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Adolescentes e jovens e suas bases de apoio :relações de amizade como suporte social no enfrentamento à violência

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Academic year: 2017

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(1)

Programa de Pós-graduação em Psicologia

ADOLESCENTES E JOVENS E SUAS BASES DE APOIO:

RELAÇÕES DE AMIZADE COMO SUPORTE SOCIAL NO

ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA

EMANOEL JOSÉ BATISTA DE LIMA

NATAL-RN

(2)

EMANOEL JOSÉ BATISTA DE LIMA

ADOLESCENTES E JOVENS E SUAS BASES DE APOIO:

RELAÇÕES DE AMIZADE COMO SUPORTE SOCIAL NO

ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA

Dissertação elaborada sob orientação

da Prof. Drª. Magda Dimesntein e

apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Psicologia da

Universidade Federal do Rio Grande

do Norte, como requisito parcial à

obtenção do título de Mestre em

Psicologia.

(3)

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Cento de Ciências Humanas, Letras e Artes

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

A dissertação "Adolescentes e Jovens e suas Bases de Apoio: relações de amizade como

suporte social no enfrentamento à violência", elaborada por Emanoel José Batista de

Lima, foi considerada aprovada por todos os membros da Banca Examinadora e aceita

pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia, como requisito parcial à obtenção do

título de mestre em psicologia.

Natal, RN, 29 de Abril de 2005

Banca Examinadora

Magda Dimenstein ________________________

Ângelo Giuseppe Roncalli _______________________

(4)

Em conseqüência também os ausentes estão presentes (...),

e, a coisa que é mais difícil de dizer, os mortos vivem... Cícero,Lélio, Diálogo da Amizade.

(5)

Agradecimentos

À professora Dimenstein.

À CAPES, pela concessão da bolsa de estudos que viabilizou a realização deste

trabalho.

Ao CNPq e à Fundació Càtedra Iberoamericana de la Universitat de les Illes

Balears – España, pelo apoio financeiro.

Aos professores do PPg-Psi.

À Escola Estadual Jean Mermoz, em nome da professora Maria de Fátima da

Silva, diretora da escola, pelo acolhimento, pelas informações fornecidas e pelo apoio

no trabalho de campo.

Ao CIESPI/PUC, pela disponibilidade e fornecimento de material.

Às meninas superpoderosas, Andreína, Monique, Rayanne, Vanessa e Íris,

bolsistas que me auxiliaram nesta pesquisa. Um grande abraço!

À Cilene, pela paciência e disponibilidade em sempre nos ajudar com carinho.

Aos professores Maria Helena Zamora e Ângelo Roncalli por aceitarem o

convite a compartilharem comigo deste momento.

A Kempes e Dani, pelos pratos deliciosos, pela jogatina e pela amizade gostosa

cultivada pelo litoral do Rio Grande do Norte.

A Alex e Narjara, pela pizza compartilhada em um domingo que parecia sem

perspectivas.

A Emílio e Valquíria por me ajudarem a compreender aquela frase de Raul: o

caminho da dor é o amigo! Emílio, através da audição de Elvis Presley. Valquíria, através da escuta inesperada em uma tarde de agosto.

A Jecson e Jeane, pelo feriado prolongado que curtimos em abril de 2005. Vocês

(6)

A Autran, pelas surpresas que se apresentam toda vez em que nos encontramos e

pelo sofrimento que compartilhamos por termos os corações vascaínos.

Aos meus amigos da AEC, D. Lucy, D. Alba, Terezinha, Soninha, Wandinha,

Seu Waldir, Seu Ismael, D. Júlia, Solange, Júnior, Seu Revorêdo, Vanilde e Fátima,

pelo carinho.

A Jade, meu gatinho.

A Marco Antônio, meu irmão e primeiro amigo, pela viagem inesquecível ao

Rio de Janeiro, onde pudemos compartilhar emoções, ver, ouvir e sentir Nando Reis e

fortalecer nosso amor.

A Júlio César, meu irmão, pelas trocas de afeto nos debates sobre basquete e

futebol e nas inesquecíveis aulas de inglês. Um grande beijo!

A Roberto Luiz, meu irmão japa, pelos desenhos presentes nesta dissertação,

pelas emoções compartilhadas nas partidas de videogame e pelo abraço em um dia de

afetos tristes.

A Fábio, Lucas e Roberta, meus priminhos, que chegam sempre para alegrar a

família através das brincadeiras, das gargalhadas e das mugangas,

A Nadielly e a Piteco, aos quais também ofereço o trecho de Cícero que abre

este trabalho.

À Rita de Cássia e Rosana, minhas tias, pelo carinho e cuidado.

À Yalle, meu amor, pelas surpresas diárias que sempre encontro em seu olhar,

em seu sorriso, em seu amor, em nosso amor. Coincidências e paixões presentes desde o

nosso primeiro encontro no sertão baiano.

À minha mãe, Maria da Paz, que com amor, paciência, zelo e trabalho,

conseguiu dar conta de quatro marmanjos da pesada. Milhões de beijos!

(7)

Sumário

Lista de figuras...ix

Lista de tabelas...x

Resumo...xi

Abstract...xii

Apresentação...xiii

1. Infância e Adolescência Brasileira: Concepções e Políticas do Século XX...16

2. Bases de Apoio e Juventude...22

2.1 Experiências e Resultados do Projeto Bases de Apoio...27

2.2 Caminhos da Pesquisa: violências...29

2.2.1 Violências e Bases de Apoio...31

2.2.2 Violência entre Jovens...32

3. Bases de Apoio em Natal/RN...35

3.1 Passos metodológicos da investigação...38

3.2 Resultados...41

3.2.1 Perfil dos participantes...41

3.2.2 Atividade escolar...47

3.2.3 Lazer e esportes...48

3.2.4 Religião...53

3.2.5 Saúde...55

3.2.6 Dificuldades enfrentadas/ Problemas e necessidades especiais...59

3.2.7 Violência familiar, na comunidade e sexual...63

4. Mapeando Violências...72

(8)

4.2 Dano e Produção Racional...75

4.3 Fronteiras demarcadas: a sociedade intimizada e não coletiva...79

4.4. Violência e juventude...83

4.4.1 Globalização, jovens e violências...85

4.4.2 Violência e formas de enunciação...87

4.4.3 Juventude e vulnerabilidade à violência...89

5. Relações de amizade como suporte social no enfrentamento à violência...95

5.1 Duradouras amizades...98

5.2 Enquanto isso em Bom Pastor...104

6. Considerações Finais...108

7. Referências Bibliográficas...111

(9)

Lista de figuras

Figura Página

01. Sexo...42

02. Atividades remuneradas...43

03. Renda familiar...45

04. Esportes praticados...49

05. Atividades realizadas quando não estão na escola...51

06. Acompanhante nas práticas de saúde...56

07. Dificuldades enfrentadas no cotidiano...59

08. Bases recorridas para o enfrentamento das dificuldades...60

09. Insatisfação quanto aos serviços públicos...62

10. Violência sofrida na comunidade...66

11. Bases recorridas na ocorrência de episódios violentos na comunidade...67

(10)

Lista de tabelas

Tabela página

01. Turmas selecionadas para aplicação do instrumento...41

02. Diversão...51

03. Violência intrafamiliar...64

04. Busca de ajuda no caso de violência intrafamiliar...64

05. Violência física na família...65

06. Tipos de violência na comunidade quanto ao sexo...68

(11)

Resumo

Esta dissertação teve como objetivos mapear as bases de apoio familiares e comunitárias para adolescentes e jovens estudantes no bairro de Bom Pastor, Zona Oeste de Natal/RN e conhecer de que forma esses recursos são usados pelos adolescentes e jovens estudantes desta comunidade. Bases de apoio referem-se tanto a atividades ou organizações formais quanto a formas de apoio espontâneas ou informais - redes de amizade e solidariedade, relações afetivas significativas na vida de crianças e jovens disponíveis na comunidade. Nossa discussão tem como base uma pesquisa realizada com 382 adolescentes e jovens estudantes da Escola Estadual Jean Mermoz, alunos do Ensino Fundamental II e médio, com idade entre 13 e 24 anos. Focamos as situações de violência vivenciadas por esses estudantes, sejam elas ocorridas no âmbito familiar ou ocorridas na comunidade. Em relação a esse aspecto os participantes recorrem com mais freqüência às bases de apoio informais, sobretudo os amigos, indicando que as bases formais não se configuram como dispositivos de suporte social. A busca das bases informais aponta que as relações estabelecidas informalmente no espaço da rua (quando procuram amigos, parentes ou vizinhos) têm mais ressonância, configurando-se como um lugar importante no qual há troca de valores e de afetos. Pensar o fortalecimento desses laços sociais é importante e aponta para o enfraquecimento da lógica hegemônica voltada para a produção de sujeitos como identidades privatizadas, para o fortalecimento de uma ética comprometida com a desmontagem de uma sociabilidade ancorada no medo, na impotência, na redução dos espaços de circulação e de enfrentamento dos dispositivos montados para reforçar a exclusão social, a intolerância e a discriminação. Deve-se voltar para a construção da amizade como um sistema de reciprocidade, de trocas afetivas, como um espaço de agenciamento político e de produção de formas de vida potentes contra a anestesia social.

(12)

Abstract

The purpose of this work is to map the family and community social supports for adolescents and young students from Bom Pastor Distric, West Zone of Natal/RN, as well as to describe how such resources are used by these individuals in that community. Social support refers not only to formal activities or organizations, but also to spontaneous or informal forms of support – friendship and solidarity nets available in the community, affective relations that are meaningful in the lives of children and young people. Our discussion is based on a research performed with 382 adolescents and young students from Jean Mermoz Public School (students from 5th to 11th grades, aged 13 to 14). We emphasized the situations of violence derived from family or community spheres faced by these students. In relation to this specific aspect, we observed the participants more frequently look for help from the informal social supports, mostly from their friends, which indicates that the formal ones are not considered to be effective instruments for social assistance. The search for informal social supports shows the relations informally established in the streets (for instance when they look for help from friends, relatives or neighbors) have more effect and play an important role in which there are values and affections exchange. Thinking the strengthening of these social links is of extreme importance and leads to the weakening of the hegemonic logics focused on the production of subjects as private identities, and to the amplification of an ethics committed to the disassembly of a sociability anchored to fear, impotence, intolerance, discrimination, and reduction of spaces for circulating and confronting mechanisms of social exclusion. It is crucial that we concentrate our attention to building friendship as a system of reciprocity and affective exchanges, as a space for political actions and production of forms of lives that are potent against social anesthesia.

(13)

Apresentação

A presença da violência dentre os humanos data, talvez, desde as suas primeiras

formas de civilização. Ao longo da história, a violência vem sendo utilizada para

demarcar e expandir territórios, defender interesses; participando também do cotidiano

das comunidades em suas formas de se relacionar, de educar, de sentir e de viver. A

partir do início da modernidade, apresenta formas complexas que guardam redes

articuladas e, ao mesmo tempo, fragmentadas, dificultando a sua compreensão e a

elaboração e execução de formas de intervenção.

Atualmente, as pessoas que mais sofrem, em termos de mortalidade, com os

diversos eventos violentos no contexto mundial encontram-se na faixa etária conhecida

como produtiva, entre 15 e 44 anos. Os adolescentes e jovens entre 15 e 24 são os

maiores envolvidos nessa situação, assumindo os papéis de vítima e perpetrador, tanto

matam como morrem (OMS, 2002).

Estudos no campo da Saúde Coletiva têm demonstrado que as populações de

áreas menos favorecidas economicamente são as mais afetadas, sobretudo nos espaços

urbanos, em relação aos eventos violentos envolvendo adolescentes e jovens. Esta

situação não é diferente no Brasil. Pensar estratégias de intervenção em relação à

violência entre jovens passou, nos últimos vinte anos, a ser pauta para as diversas áreas

do conhecimento, seja no campo das ciências humanas e sociais (sociologia,

antropologia, psicologia, direito) ou no campo das biociências (medicina, biologia)

(Minayo, 2003).

Na metade do século XX e, como mais afinco, no final da década de 1990,

estudos e pesquisas sobre bases de apoio surgiram no contexto mundial. Esses trabalhos

(14)

para o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes, incrementando também a

vida das famílias e das comunidades.

Bases de apoio referem-se tanto a atividades ou organizações formais - creches,

escolas, programas religiosos, clubes, centros juvenis -, quanto a formas de apoio

espontâneas ou informais – grupos familiares, redes de amizade e solidariedade,

relações afetivas significativas na vida de crianças e jovens disponíveis na comunidade.

A potencialização dessas bases de apoio favorece o incremento das potencialidades de

crianças, adolescentes e jovens. Desta forma, tal fortalecimento facilita o

desenvolvimento em todos os âmbitos, podendo contribuir também na construção de

novas formas de existência, e auxiliar também no tocante à violência.

Tendo em vista as discussões acima, esta pesquisa de mestrado teve como

objetivos: a) mapear as bases de apoio familiares e comunitárias para adolescentes e

jovens estudantes no bairro de Bom Pastor, Zona Oeste de Natal/RN; b) conhecer de

que forma esses recursos são usados pelos adolescentes e jovens estudantes desta

comunidade. Ao longo desta dissertação, teremos como foco a questão da violência

entre jovens.

Para a discussão de tal temática, num primeiro momento, no Capítulo I,

discutiremos acerca da construção dos olhares lançados sobre a infância, adolescência e,

conseqüentemente, juventude ao longo da história de atendimento e de elaboração e

execução de políticas sociais no Brasil a partir do fim do século XIX.

A discussão acima será articulada no Capítulo II, quando demarcaremos

teoricamente bases de apoio e a demanda histórica de sua valorização, tanto em termos de reconhecimento sócio-cultural quanto em relação a uma categoria a ser estudada e

investigada. Apresentaremos também pesquisas e alguns trabalhos realizados com bases

(15)

caminhos que foram seguidos na execução deste trabalho. Em seguida, discutiremos

acerca dos resultados obtidos por esses estudos, que demonstraram o quanto a violência

tem ressonância no desenvolvimento das bases de apoio e interfere na vida das

comunidades investigadas, tornando-se uma dificuldade a ser enfrentada; trataremos

também do impacto da violência sobre adolescentes e jovens no Brasil e em Natal/RN.

No Capítulo III, apresentaremos os passos metodológicos e o instrumento de

investigação que adotamos. Apontaremos os dados do contexto de Bom Pastor.

Debateremos também os resultados da investigação, procurando demarcar a situação

das bases de apoio no Bairro e a participação dos jovens nas mesmas, sejam formais ou

informais.

Uma discussão sobre violência e sua multiplicidade de formas de se manifestar,

sobretudo entre jovens, será desenvolvida no Capítulo IV a partir dos dados sobre

violência que identificamos na pesquisa.

Por fim, em um último momento, desenvolvido a partir dos nossos dados em

relação à participação das bases de apoio informal, sobretudo no que diz respeito às

relações de amizade, tentaremos desenvolver um debate acerca do papel dos amigos na

construção de novas formas de existir com o intuito de mudança da realidade e, como

(16)

CAPÍTULO 1 – Infância e adolescência brasileira: concepções

e políticas do século XX

(17)

1. Infância e adolescência brasileira: concepções e políticas do século

XX

As políticas sociais direcionadas à infância no Brasil, desde o período imperial,

têm seguido uma tradição que enfoca demasiadamente a situação de risco e os

problemas enfrentados pela população infanto-juvenil oriunda das classes

desfavorecidas, como por exemplo, o uso indiscriminado de drogas, trabalho infantil,

prostituição, evasão escolar, situação de rua de meninos e meninas. Tais políticas têm

características remediativas e só surgem quando os problemas se encontram em estágios

de difícil reversão.

Esta tendência fica mais bem elucidada quando compreendemos a concepção de

infância construída, sócio historicamente, no seio da sociedade brasileira. O âmbito

jurídico é a melhor expressão social da construção de tal concepção.

Esta construção pode ser expressa através da constituição do termo ‘menor’, que

até meados da década de 1900 era usado pela classe jurídica para identificar uma

questão etária em termos de maior ou menoridade penal. Com o avanço do século XX, o

termo passou a ser utilizado pela imprensa e, logo, pela sociedade, assumindo uma

conotação pejorativa. Ser menor significava ser uma criança (ou adolescente) pobre,

abandonada moral e materialmente, pelos pais, Estado e sociedade; ou delinqüente,

referindo-se aos menores que incorriam em crimes (Londoño, 1996).

As concepções presentes no imaginário social do início do século XX, e que

perduram até hoje, propõem que menor é um individuo gerado por pais suscetíveis ao

vício e à libertinagem, não havendo, nas idéias difundidas na época, nenhuma ligação

com as condições de vida impostas pela modernidade capitalista e industrial. Desta

(18)

associação direta entre criança e criminalidade, infância e periculosidade” (Rizzini,

1997, p. 202). As leis elaboradas, principalmente, no início do século XX, a exemplo do

Código de Menores de 1927, embora representassem um avanço, na medida em que

havia um reconhecimento da necessidade de existência de legislação específica para a

infância, foram baseadas em idéias que tomavam a criança ou o adolescente como

perigosos (Passetti,1996). Vigilância, controle e repressão faziam parte da pauta das

leis. As destinações dadas aos menores, compreendidos como delinqüentes pelos juízes,

eram a contenção e o enclausuramento com vistas a reeducá-los. Àqueles que eram apenas abandonados e não se encontravam em conflito com a lei eram destinadas

atividades profissionalizantes, que se caracterizavam por atividades manuais, de forma a

adestrá-los ao trabalho, encaixando-os na exploração mercadológica (Rizzini, 1997).

Desta forma, percebemos que o alvo das políticas públicas era a classe pobre

composta principalmente por negros, haja vista que estes não tiveram apoio para se

engajar na vida social após a promulgação da Lei Áurea. No ideário da época, a pobreza

passou a ser considerada fonte de desordem, destituída de moralidade, de onde

emanavam depravações e irregularidades que colocariam o futuro do país em perigo, já

que havia uma preocupação com o avanço do modelo capitalista, e o pobre brasileiro

era concebido como contemplador da vida vagabunda, que significava um

descomprometimento para com a pátria. (Rizzini, 1997)

Tomando como base estas concepções, as políticas sociais foram construídas,

principalmente a partir do processo de implantação do Estado republicano, no fim do

século XIX, e seguem até hoje os ideais do paradigma do risco, caracterizado pelas representações de reabilitação, recuperação e regeneração do menor, enfocando-se

sempre o risco, a criança-problema. Carregadas de preconceitos, assumem uma postura

(19)

adolescentes que estão em situação de risco, para os quais as ações serão direcionadas,

e, por outro, excluem todas as demais como estando fora de linha de atuação de

programas, que compõem justamente a situação da maioria das crianças e adolescentes,

que vivem em situação de miséria social.

Em suma, historicamente, as políticas vêm sendo elaboradas seguindo uma

representação de pobreza difundida no Brasil no final do século XIX e início do XX:

As famílias dos setores populares, quase sempre associadas à ‘ignorância / pobreza / descuido / vício / abandono / licenciosidade’, e muitas vezes vistas como criadoras de criminosos e delinqüentes, eram acusadas de ‘incapazes’ no que diz respeito à educação e à formação de suas crianças...(Abreu e Martinez, 1997, p.25).

Além disto, as ações são planejadas de forma descontextualizada, procurando

sempre transmitir um modelo de família nuclear burguesa, que quase sempre não é

compartilhado pelos arranjos familiares das comunidades pobres.

Na década de 1980, influenciadas pelo movimento de redemocratização do país,

surgem mobilizações sociais em forma de militância, tais como, Movimento Nacional

de Meninos e Meninas de Rua, organizações não governamentais e programas de

extensão desenvolvidos por centros de pesquisa-ação, como a CESPI-USU

(Coordenação de Estudos e Pesquisas sobre Infância – Universidade de Santa Úrsula),

questionando os paradigmas que pautavam as práticas institucionais. Objetivavam

transformar a visão pejorativa que caracterizava o termo ‘menor’ e as ações

caracterizadas pela centralização de decisões, assistencialismo e repressão, desfazendo a

dicotomia existente entre criança/adolescente e menor.

Segundo Faleiros (1995), projetos alternativos, que articulavam a iniciativa

(20)

atendimento diretamente nas ruas e nas comunidades entraram em expansão em

detrimento das políticas e práticas que priorizavam o internamento e a repressão, que

eram comuns no início de século XX e que acabaram se renovando com o advento da

ditadura militar e reafirmando o estilo asilar de tratar crianças e adolescentes (Rizzini,

1995).

Em 1990 é criado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Esse

documento é fruto de mobilizações em defesa do direito da criança. A criança e o

adolescente são compreendidos como sujeitos de direitos e estando em fase especial de

desenvolvimento que necessitam de oportunidades para desenvolverem-se. O Estatuto

traz uma descentralização administrativa, colocando a participação dos Conselhos de

Direitos e Tutelares, da comunidade1, da família em conjunto com o poder público. O ECA elimina a denominação menor e utiliza as nomenclaturas criança e adolescente,

reconhecendo-os em condições especiais de tratamento pela justiça. Além disso, derruba

o Código de Menores de 1979, que monopolizava as decisões nas mãos do juiz. Este é

um avanço político-social, pois delega responsabilidades a outras camadas da sociedade

e as crianças e adolescentes passam a serem concebidas de diferentes óticas.

Observamos que a inclusão dos conselhos nas decisões práticas como tutela, guarda e

realização de programas e projetos, revela uma evolução democrática pertinente que

permite um equacionamento dos problemas de forma partilhada e racional por

intermédio das discussões construídas no debate dos diferentes olhares.

Observamos que o Estatuto tem encontrado dificuldades para sair do papel. A

sociedade civil ainda não acordou para o princípio aí presente, da criança (ou

1 Lançaremos mão, ao longo desta dissertação, do termo comunidade; no entanto, esta palavra, de acordo

(21)

adolescente) como sujeito de direitos. Muitas comunidades, que enfrentam problemas

com crianças e adolescentes, sequer conhecem os direitos fundamentais e, pior, o papel

dos Conselhos e como podem participar nas ações dos mesmos. É importante lembrar

que o Estatuto encontra barreiras culturais para sua implantação; as comunidades,

muitas vezes não compartilham da concepção de infância proposta no ECA. Além disso,

a história do Brasil está embebida, desde antes do surgimento da república, de práticas

arraigadas ao autoritarismo e ao estilo corretivista/punitivo/higienista.

As mobilizações supracitadas, que desembocaram na criação do ECA,

propunham uma visão mais ampla, que englobasse todas as crianças e adolescentes,

abandonando o foco na infância, ou na adolescência, pobre e marginalizada como alvo

das políticas estatais. Um olhar que levasse em consideração a infância como fase

especial de desenvolvimento, que necessita de oportunidades para se desenvolver

integralmente. A pauta defendida era a da cidadania, a da inclusão. A intenção era

difundir a criança e o adolescente como sujeitos de direitos que necessitam de cuidados

(22)

CAPÍTULO 2 – Bases de apoio e Juventude

Quem me dera, ao menos uma vez, que o mais simples fosse visto

(23)

2. Bases de apoio e Juventude

O projeto referido no item anterior foi criado em 1999 pela CESPI-USU na

Universidade de Santa Úrsula no Rio de janeiro - RJ, com o apoio do Instituto

Promundo2. O objetivo do projeto era mapear as bases de apoio familiares e comunitárias para crianças e adolescentes. Hoje em dia, conhecido como Projeto Bases

de Apoio, é coordenado pela CIESPI/PUC3 (Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância – Pontifícia Universidade Católica/RJ) e tem realizado um

trabalho de pesquisa-ação que se organiza dentro dos moldes supracitados, procurando

desenvolver nas comunidades carentes do Brasil ações que priorizem o pleno

desenvolvimento da criança e do adolescente, a partir do fortalecimento de suas Bases

de Apoio.

Os estudos sobre bases de apoio se iniciaram nos Estados Unidos. Os contextos

mundial e acadêmico que se configuraram a partir da segunda metade do século XX

propiciaram o surgimento de Bases de Apoio e, conseqüentemente, começaram a

florescer pesquisas sobre o assunto.

De acordo com Costello, Pickens e Fenton (2001), crianças e adolescentes

necessitam de elos consistentes com o mundo físico e de interações fortes com outras

crianças e adultos para poderem desenvolver a capacidade de vitalidade física,

aprendendo como utilizar seu corpo e como controlá-lo. Para tal, a criança precisa de

proteção e cuidados para explorar o mundo e internalizá-lo de forma saudável. Segundo

tais autores, a criança, para desenvolver sua capacidade para relacionamentos, vale-se

dos relacionamentos que tem com as pessoas dela encarregada, que, através de

2 Organização internacional de financiamento a pesquisas e projetos sociais.

(24)

interações seguras, contribuirão para a expansão dos relacionamentos para círculos

sociais mais amplos. “(...) o desenvolvimento cognitivo e social também depende do

nível de segurança, estímulo e intimidade das pessoas encarregadas das crianças” (p.

16). Redes sociais informais são vitais para o desenvolvimento infantil. Necessário, para

tal desenvolvimento, faz-se a amplificação de relacionamentos sociais, incluindo um

contato com demais parentes e inter-relações comunitárias. Esta amplificação pode ser

realizada, também, através de bases de apoio comunitárias organizadas, tais como

creches, centros sociais, grupos religiosos, grupos de jovens. Organizações formais de

apoio podem dar às crianças e adolescentes oportunidades de desenvolvimento a partir

de atividades que seus pais cerceiam ou não possam proporcionar, estimulando, assim, a

criatividade do indivíduo.

Costello, Pickens e Fenton (2001) ainda afirmam que o desenvolvimento das

capacidades física, cognitiva, social (relacionamentos) e de autonomia dependem das

oportunidades de lidar com o mundo físico e social. O contato com crianças mais

velhas, adultos de suas famílias e redes sociais informais proporciona às crianças uma

melhor apreensão do mundo, de forma a achar soluções para os problemas emergentes,

construindo de maneira autônoma seus objetivos. Vygotsky (1989), quando postula a

Zona de Desenvolvimento Proximal, levanta a importância do entorno sócio-cultural

para o desenvolvimento individual das funções psicológicas superiores.

Com a cristalização do modo de trabalho do capitalismo industrial nos Estados

Unidos e no Ocidente, na metade do século XX, a dinâmica de vida da família nuclear

começou a passar por mudanças. Em busca de recursos financeiros, as famílias mudam

de comunidades com maior freqüência. Nas metrópoles, as famílias desenvolveram

insegurança em relação aos relacionamentos dos filhos, dificultando as interações

(25)

diminuindo o apoio informal aos filhos e inviabilizando o contato desses com crianças

de outras famílias. Com a diminuição do número de membros nas famílias, poucos

parentes, tais como, tias, irmãs, primas, podiam auxiliar na criação das crianças. Nas

comunidades populares, o incremento da pobreza fez com que os pais não tivessem

também condições financeiras para proporcionar um desenvolvimento integral; logo,

temos um contexto propício para o surgimento e a expansão das bases de apoio formal,

como, por exemplo, agremiações religiosas, grupos estudantis, creches, escolas de

tempo integral, organizações não governamentais de suporte físico e mental para

crianças e adolescentes, grupos de escoteiros. Tais bases surgiram para ajudar os pais na

tarefa de criar seus filhos: para assegurar o crescimento dos filhos de pais que têm que

cumprir uma longa jornada de trabalho nas comunidades abastadas e nas comunidades

carentes, para criar oportunidades de desenvolvimento físico e sócio-econômico.

Bases de apoio referem-se, pois, aos relacionamentos das crianças e dos

adolescentes em todas as áreas. Inter-relações afetivas com pais, parentes e demais

integrantes da comunidade, sustentadas por laços afetuosos e de solidariedade. Elos

comunitários com organizações que lhe propiciem o desabrochar de suas

potencialidades cognitiva, emocional, social, cultural, vocacional, incrementando o

desenvolvimento da criatividade com vistas ao alcance da autonomia (Rizzini, Barker e

Cassaniga, 2000; Zamora e Silva, 2002). São os recursos familiares ou comunitários,

que podem ser formais (creches, associações de moradores, ong’s, grupo de jovens,

instituições religiosas, escolas) e informais (ligações afetivas, envolvendo família,

demais parentes e amigos), fundamentais para respaldar o desenvolvimento integral da

criança e do adolescente (Rizzini, Barker e colaboradores, 2001). Segundo Zamora

(26)

formais ou informais, que ajudam os pais na tarefa de educar, proteger, e cuidar das

crianças e adolescentes” (p.109).

O projeto Bases de Apoio, desenvolvido pela CIESPI-PUC, revela uma atitude

que busca mudar a ótica no atendimento à infância e à adolescência, abandonando o

enfoque na criança-problema, representado na visão de ‘menor’, e adotando uma forma

de se englobar todas as crianças e adolescentes, de forma a criar oportunidades para o

desenvolvimento integral de todas. O objetivo desse projeto é desenvolver,

conjuntamente com as comunidades, ações que viabilizem a criação de circunstâncias

favoráveis para o desenvolvimento das potencialidades, procurando desconstruir a visão

de criança e adolescentes como riscos para elas mesmas e para a sociedade (Rizzini,

1995), bem como o abandono do paradigma que postula a ligação direta entre

crime-pobreza (Passetti, 1996). Esta perspectiva almeja envolver a comunidade na busca de

soluções para seus problemas e criar redes de solidariedade e sustentabilidade.

Tal projeto teve como primeira iniciativa o contato com as comunidades,

identificando e mapeando as bases de apoio comunitárias para pais e filhos. Em seguida,

fez um levantamento, junto à população, das reais necessidades e dos problemas

enfrentados nas comunidades. Além disso, buscou conhecer as propostas elaboradas

pelos moradores com vistas a propor ações em consonância com os mesmos, evitando,

assim, ações que têm uma ótica deturpada, ou uma visão de fora-para-dentro, sem qualquer contextualização.

O Projeto Bases de Apoio, de acordo com Rizzini, Barker e Cassaniga, (2000),

está em consonância com a visão de infância apregoada pelo Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA). Neste, a criança é vista como estando em fase especial de

desenvolvimento, que precisa ter os seus direitos básicos respeitados, como por

(27)

pleno desenvolvimento (art.6). Para cumprir tal intento, o Estatuto inclui, além da

participação do Estado, o envolvimento da família e da comunidade como fundamentais

na garantia de tais direitos. Esses são reconhecidos, no Estatuto, como elos

imprescindíveis, através da convivência das crianças em ambos. Logo, percebemos a

importância do fortalecimento das bases de apoio.

O Projeto Bases de Apoio já foi editado com sucesso em várias regiões do

Brasil, como, por exemplo, no Rio de Janeiro (Santa Marta e Bangu), em Goiânia

(Projeto Desenhos de Famílias), na Bahia (Projeto Cidade Mãe), em Minas Gerais

(Projeto Curumim). Procuraremos, agora, fazer um relato das experiências realizadas

pela equipe da CIESPI-PUC no Rio de Janeiro para perfazermos os passos

metodológicos que foram seguidos neste trabalho.

2.1 Experiências e resultados do projeto bases de apoio4

A equipe da CIESPI-PUC realizou duas experiências de mapeamento das bases

de apoio no Rio de Janeiro. A primeira delas foi na Favela Santa Marta, Zona Sul do

Município. Os membros da equipe lançaram mão de técnicas qualitativas, procurando

tomar conhecimento das instituições da comunidade que promoviam ações em benefício

da população infanto-juvenil. Entrevistaram informantes-chave, que forneceram dados

sobre a situação da infância e adolescência da comunidade e sobre os programas

existentes. A partir destas informações, a equipe visitou, posteriormente, instituições

que trabalham com adolescentes no local. Logo após, foram realizados grupos focais

com adolescentes, profissionais e pais para entender como as pessoas da comunidade

criam seus filhos e identificar com quem os pais contam nessa tarefa. Buscando

4 Para um melhor detalhamento ver:

(28)

compreender a participação das redes de apoio informal, foram realizadas entrevistas

detalhadas com mães e avós.

A segunda experiência foi realizada em Bangu, subúrbio do Rio de Janeiro, nas

comunidades de Nova Aliança e Vila Aliança. A adolescência de 13 a 18 foi o foco

dessa etapa da pesquisa. Um misto de procedimentos qualitativos e quantitativos foi

utilizado. Grupos focais foram realizados com adolescentes com vistas a conhecer os

elos comunitários formais da comunidade para a juventude. Profissionais que trabalham

com adolescentes em programas de Bangu foram entrevistados. A partir da análise

desses primeiros dados, construiu-se um instrumento em forma de questionário para

conhecer a cultura adolescente de Bangu. Jovens da própria comunidade foram

selecionados e treinados para ajudarem na construção de tal instrumento e na aplicação

do mesmo. Duzentos e vinte e cinco (225) questionários foram aplicados de forma

aleatória, em locais diversos, onde os encontros entre jovens eram comuns.

Resultados

As investigações nas duas comunidades mostraram que há um desconhecimento

da população a respeito dos programas existentes, na comunidade, para crianças e

jovens. Revelaram também que são escassas as atividades culturais para adolescentes. A

participação de jovens em grupos informais é bem maior do que em programas formais

estruturados e não existe intercâmbio entre os dois tipos de grupo. A presença do tráfico

de drogas é um fator que impacta nos programas de forma negativa.

A violência dentro da própria família é comum, bem como a falta de assistência

quando na incidência desta violência. Por se constituir um tabu, o abuso sexual, embora

mencionado como violência recorrente, não é encarado como problema que deve ser

(29)

Conclusões

A equipe da CIESPI-PUC apontou as seguintes conclusões: escassez de

financiamentos e programas para jovens; a comunidade tem mais apoio informal do que

formal, revelando que os equipamentos sociais não funcionam adequadamente e que a

população confia mais nos recursos informais. Além disso, viu-se que famílias e

comunidades dos setores populares podem ser animadas e encorajadas para a tarefa de

criar e proteger suas crianças, mas necessitam de suporte no que diz respeito ao

desenvolvimento de suas bases de apoio formal, através da amparo financeiro e técnico

para fomentar e melhorar seus esforços.

A equipe ainda destacou a necessidade de se ampliar a implantação de projetos

com as diretrizes do Bases de Apoio em outras comunidades brasileiras. É nesse sentido que visualizamos a implantação dessa proposta em Natal/RN, propondo também uma

articulação investigativa sobre violência juvenil.

2.2.Caminhos da pesquisa: violências

Entre os resultados levantados pela equipe do CIESPI-PUC nessas duas

comunidades, o que nos chamou mais atenção foi a presença da violência no cotidiano

das crianças e, principalmente, dos adolescentes e jovens. Segundo estes dados, a

violência tem um impacto muito grande na comunidade e na vida de seus moradores.

Nesta seção procuraremos levantar os problemas gerados pela violência nas duas

comunidades em questão e o impacto que provocam nas bases de apoio e o papel das

mesmas; em seguida, discutiremos o contexto da violência em sua expressão entre os

jovens.

Os eventos violentos promovem uma circulação restrita nas comunidades

(30)

domésticos por terem medo da ocorrência de episódios violentos. Os espaços públicos

destinados ao lazer, tais como, os centros culturais, as praças públicas e as quadras

poliesportivas, são ocupados por pessoas que, geralmente, estão envolvidas em

episódios violentos, tais como, gangues, traficantes e usuários de drogas.

As opções de culturais, geralmente, são também marcadas pela violência. No

Rio de Janeiro, as comunidades carentes, muitas vezes, têm os bailes funks como os

únicoslocais onde adolescentes e jovens podem se encontrar e interagir. No entanto, os bailes são marcados pelas brigas entre gangues rivais, pelo tráfico e consumo de drogas

e pela presença da polícia, que, através do uso da violência, tenta evitar o acontecimento

de episódios violentos.

Segundo os adolescentes investigados em Bangu, o espaço doméstico é encarado

com positividade; no entanto, também é marcado pela ocorrência de episódios

violentos. O âmbito familiar, por 21% destes adolescentes, assume também uma

conotação negativa em função da presença da violência intrafamiliar.

De acordo com o CIESPI-PUC, a violência tem ressonância nas bases de apoio,

dificultando a atuação das mesmas e a implantação de novas iniciativas formais para

crianças adolescentes e jovens. O confinamento que essas famílias vivem em função da

violência dificulta o incremento das bases informais de apoio, pois os moradores

circulam menos nos espaços públicos e, assim, desenvolvem poucos laços afetivos com

as demais pessoas da comunidade. O que acaba por promover uma desarticulação

política entre os moradores e se configura como uma estratégia de controle sobre essas

populações.

Podemos perceber, portanto, que a pouca atuação de bases de apoio e a

inexistência das mesmas parece facilitar o avanço da violência nessas comunidades e

(31)

articulação das bases e o incremento das mesmas devem ser pensados como dispositivos

de enfrentamento à violência.

2.2.1 Violência e bases de apoio

Alguns estudiosos do campo das políticas públicas têm apontado que as próprias

comunidades envolvidas em problemas sociais podem se articular para resolução de

seus entraves. Esta postura pode trazer para população resultados mais eficazes, pois a

ela mesma conhece melhor a realidade em que vive e pode levantar resoluções

contextualizadas e pô-las em prática. Zaluar (1997) propõe a mobilização popular

através de linhas de reciprocidade e solidariedade com vistas a fortalecer os vínculos

sociais e dar suporte às comunidades no enfrentamento das dificuldades enfrentadas no

cotidiano. Vítor Valla (1999) defende que os cidadãos podem resolver seus problemas

através da participação popular, que articula a reivindicação do papel do Estado e a

atuação ativa dos mesmos no equacionamento das problemáticas enfrentadas. Baumam

(2003) acredita que o fortalecimento dos laços comunitários propicia uma melhor

convivência entre os cidadãos e auxilia na busca de segurança e na criação de

alternativas para os problemas vividos especificamente por cada comunidade.

No tocante à questão da violência, Vergne (2002), Zamora (1999) e Velho

(2000) apontam que esta avança também ajudada pela queda, nos últimos tempos, dos

laços solidários nas comunidades, que passam a adotar uma conduta

individualista-privativa, característica da sociedade moderna. Segundo estes autores, este processo se

dá de forma mais severa nas comunidades mais diretamente envolvidas com a violência,

como já dissemos anteriormente, porque o medo, a lei do silêncio e o

auto-enclausuramento passam a ser condutas que garantem, dependendo do contexto, a

(32)

Pensamos que o fortalecimento das bases de apoio comunitárias e familiares

pode funcionar como estratégia política de enfrentamento à violência. As Bases

informais, que são os laços afetivos com que contam a criança, o adolescente e o jovem

para se desenvolverem, segundo o grupo da CIESPI-PUC, são os recursos mais

utilizados e que têm maior relevância na tarefa de cuidar e proteger crianças e

adolescentes e podem contribuir bastante neste processo de enfrentamento (Rizzini &

Barker, 2001). A articulação da população pode provocar mudanças estruturais na

realidade local, desde que envolva mobilização popular no sentido de resolver os

próprios problema e reivindicação por melhores condições para o fortalecimento das

bases de apoio formal, participando da gestão das ações (Valla, 1999). Além disso,

principalmente as bases informais podem funcionar como produtoras de referentes

culturais para pais e filhos com o objetivo de desenvolver valores de vida coletivizada.

Veremos que os principais envolvidos em episódios violentos são os

adolescentes e jovens. São os que mais têm morrido e matado. Ações de enfrentamento

à violência devem levar em consideração tal população e realizadas de acordo com os

contextos específicos em que os jovens se encontram envolvidos. A seguir, trataremos

do impacto da violência sobre adolescentes e jovens no Brasil.

2.2.2 Violência entre jovens5

Segundo o Relatório Mundial sobre Violência e Saúde da Organização Mundial

de Saúde (2002), as violências praticadas por adolescentes e jovens têm grande

visibilidade na sociedade, pois as principais vítimas são os próprios jovens. Este tipo de

violência causa prejuízos para além das mortes em si e dos danos causados à saúde.

5 Os dados sobre mortalidade que apresentaremos nesta seção sobre o Brasil e Natal/RN foram obtidos no

(33)

Entre eles, pode-se destacar: o aumento dos custos em relação aos serviços de saúde e

de bem-estar social; o decréscimo da produtividade; a desvalorização das propriedades

próximas a regiões tidas como violentas; o prejuízo do funcionamento de serviços

essenciais (bases de apoio formais); a propagação do medo entre as populações,

dificultando a articulação política das mesmas; enfim, prejuízo ao futuro das nações.

No ano de 2000, os homicídios juvenis, de acordo com a OMS (2002), para

indivíduos entre 10 e 29 anos de idade, somaram 199 mil, tendo uma média de 565

mortes por dia em todo mundo. Os índices são mais elevados na África (17,6 para cada

100 mil habitantes) e, principalmente, na América Latina (36,4 para cada 100mil

habitantes).

Pesquisas do campo da saúde coletiva demonstram que, nas duas últimas

décadas, os índices sobre violência têm atingido índices alarmantes no Brasil. A

mortalidade por causa externa (homicídios, acidentais e intencionais)6 cresceu cerca de 50% entre o fim dos anos 70 e meados dos anos 90, sobretudo em relação às populações

mais jovens (Mello Jorge, 2002). As causas externas foram responsáveis por 34.684

mortes de jovens entre 15 e 24 anos, 72,03% dos óbitos nesta mesma faixa etária em

2002.

Os homicídios estão em primeiro lugar entre as mortes por causas externas para

população em geral. Em 2002, representaram 49,2%, seguidos dos acidentes de trânsito

(26,3%). Para os jovens entre 15 e 24 anos, tal proporção foi de 62,42% para o mesmo

ano, representando 44,97% das mortes para esta faixa etária, seguidas pelos óbitos em

acidentes de trânsito com 15,7%. Os homicídios configuram-se como a principal causa

para esta população.

(34)

Além de serem mais freqüentes entre jovens, os homicídios atingem com maior

contundência a população masculina. Dos 19.207 homicídios registrados em 2002 no

Brasil na faixa entre 15 e 24 anos, 18.021 atingiram indivíduos do sexo masculino.

Em Natal, no ano de 2002, a situação não é muito diferente: das 641 mortes por

causas externas em toda a população natalense, 178 acometeram jovens entre 15 e 24

anos, registrando um aumento de aproximadamente 14% em relação ao ano de 2000; as

causas externas representaram 63,8% das mortes entre jovens da mesma faixa etária,

92,13% destas mortes foram sofridas pela população masculina. Em relação aos

homicídios, 93,75% destes atingiram a população masculina entre 15 e 24 anos no ano

de 2002.

Acreditamos que esses números possam ser maiores, pois o registro das mortes

por homicídio tem implicações jurídicas, e os médicos têm receio nessa questão, o que

produz um processo de sub-notificação desses casos. A existência dos grupos de

extermínio e o uso de cemitérios clandestinos também dificultam o processo de registro

(35)

Capítulo 3 – Bases de Apoio em Natal/RN

O sol nasce e ilumina as pedras evoluídas que Cresceram com a força de pedreiros suicidas Cavaleiros circulam vigiando as pessoas

Não importa se são ruins Nem importa se são boas

(36)

3. Bases de apoio em Natal/ RN

Com base nos dados apresentados pelo Projeto Bases de Apoio realizado no Rio

de Janeiro, bem como naqueles que refletem a situação da violência entre jovens no

contexto nacional e local, definimos nossa proposta de trabalho para esta dissertação7, que consiste no mapeamento das bases de apoio familiares e comunitárias no bairro de

Bom Pastor, Zona Oeste de Natal/RN. Para tanto, seguimos os passos metodológicos

traçados pelo projeto inicial Criança não é Risco, é Oportunidade em Bangu, Rio de Janeiro, já descrito.

Tal mapeamento estará ancorado nos seguintes eixos:

x Mapear as bases de apoio familiares e comunitárias para adolescentes e jovens

estudantes no bairro de Bom Pastor, Zona Oeste de Natal/RN.

x Conhecer de que forma esses recursos são usados pelos adolescentes e jovens

estudantes desta comunidade.

Escolhemos esta região por se configurar como área carente da capital e

apresentar graves indicadores sociais8: maior índice de Mortalidade Infantil da cidade (21,42%); maior índice de gravidez precoce e maior incidência de doenças sexualmente

transmissíveis e AIDS. De acordo com informações colhidas pelo IBGE (2000),

aproximadamente 22,5% dos chefes de família são analfabetos e 22,12% têm somente

de um a três anos de estudo. Além disto, segundo pesquisa realizada pelo Centro de

Direitos Humanos e Memória Popular, a partir de matérias de jornais locais, a Zona

Oeste apresenta o maior índice de homicídios. Silva (1997) aponta um nível bastante

alto de transgressões cometidas pela população jovem desta região. A violência atinge a

7 Pesquisa aprovada pelo Conselho de Ética em Pesquisa. UFRN. (apêndice A).

8 Projeto Global Engenho de Sonhos (2001). Construção Coletiva de Uma Estratégia de Combate à

(37)

população jovem da Zona Oeste em forma de abusos sexuais, abandono, tráfico /

consumo de drogas e exploração do trabalho infantil. Esta região também foi eleita por

apresentar algumas ações relacionadas ao desenvolvimento da área, como por exemplo,

o Fórum Engenho de Sonhos de Combate à Pobreza, o Projeto UNI-Natal em parceria

com várias entidades, com o apoio da Fundação W. K. Kellog, que visam promover o

desenvolvimento dos jovens a partir de suas participações na comunidade. Tal fato

facilitou de certa forma nossa inserção na comunidade.

Pesquisa9 realizada pelo Projeto Engenho de Sonhos com adolescentes estudantes desta comunidade revelou os seguintes dados: 48% dos adolescentes não

praticam qualquer atividade extracurricular; a atividade física (53,6%), tais como,

futebol e educação física, é a prática mais comum entre os que mantêm atividades

extracurriculares; 64,5% dos arranjos familiares não compartilham do modelo nuclear

de família (pai, mãe e irmãos); 73,5% dos pais trabalham, mas apenas 47% destes

trabalham de forma estável (carteira assinada); 41% das mães trabalham, mas apenas

62% destas trabalham de forma estável (carteira assinada); a profissão de pedreiro

(13%) é a mais comum entre os pais que trabalham e a de empregada doméstica (31%)

entre as mães; somente 58% dos adolescentes informaram a renda familiar, 57,75%

destas famílias têm renda de até dois salários-mínimos; 64,5% dos adolescentes

afirmaram ter problemas familiares, sendo a dificuldade financeira (22,5%), o

desemprego (13%) e o alcoolismo (10%) os mais apontados; violência (22%),

insegurança (14,5%) e tráfico/drogas (14%) são os pontos negativos do bairro apontados

pelos adolescentes.

9 Diagnóstico Interativo da Realidade dos Jovens no Bairro de Bom Pastor (2002). Fórum Engenho de

(38)

3.1 Passos metodológicos da investigação:

x Elaboramos instrumento – questionários – adequado à realidade local,

tomando como referência o instrumento utilizado no mapeamento

realizado pela CIESPI/PUC em Bangu, Rio de Janeiro (apêndice B).

x Pesquisa de campo propriamente dita: aplicação dos questionários.

x Os dados dos questionários foram inseridos no programa estatístico de

informática Statistica/Win.

Participantes

Inicialmente, pensamos aplicar os questionários com adolescentes de 13 a 18

anos. Mas, decidimos ampliar a faixa etária até 24 anos, pois a literatura sobre violência

no Brasil tem demonstrado que os jovens de 15 a 24 anos, como já demonstramos,

compõem a população que mais tem sofrido com a violência. Além do mais,

tradicionalmente, as políticas públicas direcionadas à juventude têm deixado descoberta

a faixa de 19 a 24 anos: ações na saúde pública são direcionadas especificamente no

campo da sexualidade e da drogadição para adolescentes até 18 anos de idade; na

educação, poucas são as ações que incluem os jovens que se encontram fora da idade

escolar ou estão atrasados na escolarização; as políticas de emprego e renda não

abarcam todos os jovens e não atendem as necessidades e aspirações. Nesta faixa etária,

encontram-se os momentos de escolha profissional e passagem para idade adulta,

configurando-se como um estágio de conflito e sofrimento, onde as pressões do mundo

moderno-capitalista tendem a se tornarem mais agudas; estas pressões são mais

(39)

Instrumentos

Utilizamos o instrumento10 para adolescentes utilizado pelo projeto bases de apoio no Rio de Janeiro. É um questionário que aborda os seguintes eixos temáticos:

a) Características sócio-demográficas dos entrevistados;

b) Escolarização / educação;

c) Lazer e esportes;

d) Religião;

e) Saúde: acesso a equipamentos e costumes;

f) Problemas e necessidades especiais enfrentadas pelos jovens;

g) Violência

h) Programas e iniciativas para jovens na comunidade.

O questionário original sofreu algumas alterações para se adaptar à nossa

realidade, foram acrescentadas algumas perguntas para um maior esclarecimento dos

aspectos a serem investigados e alterações no que diz respeito às perguntas sobre

atividades culturais para jovens, pois as nossas expressões culturais são diferentes das

do Sul do País, ficando composto por 189 itens. O instrumento foi auto-aplicável, com o

apoio dos pesquisadores.

Em todos os aspectos, os jovens foram questionados sobre as problemáticas

enfrentadas na comunidade. Apontaram os entraves e indicaram os recursos

comunitários que contam para enfrentá-los.

(40)

Local da pesquisa

A pesquisa de campo foi realizada na Escola Estadual Jean Mermoz.

Escolhemos este estabelecimento por ser central e ser a única no bairro que oferece

ensino médio (antigo segundo grau) e supletivo para alunos atrasados. Desta forma,

tivemos acesso à população na faixa etária que desejávamos, pois a escola é um

ambiente de aglutinação de jovens. As demais escolas do bairro, por oferecerem só o

ensino fundamental, não proporcionaram o acesso aos estudantes acima de 16 anos de

idade; além disso, as educadoras do bairro encaminham os alunos que estão fora da

faixa escolar para o Jean Mermoz, pois é a única que oferece os cursos de supletivo.

No início do ano letivo de 2004, entramos em contato com a direção da escola

para levarmos nossa proposta de pesquisa11 e negociarmos a possibilidade de realização da mesma. A diretoria se mostrou receptiva e apoiou a realização do nosso trabalho. A

coleta de dados foi realizada no 2° bimestre, entre os meses de maio/04 e julho/04.

Acordamos com a direção e com os professores que as aplicações seriam realizadas no

horário escolar, em sala de aula.

De acordo com os dados obtidos na secretaria da escola, a mesma contava com

739 alunos com idades entre 13 e 24 anos matriculados para o ano letivo de 2004.

Aplicamos 382 questionários com adolescentes e jovens desta faixa etária nos turnos

vespertino e noturno que se encontravam cursando os ensinos fundamental II e médio e

o supletivo. Na pesquisa de campo, constatamos que o número de alunos que

freqüentava as aulas era inferior ao número de alunos matriculados, o que indica um

alto índice de evasão escolar e nos leva a pensar que a proporção de alunos em que

aplicamos o instrumento seja bem maior.

11 A pesquisa desta dissertação é parte integrante do projeto Infância e Adolescência: Mapeando Bases de

(41)

Inicialmente, pensamos em aplicar os questionários em metade das turmas de

cada série. No entanto, duas constatações nos fizeram ampliar o número de participantes

de nossa pesquisa: 1. algumas turmas não contavam com alunos na faixa etária que

desejávamos; 2. havia mais estudantes entre 13 e 18 anos do que entre 19 e 24 anos. Na

tabela a seguir podemos observar as turmas que foram selecionadas.

Tabela 01. Turmas selecionadas para aplicação do instrumento.

N° total de turmas

Turmas com

alunos entre 13 e

24 anos Turmas aplicadas

5ª série 6 4 4

6ª série 4 3 3

7ª série 4 4 3

8ª série 3 3 2

1° ano 5 4 4

2° ano 2 2 2

3° ano 2 2 2

EJA 4 2 2

Total 30 24 22

3.2 Resultados

3.2.1 Perfil dos Participantes

Foram aplicados 382 questionários distribuídos da seguinte forma:

x Ensino Fundamental: 5ª Série (67), 6ª série (53), 7ª série (39), 8ª série

(42)

x Ensino Médio: 1º ano (79), 2º ano (41) e 3º ano (26).

x Educação de Jovens e Adultos: EJA 3 (16) e EJA 4 (8)

Esses estudantes estão distribuídos nos turnos vespertino e noturno, perfazendo

um total de 51,69% de alunos na faixa etária de 13 a 24 anos. Dos participantes, 271

possuem idade entre 13 e 18 anos, 100 entre 19 e 24 anos e 11 não informaram. Quanto

ao sexo a distribuição foi a seguinte (Figura 01):

191 184

7 0

50 100 150 200 250

Feminino Masculino Não informaram

Figura 01. Sexo.

A maioria dos participantes reside no bairro Bom Pastor (76,17%), os demais

residem em bairros da própria Zona Oeste; além disso, 71,47% desses jovens nasceram

em Natal/RN. Os moradores entre 15 e 24 do bairro somam 21,28% da população,

segundo dados do IBGE (2000), sendo 51,47% do sexo feminino e 48,53% do

masculino.

Quanto à raça, 37,43% declararam ser da raça branca, 18,56% da raça negra e

33,76% pertencerem à raça parda. O censo demográfico de 2000 (IBGE) aponta que

(43)

No que diz respeito ao estado civil, 87,69% são solteiros, 3,66% são casados,

6,02% estão em união consensual e 2,63% não responderam.

A maior parte desses jovens, 36,12%, nunca exerceu qualquer atividade

remunerada; 33,76% deles estão trabalhando atualmente (44,96% dos participantes

deste grupo são menores de idade) e 24,08% já o fizeram em outro momento. Apenas

14,73%, daqueles que estão trabalhando no momento, têm carteira assinada de trabalho.

Dos 220 participantes que declararam trabalhar ou já terem trabalhado, 134 revelaram

as atividades desenvolvidas. Na figura 02 podemos visualizar a distribuição dessas

atividades.

1 1

3

20 22

25 26

36

Jogador de futebol Prostituição Professores Prestação de Serviços Func. Privados Comerciários Ativ. Domésticas Ativ. Autônomas

Figura 02.Atividades Remuneradas

As atividades autônomas são aquelas realizadas por conta própria e sem

vinculação com qualquer estabelecimento empregatício. Encontramos na nossa pesquisa

os seguintes trabalhos dessa natureza: costureira, doceira, artesão, pipoqueiro,

panfleteiro, feirante, pedreiro, pintor, revendedores de cosméticos, sorveteiro, etc. As

(44)

empregadas domésticas e babás. Os comerciários se referem aos embaladores,

vendedores, padeiros, enfim, empregados de estabelecimentos comerciais. No setor de

prestação de serviços, encontramos manicure, garçom, mecânico, guia turístico,

capoteiro e serviços de frete. Chamamos funcionários privados aqueles que mantêm

vínculo com estabelecimentos específicos, com exceção da área comercial, tais como,

operador de máquinas, auxiliar de serviços gerais (ASG’s), auxiliar de topografia,

telefonista, secretária.

A situação de trabalho desses jovens é marcada pela informalidade e pela

ilegalidade. Em primeiro lugar, constatamos um número muito alto de atividades

informais, principalmente realizadas no âmbito doméstico, geralmente de forma

esporádica, que não oferecem remuneração fixa nem demanda de trabalho. Existem

muitos menores de idade trabalhando e um percentual muito alto de trabalhadores sem

carteira assinada (85,27%), o que não garante segurança em relação a acidentes de

trabalho nem aposentadoria. Na Região Metropolitana de Natal, apenas 50,2% dos

trabalhadores acima de 10 anos de idade têm carteira de trabalho assinada ou são

funcionários públicos estatutários (IBGE, 2000).

No Brasil há uma má distribuição de renda. Segundo dados do Relatório de

Desenvolvimento Juvenil 2003 da Unesco (2004), 10% das famílias brasileiras

concentram aproximadamente 44% da renda nacional. Ao passo que 50% das famílias

pobres dividem 13,8%. Esta má distribuição atinge Bom Pastor de maneira contundente,

pois verificamos que 75,12% das famílias dos jovens desta pesquisa têm uma renda que

se concentra entre menos de um a quatro salários mínimos. Além disso, não podemos

deixar de indicar que estas famílias são numerosas.

As famílias dos participantes são compostas, em sua maioria, por 4 a 6 membros

(45)

4,93 pessoas por família. É importante destacar que 21,72% são chefiadas por mulheres.

Constatamos que 36 participantes declaram ter filhos, grupo composto por 24 do sexo

feminino e 05 participantes menores de idade. A renda dessas famílias se configura da

seguinte maneira (figura 03):

24,34%

28,27%

22,51%

9,42%

15,46%

0% 5% 10% 15% 20% 25% 30%

Até 1 1 a 2 2 a 4 Mais de 4 Não

informaram

Figura 03. Renda Familiar (em salários-mínimos)

A renda média é de R$ 494,00. Bom Pastor, de acordo com o IBGE (2000),

apresenta um rendimento médio, para a pessoa responsável pelo domicílio, de R$

336,00 e uma média de 4,06 moradores por domicílio; além disso, aproximadamente,

60% da população do bairro vive em domicílios que têm renda de até dois

salários-mínimos da pessoa responsável pelo domicílio.

O cotidiano de pobreza vivido pelo jovem de Bom Pastor reflete a condição do

país. Com a dificuldade financeira, muitos jovens brasileiros, principalmente na região

Nordeste, são obrigados a abandonar os estudos e procurar realizar atividades

remuneradas, ou realizar as duas atividades concomitantemente. De acordo com dados

(46)

anos de idade é de 4,7, a pior do Brasil, perdendo para a Região Norte com 6,0 e a

Região Centro-Oeste com 6,2. Nesta pesquisa, aproximadamente 64% realiza ou já

realizou alguma atividade remunerada e 58 participantes menores de idade se

encontravam exercendo atividades remuneradas.

A maioria dos participantes, 90,04%, realiza ou já realizou algum tipo de

trabalho doméstico. As tarefas mais citadas são: limpar a casa (69,63%), fazer compras

(43,19%) e cozinhar (41,36%); além disso, 31,93% declararam cuidar dos irmãos e

25,65% a realização de outras tarefas, tais como, manutenção da casa, ajuda financeira,

lavar roupa, cuidar de pais ou avós.

Destacamos que 86,91% dos adolescentes do sexo feminino e 60,87% do sexo

masculino realizam tarefas domésticas. Contudo, esta diferença se torna maior quando

observamos a freqüência dos trabalhos domésticos: 76,44% dos participantes do sexo

feminino declararam realizar tarefas domésticas diariamente, ao passo que os do sexo

masculino compõem 32,07%. Há também uma diferença entre as atividades as quais os

dois sexos se dedicam: em relação à limpeza da casa, 167 meninas fazem esse tipo de

trabalho, enquanto apenas 94 meninos realizam esse tipo de atividade; na atividade de

cuidar dos irmãos, 81 meninas a executam, enquanto apenas 38 meninos realizam esse

tipo de trabalho; quando indagados sobre a atividade de cozinhar, 110 meninas

declararam realizar tal atividade em suas casas, enquanto apenas 46 meninos disseram

realizar este tipo de serviço; o item “fazer compras” foi o que o número de jovens do

sexo masculino (71) mais se assemelhou ao número de jovens do sexo feminino (89).

Podemos perceber uma questão de gênero, apontando para uma exploração maior das

meninas no trabalho doméstico. Não podemos esquecer que este trabalho não é

remunerado e dificulta a conciliação com as atividades escolares, pois mais de três

(47)

Quanto à moradia, 76,96% moram em casa própria e 17,27% em casa alugada.

Segundo os dados do Censo Demográfico de 2000, dos 4416 domicílios de Bom Pastor,

3087 são próprios (69,18%), sejam quitados ou em aquisição.

Em termos gerais, os dados desta seção indicam que as famílias de Bom Pastor

lidam cotidianamente com a pobreza. São numerosas, de maioria negra/parda, com

baixa renda e sofrem problemas financeiros.

3.2.2 Atividade escolar

No que diz respeito às atividades escolares, 87,7% dos participantes estudaram

no ano anterior ao da pesquisa. Há um alto índice de reprovação no histórico escolar

desses alunos, aproximadamente 72% já foram reprovados: destes, 40,73% ao menos

uma vez, 34,54 % duas vezes, 24% três vezes ou mais. Aproximadamente um terço dos

participantes declarou ter ficado um período de tempo afastado da escola, revelando um

alto índice de evasão escolar. Embora não tenha dados disponíveis a esse respeito, a

diretora da escola nos afirmou que, nos últimos anos, é muito grande a diferença entre

os alunos matriculados e os que chegam ao final do ano letivo.

Os pais de 78,27% dos alunos investigados costumam freqüentar as reuniões da

escola. Destes, 75,92% já foram à escola para falar com os professores, principalmente

sobre dificuldades no entendimento de disciplinas (22,9%), notas ruins (27,75%) e

reclamar de acontecimentos específicos (24,36%). Proporcionalmente, a freqüência às

reuniões é maior para os pais dos alunos na faixa etária entre 13 e 18 anos, ficando em

torno de 87,8%, ao passo que na faixa entre 19 e 24 anos é de 51%. Estes dados nos

indicam sobre a participação dos pais no processo educativo de seus filhos,

configuram-se como fontes de apoio informal, revelando preocupação com o deconfiguram-senvolvimento e

(48)

Constatamos que apenas 20,68% dos estudantes já procuraram algum tipo de

apoio para suas atividades escolares, tais como, grupo de reforço, professor particular,

explicadora e psicopedagogo. Indagamos ainda sobre a participação dos adolescentes e

jovens em cursos realizados em suas comunidades, apenas 75 dos 382, ou seja, 19,63%

jovens haviam participado de algum curso, sendo os de informática mais procurados,

com 52 indicações, seguidos dos cursos de inglês com nove indicações. Embora haja

uma preocupação dos pais com o processo educativo de seus filhos, são escassos os

apoios na comunidade no que diz respeito ao âmbito escolar, tanto de bases formais

quanto de informais, o que acaba dificultando a busca de ajuda para as atividades

escolares.

3.2.3 Lazer e Esportes

Questionamos os jovens sobre atividades de lazer e culturais. Dos participantes,

84,3% declararam ter realizado/freqüentado algum tipo no último ano. Destes, 62,73%

foram a passeios organizados, 57,76% foram a pelo menos um espetáculo musical,

47,83% participaram de gincanas, 32% assistiram a pelo menos um espetáculo de

dança, 19,87% foram ao cinema pelo menos uma vez, 19,25% assistiram espetáculos

teatrais, e 5,6% declararam outras atividades.

Apenas 37,2% dos participantes conhecem algum grupo ou pessoa que

desenvolve atividades culturais, esportivas ou de lazer na comunidade. Destes, somente

38% têm oportunidade de participar dessas atividades, sendo dança, futebol e capoeira

as mais praticadas.

Podemos perceber como são escassas as opções de lazer para esses jovens. Em

Bom Pastor não há cinemas, teatros ou espaços para apresentações culturais. As praças

(49)

shows musicais freqüentados são geralmente no período eleitoral, quando há

apresentações gratuitas promovidas pelos candidatos. Não podemos deixar de

considerar as dificuldades financeiras que os jovens do bairro devem enfrentar para se

deslocarem para os locais da cidade onde as opções de lazer e cultura são maiores; por

exemplo, o jovem de Bom Pastor precisa tomar duas conduções para ir ao cinema mais

próximo do bairro; não podemos esquecer também dos gastos com alimentação quando

esses jovens se deslocam para freqüentar tais atividades.

Dos participantes, 52,61% praticam esportes. Os esportes praticados por estes

estudantes são (figura 04):

67,80% 13,90%

13,40% 4,30%

0,60%

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80%

Futebol Vôlei Capoeira Atletismo Basquete

Figura. 04. Esportes Praticados

Dentre os que praticam esportes, 42,45% fazem parte de algum clube ou grupo

organizado. De forma geral, independente de fazerem parte ou não de um grupo

organizado, 41,88% dos que praticam esportes o fazem na própria comunidade. Estas

Imagem

Tabela 01. Turmas selecionadas para aplicação do instrumento.
Figura 01. Sexo.
Figura 02.Atividades Remuneradas
Figura 03. Renda Familiar (em salários-mínimos)
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Referências

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