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Docência como domínio de técnicas

CAPÍTULO III: O CAMINHAR METODOLÓGICO DA INVESTIGAÇÃO

4.1. Docência na educação superior: ambivalência entre a atuação profissional e o exercício do

4.1.4. Docência como domínio de técnicas

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CAPÍTULO IV: O Papel da ... Superior: tensões entre a intenção e a ação Nandyara Souza Santos

professores e estudantes nos processos de aprendizagem, também há que se articular com a instituição, em algumas situações.

A professora se refere à necessidade de os programas das disciplinas e da instituição serem organizados a partir das aprendizagens dos estudantes, atentando para a questão de que a missão precípua da educação superior é formar profissionais competentes para contribuírem efetivamente com o desenvolvimento do país, através da ciência e tecnologia, além de exercerem seu papel na sociedade de forma ética e comprometida com a melhoria da qualidade de vida da população de maneira geral.

Pela observação das representações dos professores, fica evidente que a docência na educação superior exige conhecimentos específicos e, para tanto, primeiro, faz- se necessário que as instituições da educação superior invistam em processos de profissionalização dos professores, caminhando na superação dos modelos de docência tradicional ou prático-artesanal e do professor técnico ou academicista, na direção do modelo hermenêutico ou reflexivo (PIMENTA e ANASTASIOU, 2002).

Segundo, é mister que os professores do magistério superior tomem a docência como profissão, tendo conhecimentos específicos, caminhando para uma prática profissional de professor centrada no ensino a uma docência comprometida com a aprendizagem dos estudantes. E, por fim, é urgente que as IES constituam uma política de desenvolvimento profissional dos professores (para que sejam asseguradas melhores condições de trabalho e reserva de tempo na carga horária dos professores para as atividades de formação), de maneira que o ensino seja tomado como referência para a formação dos professores. Pretendemos com isto, que o ato de ensinar seja ressignificado nas instituições de educação superior.

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CAPÍTULO IV: O Papel da ... Superior: tensões entre a intenção e a ação Nandyara Souza Santos Significa aparelhar o professor, municiar o professor de técnicas dessa ciência que é a Pedagogia, de forma a tornar mais eficaz o mistério de ensinar (Davi).

Possa trazer alguns tipos de artifícios para poder facilitar o aprendizado do nosso aluno (Maria).

Como diversificar a aula, como tornar as aulas mais atrativas, porque também para a gente começa a ficar muito cansativo, principalmente quando você dá várias aulas e você tem um formato de aula e vai reproduzindo. Então como também diversificar isso para poder prender o aluno, a atenção do aluno (Lívia).

Os depoimentos dos sujeitos da pesquisa nos mostram que a preocupação, referente ao ato de ensinar, diz respeito à imprescindibilidade de eles possuírem ou terem acesso a um repertório de métodos e técnicas de ensino, para diversificar suas aulas. Não aparece nas representações dos professores uma tentativa de se compreender como os estudantes da educação superior aprendem (pessoas adolescentes e jovens que têm características específicas de pensar, são adultas e, portanto, têm plena consciência de si e de suas aspirações), bem como sobre o projeto formativo adotado pela instituição de educação superior e os fins da educação profissional.

É notório que esta formação, baseada na racionalidade técnica, tem por objetivo municiar os professores com métodos e técnicas de ensino, sem que eles, contudo, reflitam sobre as bases teóricas, epistemológicas e metodológicas do ensino, do seu papel como professor, e como os estudantes adultos aprendem, aos fins que se propõe a formação em nível superior, da responsabilidade frente à formação de profissionais comprometidos com a realidade social na qual estão inseridos, o desenvolvimento do país, e a vivência fraterna entre as pessoas.

A representação da professora Lívia traz um novo elemento para a discussão, que diz respeito a um formato de aula único, usado sempre e em qualquer situação, sem que o professor se atente para a necessidade de a prática educativa está coerente ao contexto em que ela está sendo realizada. De novo, o excerto nos sugestiona que estes professores baseiam a sua atividade de professorar na racionalidade técnica.

Segundo esta compreensão, métodos, técnicas de ensino e formatos de aula são aplicáveis a quaisquer situação e contexto, porém, os resultados serão os mesmos em todas as circunstâncias e espaços em que forem aplicados. Todavia, o contexto social é imprescindível para as relações estabelecidas entre professores e

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estudantes. E essas relações são a base da construção dos saberes em sala de aula, de modo que não se torna possível reproduzir um planejamento de um contexto para outro. Se se muda o contexto, provavelmente o saber se transforma.

Este talvez seja um dos maiores desafios que a Didática e a Pedagogia Universitárias necessitam enfrentar e superar, para que os professores da educação superior entendam que cada aula é um momento sui generis, único irrepetível, que prescinde da adoção de modelos prontos, formatados, customizados.

Ficou muito forte no depoimento dos professores que uma das alternativas para o domínio de métodos e técnicas de ensino, visando à formação para a docência, é a utilização de estratégias de ensino. Quando nos referimos às estratégias de ensino, partimos do princípio que os critérios para a sua seleção não são aleatórios e fortuitos. Pelo contrário, revelam ideais pedagógicos, concepções de educação, de ensino, de aprendizagem, de interação professor-estudante, de aula, de avaliação.

Acerca da utilização das estratégias de ensino em suas práticas profissionais como docentes, os professores declaram:

Sou extremamente a favor de tudo que possa favorecer o aprendizado, trazer um filme, trazer algo lúdico para que ele possa captar (Maria).

Essa semana, inclusive, a gente recebeu um texto super bacana, deles, sobre como a gente ser diferente em sala de aula. Coisinhas que fazem a diferença no nosso dia a dia, buscando que a gente parasse para refletir o que é ser um docente, o que é ser um professor, o que é ir para uma sala de aula, onde a gente tem ali uma pluralidade de coisas, de pessoas, de várias questões (Lara).

Esses dias eu trouxe um filme, no horário da noite, a gente sabe que o noturno é, um filme de cinquenta e três minutos e eu assim pensando: poxa eu vou trazer um filme, e era um filme de inteligência artificial, era uma competição, um jogo de perguntas e questionamentos, onde o computador estava competindo com um humano. Também é legal, um documentário, e antes disso em casa eu pensei: “é muito tempo”!!! Será que vai chamar a atenção, mas enfim é muito bacana, me chamou a atenção, então eu vou levar. E no meio do filme eu parei, assim eu sempre interfiro, mas eu parei e perguntei se os alunos queriam que parasse o filme, porque eu sabia que era cansativo: “não professora, deixa a gente continuar. Não, é bacana”

(Ana).

Missão fundamental de trazer para o centro da discussão as estratégias de ensino e de aprendizagem. Estratégias em sala de aula, como apresentar um conteúdo para um estudante que é fruto de uma sociedade instantânea, que a todo instante está vinculado às redes de computadores. Uma sociedade que se modifica constantemente e nós ainda temos uma tradição mundial de aula jesuítica. Acho que essa reflexão sobre as estratégias é fundamental. Outro trabalho que eu já acompanhei na ASPED (Davi).

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Os depoimentos das professoras Maria, Lara e Ana e do professor Davi sugerem que a utilização das estratégias de ensino em suas aulas se dá pela necessidade de se trazer “coisinhas novas” para a sala, a fim de atrair melhor os estudantes para as atividades acadêmicas. Através das representações dos entrevistados, observamos que, ao escolherem usar estratégias de ensino, os professores visam trazer para a sua aula o caráter da novidade, da inovação, sem aparente preocupação com as questões conceituais que caracterizam a docência na educação superior e a aula universitária. Vale destacar que os professores tomam o termo estratégias de ensino como sinônimos de técnicas, mas não se centram na aprendizagem dos estudantes.

Os depoimentos, ainda, mostram a representação de docência destes professores, caracterizada pelo modelo técnico ou academicista, no qual a preocupação do docente é o domínio das técnicas, recursos e estratégias com o objetivo de diversificar as situações de ensino, sem que ele, realize qualquer reflexão sobre os fins da educação superior, da formação dos estudantes, do domínio da disciplina trabalhada. O investimento dos professores na formação dos estudantes é técnico- instrumental, como se a técnica, por si só, garantisse a trabalho colaborativo que deve ser feito entre estudantes e professores na direção da construção do conhecimento, por mediação pedagógica1 (PIMENTA e ANASTASIOU, 2002).

Este aspecto nos parece contraditório, pois na docência da educação superior, como também nas instituições nas quais este nível de ensino é promovido, há um predomínio declarado dos conhecimentos específicos, em detrimento dos conhecimentos pedagógicos. A preocupação dos professores, em lançarem mão das estratégias de ensino nas situações de sala de aula, parece-nos, em primeiro lugar, que existe uma necessidade dos docentes em aderirem a modismos, neste caso a utilização de estratégias de ensino.

E, segundo, como o estudo em epígrafe foi realizado em uma instituição de educação superior privada, que tem o ensino como atividade-fim (mencionado pelo

1 Sobre a mediação pedagógica, ver Morosini (2006, p. 378): ”processo dinâmico no qual o professor se utiliza de ferramentas ou de artefatos culturais essenciais para modelar a atividade, implicando num processo de intervenção intencional de um ou mais elementos em uma relação. Representa o aspecto indireto da atividade de ensino, por meio de instrumentos (ferramentas), tanto materiais, quanto psicológicos (signos), transformando a natureza da própria atividade (BOLZAN, 2002, p. 33 - 44). Notas: na mediação utiliza-se de dois elementos distintos: instrumento e signos que colaboram na alteração do fluxo e da estrutura das funções mentais dos docentes (BOLZAN, 2005)”.

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professor Davi anteriormente), professores e assessoria pedagógica investem em aspectos periféricos da docência, a fim de atraírem os estudantes para as aulas e capturarem (mencionado pela professora Clara anteriormente) a atenção deles durante as aulas.

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