial, o que instiga a abordagem do tópico 2.1.3.

2.1.3 Inovação

2.1.3.1 Perspectiva econômica evolucionista

As teorias heterodoxas buscam explicar o desenvolvimento econômico de formas alternativas. À vista disso, à dimensão econômica contemplada no desenvolvimento territorial estudado nesta tese é a abordada pela corrente evolucionista, a qual atribui o progresso técnico à inovação.

Nesta ótica, destaca-se Joseph Alois Schumpeter, considerado o pai dos estudos sobre inovação na área da teoria econômica. Para construir o que chamava de equilíbrio dinâmico, Schumpeter inicia seu arcabouço teórico partindo de premissas neoclássicas (FERNANDES, 2008) cuja simplificação de um modelo chamado fluxo circular representava equilíbrio estático na economia, isto é, de propriedade privada, livre concorrência e ausência de incerteza (SILVA-MELO, 2008).

Esta oposição utilizada pelo autor buscava, na realidade, explicar a importância da dinâmica econômica capitalista, na qual a ruptura de rotinas estabelecidas e a transformação de estruturas existentes ocasionadas pelas inovações, resultados das iniciativas dos agentes econômicos (indivíduos e empresas) levam, mesmo que de uma perspectiva individual, à promoção de impactos que culminam na reorganização da atividade econômica (SCHUMPETER, 1989).

Para esclarecer este ponto, Schumpeter (1989) distingue crescimento de desenvolvimento. Crescimento se trata de um aumento de população e riqueza, sem existir lucro econômico. Já o desenvolvimento provoca a destruição das estruturas econômicas existentes e a criação de novas estruturas (destruição criativa), havendo investimento com incorporação do progresso técnico (trataria-se-ia do verdadeiro processo de desenvolvimento econômico).

A mudança técnica dispara um conjunto de modificações radicais na combinação dos meios produtivos, de maneira que estas alterações não podem ser assimiladas rapidamente pelo sistema, impossibilitando a ocorrência de ajustes nas funções de produção pré-existentes (FERNANDES, 2008). Assim, Schumpeter (1989) define que estas mudanças podem vir das seguintes fontes:

 introdução de um novo bem ou de uma nova qualidade de um bem;

 introdução de um novo método de produção ou nova maneira de manejar comercialmente;

 abertura de um novo mercado;

 conquista de uma nova fonte de oferta de matérias-primas ou de bens semimanufaturados;

 estabelecimento de uma nova organização de qualquer indústria, como criação de uma posição de monopólio ou fragmentação deste.

Além deste rompimento do fluxo circular, as novas combinações, isto é, as inovações, nas quais o capitalismo concorrencial é tipicamente incorporado às novas firmas, exigem grandes gastos antes do aparecimento de qualquer renda, pois o crédito se transforma num elemento essencial do processo. Logo, o empreendedor, somente será estimulado a inovar se souber que conseguirá usufruir de lucros do monopólio durante um período de tempo – ex post (SILVA-MELO, 2008).

Então, em um primeiro momento, o de prosperidade, o empreendedor inovador acumula lucros com a aceitação da inovação pelo mercado. Em um segundo momento, na medida em que a inovação se difunde, os efeitos são cumulativos, surgem novos empreendedores “imitadores”, os lucros reduzem-se, eleva-se a produção e decaem os preços, passando-se assim para a fase de recessão (POSSAS, 1987). Na terceira fase, incorporam-se ações dos indivíduos que não necessariamente obtêm a rentabilidade esperada, o que gera frustração e

leva à crise e à depressão. Porém, os efeitos das inovações não cessam por aí. Digeridas as influências negativas dos investimentos mal realizados, inicia-se a quarta e última fase, a de recuperação, para então, o ciclo retornar à tendência inicial de geração de um novo equilíbrio.

Simplificando, a ênfase de Schumpeter sobre a inovação recai na mudança dos canais de rotina econômica, no aparato teórico dinâmico e nas características diferenciadas de conduta dos empresários, reconhecendo, assim, a inovação como resultado de um fenômeno social. Evoluindo as teorias de Schumpeter, emergem dois grupos, não rivais, assumidamente neo-schumpeterianos. O grupo que desenvolve “modelos evolucionistas”, de R. Nelson e S. Winter, e o grupo de Sussex (Reino Unido), sob direção de C. Freeman e outros expoentes como C. Perez, K. Pavitt, L. Soete e G. Dosi, que se volta para análise dos processos de geração e difusão de novas tecnologias em sua natureza de impactos, destacando sua inter-relação com a dinâmica industrial e a estrutura dos mercados. Ambos os grupos, assim como Schumpeter, procuram focalizar o papel da inovação como principal dinamizador da atividade econômica capitalista.

Para Nelson e Winter (1982), a ideia central é uma analogia biológica, tal como a evolução das espécies (Darwin), que se dá por meio de mutações genéticas submetidas à seleção do meio ambiente. As mudanças econômicas, entendidas tanto no aspecto técnico-produtivo (processos e produtos) quanto na estrutura e dinâmica dos mercados (concentração, diversificação, rentabilidade, crescimento), têm origem na busca incessante por parte das firmas como unidades básicas e no processo competitivo, com a introdução de inovações de processos e produtos. Isso teria, em regra, características estocásticas, e essas inovações, por sua vez, seriam submetidas aos mecanismos de seleção inerentes à concorrência e ao mercado (POSSAS, 1988).

Neste sentido, o mercado é considerado o principal locus da seleção e três são os seus elementos determinantes: o nível de lucratividade, a influência das preferências dos consumidores e os processos de investimento e imitação. A combinação destes determina o curso e o ritmo do processo de difusão, isto é, a trajetória natural da tecnologia.

Segundo Possas (1988), a difusão de uma inovação pode seguir habitualmente dois mecanismos: a substituição pelas empresas do produto ou processo antigo pelo novo, aumentando progressivamente sua utilização; ou, a imitação por outras empresas (no caso normal em que a invenção é patenteada).

A contribuição deste grupo é a apresentação de um marco teórico alternativo ao neoclássico, voltado à dinâmica competitiva da indústria e centrado na interação estrutura/estratégia sob o comando do processo de geração e difusão de inovações, visto como endógeno à estrutura produtiva da indústria, por meio da concorrência. Já como carências assinala-se: a necessidade de um maior aprofundamento nas conexões que caracterizam a extensão – não total – em que a dinâmica industrial é efetivamente endógena, mediante transformação provocada pelo processo inovador; não abordar a mudança tecnológica, mas a própria microdinâmica em sentido mais amplo. Contudo, essas insuficiências têm sido superadas pelo segundo grupo.

O segundo grupo se articula em torno do princípio teórico da concorrência schumpeteriana, baseando-se no desequilibro e na incerteza, oferecendo um caminho mais claro e promissor para construir o paradigma microdinâmico. Assim, propondo uma transposição do paradigma científico de Kuhn (1962), Dosi (1982) cunha pioneiramente a noção de paradigmas tecnológicos. Segundo o autor, trata-se de “um ‘modelo’ e um padrão de solução de problemas tecnológicos selecionados, baseados em princípios selecionados, derivados das ciências naturais e em tecnologias materiais selecionadas” (DOSI, 1984, p. 41). Prosseguindo a analogia, haveria no paradigma tecnológico, tal como no científico, prescrições habituais sobre que direção tomar e quais evitar (heurística positiva e negativa), chamadas pelo autor como trajetórias tecnológicas: “o padrão de atividade ‘normal’ de resolução do problema (isto é, do ‘progresso’), com base num paradigma tecnológico” (DOSI, 1984, p. 42).

Segundo Kupfer (1996, p. 356):

Um paradigma tecnológico, portanto, age como um “direcionador” do progresso técnico, definindo ex- ante as oportunidades a serem perseguidas e aquelas a serem abandonadas. É dotado, portanto, de “poderoso efeito de exclusão” (DOSI, 1984) ao permitir a redução apriorística do número de possibilidades de desenvolvimento tecnológico. Essa noção é muito próxima da trajetória natural citada por Nelson e Winter e que corrobora com a crítica sobre os processos de geração e difusão da inovação em relação à lógica tradicional do progresso técnico – demand-pull (puxadas pela demanda) e technology-push (empurradas

pela tecnologia) – ao considerar que tanto a trajetória natural quanto a difusão da inovação influenciam a mudança técnica.

Segundo Dosi (2006, p. 36), uma teoria de mudança técnica deve ser capaz de definir – na forma mais geral possível – a natureza de mecanismos interativos, e que de diferentes maneiras as teorias tradicionais do progresso técnico (demand-pull/technology-push) não conseguem fazer isso. O autor ainda afirma que a descrição da interação entre o progresso científico, os padrões de mudança técnica e a evolução das variáveis econômicas são descritas de forma insatisfatória por estes modelos.

Desta forma, na ótica de Dosi (2006, p. 37-38), há uma retroalimentação entre ambiente econômico e as direções das mudanças tecnológicas, considerados alguns aspectos do processo de inovação:

1. o crescente papel (ao menos, no século XX) de insumos científicos no processo de inovação. 2. a crescente complexidade das atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D), tornando o processo de inovação uma questão de planejamento a longo prazo para as empresas (e não apenas para elas), e depondo contra a hipótese de imediatas respostas de inovação pelos produtores face a mudanças nas condições de mercado.

3. uma significativa correlação entre esforços de P&D (como proxy dos insumos do processo inovador) e o produto da inovação (medido pelas atividades de patenteamento) em diversos setores produtivos, e a ausência, em comparações transversais entre países, de evidentes correlações entre o mercado e os padrões da demanda de um lado, e o produto da inovação do outro.

4. uma significativa quantidade de inovações e aperfeiçoamentos originando-se do “aprendizado pela execução”, que geralmente se incorpora em pessoas e organizações (principalmente firmas). 5. não obstante a crescente formalização institucional da pesquisa, as atividades de pesquisa e inovação mantêm uma intrínseca natureza de incerteza: isto se contrapõe a qualquer hipótese de um conjunto de escolhas tecnológicas conhecidas como ex-ante.

6. a mudança técnica não ocorre ao acaso por dois motivos. Em primeiro lugar, as direções da

mudança técnica são muitas vezes definidas pelo estado-da-arte da tecnologia já em uso. Em segundo lugar, muitas vezes, a probabilidade de empresas e organizações alcançarem avanços técnicos depende, entre outras coisas, dos níveis tecnológicos já alcançados por essas empresas e organizações.

7. a evolução das tecnologias através do tempo apresenta certas regularidades significativas e, muitas vezes, somos capazes de definir “trajetórias” da mudança em termos de certas características tecnológicas e econômicas dos produtos e processos.

Dada a visão econômica da inovação, passa-se a discorrer sobre o enfoque social do fenômeno.

2.1.3.2 Perspectiva social

Tradicionalmente associada a resultados econômicos e geração de lucro, a inovação tem aberto espaço para outras disciplinas e incorporado significados mais abrangentes e sistêmicos.

Neste sentido, emerge a inovação social que, como sugere o próprio nome, centra-se em questões voltadas a mudanças sociais que visem à satisfação das necessidades humanas. Segundo Moulaert et al. (2005), Schumpeter teria sido quem primeiro sublinhou a necessidade de inovação social a fim de garantir uma eficácia econômica em paralelo à inovação tecnológica. Embora algumas dicotomias essenciais sejam apontadas entre a inovação tecnológica e a inovação social, conforme o Quadro 2, destaca-se que estas não são incompatíveis.

Quadro 2 – Dicotomias essenciais entre a inovação tecnologica e a inovação social

INOVAÇÃO