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URINA E OUTROS LÍQUIDOS BIOLÓGICOS

No documento Bioquímica clínica em geriatria (páginas 65-69)

PARTE II – Dr Joaquim Chaves, Laboratório de Análises Clínicas (JCLAC) Introdução

A – QUÍMICA CLÍNICA

2. Parâmetros analíticos e valor semiológico 1 METABOLISMO DAS PROTEÍNAS

2.12 URINA E OUTROS LÍQUIDOS BIOLÓGICOS

A maioria dos fluidos corporais são ultrafiltrados do sangue que passaram por determinados processos em tecidos específicos ou são produzidos por transporte ativo. Nesses fluidos podem ser encontrados marcadores bioquímicos que não estão presentes no sangue ou então se encontram em concentrações diferentes. A sua análise pode ser útil no diagnóstico, no prognóstico e no grau de severidade de algumas patologias.

Exame sumário de urina

O exame sumário de urina (urina tipo II) é um teste não invasivo de rotina que consiste num exame físico-químico e do sedimento de uma amostra de urina. Permite detetar patologias intrínsecas do sistema urinário de diferentes origens (ex.: infeções, glomerulonefrite, perda de capacidade de concentração da urina), quer fisiológicas quer anatómicas; patologias extra-renais (ex.: glicosúria na diabetes, proteinúria nas gamapatias monoclonais, bilirrubinúria nas doenças hepáticas); permite monitorizar a evolução clínica e a resposta ao tratamento.

No exame físico-químico da urina é determinada a densidade e o pH, e semi- quantificados as esterases leucocitárias (granulócitos), nitritos, glicose, corpos cetónicos (acetoacetato), proteínas, hemoglobina, pigmentos biliares e urobilinogénio. No exame do sedimento procede-se à identificação, caracterização e quantificação dos elementos figurados clinicamente mais significativos (ex.: células epiteliais, leucócitos, eritrócitos, cilindros e cristais), por citometria de fluxo (UF1000i).

O exame microscópico do sedimento urinário efetua-se quando há discordâncias entre o exame físico-químico e a citometria de fluxo, se o resultado acrescentar valor ao diagnóstico clinico, se a citometria de fluxo não puder ser realizada por alguma razão (ex.: volume de amostra insuficiente) ou se houver necessidade de identificar a presença de acantócitos (eritrócitos dismórficos).

Valor semiológico: Útil na abordagem de patologia nefrológica, urológica e sistémica.

Permite detetar patologias intrínsecas do sistema urinário de diferentes origens, quer fisiológicas quer anatómicas; patologias extra-renais, monitorizar a evolução clinica e a resposta ao tratamento. Os principais elementos patológicos que podem ser observados são hemácias, leucócitos e cilindros, e os menos importantes são leveduras, cristais ou células epiteliais.

A Cor é um parâmetro muito variável e pouco confiável (sangue, hemoglobina, bilirrubina, corantes alimentares, medicamentos), e a Turvação pode ser devida à

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precipitação de fosfatos não tendo relevância clinica, por quilúria, leucocitúria ou hematúria. Ambos apresentam baixa sensibilidade e especificidade.

A Densidade correlaciona-se com a osmolalidade urinária, ajudando a definir o estado de hidratação do doente e reflete a capacidade do rim em concentrar a urina.

As alterações do pH urinário geralmente são produzidas em resposta às variações do pH sérico, com exceção dos doentes com acidose tubular renal, nos quais ocorre uma incapacidade de acidificar a urina para um pH inferior a 5.5. A determinação do pH é ainda útil no diagnóstico e abordagem da litíase renal e infeções urinárias.

A hemoglobina positiva na tira de teste acompanhada de observação de hematúria no sedimento, pode ser de origem renal quando associada à presença de proteinúria; ser de origem glomerular quando associada à presença de proteinúria, cilindrúria e eritrócitos dismórficos, ou de origem urológica quando não se observa cilindros, eritrócitos dismórficos e muitas vezes sem proteinúria. Nas infeções do trato urinário a hematúria é acompanhada geralmente por leucocitúria e clínica de infeção.

Na proteinúria é necessário efetuar o diagnóstico diferencial para esclarecimento da sua causa. Pode ser transitória ou intermitente e as proteínas existentes são maioritariamente as de baixo peso molecular, como a albumina, a proteína de Tamm- Horsfall (produzida no trato urinário), as microglobulinas, as proteínas presentes nas secreções prostática e seminal; podem ocorrer em situações de síndromes febris, exercício físico intenso, ingestão proteica excessiva, desidratação e ortostatismo. A proteinúria persistente pode ser por causas não renais (Insuficiência cardíaca congestiva, Diabetes mellitus, proteinúria de Bence-Jones, ou renais (glomerulares ou tubulares) e pós-renais (processos inflamatórios, infeciosos ou não, neoplasias, prostatite e uretrite).

A glicosúria ocorre quando a quantidade de glicose filtrada ultrapassa a capacidade de reabsorção do rim (180 a 200 mg/dL), observa-se em situações de hiperglicemia (ex.: Diabetes mellitus) ou em situações de normoglicémia (ex.: nefropatias com disfunção do tubo contornado proximal ou na gravidez).

A Cetonúria é detetada em casos de cetoacidose diabética, mas também quando há jejum prolongado, vómitos ou exercício físico extremo.

A presença de nitritos significa a presença de bactérias em quantidades significativas (conversão dos nitratos pelas bactérias).

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A presença de esterase leucocitária é um sinal de piúria, sendo a cistite a causa mais frequente. Observação de leucócitos no sedimento pode significar infeção urinária alta ou baixa; inflamação por glomerulonefrite, nefrite intersticial ou litíase.

A presença de bilirrubina na urina representa bilirrubina conjugada e indica possível colestase, o urobilinogénio aumenta em situações de hemólise e doença hepatocelular (permitindo diferenciá-las das obstruções biliares, nas quais o urobilinogénio não é detetado).

As células tubulares quando presentes em número elevado podem estar associadas a patologias relacionadas com lesão dos túbulos renais (ex.: necrose tubular aguda ou nefrite intersticial aguda). As células do epitélio de transição em número elevado estão relacionadas com a lesão epitelial associada a diversos processos inflamatórios, infeciosos ou não, degenerativos ou neoplásicos. As células epiteliais pavimentosas não têm significado clínico.

Os cilindros hialinos são constituídos quase exclusivamente por proteínas (proteína de Tamm-Horsfall e albumina) e estão aumentados quando há proteinúria, mas presentes em indivíduos normais. Existem também cilindros granulosos, constituídos por proteínas plasmáticas ou fragmentos celulares, que são observados na presença de glomerulonefrite crónica. Cilindros cerosos representam a degeneração dos cilindros celulares, ocorrem na necrose tubular aguda e na doença renal crónica. Os cilindros eritrocitários indicam uma lesão renal glomerular. Cilindros leucocitários são muito sugestivos de pielonefrite. Os cilindros céreos refletem a fase final da dissolução dos grânulos de cilindros granulosos e estão associados a estase muito grave nos túbulos renais. Os cilindros gordurosos são característicos de lesão tubular renal e são constituídos por colesterol e triglicéridos.

A presença de cristais pode constituir uma evidência de formação de cálculos e de certas doenças metabólicas. São formados pela precipitação dos sais da urina e estão diretamente ligados ao pH. Numa urina ácida pode-se observar cristais de ácido úrico, cistina e oxalato de cálcio, enquanto numa alcalina podem-se encontrar cristais de fosfato.

Exame bioquímico do Líquido Cefalorraquidiano (LCR)

O LCR é um líquido incolor que preenche o espaço entre as meninges, assim como o canal central da espinal medula. O seu volume total é aproximadamente 125-150mL no indivíduo adulto e a cada hora são produzidos cerca de 20mL. O LCR tem várias funções, nomeadamente a proteção do cérebro das alterações súbitas de pressão,

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manutenção do ambiente químico e eliminação dos produtos do metabolismo cerebral. Alterações no sistema nervoso central, causadas por mecanismos patológicos próprios, podem refletir-se em diversas alterações macroscópicas, microscópicas e químicas do LCR.

O exame laboratorial do LCR pode ser útil no diagnóstico de uma grande variedade de patologias neurológicas. Os parâmetros laboratoriais mais pedidos na rotina são a contagem de células, exame cultural e, como parâmetros bioquímicos, o doseamento de proteínas totais e glicose.

Proteínas: O LCR é um ultrafiltrado do plasma, pelo que, em situações normais

predominam proteínas de baixo peso molecular (ex.: pré-albumina, albumina e transferrina). A permeabilidade da barreira hematocefálica às proteínas plasmáticas pode sofrer alterações em situações clinicas que aumentam a pressão intracraniana. O doseamento das proteínas no soro deve ser determinado simultaneamente para diferenciar entre o aumento da permeabilidade da barreira e a produção aumentada nas meninges.

Valor semiológico: Ocorrem aumentos significativos nas meningites bacterianas,

aumentos mais discretos são compatíveis com quadros clínicos de outras doenças inflamatórias, neoplásicas ou hemorrágicas.

Glicose: A concentração de glicose no LCR é mantida por difusão simples e por

transporte facilitado, nos capilares e vilosidades aracnoides, ou por consumo pelas células do tecido nervoso circundante. O equilíbrio com a concentração do plasma leva tempo a atingir e a razão LCR/plasma é normalmente 0.6 em condições normais. Os níveis de glicose no LCR podem estar alterados em várias condições patológicas.

Valor semiológico: Concentrações baixas de glicose no LCR estão associadas a

infeções do sistema nervoso central por micobactérias e fungos. Valores <1.0 mmol/L são fortemente preditivos de meningites bacterianas. Nas infeções virais os níveis de glicose encontram-se tipicamente normais, embora possa haver exceções (ex.: vírus herpes e enterovirus.

Exame bioquímico do Liquido Ascítico (LAS) /peritoneal

A ascite é um sinal clínico que designa a acumulação anormal de fluido dentro da cavidade peritoneal e a sua produção depende da permeabilidade vascular e da pressão hidrostática e oncótica. O fluido pode ser um transudado ou um exsudado.

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O transudado é um ultrafiltrado do plasma que atravessa os capilares sanguíneos e é drenado pelo sistema linfático (acumula menos de 5mL em situações normais), o seu acúmulo resulta do aumento da pressão hidrostática ou da diminuição da pressão oncótica do plasma.

O exsudado resulta do aumento da permeabilidade capilar ou da diminuição da reabsorção linfática, que ocorre em processos de inflamação e é rico em proteínas e células (ex.: leucócitos).

Vários processos patológicos estão na origem do acúmulo de liquido ascítico, nomeadamente, hipertensão portal, hipoalbuminémia, aumento da permeabilidade capilar e neoplasias. Clinicamente é importante distinguir o transudado do exsudado. Cerca de 80 % das amostras de LAS são do tipo transudativo e de causa hepática. Os testes laboratoriais mais úteis para distinguir entre transudado e exsudado num LAS incluem o doseamento das proteínas totais, que quando superior a 3 g/dL sugere que o líquido é um exsudado, podendo ter uma causa inflamatória ou neoplásica.

A presença ou ausência de hipertensão portal é estabelecida calculando a diferença entre o doseamento de albumina no soro e no LAS (SAAG, serum-ascites albumin gradient), numa colheita simultânea, o gradiente é elevado no transudado (Hipertensão portal) e diminuído no exsudado.

Valor semiológico: Esclarecimento das causas de ascite.

No documento Bioquímica clínica em geriatria (páginas 65-69)