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CAPÍTULO 1 – BREVE HISTÓRICO, EMISSÕES BRASILEIRAS, POLÍTICA NACIONAL

1.5 Uma meta de longo-prazo para as emissões brasileiras?

Os bons resultados obtidos no controle do desmatamento e consequentemente no controle dos GEE, sobretudo em um contexto de crescimento econômico e de maior inclusão social, mostram a sensibilidade do país às questões ambientais e a preocupação com o aquecimento global. Não obstante, a continuidade do crescimento econômico deverá ocorrer sobre fontes de GEE mais aderentes à produção. De certo modo, a “vantagem” comparativa que o Brasil dispunha foi bem aproveitada.

O esforço realizado até aqui foi suficiente? Qual deve ser a contribuição brasileira para a redução dos GEE? À medida que envolve decisões relacionadas às gerações futuras e que tem implicações sobre a equidade e a justiça, a distribuição desses esforços entre os países pressupõe algum tipo de juízo normativo. Neste caso, há diferentes formas de se avaliar o problema. Por exemplo, IPCC (2014) recorre, de modo ilustrativo, à distinção entre justiça e valor. No primeiro caso, tenta-se assegurar às pessoas o que lhes é devido, no segundo, a preocupação está em melhorar o mundo.

A responsabilidade causal e a responsabilidade moral da mudança climática são temas relacionados à justiça. Uma vez que o aquecimento global advém do acúmulo de GEE que perduram décadas ou séculos na atmosfera, os países que se industrializaram antes tendem a ter maior responsabilidade causal. Entretanto, como os efeitos da mudança do clima são diferenciados para os países, a questão sobre quem deve assumir a responsabilidade moral por alcançar a justiça não é trivial, tampouco o é definir compensações pelos danos causados pelas mudanças climáticas (IPCC, 2014).

Desde o relatório Brundtland43 a preocupação com as gerações futuras é central em toda discussão acerca do desenvolvimento sustentável. Por sua vez, a justiça para com as gerações futuras envolve tanto a preservação dos seus direitos, se assim entendidos44, como o que o lhes é devido pela geração atual (GARDINER, 2004; CANEY, 2006a). Se a imposição de tetos para as emissões pode implicar em sacrifícios hoje, quais sacrifícios são aceitáveis? E como mensurá-los? Há ainda o aspecto distributivo. Admitido um limite para a alteração do clima, a distribuição das cotas de emissões entre os países pode levar em conta além da justiça na utilização do espaço de carbono, o nível de bem-estar que permite em cada sociedade.

A responsabilidade causal originada das emissões acumuladas no tempo pode ser atenuada seja pelo desconhecimento das gerações passadas das implicações de suas escolhas sobre o clima, porque as gerações atuais não influenciaram as suas decisões, ou ainda porque os indivíduos de hoje, em suas identidades particulares, não estão em melhor ou pior situação em função das ações de seus antepassados, isto porque não seriam quem são tivessem as

gerações passadas agido de modo diferente (IPCC, 2014;

GOSSERIES, 2004; CANEY, 2006b; MEYER & ROSER, 2010). Porém, desfrutam desde o nascimento do resultado das atividades emissoras de GEE realizadas no passado, daí que o princípio distributivo deve ser considerado na atribuição da responsabilidade sobre a mudança climática (IPCC, 2014).

Além da justiça, as decisões acerca da mudança climática também afetam e são influenciadas por uma multiplicidade de valores e do bem-estar humano. A agregação destes valores e a mensuração do bem-estar é um desafio de largas proporções, se não impossível em muitos casos. A dificuldade entretanto não deve ser motivo para a inação, e há também as interfaces entre as políticas de mitigação e adaptação ao clima e as políticas relacionadas aos demais objetivos do desenvolvimento.

Dentre as tentativas numéricas de responsabilização, a primeira proposta de divisão dos esforços de redução das emissões a ganhar atenção nas negociações sobre o clima foi aquela apresentada à UNFCCC pelos representantes do Brasil, em 1997 (ELZEN et al, 2013; UNFCCC, 1997; BASIC, 2011). A proposta brasileira distribuía os esforços de mitigação conforme a contribuição histórica de cada país para a elevação da temperatura

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Diz respeito ao documento Our Common Future, de 1987, da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento, em que o desenvolvimento sustentável foi definido como “aquele que atende às necessidades do presente

sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas necessidades”. O nome “Brundtland” é uma

referência à ex-primeira-ministra norueguesa que então chefiou a comissão responsável pelo documento, Gro Harlem Bruntdland.

média da superfície terrestre, proporcionalmente à emissão de GEE, para o período entre 1850 e 1990, passível de revisão periódica. Entretanto, apenas o CO2 da geração de energia e produção do cimento foi contabilizado. O Brasil responderia por 0,32% das emissões acumuladas no período. Dados atualizados pelo WRI aumentaram o percentual para 0,80% até o ano de 2005.

Elzen et al (2013) calcularam a contribuição histórica dos países para o aquecimento global considerando todos GEE indicados pelo IPCC, incluindo as emissões da MUTF. Nesta estimativa a contribuição brasileira foi de 3,9% até o ano de 2010. Excluindo a MUTF esse percentual foi de apenas 0,9%. Quando descontado o progresso tecnológico45 a contribuição brasileira alcançou 4,2%, e deduzidas as emissões necessárias para o atendimento de necessidades básicas46, o percentual atingiu 4,4%. A razão entre a participação do país nos GEE acumulados desde 1850, e a participação de sua população na população total acumulada no mesmo período foi de 1,8. Se considerado apenas o ano de 2010, a razão foi de 1,4.

Há tentativas mais elaboradas de atribuição de metas para os países. Por exemplo, Chakravarty et al (2009) propuseram que os esforços de mitigação seguissem o princípio das responsabilidades comuns porém diferenciadas aplicado aos indivíduos. Para tanto, a distribuição de renda dos países foi convertida em distribuição das emissões de CO2 da queima de combustíveis fósseis, conforme a elasticidade-renda dessas emissões. IPCC (2007) estimou um teto de 30 Gton de CO2 em 2030, compatível com a concentração atmosférica deste gás em 450 ppm, e elevação da temperatura entre 2,4° e 2,8° C. Esse valor foi dividido pela população projetada naquele ano. O teto per capita foi tomado como referência. Os países deveriam eliminar as emissões acima deste teto. Consideradas as projeções da população e do PIB, o Brasil teria naquele ano, sem mudanças na distribuição de renda, 10 milhões de habitantes emitindo acima do teto. Com relação ao cenário tendencial, business as

usual (BAU)47, as emissões brasileiras deveriam recuar em apenas 4%. A meta de emissões seria de 0,6 Gton de CO2 em 2030. Neste caso, não foram consideradas a responsabilidade histórica, o comércio internacional e outros gases menos correlacionados ao PIB per capita.

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O argumento é de que os países que se industrializaram primeiro não contavam com os avanços tecnológicos disponíveis aos late comers, daí o desconto em suas emissões (ELZEN et al, 2013; HÖHNE & BLOCK, 2005).

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Calculado em termos per capita diz respeito ao mínimo de emissões para atividades básicas como aquecimento e preparação de alimentos (ELZEN et al, 2013; MULLER & HÖHNE, 2009)

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Projeções do PIB, das emissões e da população conforme a Energy Information Administration (EIA), órgão de estatística sobre energia do governo dos EUA.

Já Timilsina (2008) investigou a possibilidade de estabilização da concentração de CO2 até o ano de 2030, para tanto, em dois cenários, os países em desenvolvimento deveriam manter suas emissões ao nível estimado para 2025 ou 2020. Em 2030 o Brasil deveria emitir 9% ou 16% menos em relação ao cenário BAU48. Em relação ao ano de 1990 o aumento das emissões seria de 144% ou 125%. Para que fossem evitados prejuízos à evolução do PIB, a intensidade de CO2 deveria diminuir 30% e 40%.

Veiga & Vale (2009) construíram um índice de responsabilidade das emissões que pondera a contribuição histórica pelos lançamentos atuais, no caso, no ano de 2004, e um indicador da capacidade dos países de lidar com as mudanças do clima, a rigor, da capacidade de inovação. Os autores deixam em aberto a necessidade de revisão periódica do índice, bem como de discussão do ano de referência do quadro atual. Não obstante, o cálculo sugerido pelos autores foi tomado como indicador do esforço brasileiro até o ano de 2030. O índice brasileiro multiplicado pelo corte necessário nas emissões globais atinge 0,495 Gton de CO2eq em 2050, e 0,330 em 2030.49

A Tabela 5 apresenta alguns dos limites sugeridos pela literatura para o ano de 203050.

Tabela 5 – Limites para as emissões brasileiras em 2030, segundo diferentes critérios normativos. Autores GEE Emissões em 1990 (Gton) Emissões em 2012 (Gton) Meta 2030 (Gton) População, milhões (2030) Concentração (2100) Veiga e Vale (2009)a CO2eq 1,607 1,823 1,879 223.126 500 ppm Timilsina (2008)b CO2 energia 0,197 0,443 0,481 223.126 450 ppm Timilsina (2008)c CO2 energia 0,197 0,443 0,443 223.126 450 ppm Chakravarty et al (2009) CO2 energia 0,197 0,443 0,514 223.126 450 ppm Elzen et al (2013)d CO2eq 1,607 1,823 1,784 223.126 530 ppm Elzen et al (2013)e CO2eq 1,607 1,823 1,003 223.126 430 ppm Elzen et al (2013)f CO2eq 1,607 1,823 0,943 223.126 430 ppm

Per capitag CO2eq 1,607 1,823 1,377 223.126 530 ppm

Per capitah CO2eq 1,607 1,823 0,826 223.126 430 ppm

a) A meta em 2030 foi calculada como as emissões de 2004 menos 0,330 Gton CO2eq.

b) Neste caso as emissões brasileiras devem ser estabilizadas no ano de 2025, conforme estimativa da IEA.

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Estimativas da EIA.

49 Índice de 1,65 vezes a diferença das atuais 49 Gton de CO

2eq para 20 Gton em 2050, e 30 Gton em 2030. 50

Para IPCC (2014) se a redução dos GEE for postergada para depois de 2030 a taxa anual de redução das emissões deverá dobrar.

c) Aqui as emissões brasileiras devem ser estabilizadas em 2020, nas estimativas da IEA. d) Considera a participação do Brasil nas emissões históricas até 2010.

e) Considera as emissões históricas com o desconto do progresso tecnológico.

f) Considera as emissões históricas descontadas do mínimo para o atendimento das necessidades básicas. g) Emissões totais de 50 Gton de CO2eq divididas pela população mundial de 8,1 bilhões de pessoas,

estimada em UN (2004) e multiplicadas pela população brasileira em 2030, estimada em IBGE (2013). h) Emissões totais de 30 Gton de CO2eq divididas pela população mundial de 8,1 bilhões de pessoas e

multiplicadas pela população brasileira em 2030, estimada em IBGE (2013).

Fonte: elaboração própria a partir de WRI (2015); IPCC (2014a; 2014b); Veiga e Vale (2009), 2015.

Quando considerado o CO2eq e sua concentração atmosférica igual ou acima de 500 ppm, as emissões brasileiras, com relação ao ano de 2012, podem aumentar em até 3%, no critério de Vale & Veiga (2009), ou serem reduzidas em até 25%, levando-se em conta a alocação per capita. A elevação da temperatura ficaria no intervalo provável de 2,4° a 2,9° célsius. A concentração de até 430 ppm, implica redução das emissões de 45% a 55%, na alocação conforme Elzen et al (2013)d e per capita. Neste caso, a temperatura aumenta em até

2° célsius.

Nos casos em que apenas o CO2 foi considerado, sua concentração atmosférica foi sempre a mesma, 450 ppm, que, admitindo que os lançamentos dos demais GEE se mantenham estáveis, resulta em 550 ppm de GEE (CHAKRAVART et al, 2009). O espaço para o aumento das emissões brasileiras vai de 0,02% em Timilsina (2008)b, a 16% em Chakravarty et al (2009). Resta ainda considerar o efeito do crescimento econômico sobre o espaço de carbono disponível, mais propriamente sobre a intensidade de GEE.

A Tabela 6 mostra as intensidades de emissões necessárias para que as metas sejam cumpridas, assumindo diferentes taxas de crescimento econômico e a mesma evolução demográfica.

Tabela 6 – Intensidade de emissões em Gton. por trilhão de R$ do PIB, em 2012 e projeção em 2030.

Autores Intensidade Intensidade 2030 Variação % da intensidade (2012) (g=1%) (g=2%) (g=3%) (g=1%) (g=2%) (g=3%) Veiga e Vale (2009)a 0,415 0,358 0,300 0,251 -14% -28% -39% Timilsina (2008)b 0,100 0,091 0,077 0,064 -9% -24% -36% Timilsina (2008)c 0,100 0,084 0,071 0,059 -16% -29% -41% Chakravarty et al (2009) 0,100 0,098 0,082 0,069 -2% -18% -31% Elzen et al (2013)d 0,415 0,340 0,284 0,239 -18% -31% -43% Elzen et al (2013)e 0,415 0,191 0,160 0,134 -54% -61% -68% Elzen et al (2013)f 0,415 0,180 0,150 0,126 -57% -64% -70% Per capitag 0,415 0,262 0,220 0,184 -37% -47% -56% Per capitah 0,415 0,157 0,132 0,111 -62% -68% -73%

a) Na TAB. 6, g é a taxa anual de crescimento do PIB. A intensidade de emissão é a razão entre o total de emissões e o PIB.

Fonte: elaboração própria a partir de WRI (2015); IPCC (2014a; 2014b); Veiga e Vale (2009), 2015.

Em todos os casos a intensidade de emissões da economia precisará cair. Em até 62%, se consideradas as emissões per capita, para um crescimento de apenas 1% ao ano do PIB. Se o PIB crescer 2% a.a., as diminuições necessárias atingem de 18% no critério de Chakravarty et al (2009), até 68%, na alocação per capita. Para g = 3%, estes valores atingiram 31%% e 73% respectivamente.

As economias afluentes em geral apresentam maior participação dos serviços na composição setorial do PIB. Ademais, têm maior produtividade e eficiência na gestão de seus recursos, daí que a intensidade de emissões tende a cair com o crescimento. Não obstante, o descolamento absoluto51 entre a atividade econômica e o lançamento de CO2 não ocorreu em termos globais no total das últimas três décadas (IPCC, 2014). O Gráfico 8 traz o percurso da intensidade de GEE da economia brasileira desde 1990.

Gráfico 8 – Intensidade de emissões de GEE da economia brasileira, por tipo de gás, de 1990 a 2012.

Fonte: elaboração própria a partir de WRI (2015) e IBGE/SCN 2000 Anual, 2015.

Houve significativa queda da intensidade de emissões. Todavia, em função do controle do desmatamento. A intensidade, desconsiderando a MUTF, pouco mudou em todo o período. O crescimento acumulado do PIB foi de 87%. A estabilidade em torno de 0,25 Gton de CO2eq sugere complementaridade entre a produção e as emissões de GEE, exceto o CO2 da MUTF, no período em questão52.

O CO2 deveu-se, basicamente, à geração de energia, sobretudo para os transportes e indústria. Ainda que a matriz de produção de eletricidade no Brasil seja pouco dependente dos combustíveis fósseis, desde o final dos anos 1990 houve um incremento na geração pelas termelétricas, e as dificuldades à implantação de novas hidrelétricas aumentaram (EPE, 2012). As fontes alternativas, eólica e solar, aumentaram sua capacidade de produção, entretanto, ainda são pouco expressivas (EPE, 2013). Por sua vez, o setor de transporte brasileiro é fortemente dependente do modal rodoviário, e o PNLT não deve alterar significativamente este quadro. O aumento da renda também foi acompanhado da venda de automóveis53, consequentemente, do consumo de gasolina.

O CH4 e o N2O estão relacionados à agropecuária. O primeiro ocorre basicamente na fermentação entérica do gado bovino. O segundo, principalmente pelo uso de fertilizante

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A intensidade variou entre 0,23 e 0,26 no período avaliado.

nitrogenado, utilizado entre outras culturas na produção da soja para exportação e alimentação de animal (LENZEN et al, 2013; ANDA,/IBGE, 2005). A carne bovina também é mais intensiva no consumo de grãos que a carne suína ou de frango54. Entre 1995 e 2010 o rebanho bovino aumentou 36% e a demanda por fertilizantes aumentou três vezes (VALE, 2013). Os gases-F (HFC’s, PFC’ e CFC’s) tiveram participação irrelevante nos GEE.

Ainda que existam tecnologias para a redução das emissões, não é trivial diminuir a intensidade até 2030 nos níveis exigidos para o crescimento econômico de 2% ou 3%. Embora, o controle do desmatamento e o setor da agropecuária ainda possam contribuir, como revelam as INDCs brasileiras. O esforço exigido do Brasil caso as emissões líquidas da MUTF fossem zeradas em 2012 está descrito na Tabela 7.

Tabela 7 - Intensidade de emissões em Gton. por trilhão de R$ do PIB, exclusive MUTF, em 2012 e projeção em 2030.

Autores Intensidade Intensidade 2030 Variação % da intensidade (2012) (g=1%) (g=2%) (g=3%) (g=1%) (g=2%) (g=3%) Veiga e Vale (2009)a 0,231 0,358 0,300 0,251 55% 30% 9% Timilsina (2008)b 0,100 0,091 0,077 0,064 -9% -24% -36% Timilsina (2008)c 0,100 0,084 0,071 0,059 -16% -29% -41% Chakravarty et al (2009) 0,100 0,098 0,082 0,069 -2% -18% -31% Elzen et al (2013)d 0,231 0,340 0,284 0,239 47% 23% 4% Elzen et al (2013)e 0,231 0,191 0,160 0,134 -17% -31% -42% Elzen et al (2013)f 0,231 0,180 0,150 0,126 -22% -35% -45% Per capitag 0,231 0,262 0,220 0,184 14% -5% -20% Per capitah 0,231 0,157 0,132 0,111 -32% -43% -52%

Fonte: elaboração própria a partir de WRI (2015); IPCC (2014a; 2014b); Veiga e Vale (2009), 2015.

Na maior parte dos casos seriam exigidas reduções absolutas dos GEE, exceto nos critérios de Veiga & Vale (2009)a, em que poderiam aumentar até 85%, Elzen et al (2013)d, com aumento possível de 76% e na alocação per capitapara 530 ppm, elevação de até 36%. Na hipótese de g=1%, a intensidade em 2030 fica até 55% maior em Veiga e Vale (2009), e 32% no critério per capita, a 430 ppm.

Em linhas gerais, mesmo se as emissões líquidas da MUTF forem zeradas, as metas em 2030 serão factíveis caso o crescimento econômico seja lento, de 1% a.a., ou se o critério escolhido para a divisão dos esforços internacionais de redução dos GEE for favorável ao Brasil. Em outras palavras, o cenário business as usual é incompatível com o cumprimento

das metas, mesmo no curto-prazo e com o controle do desmatamento líquido zerado. Vale notar, entre 1990 e 2011 o crescimento médio anual da economia brasileira foi de 2,89%, as emissões exclusive a MUTF variaram 2,09% a.a. Neste ritmo serão 1,642 Gton em 2030.

Quanto às ações anunciadas nas INDCs, que, além de zerarem as emissões líquidas do desmatamento, prometem ampliar o reflorestamento, a recuperação de pastagens, a integração lavoura-pecuária-floresta e o uso de fontes renováveis de energia, conferem ao país uma meta ambiciosa para o médio-prazo. Até 2030 o governo espera reduzir em 43% as emissões totais comparadas àquelas observadas em 2005, portanto, a meta é de 1,165 Gton de CO2 equivalente. Neste caso a intensidade de emissões deveria recuar em até 32% para admitir um crescimento de 3% do PIB, com relação ao ano de 2012.

As INDCs colocam o país na vanguarda do combate ao aquecimento global, o Brasil é o país em desenvolvimento a se comprometer com metas absolutas, conferem tempo e ampliam o espaço de carbono para o crescimento econômico. Trata-se de um passo importante, que transfere para o futuro próximo outras duas questões. A primeira é a diminuição da desigualdade, pois, se o objetivo for atingir um padrão de consumo próximo ao dos países ricos, então a intensidade de emissões deverá diminuir ainda mais, a segunda é o próprio espaço de carbono no longo-prazo, que impõe a questão sobre que tipo de crescimento que se deseja.

Segundo o IPCC (2007; 2014), as emissões deverão diminuir até o ano de 2050, quando seriam estabilizadas. Até lá, as diferentes simulações compatíveis com um aumento da temperatura de até 2° C apontam que os lançamentos globais de GEE deverão recuar entre 40% e 70% do nível observado em 2010. Assim, considerando o menor recuo e o crescimento populacional até 205055, as emissões per capita deverão atingir até 3 toneladas56. A meta para a economia brasileira passa a 0,68 Gton de GEE.

Considerando uma taxa de crescimento econômico de 2% a.a. entre 2012 a 2050, o que pouco mais que dobraria o PIB, a intensidade de emissões deveria recuar 82%, ou seja, seria necessária uma tecnologia 5,5 vezes mais eficiente. Para uma taxa de crescimento de 3% a.a., que aproximaria a renda per capita brasileira daquela dos países ricos, a redução da

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Segundo as Nações Unidas, no documento The World Population Prospects: 2015 Revision, em 2050 a população mundial será de 9,7 bilhões de pessoas. A população brasileira, estimada pelo IBGE será de 226.347.688 habitantes.

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intensidade seria de 87%, ou uma tecnologia quase 8 vezes mais eficiente57,58. Dificilmente este resultado seria alcançado sem mudanças profundas na economia e no padrão de consumo.

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Isto é a razão entre a intensidade de emissões em 2012 e as intensidades projetadas para 2050 com suas respectivas taxas de crescimento.

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O crescimento de 3% a.a. até 2050 triplicaria o PIB brasileiro. Em 2012, a renda per capita corrigida pela paridade do poder de compra alcançou U$ 14.323,00 no Brasil, U$ 34.366,34 na União Europeia e U$ 35.726,00 nos países do anexo I do protocolo de Quioto (WRI, 2015).