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LISTA DAS DOENÇAS PROFISSIONAIS

6.3 Valores limite na exposição profissional a chumbo

Em Portugal, a vigilância da saúde dos trabalhadores expostos a chumbo está regulamentada pelo Decreto-lei nº 274/89 de 21 de Agosto, que transpôs para o direito interno a Directiva da Comissão Europeia nº 82/605/CEE de 25 de Junho.

No que respeita à exposição ambiental nos locais de trabalho, o diploma estabelece que o “Valor Limite de Concentração” (valor da concentração de chumbo referido a 8 horas diárias e 40 horas semanais, que não deve ser ultrapassado) é de 150 µg/m3.

Quanto à utilização de indicadores biológicos, o diploma prevê que a vigilância biológica deva compreender a plumbémia e, adicionalmente, segundo critério médico, a PPZ, o ALA-U e a ALA-D.

Estabelece, ainda, como limites de aceitabilidade dos reflexos da exposição, o valor de 70 µg/dL para a plumbémia, podendo ser admissível um valor até 80 µg/dL desde que se verifique uma das condições seguintes:

− uma taxa de ácido δ-aminolevulínico na urina (ALA-U) inferior a 20 µg/g de creatinina;

− um valor de protoporfirina-zinco (PPZ) inferior a 20 µg/g de hemoglobina;

− um nível de desidratase do ácido δ-aminolevulínico (ALA-D) superior a 6 unidades europeias.

Diversos critérios, por seu lado, estão em vigor em outros países, dentro e fora da Comunidade Europeia, designadamente para a plumbémia. (Quadro I.19)

Quadro I.19: Limites máximos da plumbémia em diversos países.

País Limites

ALEMANHA 70 30 para mulheres

AUSTRALIA 70

DINAMARCA 60

EUA (ACGIH) 50 (intenção de 30)

EUA (OSHA) 60 Média de 50 em 3 testes consecutivos

FINLÂNDIA 50

FRANÇA 60

NOVA ZELÂNDIA 66 Média de 54 em 3 testes consecutivos

REINO UNIDO 60 40 para mulheres

SUÉCIA 50

PORTUGAL 70 80 se ALA-U<20 mg/g creatinina ou PPZ< 20 µg/g hemoglobina ou ALA-D> 6 U.E. (unidades: µg/dL)

O desenvolvimento do conhecimento científico tem, entretanto, permitido reconhecer a necessidade de melhorar os níveis de prevenção dos efeitos adversos da exposição a chumbo, o que passa, necessariamente, pela definição de novos limiares significativos de um patamar de aceitabilidade que represente uma maior protecção da saúde dos trabalhadores.

A grande atenção que vem sendo dada aos efeitos precoces e sub-clínicos induzidos pela exposição a chumbo (e que apenas diferem dos efeitos clínicos clássicos pela sua intensidade), revela que a baixas doses de exposição a toxicidade do chumbo se manifesta ao nível hematológico bem como sobre os sistemas nervoso, cardiovascular, endócrino, imunológico e reprodutor, enquanto a questão da possível carcinogenicidade e mutagenicidade do chumbo permanece em aberto. E muitos destes efeitos têm sido constatados a níveis de plumbémia que ficam aquém dos limiares actualmente em vigor (APOSTOSTOLI e ALESSIO, 1992; APOSTOLI , 1998).

Neste contexto e tendo por base a múltipla investigação efectuada nos últimos anos, um relatório datado de Setembro de 2000 intitulado “Recommendation from Scientific

Committee on Occupational Exposure Limits for Lead and its Inorganic Compounds”

elaborado para a Comissão Europeia, preconiza que novos limiares para a exposição profissional ao chumbo sejam estabelecidos, devendo situar-se em 100 µg/m3 para a exposição ambiental e 30 µg/dL para o valor da plumbémia (SCOEL, 2000).

CAPÍTULO II

UTILIZAÇÃO da PROTOPORFIRINA-ZINCO (PPZ) na VIGILÂNCIA de SAÚDE de TRABALHADORES

1.

Introdução

Em Saúde Ocupacional, a avaliação/gestão dos riscos profissionais na exposição a agentes químicos exige que se tenham em conta a forma, a natureza e a dimensão do contacto da substância com a população exposta, considerando todas as fontes de exposição, ocupacionais e não-ocupacionais. Mas implica, igualmente, reconhecer o modo e a intensidade como cada indivíduo, dessa mesma população, responde ao contacto com o agente em presença.

A quantificação de um risco para a saúde depende, assim, da caracterização da exposição e da natureza das relações dose-resposta ou da toxicidade dos agentes envolvidos (IPCS, 2001).

O principal objectivo da vigilância biológica é o de detectar efeitos tóxicos na fase de reversibilidade, antes da instalação de alterações patológicas, assegurando que a exposição não conduza a um risco inaceitável para a saúde (BAKER e MATTE, 1994; HOET, 1996). E, na medida em que tem por base a globalidade da exposição (profissional e não-profissional) e avalia a resultante da interacção tóxico/organismo, deverá ser entendida como instrumento a privilegiar na planificação e concretização de qualquer estratégia preventiva.

Na exposição a agentes químicos, deste modo, a utilização de indicadores biológicos, designadamente de efeito, enquanto avaliadores de alterações bioquímicas reversíveis determinadas pela absorção do agente, adquire um estatuto de primordial importância.

A selecção dos indicadores biológicos exige não só que sejam adequados, fundamentalmente sensíveis e específicos, mas, ainda, que sejam tidos em conta aspectos relacionados com a respectiva aplicabilidade, como são os casos da simplicidade ou complexidade das técnicas e dos equipamentos de medição e do custo de tais avaliações (WHO, 1996; NICOLL, PIGNONE e DETMER, 2001).

A sua pertinência, a natureza da informação que permitem e as exigências técnicas para a sua obtenção requerem, assim, rigoroso critério na sua escolha e na interpretação dos resultados que fornecem. Adicionalmente, em particular porque tal vigilância se dirige a grupos de trabalhadores regra geral numerosos e a persistência da exposição exige a sistemática vigilância e a sucessiva avaliação analítica importa, sem pôr em causa o primado da preocupação pela melhor saúde, não negligenciar os aspectos relacionados com desejáveis critérios de equilíbrio entre o custo e a eficácia.

A intoxicação por chumbo de origem profissional caracteriza-se, clinicamente, por uma sintomatologia de evolução arrastada, com queixas difusas e de elevada inespecificidade, facto particularmente mais notório nas fases iniciais da sua instalação (ZIEGLER, 1990; DAVIDSON, 1994; LEE et al., 2000; HU, 2002). A vigilância médica de trabalhadores sujeitos a este risco, entendida em termos restritos, com base na pesquisa de sinais precoces de doença, enfrenta, assim, sérias dificuldades e configura uma elevada probabilidade de se não revelar atempada.

Tal facto oferece à vigilância biológica da exposição profissional a chumbo uma importância acrescida.

Não existindo dados objectivos que permitam sistematizar o modo como a vigilância da saúde dos trabalhadores expostos a chumbo se efectua em Portugal, resta uma apreciação de base empírica, fundamentada na experiência de observação e numa informação avulsa sobre a matéria. Tanto quanto é possível perceber, esta vigilância assenta na realização (mais ou menos periódica) da plumbémia (Pb-S) e no recurso, menos frequente, à determinação do ácido δ-aminolevulínico na urina (ALA-U). Para além disso, com alguma frequência os programas de rotina incluem, ainda, a realização dos parâmetros hematológicos (hemograma).

À luz da literatura científica publicada, o que se reflecte, aliás, nas recomendações técnicas internacionais, parece consensual que a vigilância biológica dos trabalhadores expostos a chumbo se deve basear na realização da plumbémia como indicador de dose e privilegiar, como indicadores de efeito, a protoporfirina-zinco (PPZ) e, ou, o ácido δ- aminolevulínico (ALA), segundo metodologias e protocolos que variam em função das realidades específicas da exposição e, até, de diferentes interpretações valorativas que se atribuem ao significado de cada um destes parâmetros. Parece, por outro lado, não haver razoabilidade no recurso cego e sistemático à caracterização hematológica.

O objecto central da presente investigação situou-se na avaliação da utilidade e da exequibilidade do doseamento da protoporfirina-zinco no sangue, por recurso a um equipamento portátil (hematofluorímetro) e a uma técnica de fácil execução (punção capilar) (PIOMELLI et al., 1973; BLUMBERG et al., 1977; BUHRMANN, MENTZER e LUBIN, 1978; EISINGER et al., 1978; KARACIC, MAJIC e TELISMAN, 1980; METS, 1981; FISCHBEIN et al., 1982; MARSH, NELSON e KOENIG, 1983; ESPAÑA, 1987; VERSCHOOR et al., 1987b; WILDT, BERLIN e ISBERG, 1987; PARSOSNS et al., 1989; STANTON et al., 1989; ZWENNIS, FRANSSEN e WIJNANS, 1990; McELVAINE et al., 1991; ROLFE et al., 1993; FROOM et al., 1998; PRISTA, PINTO e AGUIAR, 2002).

Um diverso conjunto de questões, entendidas como pertinentes, fundamentou esta intenção: (1) até ao início do presente estudo, o método não era concretizável em Portugal, apesar de a PPZ ser um dos indicadores referenciados no diploma legal que

regulamenta a exposição profissional a chumbo; (2) é utilizado e recomendado em grande número de países; (3) fornece uma informação adequada e eventualmente melhor que a de outros indicadores de efeito; (4) é, por alguns autores, recomendado como teste de avaliação inicial; (5) implica meios e técnicas de fácil execução e baixo custo; (6) o doseamento pode ser confirmado, em caso de necessidade, recorrendo-se a técnicas laboratoriais.

O objectivo final da investigação prende-se com a definição de um quadro metodológico de utilização dos indicadores biológicos da exposição a chumbo, pretendendo-se que contribua para uma mais adequada e eficaz vigilância da saúde dos trabalhadores sujeitos a este factor de risco.

2.

Desenho do Estudo

Para alcançar os propósitos definidos, o presente estudo foi desenhado segundo uma metodologia faseada, capaz de responder ao conjunto de questões em presença.

Essencialmente, o estudo visou avaliar o grau de associação da PPZ, do ALA-U e dos parâmetros hematológicos (indicadores de efeito) com a Pb-S (indicador de dose), retirando as necessárias ilações sobre a utilização deste indicadores nos programas de vigilância da saúde de trabalhadores expostos a chumbo.

Este desiderato, no contexto para tal definido, implicou que, numa fase preliminar, a investigação se preocupasse com duas questões determinantes para a prossecução do estudo:

− validar o método e a técnica relacionados com o doseamento da PPZ e os dados assim obtidos;

− clarificar a necessidade, ou não, de recurso a colheitas de urina de 24 horas para doseamento do ALA.

Dada a inexperiência de utilização do equipamento para doseamento da PPZ e respectiva técnica, foi previsto um primeiro tempo de treino e adaptação ao método e definido que a fase prática, propriamente dita, do estudo, apenas se iniciaria uma vez estabelecidas condições satisfatórias de domínio dos procedimentos.

No planeamento do estudo foi prevista a selecção de dois grupos de trabalhadores, um profissionalmente exposto a chumbo e outro não-exposto, cada um com uma dimensão de cerca de 100 indivíduos.

A todos os indivíduos se efectuaria o doseamento dos parâmetros sanguíneos em investigação (Pb-S, PPZ e Hemograma). Por razões de operacionalidade e exequibilidade definiu-se que o doseamento do parâmetro urinário em causa (ALA) se efectuaria apenas a cerca de 25% dos indivíduos.

Todos os elementos seriam do sexo masculino e os dois grupos deveriam ser semelhantes em relação à estrutura etária.

A selecção do grupo “exposto” foi efectuada em duas unidades fabris, uma de fabrico de acumuladores de chumbo-ácido (baterias de arranque) e outra de produção de pigmentos de chumbo, tendo por base o conhecimento da sua exposição fornecido pelos respectivos serviços de medicina do trabalho.

O grupo de indivíduos não-expostos, por razões de natureza prática, foi maioritariamente recrutado em trabalhadores das mesmas unidades empresariais, embora laborando em sectores e afectos a tarefas não-relacionadas com a exposição a chumbo.

3.

Questões Preliminares

A pesquisa relativamente às questões preliminares colocadas (validação da técnica de doseamento da PPZ e definição do tipo de colheita urinária para doseamento do ALA) determinou a concretização de duas investigações iniciais, apresentadas em edições próprias (PRISTA, PINTO e AGUIAR, 2002; PRISTA, UVA e AGUIAR, 2002), cujas conclusões sumariamente se apresentam.