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Esporte orientação e formação de professores de Geografia: uma experiência como cartografia escolar

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Academic year: 2017

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ARCÊNIO MENESES DA SILVA

ESPORTE ORIENTAÇÃO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE GEOGRAFIA: UMA EXPERIÊNCIA COM CARTOGRAFIA ESCOLAR

Tese de Doutorado apresentada ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas do Campus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Geografia, junto ao Programa de Pós-Graduação em Geografia. Área de concentração: Organização do Espaço Linha de Pesquisa: Geografia, Ensino e Cartografia Escolar

Orientador: Prof. Dr. João Pedro Pezzato

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______________________________________ Prof. Dr. João Pedro Pezzato (Orientador)

______________________________________ Profa. Dra. Maria Bernadete Sarti da Silva Carvalho

______________________________________ Profa. Dra. Maria Isabel Castreghini de Freitas

______________________________________ Profa. Dra. Amanda Regina Gonçalves

______________________________________ Profa. Dra. Suely Aparecida Gomes Moreira

Rio Claro, SP, 30 de Janeiro de 2013.

Resultado: Aprovado

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Para você, Marlir, companheira de sempre, por sua paciência e compreensão.

Para você, Gabriel meu filho, que soube com maturidade exemplar entender minha ausência em seus momentos de futebol e em seus estudos.

Para você, Maria Clara, que veio a este mundo durante a realização deste trabalho, nos fazendo refletir sobre o que realmente vale a pena.

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tudo que conseguimos realizar hoje é fruto de uma formação que antecede ao período da pesquisa em si. Mas, há aqueles (as) que de uma forma direta ou indireta estiveram mais presentes neste empreendimento. Portanto, reconheço e agradeço de forma sincera:

A Deus pela condição humana e existencial da vida na Terra.

Aos meus pais Antônio Luiz e Maria Cesar por minha saúde e educação fundada nos princípios éticos que tem norteado minhas ações e relações dentro e fora do ambiente profissional.

A todos da minha família, especialmente aos meus irmãos Weber, Gilson, Areno, Alziro, Milton, Gildázio e as minhas irmãs Maria Sônia, Maria Júlia e Agina, pelo carinho, respeito e compreensão das minhas ausências nos finais de semana de convívio em família.

À minha esposa Marlir, pelo amor demonstrado e pela compreensão de minha ausência material ou não, durante este período. Obrigado pelo apoio e parceria que tivemos nesse percurso e que soube ser forte, paciente e companheira, fazendo os dias e as noites de estudos ficarem menos solitários.

Ao meu filho Gabriel pelo carinho e compreensão demonstrado nesse período de ausências, pelos importantes diálogos que tivemos sobre os conceitos da linguagem cartográfica e o esporte Orientação, que me fizeram refletir sobre muitas coisas que estava escrevendo, e pelo companheirismo nas viagens a Uberaba durante o curso com os professores aos sábados. À Universidade Federal de Uberlândia por ter oferecido condições para que o sonho do curso superior se tornasse uma realidade.

Aos professores e amigos do curso de Geografia, pela a amizade e companheirismo que foram muito importante em minha formação acadêmica, especialmente aos professores Samuel do Carmo Lima pelas orientações durante a graduação e no mestrado, e a professora Suely Regina Del Grossi por ter me ensinado muito sobre a Geografia e sobre a vida por meio de exemplos e de sua forma de ver o mundo.

Ao Rogério Gonçalves pelas muitas aprendizagens e reflexões conjuntas que fizemos ao longo das jornadas trabalhando em escolas do ensino básico, as quais constituíram um importante edifício conceitual, na estrutura deminhas ações acadêmicas hoje em dia.

Ao Instituto Federal do Triângulo Mineiro – IFTM, por ter me concedido condições especiais para arealização desta pesquisa, com liberação parcial e depois integral, sem comprometer o andamento das pesquisas e das aulas com os alunos, sem as quais este projeto dificilmente teria sido concluído com êxito.

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À Vera Lúcia Abdala pela parceria nas aulas de Geografia do Ensino Médio do IFTM, com quem pude aprender ser mais tolerante com os alunos, e pelo incentivo nos momentos de dificuldades e descrenças.

À UNESP-Rio Claro, por oferecer todas as condições necessárias para a realização deste curso de Pós graduação.

A todas as pessoas do grupo de pesquisa “Geografia e Cartografia Escolar” da UNESP-Rio Claro, liderado pelo prof. João Pedro Pezzato e pela professora Rosângela Doin de Almeida, que dividiram comigo as alegrias, angústias, cansaços e muitos aprendizados. Agradeço pela convivência ao Wilson Soares, à Raquel Fonseca, à Tânia Canto, à Rafaela Localli, ao Paulo Estevão, à Geógia Picelli, à Maria do Carmo, à Paula Juliasz, ao Alexander Lima, ao Thiago, à Rita e ao Levon Boligian. As leituras e debates conceituais que ocorreram ao longo desses quatro anos muito me engrandeceram e me fizeram ver outras cartografias, para além da minha pesquisa em si.

Aos meus alunos e ex-alunos que são a razão de ser de minha profissão e que muitas vezes me desafiam a desenvolver novas metodologias para melhor ensinar e aprender com eles.

Ao sempre professor Ireneu Antônio Siegler que me fez construir a sabedoria de que ninguém ensina aquilo que não sabe. Sabedoria que trago comigo por toda a vida.

ÀSuely Aparecida Gomes Moreira pela amizade e companheirismo que se fizeram presentes antes e durante o período de realização deste empreendimento. Obrigado pelo incentivo, pelos diálogos ao longo do caminho e pela inspiração de coragem que demonstrou de forma exemplar em situações difíceis da vida.

À professora Amanda Regina Gonçalves, pelas contribuições teóricas e práticas que apontou durante a qualificação e depois indicando percursos que me pareceram mais coerentes com os objetivos da pesquisa.

Ao professor João Pedro Pezzato pelas orientações e correções bem fundamentadas, pela paciência, confiança e sábia perspicácia nos momentos em que tudo parecia muito confuso, nos fazendo ver que este estudo possuía relevância e que poderia ser concluído com êxito. Obrigado pela relação de amizade e parceria que pretendo manter em futuros trabalhos conjuntos ao longo da vida acadêmica.

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ao longo de minha prática profissional como professor de Geografia atuando no ensino básico. Desafios de aprender para ensinar e ensinar para aprender a lidar com o processo de ensino-aprendizagem dos alunos em relação ao domínio de alguns conceitos da Geografia, especialmente aqueles relacionados à Cartografia Escolar. A partir dessas e de outras questões, propusemos este estudo com o intuito de discutir e apresentar uma proposta didática fundamentada na prática do esporte Orientação, no sentido de contribuir para a didática da Geografia e para a tarefa de vivenciar as noções espaciais com seus alunos e, ao mesmo tempo, mediar a compreensão e interpretação da linguagem cartográfica de forma mais eficiente e significativa. Entendemos, pois, que essa linguagem não pode ser considerada per se, mas no contexto da construção dos conhecimentos geográficos necessários à participação autônoma dos indivíduos no meio em que vivem. Essa articulação, da modalidade esportiva com os conhecimentos da Cartografia, converge para o uso de mapa e bússola, em que o praticante desse esporte, ao deslocar-se no espaço, num percurso pré-estabelecido, requer domínio da linguagem cartográfica para operar com esses instrumentos próprios da cartografia. Os dados para análises foram obtidos a partir de observações diretas, gravações de áudios e vídeos, e registros em diários reflexivos produzidos pelos professores durante a realização de uma experiência concreta na construção de um mapa durante uma atividade de esporte Orientação. As situações de aprendizagens experimentadas num curso de formação continuada com professores de Geografia, atuantes na rede municipal de ensino, realizado no IFTM-Uberaba no ano de 2011, permitiram aos participantes vivenciarem a experiência da construção de um mapa e elaboração de um percurso de Orientação. A natureza metodológica da pesquisa foi norteada por uma abordagem qualitativa, em que os sujeitos participaram efetivamente da investigação, envolvendo estudo com a prática profissional desses professores. As atividades realizadas durante o curso enfatizaram a produção de um mapa, a partir de uma folha em branco, em que os professores puderam promover e colocar em prática as noções espaciais de localização, orientação espacial e escala, além dos principais conceitos da linguagem cartográfica necessários à elaboração, leitura e interpretação de um mapa feito por eles próprios. As análises e interpretações evidenciaram as dificuldades no domínio e operação dos conceitos cartográficos necessários para a produção de um mapa e apontaram o potencial da opção metodológica baseada em efetiva participação dos sujeitos na atividade proposta. Com essa experiência, verificou-se que, ao construir um mapa, os professores desenvolveram e colocaram em prática alguns conceitos-chave para leitura e interpretação dos mapas, como o de localização, orientação espacial e escalas. Além disso, ao executar um percurso de Orientação, realizado sobre o mapa construído por eles, demonstraram que esse esporte pode ser um importante instrumento motivador para a promoção dos saberes ligados à Cartografia Escolar. Pelas análises foi possível perceber o potencial do esporte Orientação, que a nosso ver, contribuiu para as discussões sobre a Cartografia para Crianças e Escolares, pois, diferentemente dos métodos habituais para apresentação de informação espacial, tais como o mapa impresso nos livros didáticos ou pendurado na parede, a modalidade esportiva recorre a estratégias que acionam os múltiplos sentidos em um ambiente de contato com o espaço real e experiências de leitura e produção de uma representação cartográfica.

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This study is the result of questions and challenges I have faced throughout my professional practice as a teacher of Geography working in education. Challenges of learning to teach and teaching to learn to deal with the difficulties of student learning in relation to the domain of some concepts of geography, especially those related to Cartography. From these and other issues, I propose this study in order to discuss and present a proposal based on the teaching practice of Orienteering, in order to equip the teacher of Geography to the task of teaching space concepts to his/her students, and, at the same time, more efficiently and significantly mediate the understanding and interpretation of cartography language. Therefore I understand that this language can not be considered per se, but in the context of the construction of geographical knowledge which is necessary for autonomous participation of individuals in their environment. The articulation of the sport with the knowledge of cartography, converges to the use of map and compass, where the practitioner, when moving over a route, must master language mapping to operate with cartography instruments. The learning situations experienced during a course of continuing education to teachers of Geography, working in municipal schools, held at IFTM Uberaba in 2011, allowed participants to experience of building and developing a map of a route guidance. Data for analysis were obtained from direct observations, audio recordings and videos, and records in daily reflective diaries produced by the teachers during the performance of a concrete experience in building a map. The methodological nature of the research was guided by a qualitative approach, in which subjects actively participated in the research study involving professional practice with the teachers. The activities performed during the course emphasized the production of a map from a blank sheet, where teachers could promote and put into practice the concepts of spatial location, orientation and scale, and major concepts of cartographic language needed for preparation, reading and interpreting a map made by them. The analyzes and interpretations showed the difficulties in the field of operation, and cartographic concepts required to produce a map, and pointed out the potential of methodological choices based on effective participation of individuals in building a map. With the experience, it was found that, in constructing a map, teachers developed and put into practice some key concepts for reading and interpreting maps, such as location, orientation and spatial scales. Also, when running a route guidance, conducted over the map built by them, it was demonstrated that Orienteering can be an important tool for motivating the promotion of knowledge related to school cartography. It was also possible to realize the potential of Orienteering, which contributed to discussions on Cartography for children and scholars, because, unlike the usual methods for presenting spatial information such as the map printed in textbooks or hanging on the wall, the sport uses other intelligences that trigger multiple senses in an environment of contact with the real space.

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Figura 2: Variações de modalidades do esporte Orientação 59 Figura 3: Prisma e Picotador numa base metálica indicando um ponto de controle

no terreno.

60

Figura 4: Equipamento SPORTident usado para registrar a passagem pelo ponto de controle

60

Figura 5: Recorte de mapa de Orientação da Unidade I do IFTM Uberaba 61 Figura 6: Cartão de Controle usado para marcar os pontos de controle em um

percurso de Orientação

62

Figura 7: Mapa de Orientação do Parque do Sabiá em Uberlândia-MG 66 Figura 8: Mapa utilizado para Orientação antes da criação da ISOM, em 1962 69 Figura 9: Norte magnético (NM) e norte geográfico (NG). No centro, norte da

quadrícula (NQ)

70

Figura 10: Mapa do primeiro evento de Orientação em 1897 na cidade de Oslo na Noruega, desenhado em escala de 1:30.000

72

Figura 11: Padronização de referência para mapa de Orientação baseada na ISOM 2000

74

Figura 12: Simbologia do Cartão de descrição do mapa de Orientação 75 Figura 13: Exemplo de um Cartão de descrição simbólica para identificar os pontos

de controle

75

Figura 14: Recorte de Carta Topográfica da área do município de Uberaba-MG, Folha SE-23-Y-C-IV. Escala – 1:100.000

77

Figura 15: Fotografia aérea com vista total da área do IFTM Uberaba/MG 78 Figura 16: Imagem da área onde está situado o IFTM Uberaba no ponto central das

coordenadas geográficas 19°39’34.34” S 47°58'10.12" O

78

Figura 17: Percurso de Orientação usando carta topográfica 79 Figura 18: Mapa do século XIX, usado em percurso de Orientação na Noruega 82 Figura 19: Primeiro mapa de Orientação colorido, 30 Abril 1950. Oslo, Noruega 83 Figura 20: Mapa do primeiro campeonato europeu de Orientação em 1962 na

Noruega

84

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Figura 23: Orientação no mundo em 2012 85 Figura 24: Tela parcial do software Amiglobe em projeção esférica 112 Figura 25: Conjunto de mapas em diferentes escalas cartográficas e geográficas 117 Figura 26: Exercício de localização e orientação do mapa sobre a mesa 126 Figura 27: Esquema de indicação do norte magnético na folha de papel-1 128 Figura 28: Esquema de indicação do norte magnético na folha de papel-2 129 Figura 29: Representação da orientação usando o corpo em relação ao sol 131

Figura 30: Construindo o mapa de Orientação 1 149

Figura 31: Construindo o mapa de Orientação 2 150

Figura 32: Construindo o mapa de Orientação 3 151

Figura 33: Construindo o mapa de Orientação 4 151

Figura 34: Colocação do prisma no ponto de controle 156

Figura 35: Construindo um percurso de Orientação 1 157

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INTRODUÇÃO... 13

2 A CARTOGRAFIA COMO CAMPO DE PESQUISA... 24

2.1 Contexto e problematização... 24

2.2 O mapa como instrumento material da linguagem espacial... 29

2.3 Linguagem cartográfica e processos de aprendizagens... 36

3 CARTOGRAFIA E GEOGRAFIA ESCOLAR: SABERES E PARTICULARIDADES... 44

3.1 Cartografia e Geografia: aproximações e distanciamentos... 44

3.2 Cartografia Escolar, currículo e saberes a serem ensinados... 49

4 O ESPORTE ORIENTAÇÃO... 56

4.1 Dimensões e instrumentos da Orientação... 56

4.2 A Cartografia do esporte Orientação... 65

4.3 O Mapa de Orientação: construção e convenções simbólicas... 73

4.4 Fontes documentais para construção do mapa de Orientação... 77

4.5 Especificações internacionais para o mapa de Orientação... 80

4.6 Histórico da Orientação como esporte... 81

5 CARTOGRAFIA ESCOLAR, ESPORTE ORIENTAÇÃO E FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES... 87

5.1 Procedimentos metodológicos da pesquisa... 87

5.2 Os sujeitos e os dados da experiência de “pesquisa” e de “ação” como alternativa didática na formação continuada de professores... 92

6 SABERES E CAMINHOS QUE CONSTITUÍRAM O ESPORTE ORIENTAÇÃO COMO ALTERNATIVA DIDÁTICA AOS PROFESSORES.... 99

6.1 Conhecendo a proposta de formação em Cartografia Escolar com uma “pesquisa-ação”... 99

6.2 Expectativas dos professores participantes em relação à experiência e suas possibilidades didáticas no processo de formação ... 103

6.3 Situações de aprendizagens e saberes construídos com o esporte Orientação... 108

6.3.1 Localização e orientação espacial usando o mapa e Bússola... 109

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6.3.5 Construção, leitura e interpretação do mapa em um percurso de Orientação... 122

7 ANÁLISES E DISCUSSÕES DOS DADOS OBTIDOS DURANTE AS

SITUAÇÕES DE APRENDIZAGENS... 124 7.1 Análise e discussão das atividades de localização e orientação espacial... 124 7.2 Análise e discussão das atividades sobre o uso de escalas cartográficas e

geográficas... 132 7.3 Análise e discussão das atividades sobre legenda e simbologia do mapa de

Orientação... 143 7.4 Análise e discussão da experiência de construção do mapa de Orientação... 146 7.5 Análise e discussão das atividades de construção e leitura de um mapa com o

percurso de Orientação... 156 8 ESPORTE ORIENTAÇÃO E CARTOGRAFIA ESCOLAR: relações possíveis.. 165 9 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 173 REFERÊNCIAS...

ANEXO 1 – QUESTIONÁRIO APLICADO AOS PROFESSORES... ANEXO 2 – ROTEIRO DE ENTREVISTAS COM PROFESSORES... ANEXO 3 - EVOLUÇÃO DAS ESPECIFICAÇÕES INTERNACIONAIS PARA O ESPORTE ORIENTAÇÃO

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Esta pesquisa surgiu a partir de reflexões e questionamentos que têm habitado meus pensamentos e práticas ao longo de mais de quinze anos de exercício profissional como professor de Geografia na educação básica em escolas públicas e privadas de diferentes municípios da região do Triângulo Mineiro, no Estado de Minas Gerais e em municípios do Estado de São Paulo.

Faz parte dessa trajetória um movimento constante de reflexão sobre as práticas de ensino que desenvolvo junto aos alunos, bem como as situações de aprendizagem que considero serem mais significativas na formação dos alunos. A prática profissional na escola colocou-me diante de constantes dilemas e desafios a serem enfrentados. Desafios de aprender para ensinar e ensinar para aprender a lidar com as dificuldades de aprendizagem dos alunos em relação ao domínio de alguns conceitos da Geografia, especialmente aqueles relacionados à Cartografia Escolar1.

Pensar a educação sob o ponto de vista da relação entre a ciência e a técnica é mais comum que pensá-la sob a perspectiva da relação entre teoria x prática ou na relação entre experiência e sentido (BONDIA, 2001). Se o segundo caminho remete especialmente a um ponto de vista político e crítico, Larossa Bondía irá ressaltar que o primeiro submete à perspectiva positivista e retificadora. Assim, tenho buscado orientar minha atuação profissional em limiares das perspectivas da relação teoria x prática, na medida em que apreendo a prática docente como um espaço do desenvolvimento de posturas críticas. Também tenho evidenciado a importância da relação entre experiência e sentido nas interações com os alunos, levando à concepção de que a prática docente também precisa estar aberta à “experiência”, compreendida como a disposição para a formação ou à transformação. A experiência é algo singular, pois o “saber de experiência” se dá na mediação entre o conhecimento e a vida humana e, nesse sentido, a prática docente colocou-me diante daqueles constantes dilemas e desafios relacionados à Cartografia Escolar.

Algumas das dificuldades que insistem a colocar em xeque meus “saberes” e minhas “experiências” estão relacionadas à compreensão de conceitos cartográficos que devem ser ensinados nas aulas de Geografia do ensino básico, como localização geográfica, orientação, legenda e escala, e outras que se pautam na utilização da Cartografia como linguagem de representação e comunicação do pensamento socioespacial.

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No Brasil, desde a década de 1970, diversos estudos vêm sendo realizados por pesquisadores em nível de graduação, pós-graduação e por professores da educação básica, com vistas a buscar uma melhoria significativa da qualidade do ensino de Geografia, especialmente aquele relacionado ao uso da linguagem cartográfica com estudantes nesse nível de ensino.

A precursora Lívia de Oliveira (1978) contribuiu para dar visibilidade à Cartografia Escolar quando elaborou sua tese de livre docência sobre o estudo metodológico e cognitivo do mapa, enfatizando os métodos interdisciplinares. A partir dessa pesquisa surgiram, em nosso país, vários outros estudos sobre educação cartográfica em diversas perspectivas, atualmente contando com um grupo significativo de pesquisadores que abordam a Cartografia e o seu ensino. A partir de 1995 tem início a realização dos colóquios de Cartografia para escolares2, o que contribui para um aumento representativo no número de publicações, cujas temáticas são diversificadas: representação do espaço; metodologia de ensino; tecnologias e produção de materiais didáticos cartográficos, formação docente e currículo e, mais recentemente, novas tecnologias e internet (ALMEIDA, 2011).

Apesar dos avanços obtidos com os resultados dessas pesquisas, a prática da leitura e interpretação de mapas ainda não se constituem uma atitude comum no cotidiano da maioria das pessoas o que, a nosso ver, é um empecilho a ações propositivas e autônomas dos indivíduos no espaço geográfico. Como destaca Cazetta,

A ausência de raciocínios cartográficos em nossas práticas espaciais e visuais cotidianas, característica de nosso contexto cultural brasileiro, sinaliza de algum modo uma tradição em se conceber a Cartografia como ramo do conhecimento que lida com mapas prontos e acabados, cujos detentores de seu arcabouço teórico-metodológico são, no momento atual, os engenheiros cartógrafos e/ou geógrafos especializados em cartografia ou sistemas de informação geográfica (SIG) ou Geographic Information System (GIS) (Cazetta, 2009).

Quem de nós ainda não teve a sensação de estar desorientado ao circular por um espaço desconhecido? Essa dificuldade pode ser percebida na experiência das pessoas comuns no momento de buscarem auxílio para se orientarem espacialmente e/ou encontrarem um endereço numa cidade, ou ainda situar-se espacialmente em relação a algum ponto de referência. Comumente, construímos o mapa “mental” do lugar ou, quando possível, buscamos ter em mãos um mapa antes ou durante qualquer deslocamento na área urbana ou

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rural, apropriando-nos da sensação de liberdade proporcionada pelo domínio espacial do lugar, para além daquilo que o lance do olhar permite-nos ver ou a memória lembrar. É como se tivéssemos o controle do espaço, sem precisar depender de orientações de outras pessoas.

A ausência desta autonomia ou noção para além do visível e/ou da lembrança para saber onde se encontra e para onde se deslocar é evidenciada, também, quando grande parte dos estudantes não consegue realizar procedimentos elementares, como orientar-se com o uso de um mapa, encontrar uma direção a partir de um ponto de referência representado na planta da cidade onde vivem, calcular a distância entre dois lugares ou uma área usando a escala, compreender a representação bidimensional de uma representação tridimensional, dentre outras tarefas.

As dificuldades em relação à compreensão da linguagem cartográfica também podem ser verificadas nos baixos índices de acertos em questões de vestibulares ou do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM3) em que envolvem a compreensão desses conceitos, percebidas com a experiência ao longo dos anos trabalhando com alunos que participaram dessas provas de seleção.

Esses são alguns exemplos que atestam a incapacidade de muitas pessoas em operar com as noções espaciais e, por conseguinte, com a linguagem presente nos mapas. O que se percebe é que “não possuímos o hábito de olhar e ler os mapas”, o que se constitui, na maioria das vezes, num empecilho às ações e reivindicações mais efetivas no espaço, onde nossas vidas, de fato, acontecem (CAZETTA, 2009). Mas o desafio é ainda maior quando reconhecemos a importância dos mapas não apenas como conteúdo ou parte da Geografia, mas como uma linguagem específica que, quando compreendida, permite a interpretação e análise dos contextos espaciais necessários em várias situações, tanto no cotidiano escolar como fora dele, durante toda a nossa vida.

Essa importância, relacionada às noções espaciais, é destacada por Ives Lacoste (1997), numa referência fundamental a essa temática, quando sugere que devemos buscar articular o ensino do mapa e os seus pressupostos ideológicos com uma concepção crítica da geografia, ressaltando a necessidade de se ter o domínio da linguagem cartográfica e desenvolver metodologias adequadas para que estudantes compreendam sua utilidade na vida cotidiana. Dessa forma, entende-se que as representações cartográficas somente fazem sentido quando sua leitura é realizada de maneira propositiva, reconhecendo sua importância como

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meio de comunicação e instrumento para a conquista da autonomia espacial pela sociedade em geral, e não como recurso de poder e controle como tem sido usada por alguns grupos que a usam com essa finalidade (LACOSTE, 1997).

É necessário dominar a técnica e habilidades para analisar de forma mais atenta a mensagem que os mapas estão comunicando, não se limitando a um olhar superficial apreciando apenas o caráter estético em si mesmo. Almeida (2001) destaca que, a partir do domínio da linguagem dos mapas as pessoas podem pensar e agir sobre o espaço de forma mais autônoma. Nesse sentido, o domínio dessa linguagem, contribui para a autonomia espacial ao permitir que as pessoas pensem e tenham consciência de seu espaço onde vivem, e saibam relacionar-se com outros espaços, em diferentes escalas geográficas. Para isso necessitam dominar os conceitos básicos dessa linguagem. Como destaca Cavalcanti (2011, p.74) “A relação dos alunos com o espaço, com sua espacialidade, com abrangência e profundidade, requer instrumentos conceituais básicos. Esses instrumentos permitem uma leitura de mundo, de espaço”.

A importância e a necessidade de saber analisar e interpretar o espaço geográfico por meio dos mapas são reconhecidas e enfatizadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (BRASIL, 1998. p. 35), que estabelecem as seguintes habilidades e competências aos alunos egressos do ensino fundamental:

a) Conhecer a organização do espaço geográfico e o funcionamento da natureza em suas múltiplas relações, de modo a compreender o papel das sociedades em sua construção e na produção do território, da paisagem e do lugar;

b) Compreender a espacialidade e temporalidade dos fenômenos geográficos estudados em suas dinâmicas e interações;

c) Conhecer e saber utilizar procedimentos de pesquisa da Geografia para compreender o espaço, a paisagem, o território e o lugar, seus processos de construção, identificando suas relações, problemas e contradições;

d) Fazer leituras de imagens, de dados e de documentos de diferentes fontes de informação, de modo a interpretar, analisar e relacionar informações sobre o espaço geográfico e as diferentes paisagens;

e) Saber utilizar a linguagem cartográfica para obter informações e representar a espacialidade dos fenômenos geográficos.

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As dificuldades apontadas despertam ainda mais atenção, tendo em vista a intensa exposição dos produtos cartográficos disponibilizados nos meios digitais e em ambientes virtuais, que fazem parte do universo com os quais esses alunos, direta ou indiretamente, têm contato diariamente. São comuns as exposições de mapas nos telejornais, jogos eletrônicos ou disponíveis pela internet, o que permite uma maior aproximação das pessoas comuns com os mapas. Os estudantes estão cada vez mais conectados ao mundo virtual e os atrativos são constantemente atualizados e estrategicamente pensados, para garantir toda a sua atenção. Enquanto isso, no ambiente escolar, os estudos e metodologias de ensino da linguagem Cartográfica, baseados em materiais impressos, especialmente em livros didáticos ou mesmo em fontes digitais sem o planejamento adequado, se tornam desinteressantes e não estimulam a curiosidade e o interesse dos alunos.

Contudo, vale salientar que a maior exposição na mídia não significa maior conhecimento ou habilidade em relação ao domínio da linguagem presente nos mapas. O acesso a esses meios de comunicação ocorre de forma passiva, em que as pessoas são apenas consumidoras de informação e, via de regra, não são estimuladas a realizar, por meio de senso crítico, qualquer tipo de relação entre as imagens cartográficas disponibilizadas com os conceitos ou noções espaciais. Esse caráter, essencialmente de consumidor de informação, também está presente entre os professores e estudantes de Geografia em sua relação com os mapas.

Sobre essa relativa passividade em relação aos mapas, Girardi (2000) nos alerta ao afirmar que a Geografia assumiu, muitas vezes, o papel apenas de consumidora desse produto cartográfico e não de produtora ou usuária consciente do mesmo. Segundo essa autora, a distinção entre consumo e uso do mapa é feita a partir da observação de como esse produto cartográfico é tratado em seu trabalho cotidiano. A interação entre os interlocutores, mapeadores e leitores ou usuários, requer que ambos conheçam os signos da linguagem dos mapas e consigam produzir novos significados. Por outro lado, enquanto consumidores apenas, dificilmente terão condições de pensar e entender as mensagens e interesses colocados nas representações cartográficas disponíveis.

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desenvolvem um maior interesse pela Cartografia e, consequentemente, compreendem mais facilmente os conceitos e as noções espaciais necessários em suas vidas cotidianas. No entanto, não é isso que temos observado no contexto escolar do ensino básico.

Simielli (1986, p.139) em seus estudos sobre comunicação cartográfica já havia destacado que “boa parte do professorado não domina noções elementares de Cartografia e, consequentemente não possui condições de trabalhar com o mapa, usando-o apenas como recurso visual.” O que se percebe ainda hoje é que os temas da Cartografia, especialmente aqueles relacionados à leitura e interpretação de mapas estão muito distantes das escolas brasileiras (Castellar, 2005). Acreditamos que essa distância se explica pelo fato de que, em grande parte, as habilidades para leitura, escrita e interpretação através de meios gráficos são desconhecidas dos professores e dos alunos, e esse é o problema que deve ser enfrentado.

Todas essas questões nos preocupam e nos instigam a buscar alternativas pedagógicas mais eficazes para mediação da linguagem cartográfica com nossos alunos. Ensinar Cartografia, como advertiu Loch e Fuckner (2005), tem se tornado, cada vez mais, um desafio aos professores que atuam no ensino básico. A construção das habilidades de leitura, interpretação e construção de um mapa não ocorrem naturalmente. Necessitam ser mediadas por alguém que tenha o domínio dessa linguagem e, tradicionalmente, no currículo escolar essa responsabilidade é uma atribuição dos professores de Geografia.

A partir dessas e de outras questões, proponho este estudo com o intuito de discutir e apresentar uma proposta didática que instrumentalize o professor de Geografia na tarefa de vivenciar as noções espaciais com seus alunos e, ao mesmo tempo, mediar a compreensão e interpretação da linguagem cartográfica de forma mais eficiente e significativa. Entendemos, pois, que essa linguagem não pode ser considerada per se, mas no contexto da construção dos conhecimentos geográficos necessários à participação autônoma dos indivíduos no meio em que vivem.

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Neste sentido, além da discussão das potencialidades dessa atividade esportiva na aprendizagem de noções cartográficas, o objetivo deste trabalho consiste em apresentar uma proposta didática com o uso dessa modalidade esportiva. O intuito é contribuir para que os professores ampliem suas compreensões, interpretações e reflexões sobre os processos envolvidos no ensino e aprendizagem da linguagem cartográfica, de modo que possam compartilhar e aprimorar esses conhecimentos com seus alunos em diferentes contextos escolares.

Reconhecidamente uma das maiores dificuldades que encontramos no contexto escolar diz respeito ao desinteresse, desencanto e falta de motivação por parte dos alunos em relação à aprendizagem de alguns conceitos da Geografia, em especial aqueles relacionados à Cartografia Escolar. A iniciativa de usar um esporte com o propósito de colaboração didática está baseada no princípio de que a prática esportiva pode ser uma forma prazerosa e motivadora de apreender conceitos relacionados a diversos campos do conhecimento.

Muitos são os questionamentos de alguns alunos que temos presenciado durante as aulas de Geografia: “para que serve isso aí professor? Nunca usei um mapa mesmo”; “Isso é aula de Geografia ou Matemática, professor, só tem conta”; “Quando é que vou precisar disso na minha vida, hoje tenho o GPS que me dá informação de tudo.”, dentre outros. Nesse sentido, torna-se necessário desenvolver atividades que motivem e despertem o desejo de aprender sobre algo tão importante para nossas vidas, inclusive, que desmistifique a ideia de que a tecnologia poderá suprir todas as nossas dificuldades em operar com as noções espaciais. Trata-se, portanto, de um caminho que parece estar sendo deixado de lado e sem o reconhecimento devido.

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Ao realizar percursos de Orientação com alunos dos vários níveis de escolaridade (ensino fundamental, médio e superior) e participando de competições em várias regiões no Brasil, foi possível fazer alguns questionamentos quanto ao potencial desse esporte como instrumento de mobilização para a aprendizagem da Cartografia escolar. Precisamos compreender, portanto, quais noções espaciais e conceitos cartográficos poderiam ser desenvolvidos com a prática desse esporte. Como o esporte Orientação poderia ser adaptado ao contexto escolar sem perder suas características esportivas e, ao mesmo tempo, contribuir para o processo de ensino e aprendizagem da Cartografia escolar? Ou ainda, como propor essa prática ao universo dos professores de Geografia que atuam no ensino fundamental? Esses questionamentos me induziram a levantar algumas hipóteses investigadas nesta pesquisa: o esporte Orientação é um importante mobilizador para colocar em ação as habilidades fundamentais para leitura, compreensão, interpretação e mapeamento que o professor de Geografia precisa desenvolver com seus alunos, como forma de consolidar a aprendizagem das noções espaciais e da linguagem dos mapas; a prática frequente desse esporte, com o uso das técnicas de orientação espacial a partir da leitura de um mapa, poderá auxiliar o domínio de conceitos relativos a noções espaciais, especialmente os de localização e orientação, além de ampliar a habilidade de analisar o espaço geográfico por meio da linguagem cartográfica; a prática frequente do esporte Orientação possibilita a familiarização com uso do mapa, popularizando o uso desse instrumento de comunicação cartográfica no cotidiano.

Destas indagações e pressupostos estabeleci como objetivo para esta pesquisa a realização de um estudo que procura discutir o potencial do esporte Orientação como instrumento metodológico capaz de auxiliar de forma significativa a aprendizagem das noções espaciais e de conceitos relacionadas à linguagem cartográfica junto aos professores que atuam na educação básica, de forma que possam significativamente mediar esses conhecimentos quando estiverem trabalhando com seus alunos. Assim, o eixo central é desenvolver uma proposta didática para ensino e aprendizagem da linguagem cartográfica no contexto de formação continuada de professores que atuam no ensino fundamental.

Nessa perspectiva, proponho que o esporte Orientação seja usado como mediador para compreensão dessa linguagem, na formação de professores, tendo em vista que o mesmo possui características que aproximam seus praticantes dos conceitos empregados pela Cartografia Escolar, podendo facilitar sua apreensão e domínio.

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conceituação: facilitar a mediação de aprendizagem da linguagem cartográfica junto aos professores de forma significativa e ao mesmo tempo contribuir para o desenvolvimento de noções espaciais junto aos alunos do ensino básico, de forma igualmente significativa e propositiva.

Para isso, foi desenvolvido um conjunto de atividades com as quais os professores participantes de uma experiência num curso de formação continuada, em que o esporte Orientação foi usado como instrumento mediador para a aprendizagem de noções cartográficas tiveram uma experiência concreta na realização/construção de um mapa específico para a prática de um percurso do esporte Orientação.

Para atingir a esse objetivo foi estabelecido um planejamento e definidas os objetivos específicos que orientaram a pesquisa. A seguir são apresentadas tais objetivos que nortearam a atividade da pesquisa: Compreender o ensino de cartografia escolar como uma forma de linguagem espacial; Apresentar o esporte Orientação como instrumento didático para ensino e aprendizagem de noções espaciais e conceitos relacionados à linguagem cartográfica, estimulando a curiosidade e a reflexão sobre essa temática; Realizar atividades práticas com situações de aprendizagens junto aos professores para promover a aprendizagem das noções espaciais a partir da prática do esporte Orientação; Desenvolver atividades de construção de um mapa base com os professores para a realização de um percurso de Orientação; Analisar a relação dessa modalidade esportiva com a linguagem cartográfica, identificando os potenciais pedagógicos promovidos pela prática desse esporte.

O esporte Orientação, a meu ver, contribuiu para as discussões sobre a Cartografia para Crianças e Escolares, pois, diferentemente dos métodos habituais para apresentação de informação espacial, tais como o mapa, impresso nos livros didáticos ou pendurado na parede, a modalidade esportiva recorre a outras inteligências que acionam os múltiplos sentidos em um ambiente de contato com o espaço real. Portanto, é buscada uma aproximação entre as discussões sobre o esporte Orientação e Cartografia para Crianças e Escolares, pois em certa medida as atividades recreativo-esportivas fazem parte da vida das crianças e adolescentes independentemente da educação formal.

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informação espacial, uma vez que compreendemos que atividades de ensino que propõe interações colaborativas podem potencializar a construção de conhecimentos.

Na primeira parte da tese há uma discussão e problematização da Cartografia no atual contexto do ensino de Geografia e como campo de pesquisa, na busca por uma reflexão sobre a importância dos conhecimentos cartográficos básicos para melhor compreender a organização socioespacial. Também apresento um debate sobre a Cartografia praticada na escola, ou Cartografia Escolar, à luz das pesquisas relatadas na literatura disponível sobre esse tema, tendo em vista suas peculiaridades em relação à cartografia em geral, discutindo alguns conceitos, como a noção de localização, orientação espacial, escala e legenda, fundamentais na vida cotidiana de qualquer indivíduo. Apesar desses conceitos se apresentarem como objetos de estudo por diferentes áreas do conhecimento, esse enfoque torna-se necessário sob a perspectiva da compreensão das representações do espaço geográfico, a partir de suas implicações na leitura e interpretação de formas cartográficas mediadas pelo uso do mapa. No contexto de ensino e aprendizagem da cartografia procuro situá-la como uma forma de linguagem gráfica que, por meio do mapa, materializa as informações espaciais. A observação sobre a aproximação e distanciamento entre a Geografia e Cartografia são aspectos importantes discutidos nessa parte da pesquisa, tendo em vista a importância de considerarmos e valorizarmos a Cartografia como instrumento imprescindível na compreensão dos conceitos geográficos.

Em seguida é apresentado o esporte Orientação como modalidade esportiva que se relaciona, por meio do uso do mapa, com a Cartografia escolar. Esse esporte que é fundamentado no uso de um mapa e uma bússola, como seus principais instrumentos de realização, tem suas dimensões e instrumentos destacados, mostrando seu caráter competitivo, turístico, ambiental e, sobretudo, pedagógico, tendo em vista a aproximação com os conceitos e noções espaciais relacionados ao ensino do mapa. O contexto histórico e espacial dessa modalidade é destacado, e são apresentadas as especificações técnicas que caracterizam a produção e uso dos mapas, classificando-as como um conjunto que pode ser entendido como uma Cartografia de Orientação.

Em seguida são apresentados os procedimentos metodológicos utilizados na pesquisa, bem como os sujeitos participantes e seus envolvimentos no curso desenvolvido para realização da experiência concreta com os professores e situação de formação continuada em serviço.

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situações de ensino e aprendizagem das noções espaciais e da linguagem cartográfica. O eixo condutor foi a construção de um mapa e um percurso de Orientação, refletindo sobre as dificuldades e as necessidades de buscar alternativas mais dinâmicas, na tentativa de despertar o interesse dos participantes em ampliar os horizontes em termos de domínio e operação face à linguagem cartográfica.

Em seguida apresento as atividades desenvolvidas e que permitiram avaliar em que medida os saberes construídos com a experiência constituíram o esporte Orientação como alternativa didática para o ensino de noções espaciais e da linguagem cartográfica.

Procuro mostrar na sequência, os elos existentes entre o esporte Orientação e os conteúdos da linguagem cartográfica ensinados no contexto escolar, apresentando as habilidades desenvolvidas e os ganhos possíveis em termos de autonomia espacial de quem pratica esse esporte. Nessa parte são apresentados alguns caminhos para adaptação desse esporte como instrumento didático para a construção e desenvolvimento dos conceitos cartográficos associados às noções espaciais, bem como a importância dessa atividade esportiva como elemento de motivação para aprendizagens de professores e alunos.

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2 A CARTOGRAFIA COMO CAMPO DE PESQUISA

2.1 Contexto e problematização

A Geografia é um campo de conhecimento que surgiu como uma disciplina escolar e hoje é consagrada no interior do currículo oficial da educação básica, junto a outras ciências, cujo papel é promover aos estudantes as habilidades e competências em relação à compreensão da organização socioespacial. Nesse sentido, Moraes (1999) ressalta que os professores de Geografia que atuam na educação básica têm um importante papel na mediação da construção e desenvolvimento das noções espaciais necessárias ao longo da vida dos indivíduos. Implícita a essa ideia está a concepção de que saber operar com as noções espaciais é uma condição necessária e indispensável na vida de qualquer pessoa, e nós como professores de Geografia, devemos contribuir para o desenvolvimento de alunos críticos que saibam pensar o espaço para que possam nele agir com maior autonomia (LACOSTE, 1997).

A percepção espacial e a consequente ação no espaço real é uma necessidade, ou mesmo uma condição que temos para sobrevivência desde o nosso nascimento. As atividades que fazemos de forma individual ou coletiva, em casa, nos locais de trabalho ou em outros espaços sociais exigem o conhecimento sobre o espaço. Portanto, dominar as noções espaciais básicas, como saber onde estamos, que direção seguir em determinados trajetos, onde se localiza determinada empresa, escola, shopping, qual a distância entre os lugares, qual o tamanho e o limite de determinada área, o que permite dimensionar o espaço em outras escalas mais amplas a partir de relações de proporcionalidade e coordenadas geográficas, por exemplo, ou ainda reconhecer como se distribui as atividades econômicas em uma região ou país ou a divisão de terras para a população e para diferentes usos, são prerrogativas essenciais para agirmos e planejarmos nossas ações no cotidiano, bem como termos melhores subsídios para fundamentar nossos posicionamentos quanto a diferentes questões sociais e ambientais regionais, nacionais e globais representadas em mapas.

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Para empreender esse processo de construção das noções espaciais, a Geografia utiliza vários instrumentos e linguagens que, associadas a outras ciências, podem facilitar a apreensão dos conceitos envolvidos no entendimento da organização socioespacial. Nesse sentido, a linguagem cartográfica, por meio de um mapa, ocupa um lugar central no ensino e aprendizagem dessas noções. Em sua essência, a materialidade dessa linguagem, é uma representação visual gráfica, construída por alguém para comunicar e interagir sobre informações espaço-temporais de determinado lugar.

Os estudos sobre as representações gráficas, por meio do mapa, consolidaram-se como um campo de conhecimento, em grande medida, paralelo à Geografia, denominado Cartografia que, embora controverso, possui uma epistemologia razoavelmente definida. As discussões envolvendo a definição do objeto de estudo da Cartografia e suas diferentes formas de uso, levaram a uma categorização sobre essa área de conhecimento. Isso contribuiu para a criação de uma vasta terminologia que procura definir a Cartografia de acordo com os interesses que a produzem. Dessa forma, algumas terminologias são observadas em várias literaturas. Cêurio de Oliveira (1993) representando o programa editorial do IBGE publicou uma obra de referência para terminologias ligadas ao tema Cartografia. O autor destaca que o termo Cartografia é um “vocábulo criado pelo historiador português Visconde de Santarém, em carta de 8 de dezembro de 1839, escrita em Paris, e dirigida ao historiador brasileiro Adolfo Varnhagen. Antes da divulgação e consagração do termo, o vocábulo usado tradicionalmente era cosmografia” (OLIVEIRA, 1993. p. 84). Associado a esse termo surgem outros muito comuns na literatura especializada, como cartografia especial, fotográfica, geográfica, marítima, aeronáutica, mineira, antiga, medieval, moderna, renascentista, militar, oficial, prática, privada, sistemática, temática, automática, cadastral, computadorizada e teórica (OLIVEIRA, 1993. p. 85).

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representação gráfica do espaço real por meio de um mapa (RIMBERT, 1964; BAKKER, 1965). Alguns destacam, ainda, que a Cartografia é meio de comunicação de informações espaciais entre indivíduos (MORRISON, 1979; RATAJSKI,1970; BOARD, 1991), deixando clara uma compreensão da Cartografia como linguagem, a linguagem espacial, cujo papel é comunicar a informação espacial por meio dos mapas. Já, a Associação Cartográfica Internacional não a considera como ciência, ressaltando se tratar de um “conjunto de estudos e de operações científicas, artísticas e técnicas que intervém a partir dos resultados das observações diretas ou da exploração de uma documentação, tendo em vista a elaboração de cartas, plantas e outros modos de expressão, assim como sua utilização” (ACI, 1991).

Nesse sentido, essa linguagem precisa ser ensinada aos alunos. Assim como na linguagem escrita, em que os alunos precisam saber ler e escrever, os estudantes precisam ser alfabetizados em Cartografia para que compreendam e saibam utilizar essa linguagem gráfica (SIMIELLI, 2004).

Nesse ponto há muitas reflexões sobre as metodologias que devem ser empregadas nesse processo de alfabetização. Passini (1998) destaca dois procedimentos considerados fundamentais para que esse processo de educação cartográfica seja desenvolvido. O primeiro diz respeito ao desenvolvimento cognitivo em relação à simbologia cartográfica. Este deve ocorrer a partir da prática de representação, em que o estudante exercita a construção de um mapa realizando a classificação, comparação, seleção, quantificação e ordenação dos símbolos, projeção e redução. O segundo relaciona a abordagem escalar, destacando que o exercício do mapeamento deve ser iniciado a partir de objetos próximos e conhecidos do aluno, de forma que essa percepção espaço-temporal crie mais significados e possibilite posteriormente a compreensão de espaços mais distantes por meio da generalização.

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A interpretação e análise espacial, necessária em nossas vidas, dentro ou fora da escola, dependem da aquisição e domínio de habilidades e competências para a leitura e interpretação dos mapas, as quais são atributos a serem desenvolvidos nas aulas de Geografia desde os primeiros anos do ensino formal na escola. Portanto, a aquisição desses conhecimentos no ambiente escolar está diretamente relacionada às capacidades e habilidades desenvolvidas por nós, professores de Geografia, evidenciando a importância da escola básica e de nossa formação profissional para atuarmos nesse nível de ensino. Assumimos, dessa forma, a responsabilidade pela aquisição de técnicas que possibilitem a leitura da linguagem cartográfica pelos alunos. Esta estaria contribuindo para a aprendizagem e aperfeiçoamento dos processos de leitura de mundo e ampliando a visão de mentes curiosas.

No levantamento bibliográfico para elaboração desta pesquisa, foram eleitas algumas obras como referência específica que ajudam na reflexão teórica sobre o ensino da Geografia e da Cartografia Escolar. Elas discutem a importância de se dominar a linguagem e o uso adequado dos mapas, além da preocupação com a formação de professores e a forma como se ensina na escola. Outros trabalhos apresentam sugestões de procedimentos metodológicos para o trabalho com essa linguagem, de maneira que os estudantes possam entender os diferentes lugares produzidos socialmente e neles saber agir com maior autonomia. Muitas dessas literaturas abordam a Cartografia Escolar como linguagem de representação espacial, como se verificou nos trabalhos de Almeida (2000; 2001; 2010), Oliveira (1978), Sanches (2004), Picarelli (1995-97), Castrogiovani (2000), Girardi (2000), Guimarães (2000), Katuta (2001), Moraes (2003), Neves (2002), Passini (1994; 1996) e Simielli (1986; 1996).

Uma atenção especial é dedicada à necessidade de compreendermos o mapa como um meio de comunicação, ou como uma linguagem que nos permite “expressar espacialmente um conjunto de fatos”, ou “apresentado como uma solução alternativa de representação espacial de variáveis que possam ser manipuladas na tomada de decisões e na resolução de problemas” (OLIVEIRA, 2010, p.19). Ao se referir à Cartografia para crianças Oliveira (2010, p.25) sugere que “para o seu desenvolvimento ser eficaz, é preciso considerar o mapa um entre os vários tipos de linguagens de que os homens dispõem para se comunicarem e se expressarem”, deixando clara sua preocupação em conceber o mapa como uma forma de linguagem a ser ensinada e compreendida desde os primeiros anos da vida escolar dos alunos.

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Os problemas complexos da cartografia moderna não podem ser estudados e entendidos com sucesso – e muito menos resolvidos, e o progresso da arte assegurado -, a não ser que seja dada total atenção à conexão mútua entre os dois componentes principais da comunicação cartográfica, ou seja, a produção e a criação de um trabalho de cartografia e sua utilização ou consumo (SIMIELLI, 1986, p.46).

O autor mostra que a comunicação cartográfica será mais eficiente se essa conexão entre a transmissão da informação espacial e sua leitura ou consumo não for interrompida.

No entanto, é preciso considerar que:

Tratar a Cartografia simplesmente como um meio de transmissão de informação realmente não acrescenta nada de novo à literatura existente, considerando-se que a preocupação do cartógrafo sempre foi, e ainda é, a de fazer um bom mapa, que conduza a uma leitura eficiente (SIMIELLI, 1986, p. 15).

Esses autores defendem, sobretudo, a necessidade dos professores que atuam com alunos da educação básica, de dominarem essa linguagem como princípio para ter condições de auxiliá-los em tal intento.

Contudo, o que se observa é que, na prática, muitos ainda abordam a Cartografia apenas como um conteúdo fragmentado dentro do ensino de Geografia, ao invés de uma linguagem espacial que deve ser desenvolvida durante todo o ensino escolar. Constata-se, também, que a maioria tem adotado metodologias que não contemplam a prática de construção de mapas nesse nível de ensino. Quando há um trabalho mais efetivo em sala de aula, se restringe à leitura de mapas prontos, que foram construídos fora da realidade de alunos e professores, em escalas muito pequenas e que não despertam o interesse de seus estudantes.

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O que se verifica no contexto escolar, é que muitos ainda têm dificuldade em lidar com os mapas e uma das explicações plausíveis está relacionada à falta de domínio de metodologias eficazes ao ensino e aprendizagem do mapa como instrumento de comunicação de informações espaciais. Muitas vezes, preferimos lançar mão de outros artifícios ou recursos reducionistas baseados em aulas expositivas, em que os alunos não participam ativamente, as quais têm demonstrado pouca eficácia para o desenvolvimento das noções espaciais junto aos jovens estudantes do ensino básico.

O mapa como linguagem de uma comunicação visual deve permitir uma interação do leitor com seu autor, possibilitando a construção de sentidos por parte de quem está lendo a imagem gráfica. No entanto, verifica-se uma distância em relação aos interesses de quem faz o mapa e de seus leitores na escola, o que restringe as possibilidades de interações. Como destaca Wood (2001) a relação das pessoas com os mapas é claramente dicotomizada entre os Cartógrafos, aquelas pessoas com conhecimentos especializados que produzem os mapas, de um lado, e os usuários dos mapas, o leitor, o estudante e o professor, do outro. Essa dicotomia, muitas vezes, impede um diálogo e interações entre quem produz e quem faz uso desse documento cartográfico (WOOD, 2001). Na condição apenas de leitor, ou usuário do mapa, as pessoas estão restritas em suas possibilidades de entender os mecanismos da linguagem que deu origem a essa construção e as intenções de quem o construiu.

Hoje, por meio de modernos instrumentos científicos baseados em sistemas de sensoriamento remoto e utilização de receptores como o Global Positioning System (GPS), os mapas estão sendo elaborados e disponibilizados nas diversas formas de mídias, a saber, revistas, jornais, meio digital, Internet e, principalmente, nos materiais didáticos utilizados nas escolas. Ao torná-los disponíveis nesses meios, digitais ou impressos, os cartógrafos mapeadores ou editores tentam adequá-los de acordo com o público alvo.

2.2 O mapa como instrumento material da linguagem espacial

O interesse pela Cartografia, assim como a produção de mapas para as diversas finalidades, tem acompanhado a história humana desde os períodos quando os homens deixavam suas marcas registradas por meio de desenhos nas pedras e cavernas, demonstrando que desde então já se tratava de uma forma de comunicação e interação entre os sujeitos, por meio desses registros visuais.

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de apreensão dessa linguagem, capaz de registrar e comunicar informações espaciais, em que o real ou imaginário é representado sobre uma folha de papel, utilizando para isso as convenções gráficas próprias da cultura na qual foi produzido. Ao adotarmos essa concepção do mapa como um instrumento da linguagem cartográfica, que comunica informações geoespaciais e permite múltiplas interações, devemos refletir cotidianamente sobre os procedimentos metodológicos utilizados no processo de ensino-aprendizagem dessa forma cartográfica uma vez que, de acordo com pesquisas realizadas por Moreira (2003), Archela (2002) e Neves (2002), a metodologia usada por grande parte dos professores de Geografia no ensino básico ainda está fundada no pensamento de que a Cartografia é apenas um conteúdo que deve ser ensinado em determinado momento da vida escolar.

Por se tratar de uma forma de comunicação, a Cartografia apresenta uma linguagem própria que exige um conhecimento mínimo para que possa estabelecer um diálogo entre os sujeitos envolvidos. Trata, portanto, de conhecermos a linguagem das representações cartográficas que é composta de um conjunto de signos que promovem a interação do seu autor (o cartógrafo mapeador) com seus leitores ou usuários (alunos, professores, turistas, outros profissionais) e deles com o espaço real ou fenômeno representado.

Segundo Bertin (1980) essa linguagem se configura como um sistema simbólico arquitetado pela relação entre o significante (mensagem, símbolo) e o significado (ideia formada na mente do interlocutor), em que ambos se articulam numa representação visual que possibilita uma legibilidade. O significado é definido pelos dados ou objetos representados ou a ideia formada na mente do interlocutor, que ao observar a imagem pode estabelecer três tipos de relações: de similaridade ou diversidade (), de ordem (O) e de proporcionalidade

(Q) entre os dados transcritos no mapa pelas variáveis visuais de mesma natureza. Em outras palavras, Bertin destaca que:

A representação gráfica não é convencional, pois ela transcreve uma relação por uma relação. Transcreve uma semelhança entre as coisas por uma semelhança visual entre os símbolos ou entre posições (elas são próximas).

Transcreve uma ordem entre as coisas por uma ordem visual entre os

símbolos ou entre posições. Transcreve uma proporção entre as coisas por

uma proporção visual entre os símbolos ou entre posições (BERTIN, 1980.

p. 169).

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relação entre o significante e o significado leva à significação como se fosse um produto final entre os dois, como destaca Simielli (1982) dizendo que é como

a relação entre palavras e coisas, em que a “relação é determinada pela necessidade de designar as coisas pelas palavras. Disso deriva que o signo é sempre arbitrário e seu significado é estabelecido simplesmente por uma convenção. Por isso o signo é representativo ocupando o lugar das coisas e não as coisas (SIMIELLI, 1986 p.74-76).

O mapa, como instrumento que materializada uma representação espacial, é capaz de mediar e estabelecer uma articulação entre os signos, e entre a realidade espacial e os sujeitos envolvidos com a representação. Dessa forma, se o mapa é o instrumento que permite, por meio dele, pensar o espaço, deve ser compreendido como algo imprescindível na vida cotidiana, o que nos incentiva e obriga a conhecer sua linguagem e seus fundamentos teóricos que, independentemente de sua finalidade, é um meio de comunicação e exige do seu leitor ou construtor, conhecimentos mínimos de Cartografia (ARCHELA e THÉRY, 2008). A partir das representações presentes no mapa podemos elaborar uma interpretação e analisar alguns aspectos do território, mesmo sem tê-lo conhecido previamente. Mas isso só é possível quando somos capazes de decodificar sua linguagem gráfica, entendendo seus significados e suas inter-relações, as quais se mostram de grande complexidade e de difícil assimilação por parte de professores e estudantes de Geografia.

Nos estudos sobre as concepções de linguagem desenvolvidas por Bakhtin, a relação estabelecida entre os interlocutores se dá por meio de um enunciado, o qual é referência principal em toda sua construção teórica sobre linguagem. É por meio do enunciado que ocorre a materialização da comunicação e interação entre os sujeitos (BRAIT e MELO 2008).

A interlocução acontece na complexa interação entre um enunciador (quem fala ou escreve) e um enunciatário (receptor que lê, vê ou ouve). Assim, os signos e os seus significados são construídos na interação e serão influenciados pelo contexto histórico-cultural em que os sujeitos estão vivenciando no momento da interlocução. O enunciado, no entanto, não se apresenta de forma estática, com um significante e seu significado associado, nem para o enunciador nem para o enunciatário e, também, não é repetível e é determinado pelas relações sociais, históricas e pelo conhecimento prévio dos sujeitos envolvidos (BRAIT e MELO 2008).

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ambos conheçam os signos da linguagem dos mapas para que consigam produzir novos significados (OTTOSSON, 1987).

O desconhecimento desses signos tem refletido também na dificuldade de aprendizagem e desinteresse dos estudantes do ensino básico com os quais tenho trabalhado nos últimos anos. Portanto, é fundamental o domínio dos instrumentos e técnicas que materializam a representação de um recorte espaço-temporal do território, em que a decodificação da imagem construída e a busca pelos significados por meio do sistema de signos produzam uma compreensão do espaço representado pelo mapa.

Ao considerarmos a Cartografia como uma linguagem, devemos entender que o desenvolvimento do seu ensino junto aos estudantes deve ser compreendido ao longo de toda a vida escolar, permitindo uma construção processual de aprendizagem que não se encerra quando termina o capítulo do livro didático.

No entanto, lidar com mapas não é uma prerrogativa ou necessidade apenas do professor ou estudantes de Geografia. O mapa como instrumento de comunicação possibilita múltiplas interações do leitor com as informações geoespaciais presentes nele, e é carregado de símbolos que se associam ao conteúdo nele representado (MARTINELLI, 2010). Presente em nosso cotidiano o mapa tem sua prática de leitura e interpretação exigida em muitas circunstancias da vida em sociedade, e em muitas situações diferentes.

São muitas as situações que requerem o domínio da linguagem cartográfica, como no trabalho de especialistas cartógrafos, em que o mapa é seu principal objeto de trabalho, sendo que a função principal desses profissionais é produzi-lo e reproduzi-lo a fim de atender aos interesses de seus usuários. Os planejadores que trabalham com a gestão territorial urbana e agropecuária usam cartas topográficas e plantas das cidades ou de propriedades rurais. Ou seja, as representações cartográficas são importantes instrumentos de gestão e análise espacial, tendo em vista a necessidade de tomar decisões mais eficazes acerca das intervenções sobre o território em questão.

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As pessoas que praticam algumas modalidades esportivas como corridas ou caminhadas de Orientação, andando de bicicleta ou estando motorizados, usam mapas para se orientarem sobre a paisagem nas trilhas e estradas, definindo o melhor roteiro a seguir.

As representações por meio de mapas estão presentes na história da humanidade desde tempos mais remotos e, independentemente da formação ou atividade dos indivíduos, há necessidade de saber lidar ou conhecer os signos desse instrumento que possibilita maior autonomia nos deslocamentos no espaço geográfico. Em muitos casos, principalmente nas atividades de construção de um mapa, exige-se um mínimo de conhecimento prévio acerca de sua linguagem gráfica específica (MARTINELLI, 2010).

Dessa forma, o mapa pode possuir um papel estratégico, o que deve ser valorizado no contexto dos estudos de Geografia, como sugere Lacoste (2002), ao afirmar que é possível pensar o espaço e sua organização por meio da análise de um documento cartográfico. Coerente com essa ideia do mapa como instrumento estratégico e a serviço do poder ao longo da história humana, Martinelli (2010) enfatizou que "a finalidade mais marcante em toda a história dos mapas, desde o seu início, teria sido aquela de estarem voltados à prática, principalmente a serviço da dominação, do poder" (MARTINELLI, 2010, p.8). Essa importância, ligada ao exercício do poder ao longo da história, marcou o desenvolvimento da Cartografia como campo de conhecimento autônomo e que serve de instrumento de análise em outras ciências. Isso pode ser comprovado pela evolução significativa na produção de mapas, tanto em termos qualitativos como quantitativos, que ocorreu na Europa a partir dos séculos XV e XVI.

Segundo Martinelli (2010) as relações comerciais entre os países europeus e dos países europeus com os do Oriente exigiam mapas e outros meios de registro e orientação, cada vez mais detalhados para facilitar seus deslocamentos. Além disso, a invenção da imprensa permitiu seu barateamento e maior difusão desse instrumento de comunicação entre as nações. O período dos “descobrimentos” também levou a Cartografia e os mapas ao status de armas geopolíticas nas mãos dos detentores do poder. A partir dos séculos XVIII e XIX, com o advento do imperialismo, se inicia a cartografia moderna e, com a instituição das academias científicas, ampliaram-se as produções de mapas em benefício das potências que necessitavam de inventários cartográficos das áreas conquistadas ou de interesses futuros (MARTINELLI, 2010).

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entre seus interlocutores, os produtores (mapeadores, editores) com seus leitores ou usuários com as informações geoespaciais e temporais representadas.

A partir dessas reflexões tenho buscado compreender o mapa como a materialização da linguagem cartográfica, e ao mesmo tempo procuro alternativas didáticas que contribuam com um ensino que seja mais significativo aos professores e alunos do ensino básico. Esse movimento levou-me a uma aproximação aos estudos e pesquisas que discutem o contexto da Cartografia Escolar dentro do processo da educação geográfica.

Um dos equívocos observados no processo de ensino-aprendizagem da linguagem cartográfica está no fato de se procurar abordá-la como um sistema de códigos preestabelecidos, pronto e carregado de significados estranhos à realidade do estudante, ao invés de tratá-la como uma linguagem que representa um determinado contexto socioespacial. Por isso, a apreensão e domínio dessa linguagem devem ser acompanhados de uma imersão no contexto sociocultural a que está inserida, sem o qual seus aspectos técnicos baseados em signos ou convenções tornam-se vazios e desprovidos de sentidos para os interlocutores, professores e estudantes.

Ao abordarmos o mapa como uma forma de linguagem gráfica há necessidade de uma reflexão precedente sobre o conceito de linguagem em geral, tendo em vista se tratar de uma forma de comunicação que busca a interação entre os atores envolvidos. Entender, portanto, essa concepção é de fundamental importância para a construção de sentidos, ou de uma ressignificação, baseados na representação do mapa. O entendimento do significado e a possibilidade de criação de novos sentidos configuram-se na necessidade da interpretação de um mapa, colocando em evidência a relação entre pensamento e linguagem, pois é no estabelecimento do significado que se constrói a mediação simbólica entre quem construiu e seus interlocutores (Vigotsky, 2009). Dessa forma, o significado é que permite a comunicação entre o usuário do mapa e o mundo real por ele representado, ou seja, o significado é um fenômeno possibilitado pela leitura da representação cartográfica, materializada no mapa e, a atribuição de sentido, ou significado, é resultado dessa interação social.

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contexto cultural em que vivemos e experimentamos desde nossa infância, o que permite produzirmos sentidos e analisarmos sob nossa visão de mundo. No entanto, ao procuramos interpretá-lo e analisá-lo, considerando não apenas o visível de imediato como uma imagem material, mas procurando abstrair-se e pensar no contexto do autor ou editor em seu cenário social, espacial e histórico, é possível construir outras interpretações que nos possibilitam fazer análises e tomarmos outras atitudes motivadas por outros olhares sobre o mapa.

Os estudos em relação à linguagem cartográfica são, em sua maioria, trazidos do campo da linguística, sobretudo da linguística estrutural, que tratam da concepção de mapa a partir da semiologia geral (GIRARDI, 2000). Essa abordagem, que considera a Cartografia como linguagem, comporta dois aspectos inerentes ao mapa que são imprescindíveis quando de sua leitura, interpretação e análise: o técnico e o cultural. Quanto ao aspecto técnico da leitura do mapa deve-se considerar a acurácia e a legibilidade dos seus elementos e suas correspondências ao espaço representado, neste caso, saber usar a legenda, escala, sistema de coordenadas, curvas de nível e projeções são fundamentais para uma boa leitura e interpretação (GIRARDI, 2000). Assim, o mapa representa uma organização espacial num determinado momento, baseada numa projeção ortogonal da superfície terrestre sobre o plano, e os signos encontram-se diretamente condicionados às características dos fenômenos e aos dados disponíveis para a elaboração de uma dada composição simbólica (RODRIGUES e SOUZA, 2008).

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alienado de seu valor e de sua importância para a cidadania (BOARD, 1984, apud GIRARDI, 2000).

O aspecto cultural ilumina uma trilha possível para ensinar a leitura e interpretação do mapa. É possível iniciar com a contextualização e apresentação da função social do mapa, tendo em vista se tratar de uma linguagem gráfica, descrevendo a história, objetivos e entendendo o significado das suas representações. Posteriormente, estimular o diálogo, de forma contextualizada, para uma interlocução com seu autor e os fenômenos representados, de forma que seja capaz de produzir uma ressignificação, de acordo com seu ponto de vista, sua visão de mundo, ou seja, construir sentido(s) para aquilo que está sendo representado.

Esse caminho, que produz sentido ao mapa, pode possibilitar às pessoas uma nova compreensão da importância e do potencial das representações cartográficas, que muitas vezes são desconsiderados quando se procura ler apenas seus aspectos técnicos da precisão e legibilidade. Enquanto tentarmos ensinar a linguagem dos mapas a partir de técnicas isoladas de seus contextos sociais e culturais, dificilmente teremos êxitos no processo de ensino e aprendizagem.

2.3 Linguagem cartográfica e processos de aprendizagens

O processo de aprendizagem da linguagem cartográfica, assim como de qualquer outra linguagem, depende do meio cultural onde se vive e de como as pessoas se relacionam. A aquisição das habilidades para operá-la deve se articular ao processo de ensino e aprendizagem que ocorre, sobretudo, no contexto escolar, espaço privilegiado para o desenvolvimento formal dos indivíduos (CAVALCANTI, 2006). O papel do professor de Geografia assume uma relevância significativa, tendo em vista que dentro do currículo escolar é a disciplina de Geografia que se responsabiliza por desenvolver as noções espaciais fundamentais que serão exigidas ao longo de toda a vida do indivíduo.

Referências

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