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Uma constelação de modelos, “ismos” e setores

Prêmios em Jornalismo

2.2 Uma constelação de modelos, “ismos” e setores

Os prêmios versam sobre valores e práticas jornalísticas relativas a vários modelos62, “ismos”63 e setores64. Sabe-se que o Jornalismo Informativo estabelece a

configuração da atividade jornalística como profissão a partir da adoção dos critérios de

Objetividade. Um dos principais baluartes dentro desta perspectiva foi o Jornalismo

Investigativo. José Marques de Melo e Luiz Beltrão estabelecem o Jornalismo

62 Jornalismo Informativo, Jornalismo Investigativo, Jornalismo Interpretativo, Jornalismo Opinativo, Jornalismo Econômico, Jornalismo Institucional, Jornalismo Corporativo, Jornalismo Público e Novo Jornalismo.

63 Com as seguintes tensões quase que binárias: atuação x isenção (1); jornalistas profissionais x amadores/provisionados (2); redações x assessorias de imprensa (3); formação tecnicista x formação humanística (4); prática x teoria (5); interesse público x interesse privado (6); informação x opinião (7); interesse público x interesse do público (8). Sem falar em perspectivas que não são antagônicas, mas não deixam de ser complexas, relativas à democracia representativa (cão de guarda fiscalizados dos 3 poderes estatais) e democracia participativa (defensor da cidadania) (9).

Informativo como uma contraposição ao Jornalismo Literário. E, em vista da atividade jornalística pós-Objetividade, tem-se como gêneros: Jornalismo Investigativo,

Jornalismo Interpretativo e Jornalismo Opinativo.

Inicialmente, o mercado noticioso foi criado com a anulação do sujeito no jornalismo, como mecanismo de afirmação do cientificismo e do status de verdade na profissão. A Objetividade também deu o limite profissional entre redações e assessorias. Com o passar do tempo, algumas práticas emergiram dentro deste contexto pós-

Objetividade retomando o sujeito: o Novo Jornalismo (retomando a questão do sujeito na narrativa) e o Jornalismo Público (retomando o sujeito como interventor da realidade).

A pesquisa tem na sua amostra o Prêmio Esso, que faz parte do contexto da instauração da atividade jornalística como profissão no Brasil. Um cuidado que tentamos ter na pesquisa foi o de não criar embates entre modelos e nem as tentativas desnecessárias de se dizer o que é jornalismo (ou não) segundo uma constelação de modelos: como efeito pós-Objetividade (Jornalismo Informativo, Jornalismo

Investigativo, Jornalismo Interpretativo, Jornalismo Opinativo, Jornalismo Econômico, Jornalismo Institucional, Jornalismo Corporativo) e pós-Sujeito (Jornalismo Público e

Novo Jornalismo). Os prêmios da amostra versam sobre todas as classificações. Entretanto, sabe-se que cada classificação delimita espaços em relação a ideologias, técnicas e preceitos, dentro da configuração normativa da profissão, dos produtos e serviços do mercado noticioso.

A literatura sobre o jornalismo costuma referendar alguns modelos como puros e isolados, a partir de sua gênese. Não raro, em virtude disso, é o senso comum de que o

Prêmio Esso, por ter promovido a profissionalização da atividade jornalística e a adoção dos critérios de Objetividade, seja o mesmo, em 2012, como na sua origem, em 1955.

O Prêmio Esso, inicialmente, era bem prescritivo com este aparato relativo à adoção dos critérios de Objetividade (isenção, imparcialidade, anulação do sujeito, valorização da função do repórter, separação dos conteúdos noticiosos entre informação e opinião, além de ênfase no Jornalismo Investigativo). O próprio código de ética, no Brasil, também tinha essa configuração: como o Código de Ética dos Jornalistas

Profissionais65. O mercado, os profissionais, os prêmios e todo aparato em jornalismo antes do neoliberalismo tinha como ênfase o profissionalismo, cientificismo e status de

verdade da informação noticiosa. Vencida essa etapa da estruturação da profissão, novo dilema veio à tona: como a questão do sujeito.

Chamamos de pós-Sujeito a retomada do “eu” no jornalismo66, mas de cunho

profissional e noticioso, pois ele já existia quando a atividade se confundia com literatura. O sujeito quanto à narrativa já existia na atividade jornalística, mas foi retomado na perspectiva de atividade profissional, dentro dos formatos informativos, com o Novo Jornalismo67. Já o sujeito, enquanto atuação social e a ideia do jornalista participante da vida pública, é uma construção recente tributária do Civic Journalism68 (que tem uma adaptação peculiar ao contexto brasileiro no que diz respeito ao

Jornalismo Público).

O impacto das novas tecnologias, além da profissionalização das assessorias e de organismos do Terceiro Setor, relativizou premissas taxativas da Objetividade: “jornalismo está nas redações”, “jornalismo é denúncia” e “jornalismo é isenção”. E isso tem efeito sobre os prêmios. O Prêmio Esso, tido como o modelo fundamental de premiação no Brasil, passou a adotar novos tipos de categorias e concepção do que é jornalismo e informação. Historicamente, essas mudanças também são percebidas no plano ético, com a edição recente do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, que já não versa mais sobre a questão da profissionalização (etapa de estruturação da atividade até então vencida) com a mesma ênfase de outrora.

A edição do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros (2007) tem um texto voltado para uma nova perspectiva de jornalismo de atuação social, em vista de um processo já estabelecido de profissionalização da atividade. E se difere em vários pontos da ênfase dada pelo Código de Ética dos Jornalistas Profissionais (1987) à estruturação da profissão. Sem falar que, o código recente já tem dispositivos que consideram os jornalistas nas organizações e não só nas redações.

O primeiro desafio da pesquisa é organizar este mosaico de possibilidades e significados. Todas essas tensões que compõem a constelação de limites do jornalismo

66 A inclusão do sujeito no jornalismo como atividade profissional (não-literária) e a retomada do sujeito como atividade jornalística (não-profissional), já o “eu” existia na narrativa do Jornalismo Literário e continuou existindo nos gêneros informativos opinativos (comentário, artigo, resenha, coluna), mas não nos noticiosos (notícia, nota, reportagem).

67 O sujeito a serviço da Literatura no jornalismo está no Jornalismo Literário. O sujeito a serviço da informação, formatos e mercado noticioso está no Novo Jornalismo, Jornalismo Interpretativo e no Jornalismo Opinativo.

68 O Civic Journalism nasce nos jornais norte-americanos, mas tem sua recepção e adaptação no contexto brasileiro com o Jornalismo Público, muito praticado por organismos do Terceiro Setor, aliado ao Jornalismo Institucional.

como mercado, profissão e área de conhecimento também perpassam os prêmios. A pesquisa trabalha com duas linhas majoritárias: relativas ao Jornalismo Informativo (objetividade) e Jornalismo Público (sujeito), quanto à questão do profissional socialmente responsável (democracia participativa, poder social, atuação e serviço). Mas que tem em segundo plano o Jornalismo Investigativo (denúncia) e Jornalismo

Institucional (promoção)69, que fomenta a figura do jornalista cão de guarda (democracia representativa, quarto poder, isenção, denúncia).

O Prêmio Esso, por exemplo, faz parte da amostra e nasce puro e tal qual a concepção do Jornalismo Investigativo (cão de guarda: denúncia) e de Jornalismo

Informativo (critérios objetivos: isenção). Entretanto, em quase 60 anos de existência, a premiação absorveu categorias que contemplam novas práticas recentes. É sobre este aspecto de hibridismo que a pesquisa fixa o olhar nos pontos de encontro e complementariedade dos modelos, fugindo das prescrições taxativas e cartesianas. Um bom exemplo que configura isso são dois prêmios com nomes parecidos: o Prêmio Tim

Lopes de Investigação Jornalística (Rede Globo) e o Concurso Tim Lopes de

Investigação Jornalística (ANDI). O primeiro trabalha com honrarias em relação a reportagens pós-veiculadas na mídia. E o segundo com a pré-produção de reportagens ainda em formato de pautas. O da Rede Globo é ligado diretamente a denúncias e o romper do Jornalismo Investigativo. O da ANDI é ligado à cidadania e ao serviço de discussão dos dilemas sociais, como o problema das crianças e adolescentes em situação de risco. Ambos trabalham com reportagem e investigação, mas a partir de valores diferentes: valores-notícia e valores-serviço70.

Pode ser um pleonasmo, mas todo jornalismo é investigativo (1). Todo jornalismo é público (2). E todo jornalismo profissional é informativo (3). Entretanto, quando fechados em um modelo, a investigação (1), o interesse público (2) e a informação noticiosa (1), recebem marcações conceituais e taxativas que podem não corresponder à realidade, apesar de funcionarem bem como demarcação de um tipo de práxis. Veja: o Prêmio Esso é tido como baluarte no sentido das tipologias de

Jornalismo Informativo e Jornalismo Investigativo. No entanto, ele tem criado

69 O Jornalismo Institucional é uma guerra à parte de classificações, pois também figura ao lado de Jornalismo Corporativo. Sem falar em jornalistas que acreditam que nas assessorias não haja jornalismo, mas apenas as perspectivas de relações públicas: Comunicação Organizacional, Comunicação

Empresarial, Comunicação Social, Comunicação Institucional e Comunicação Corporativa.

70 Quando se diz cartesiano, entenda-se o jornalismo como centrado apenas nas redações, repórteres e critérios de Objetividade: “jornalismo está nas redações”, “jornalismo é denúncia” e “jornalismo é isenção”

categorias específicas que aglutinam práticas e valores do Jornalismo Público. No mesmo prêmio, existe o apoio e incentivo a um modelo de isenção e outro de atuação do jornalista. Os prêmios, por excelência, têm se mostrado híbridos em muitos casos.

Os conceitos e fronteiras entre o Jornalismo Investigativo (isenção do sujeito) e

Jornalismo Institucional (atuação) estão centrados em desencontros e pontos de contato71 a partir da perspectiva da informação como denúncia (considerada a essência do jornalismo e o seu principal fator de lucro)72. No entanto, com o advento do

Jornalismo Público, integra-se a esta perspectiva a aceitação do valor-social como valor-notícia, assim como instrumento de exercício da cidadania73. Partimos da premissa que existe, de fato, este cotejo entre o jornalismo de informação (denúncia) e o jornalismo de comunicação (formação) (SILVA, no prelo).

Recentemente, algumas pesquisas têm demonstrado que a tipologia de

Jornalismo Investigativo tem sofrido interferência de interações com outros atores sociais, além da ampliação do significado e meios pelos quais são produzidas as notícias7475.