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A afetividade na prática de professores de escolas públicas bem-sucedidas em avaliações de larga escala

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Academic year: 2017

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Pró-Reitoria Acadêmica

Escola de Educação, Tecnologia e Comunicação

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação

A AFETIVIDADE NA PRÁTICA DE PROFESSORES DE

ESCOLAS PÚBLICAS BEM-SUCEDIDAS EM AVALIAÇÕES DE

LARGA ESCALA

Autor: Leandro Batista da Silva

Orientadora: Profª Drª Sandra Francesca Conte de Almeida

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LEANDRO BATISTA DA SILVA

A AFETIVIDADE NA PRÁTICA DE PROFESSORES DE ESCOLAS PÚBLICAS BEM-SUCEDIDAS EM AVALIAÇÕES DE LARGA ESCALA

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Educação, na área de concentração de Ensino-aprendizagem.

Orientadora: Dra. Sandra Francesca Conte de Almeida

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FOLHA DE APROVAÇÃO

Tese de autoria de Leandro Batista da Silva, intitulada ―A afetividade na prática de professores de escolas públicas bem-sucedidas em avaliações de larga escala‖, apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor em Educação da Universidade Católica de Brasília, em 14 de março de 2016, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo-assinada:

____________________________________________ Profª Drª Sandra Francesca Conte de Almeida

UCB – Orientadora

____________________________________________ Profª Drª Regina Lúcia Sucupira Pedroza

UnB – Membro Externo

____________________________________________ Profª Drª Viviane Neves Legnani

UnB – Membro Externo

____________________________________________ Profª Drª Carmen Jansen de Cárdenas

UCB – Membro Interno

____________________________________________ Prof. Dr. Luiz Síveres

UCB – Membro Interno

____________________________________________ Profª. Drª. Katia Cristina Tarouquella Rodrigues

UCB – Membro Suplente

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Dedicar um trabalho de pesquisa que tem como campo de análise o fazer docente não se mostra tarefa das mais difíceis: este trabalho não poderia ser dedicado a ninguém que não aos professores, os operários da educação, que, diuturnamente, dedicam-se à faina de transformar o país pela força de sua palavra.

Como este trabalho também tem, em sua gênese, a questão da afetividade, decido dedicá-lo a professores que, ao longo de minha trajetória, impactaram-me por sua conduta, por sua interação, pelo modo afetivo (ainda que não consciente) como conduziram sua prática:

Profª Marli, na longínqua 4ª série, em 1991, na Escola Classe 46, em Ceilândia DF, cuja prática era eivada de afetividade. Sua confiança em nossa capacidade fez com que vencêssemos as barreiras sociais gritantes em que estávamos imersos.

Profª Hedmar, carinhosamente chamada de “Dininha”, na 8ª série, na Escola Estadual Nély Amaral, em Patrocínio MG. No ensino de História, abriu-nos portas para a importância da consciência crítica em nossas vidas.

Profª Sílvia Casagrande, na graduação em Letras, nos anos de 1999 a 2001, no Centro Universitário do Cerrado de Patrocínio – MG. Não pude ter melhor exemplo de prática educacional preocupada com o outro e aberta a suas demandas.

Profª Mariza Rocha, também na graduação em Letras, cujo exemplo de dedicação ao ensino da Língua Portuguesa trago até hoje no trato com meus alunos. Com essa professora, aprendi que seriedade também é afetividade e que o bom professor é aquele que exige o máximo do aluno, para que ele aprenda.

Profª Sandra Francesca, que tão carinhosamente me acolheu na tarefa de buscar compreender os meandros da afetividade e cuja prática me comprovou que a pesquisa acadêmica também pode ser pensada e praticada numa perspectiva afetiva.

E, por último, a uma pessoa que não foi minha professora, mas que, com seu exemplo profissional, fez com que eu me tornasse um apaixonado pela educação: Profª Lucimara Reis, talvez a educadora mais afetiva que já conheci. Seu exemplo servirá, sempre, àqueles que quiserem fazer da práxis educativa um ato de transformação permeado pela generosidade e pelo respeito ao próximo.

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AGRADECIMENTOS

À minha orientadora, Profª Drª Sandra Francesca Conte de Almeida, cuja orientação sempre acertada levou-me a acreditar neste trabalho e a crer que a educação, quando embasada em uma prática pensada, consciente, reflexiva, pode, verdadeiramente, mudar o mundo. Muito obrigado!

Aos professores Drª Regina Lúcia Sucupira Pedroza, Drª Viviane Neves Legnani, Drª Carmen Jansen de Cárdenas, Dr. Luiz Síveres, Drª Kátia Rodrigues Tarouquella, que, prontamente, aceitaram partilhar a leitura deste trabalho e apresentar novos caminhos para esta investigação. Muito obrigado!

À direção das três escolas participantes, que abriram suas portas e seu dia a dia docente de forma tão amiga, para que pudéssemos realizar esta investigação. Muito obrigado pelo apoio!

Aos meus pais, Ely e Angela, por terem, sempre, acreditado em mim. Esta vitória é, principalmente, de vocês.

À querida Aurélia, que teve papel decisivo na transcrição das entrevistas. Você foi fundamental e demonstrou uma afetividade irradiante. Deus a abençoe!

Às seis professoras que se prontificaram em ser ―co-partícipes‖ desta pesquisa: parabéns pelo trabalho, pela dedicação e pelo amor aos alunos e à educação. Com o exemplo de cada uma de vocês, tornei-me um professor melhor!

De um modo muito especial, meu eterno agradecimento às queridas Edgleuba e Karina Alvim. Sem vocês, este trabalho não existiria.

Às amigas Patrícia e Gabriela, grandes profissionais, que sempre me encorajaram na busca deste objetivo.

De modo muito especial, à amiga Regina Blum, cujos exemplos pessoal e profissional, eivados da mais pura afetividade, levarei para sempre em minha existência. Obrigado pela leitura compartilhada deste trabalho e pelas sugestões valiosas. Você é muito importante para mim!

À amiga Lucia Leite, parceira de sempre e uma das grandes incentivadoras deste projeto. Foi muito bom encontrá-la em minha vida. Graças a você, continuei neste empreendimento. Muito obrigado!

Aos amigos Keila, Adriane, Ronaldo, Regina e a todos que torceram pelo sucesso deste empreendimento.

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A superioridade do homem está, pelo contrário, ligada à necessidade de aprendizagens prolongadas e sucessivas, em que cada função, à primeira vista ineficaz, deve descobrir as suas diferentes virtualidades e estabelecer conexões interfuncionais tão complexas quanto as circunstâncias o permitam atualmente e o possam exigir mais tarde.

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RESUMO

SILVA, Leandro Batista. A afetividade na prática de professores de escolas públicas bem-sucedidas em avaliações de larga escala. 2016. 185 f. Tese (Doutorado em Educação). Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2016.

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com esses índices não deve superar o empenho e a atenção a um trabalho docente verdadeiramente transformador e capaz de operar mudanças na vida dos discentes.

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ABSTRACT

SILVA, Leandro Batista. The affectivity in the teachers’ practice of successful public schools in large-scale assessments. 2016. 185 sheets. Doctorate in Education - Catholic University of Brasília, Brasília, 2016.

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exceed the commitment and attention to one teaching truly transformative and able to bring about change in the students’ lives.

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ... 13

INTRODUÇÃO ... 15

CAPÍTULO I – PROBLEMA, TESE E OBJETIVOS DE PESQUISA ... 21

1.1 CONTEXTUALIZANDO O PROBLEMA ... 21

1.2 DEFINIÇÃO DO PROBLEMA ... 25

1.3 TESE ... 26

1.4 OBJETIVOS ... 26

1.4.1 Objetivo geral ... 26

1.4.2 Objetivos específicos ... 27

CAPÍTULO II – A AFETIVIDADE NA PERSPECTIVA WALLONIANA ... 28

2.1WALLON E A TEORIA DA PESSOA CONCRETA... 30

2.2 A AFETIVIDADE EM WALLON... 32

2.3 AFETIVIDADE, ENSINO E APRENDIZAGEM ... 42

CAPÍTULO III – AS AVALIAÇÕES DE LARGA ESCALA NO BRASIL: SAEB E ENEM ... 50

3.1 SAEB E IDEB: UMA FORMA DE SE MENSURAR A QUALIDADE DA EDUCAÇÃO BÁSICA ... 54

3.2 ENEM: UMA NOVA VISÃO DO ENSINO MÉDIO ...56

3.3EXAMES DE LARGA ESCALA NO BRASIL: ALGUMAS CONTRIBUIÇÕES ACADÊMICAS... 58

CAPÍTULO IV - MÉTODO ... 60

4.1 NATUREZA DO ESTUDO ... 60

4.2 LINGUAGEM E DISCURSO NA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO EM CIÊNCIAS HUMANAS... 63

4.3 O MATERIALISMO HISTÓRICO E DIALÉTICO NA PSICOGÊNESE DA PESSOA CONCRETA DE HENRI WALLON ... 65

4.4 O PAPEL DA LINGUAGEM NA LÓGICA WALLONIANA ... 69

4.5 CONCEPÇÕES DOCENTES: UMA ANÁLISE TEÓRICA ... 70

4.6 NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO E SENTIDO COMO INSTRUMENTOS PARA A ANÁLISE DAS CONCEPÇÕES DOCENTES ... 71

4.7 INSTRUMENTOS PARA A COLETA DE DADOS ... 74

4.7.1 A entrevista semiestruturada e o grupo focal ... 74

4.7.2 A observação ... 77

4.8 ESCOLAS E PROFESSORES PARTICIPANTES ... 82

4.9 PROCEDIMENTOS ... 84

CAPÍTULO V – RESULTADOS: ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO E SENTIDO ... 85

5.1ANÁLISE DE SIGNOS PRODUZIDOS NOS DISCURSOS DOCENTES: PERSPECTIVA TEÓRICA ... 85

5.2 O DIÁRIO DE OBSERVAÇÃO ... 87

5.3 A COMPOSIÇÃO DOS NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO E SENTIDO... 107

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5.5 ANÁLISE E DISCUSSÃO INTEGRADAS DOS NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO E SENTIDO, OBSERVAÇÕES EM SALA DE AULA E GRUPOS FOCAIS COM OS

ALUNOS... 113

5.5.1 Núcleo 1: O olhar do docente sobre a escola pesquisada e sobre as avaliações de larga escala ... 114

5.5.2 Núcleo 2: Concepções de afetividade...129

5.5.3 Núcleo 3: Afetividade, interação e prática docente ... 139

5.5.4 Núcleo 4: Afetividade, aprendizagem e desempenho em avaliações de larga escala... 155

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 166

REFERÊNCIAS ... 171

APÊNDICE I – ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA ... 179

APÊNDICE II – ROTEIRO PARA CONDUÇÃO DO GRUPO FOCAL ... 181

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APRESENTAÇÃO

Neste trabalho, procurou-se investigar o lugar da afetividade nas práticas de professores de três escolas públicas – aqui entendidas como instituições mantidas com recursos do poder público, seja estadual, seja federal – que apresentam resultados satisfatórios em avaliações externas, como o SAEB e o ENEM. Como base teórica, este estudo vale-se da teoria psicogenética de Henri Wallon, que considera a pessoa um ser total, composto por afetividade, cognição e motricidade. Para se analisar as práticas das seis professoras que se voluntariaram a participar do estudo, foram utilizadas observações e entrevistas semiestruturadas.

Como forma de se triangular os dados obtidos, também foram realizados grupos focais com os alunos, com o objetivo de se verificar se as trocas afetivas percebidas pelo pesquisador, bem como aquelas identificadas pelas docentes colaboradoras, conseguiam atingir o aluno em seu processo de aprendizagem,

As professoras desta pesquisa possuem tempo de atuação e formação muito diferentes, o que possibilitou uma riqueza de análise nas falas, quando foram convidadas a apresentarem suas concepções sobre afetividade, sua opinião sobre a influência das avaliações de larga escala em sua práxis, sobre a prática de ensino e sobre as manifestações de afetividade na escola.

No Capítulo I, realiza-se a introdução ao problema de pesquisa, contextualizado a partir do mote proposto por Freire ([2001] 2014), de que é no plano da sensibilidade que deverão ser encontradas as raízes mais profundas da relação entre aluno e conhecimento; e da relação entre professor e aluno, uma vez que a tarefa educativa é essencialmente, e por natureza, relacional. Ainda neste capítulo, apresentam-se os objetivos, as questões de pesquisa e a tese diretriz que nortearam a investigação.

No Capítulo II, apresenta-se a teoria psicogenética de Henri Wallon, que considera a pessoa como um ser total. É realizado um diálogo entre os pressupostos wallonianos e as pesquisas mais recentes, no Brasil, sobre a influência da afetividade nas práticas de sala de aula e na relação professor-aluno.

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escolas, o que, por vezes, a análise enviesada dos resultados das avaliações de larga escala suscita.

O Capítulo IV se presta a validar o método empregado nesta pesquisa. Buscou-se, nesse quesito, uma sólida sustentação teórica e metodológica, apresentando a vinculação de Wallon ao método materialista-dialético da pesquisa em ciências humanas. Além disso, buscou-se, na leitura de Žižek, legitimar o materialismo dialético como corrente filosófica válida para a pesquisa na atualidade. Outro ponto validado neste capítulo foi a importância, para o alcance dos objetivos pretendidos, de se trabalhar com instrumentos qualitativos na coleta e construção dos dados. Nesse aspecto, foi fundamental a argumentação teórica do trabalho com concepções docentes e com núcleos de significação e sentido.

No Capítulo V, foram ampliadas as noções referentes à elaboração de núcleos de significação e sentido para a análise da fala docente, sempre ancorada na teoria de Wallon e na perspectiva de que as pessoas são histórica, social e culturalmente determinadas.

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INTRODUÇÃO

O caminho mais seguro para tentar resolver um problema é o de estudar o Homem na sua gênese. René Zazzo

A década de 1990 representa para a educação brasileira um divisor de águas no que se refere à busca por um ensino de qualidade: assiste-se à promulgação de uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), institui-se o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM); também é organizado o Exame Nacional de Cursos (1998) – o antigo Provão –que viria a ser o ―embrião‖ do atual SINAES – Sistema de Avaliação da Educação Superior. E, logo no primeiro ano da década, em 1990, é instituído o SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica. Observa-se, dessa feita, um longo processo na busca por um ensino que realmente tenha a qualidade como seu ponto de partida, seu meio e sua finalidade. Críticas à parte, não se pode negar o esforço em se promover medidas que possam garantir que o ensino dispensado às crianças e aos jovens – especialmente na esfera pública – seja um ensino de qualidade, ainda que a prática demonstre que essa meta esteja longe de seu ideal e que estejam ocorrendo ―desvirtuamentos‖ dessa premissa fundamental, haja vista o constante uso dos dados dessas avaliações para mera construção de rankings de escolas.

A inquietação que deu origem a esta investigação tem sua gênese em dois momentos distintos: em primeira instância, é o aprofundamento do estudo do constructo da afetividade – preconizado por Henri Wallon em sua teoria psicogenética – , pesquisado por nós em nossa dissertação de mestrado; e, agora, neste trabalho, representa a investigação da presença do componente afetivo nas práticas de professores de escolas bem-sucedidas nas controversas avaliações de larga escala.

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Ensino Médio também em escola pública. Em 2001, como aluno do último ano do Curso de Letras de uma instituição privada, realizamos o Exame Nacional de Cursos, gênese do atual SINAES – Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior.

Essa ―volta no tempo‖ abre a mente para a constatação de que, há muito, os mecanismos para avaliação da educação brasileira vêm sendo testados, mas que, ainda, professores e alunos não compreendem em profundidade a relevância e mesmo o ―porquê‖ de tais avaliações. É fundamental que, como educadores, busquemos resgatar o espírito reflexivo de nossa prática e de nossas condições de trabalho. Essa reflexão, contudo, somente será possível e proveitosa quando o educador realmente perceber-se imbuído na plenitude de sua profissão – e essa percepção passa, obrigatoriamente, pelo componente afetivo; para que tal percepção se efetive, é necessário engajamento, envolvimento com a função e com o outro a quem nos dirigimos – elementos altamente subjetivos e que não serão mensurados apenas a partir dos resultados de uma avaliação, seja ela externa ou interna.

Ao verificarmos que estivemos – na condição de aluno – presentes na implementação ou continuidade das avaliações de larga escala do Governo Federal, pudemos perceber que ainda está longe o ideal de educação pública de qualidade e em igualdade de condições de acesso e de permanência a todos que dela necessitem. Esse posicionamento que ora fazemos é fundamental, uma vez que, em nossa base empírica, defendemos que a pessoa constrói-se nas suas relações históricas e culturais, dialeticamente; portanto, as conquistas que tivemos como ―aluno-pessoa‖ agora se opõem dialeticamente às conquistas do ―pesquisador-pessoa‖ a fim de, num processo de devir, construir o ―professor-pesquisador-pessoa‖. No entanto, deve-se registrar que o foco desta investigação não é sociológico; nosso foco está nas interações realizadas no interior das escolas, no processo mais primário e que é fundamental para uma aprendizagem eficaz: a relação professor-aluno, enquanto seres em contínuo desenvolvimento; relação esta permeada, profundamente, pelo componente afetivo.

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O segundo processo é o ENEM, que nos dá um retrato de como se desenvolve o Ensino Médio nas escolas do país. No entanto, deve-se delimitar, desde agora, que este estudo pretendeu analisar um fator que contribui decisivamente para o sucesso (ou insucesso) dos alunos no processo ensino-aprendizagem e que não pode ser medido por esses testes de larga escala: a afetividade. Ousamos afirmar que o conteudismo enciclopédico da cultura geral – tão presente no discurso atual das avaliações de larga escala – não abre espaço para a compreensão da relevância do componente afetivo no desempenho de alunos, de professores e de escolas.

Franco (2001) aponta em seu artigo uma série de fatores que devem ser superados, na conformação do SAEB, para que sua avaliação possa mostrar com mais clareza os fatores de sucesso e de insucesso das escolas. Esses fatores demonstrados pelo autor têm relação direta com elementos mais facilmente mensuráveis em processos de avaliação do ensino, como a crítica ao modo como é aplicado o teste (avaliação não-longitudinal) e outros elementos, como a falha na análise de taxas de absenteísmo, por exemplo. No entanto, entende-se que há fatores intrínsecos decisivos que incidirão de maneira contundente no bom desempenho de alunos; entre esses fatores, sem dúvida, está a relação professor-aluno, que é diametralmente atingida, envolvida, enredada pelas questões vinculadas à afetividade.

Silva (2011, p. 95), ao abordar a questão da interação, afirma que

[...] toda aprendizagem em que professor e aluno se entregam ao prazer de aprender, respaldados pelo afeto, pela liberdade, pela busca de equilíbrio na relação estabelecida e pelo respeito, torna-se um encontro de duas pessoas histórica, social e culturalmente determinadas, direcionadas a um objetivo mais amplo: a aquisição do conhecimento e a ―humanização‖ das pessoas, trabalho de civilização que cabe à educação realizar.

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aprenderão porque se sentem respeitados por seus professores em seu status de pessoas concretas.

Em razão dessa conexão já amplamente demonstrada entre afetividade, cognição e aprendizagem (SILVA, 2011; ARANTES, 2003; GALVÃO, 2008; DE LA TAILLE et all, 1992; ALMEIDA, 1999; 2007; ROSSI, 2006; LEITE; TASSONI, 2002; TASSONI, 2000; MAHONEY; ALMEIDA, 2005; 2009; LEGNANI; ALMEIDA, 2004; ALMEIDA, 1993; SILVA, 2007; CANAVARRO, 1999; RODRIGUES; GARMS, 2007; SILVA, 2004; PEDROZA, 1993; 2005), observou-se a necessidade de se analisar outra interface ainda não tão desvelada: em que medida a afetividade comparece como elemento de interferência decisiva em bons resultados obtidos por determinadas escolas, quando se analisam dados oriundos dos exames de larga escala do SAEB e das avaliações do ENEM?

Responder a esse questionamento mostrou-se algo extremamente desafiador, uma vez que os resultados divulgados nesses exames levam em consideração apenas a análise dos números obtidos, não havendo espaço para a análise da complexa trama educacional que se delineou, anteriormente, por trás daquele resultado, para que aqueles educandos alcançassem números considerados expressivos.

Dessa forma, valendo-se do raciocínio de Gonçalves e Alarcão (2004), é perceptível que o componente afetivo deveria comparecer explicitamente no modo como os currículos são geridos. No entanto, a afetividade surge de maneira oculta, muitas vezes não percebida, a partir da mediação docente e pode vir a ―desaguar‖ em sala de aula positivamente ou negativamente. Vê-se, pois, que os resultados expressivos obtidos por alunos de uma determinada escola nesses exames de larga escala além de apontarem para questões da ordem do cognitivo e do funcional (como a gestão da escola, por exemplo), trazem em sua essência as implicações das relações afetivas, já que, de acordo com a literatura pertinente, a presença do componente afetivo nas práticas dos professores influenciará decisivamente na relação entre alunos e objetos do conhecimento, já que a aprendizagem está vinculada a uma relação com o outro (ALMEIDA, 1993).

Almeida (1999, p.89) afirma que:

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No cotidiano escolar, muitas vezes, é justamente esse o processo que se encontra: há uma desarticulação entre os diferentes campos que compõem a pessoa em sua completude; é mais perceptível uma priorização do domínio cognitivo, deixando-se a afetividade relegada a segundo plano, desconsiderando-a enquanto elemento facilitador da aprendizagem. Tal posição encontra eco no que afirma Kupfer (2003, p. 35): ―Em nossos dias ainda é habitual, entre os educadores, o uso de uma concepção teórica segundo a qual uma criança pode ser dividida em duas metades: a cognitiva e a afetiva‖.

Além disso, não há espaço, nas escolas brasileiras, para que os professores possam refletir sobre como esses dois componentes – afetivo e cognitivo – podem comparecer na gênese de sua prática. Em razão disso, o educador não tem a oportunidade de revisitar sua trajetória profissional e poder observar, com clareza, em que situações e de que forma o aspecto afetivo comparece em sua práxis e de que modo a influencia, ainda que ele não perceba.

Essa perspectiva cristaliza, portanto, a ideia de que a escola é um locus exclusivo da cognição; bons resultados, portanto, somente seriam obtidos quando esse constructo (cognição) tem a primazia na análise. Dessa forma, conforme Leite e Tassoni (2002), desconsidera-se a totalidade do ser humano, já que a pessoa, em sua constituição, representa um entrelaçamento, uma combinação de aspectos cognitivos, afetivos e motores. A desconsideração dessa combinação leva a uma análise reducionista do professor, de sua prática e do aluno; é vital, pois, que se busque compreender e desvelar de que formas o componente afetivo se apresenta no cotidiano profissional dos professores das escolas que atingem bons resultados.

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Em razão disso, esta investigação buscou a análise, in loco, de como as categorias emanadas no discurso emocionado do professor compareceram de forma concreta na sua prática (AGUIAR, 2006). Além disso, buscou-se verificar como os educandos percebem o aspecto afetivo no discurso e nas práticas de seus professores.

Nessa perspectiva, o modo como o professor concebe e valoriza a afetividade e a cognição possibilita uma relação mais positiva ou negativa dos estudantes com os objetos de conhecimento. E essa relação, seguramente, afetará decisivamente nos resultados obtidos pelas instituições nos exames de larga escala, apresentando-se, desse modo, como um elemento que não pode ser aferido concretamente nessas avaliações; mas que interfere, de maneira contundente, nas dinâmicas escolares.

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CAPITULO I – PROBLEMA, TESE E OBJETIVOS DE PESQUISA

O que deve unir os homens entre si é a cultura. Henri Wallon

1.1 CONTEXTUALIZANDO O PROBLEMA

Wallon ([1934]1995) esclarece que as relações do sujeito com o mundo são relações de interação social, uma vez que, desde os primeiros momentos da infância, a criança precisa demandar o outro (adulto) para a satisfação de suas necessidades imediatas. À medida que a criança cresce, essas necessidades vão se tornando cada vez mais simbólicas (como o conhecimento, por exemplo), mas sempre existirá a necessidade da interação com o outro para a satisfação de determinados interesses.

Desse modo, pode-se questionar o que faz de uma escola uma boa instituição de ensino. A resposta, com frequência, diria que uma boa instituição de ensino seria aquela que possibilita uma boa mediação entre os alunos e os objetos de conhecimento. Essa afirmação tem seu fundo de verdade; no entanto, na gênese dessa mediação do aluno com os objetos do conhecimento, está a figura do professor. Mesmo em tempos de tantos avanços tecnológicos – os quais têm colocado em xeque a necessidade e a posição a ser ocupada pelo docente na prática educativa –, não se pode negar que o ―componente humano‖ ainda é primordial no processo educacional. Esse professor – essa figura humana – é uma pessoa completamente atravessada pela questão da afetividade e a traz para a sala de aula.

Partindo-se desse raciocínio, a interação dos alunos com o conhecimento perpassa, obrigatoriamente, a questão da afetividade, tendo em vista serem também eles, os educandos, seres concretos e permeados pela afetividade em sua constituição. Nesse contexto, é no plano da sensibilidade que deverão ser encontradas as raízes mais profundas dessa relação, pois, conforme Freire ([2001] 2014, p. 71)

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Vê-se que a tarefa educacional é, sobretudo, tarefa relacional, que leva à apreensão de conhecimentos de diversas ordens. Justamente por ser tarefa relacional, mostra-se entranhada no componente afetivo. Dessa feita, é fundamental, pois, que educadores e instituições escolares, para realizar o que se espera deles em sala de aula (o acesso ao conhecimento), compreendam a influência que exercem no desenvolvimento de seus alunos. E a partir da qualidade da interação estabelecida no interior das escolas, índices, exames, avaliações de larga escala – ainda que o discurso dominante desconsidere a presença do componente afetivo nesses instrumentos de avaliação e de análise – têm seus resultados impactados pela afetividade, haja vista a educação ser tarefa altamente permeada pela subjetividade.

De acordo com Santos (2012), o Sistema de Avaliação da Educação Básica – SAEB – ―caracteriza-se por avaliar o fim da Educação Básica (5º e 9º anos do Ensino Fundamental e 3º ano do Ensino Médio). A Prova Brasil, por sua vez, avalia somente o 5º e o 9º ano em escolas públicas‖ (p. 74). A partir do cruzamento dos resultados obtidos no SAEB (a partir da confluência dos dados da Avaliação Nacional da Educação Básica e da Prova Brasil – nome popular da Avaliação Nacional do Rendimento Escolar), é possível que se determine o IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica.

Já o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) é uma avaliação concebida em uma perspectiva interdisciplinar, prevista pelos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN – e cuja maior ambição é constituir-se em uma avaliação que possa substituir os vestibulares como instrumentos para acesso ao Ensino Superior. A adesão é voluntária e o foco avaliativo é o aluno; no entanto, os resultados obtidos pelos alunos de uma instituição demonstram, ainda que não seja de forma absoluta, o nível de desempenho dessa instituição nos processos de ensino e de aprendizagem.

Deve-se ressaltar, no entanto, que, conforme Santos (2012), o ENEM não avalia com total fidedignidade o Ensino Médio, uma vez que se trata de ―[...] um exame em perspectiva interdisciplinar para alunos que em sua grande maioria foram submetidos à ação pedagógica de escolas dedicadas a trabalhar com disciplinas‖ (p. 77). Apesar disso, pode-se questionar que, talvez, as escolas que obtêm bons resultados nesse exame tenham feito mudanças consideráveis em suas práticas de ensino, além de se pensar que a qualidade da interação entre alunos, professores e objetos do conhecimento possam ser fatores que contribuem para os bons índices alcançados.

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SAEB), utilizados para apresentar um diagnóstico da educação no Brasil, têm como sujeitos de sua análise pessoas que se encontram em duas fases muito importantes do desenvolvimento humano, de acordo com a teoria de Wallon: a passagem do estágio categorial (que vai dos 06 anos aos 11 anos – portanto, a idade dos alunos do 5º ano do Ensino Fundamental) para o estágio da puberdade e adolescência (que se inicia por volta dos 11 anos e vai até a conformação da pessoa em adulto – período que abrange os alunos do 9º ano do Ensino Fundamental e do 3º ano do Ensino Médio).

Essas duas etapas têm características bem demarcadas na teoria de Wallon: o estágio categorial se caracteriza pelo grande interesse da pessoa em conquistar o conhecimento; é um período marcado pela razão (WALLON, [1941] 2007), no qual a afetividade vai se manifestar pelo manejo na execução de tarefas que levem à busca pelo conhecimento.

Já no estágio seguinte – puberdade e adolescência – tem-se a primazia da afetividade; a pessoa se volta para si e busca compreender o mundo que a rodeia; é um período marcado pela contestação dos valores vigentes e, por extensão, de pessoas e de instituições que representem esses valores (como o professor e a escola). A população alvo dos exames que avaliam a qualidade da Educação Básica está saindo de um período marcado pela razão (categorial), para um estágio marcado pelo predomínio da afetividade, no qual a oposição aos outros e às ideias mostrar-se-ão como principais recursos de aprendizagem.

Nessa perspectiva, faz-se fundamental que o docente, o adulto na relação estabelecida com o aluno, tenha a sensibilidade de ―guiar‖ o aprendente nesse processo de transição, a fim de que a ambivalência de sentimentos e a oposição ao outro, típicas do adolescente, possam ser utilizadas no processo de aquisição do conhecimento. É fundamental que nesse processo de interação o professor possa se apropriar de seu papel, apresentando-se como um ―propositor‖, um ―apontador‖ de caminhos para seus alunos. A esse respeito, Freire ([2001] 2014, p. 129) afirma que uma das tarefas do educador é ―abrir caminho, é propor [...] é ajudar o aluno a saber que há coisas escondidas para que ele descubra‖.

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demonstramos essa preocupação no estudo que antecedeu esta tese, durante o mestrado (SILVA, 2011).

Reconhecendo a influência do componente afetivo na práxis docente, este estudo investiga, particularmente, o lugar ocupado pela afetividade na prática de professores de três escolas públicas bem-sucedidas de acordo com dados informados pelo IDEB e pelo ENEM, índice e exame de larga escala organizados pelo Ministério da Educação para medir a qualidade da educação ministrada nas escolas brasileiras. Para tanto, foram selecionadas duas instituições da Coordenação Regional de Ensino do Plano Piloto de Brasília – Distrito Federal – que obtiveram resultados expressivos: uma Escola Classe (que atende a alunos da Educação Infantil ao 5º ano do Ensino Fundamental); e um Centro de Ensino Fundamental (que atende a alunos do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental). E foi escolhida uma escola da Rede Federal de Ensino, que atende a alunos do 6º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Médio. Os dados pesquisados no Colégio de Ensino Médio foram gerados entre os alunos e professores desse nível de ensino.

1De acordo com dados do site do Ministério da Educação (http://mec.gov.br), a

Escola Classe obteve a nota 7,1 para o IDEB de 2011 e nota 6,5 para o IDEB de 2013 sendo que a média do Distrito Federal foi de 5,4 em 2011 e de 5,9 em 2013; já o Centro de Ensino Fundamental obteve a média 5,6 (em 2011) e 5,5 em 2013, quando a média do DF para o 9º Ano do EF foi de 4,4 nos dois anos.

Quanto ao Colégio de Ensino Médio, alcançou 637, 26 pontos no ENEM 2010, sendo a escola pública com melhor desempenho no Exame naquele ano. Como houve mudança na metodologia de avaliação da nota do ENEM para os participantes de 2011 – que passou a não efetuar a nota de instituições em que 50% ou menos dos alunos realizaram o exame – não foi possível agregar esse valor. Em 2013, a instituição alcançou 606,60 pontos nas questões objetivas do ENEM e 653, 91 pontos na média de redação, sendo a 17ª instituição do DF (entre públicas e particulares) e a 1ª colocada entre as públicas. Na edição 2014, as notas foram 609,24 pontos de média geral e 624, 58 pontos em redação. No 9º ano do Ensino Fundamental, o Colégio de Ensino Médio alcançou média 6,2 em 2013, no IDEB, sendo a segunda melhor média do Distrito Federal.

Tendo por base os expressivos resultados obtidos pelas três instituições, pretendeu-se investigar de que modo a afetividade comparece no discurso e nas práticas de docentes

1

(25)

dessas escolas; além disso, buscou-se verificar se os educandos percebem a presença desse componente afetivo nas práticas de seus professores e se percebem como esse processo se dá. Para concluir a investigação, foi feita a análise de como o componente afetivo pode interferir nos bons resultados obtidos pelas instituições, a partir do cruzamento das informações obtidas no discurso dos alunos e dos professores.

1.2 DEFINIÇÃO DO PROBLEMA

Dentro da contextualização apresentada, esta pesquisa buscou investigar o seguinte problema:

Qual o lugar ocupado pela afetividade na prática de docentes de três escolas públicas do Distrito Federal bem-sucedidas em avaliações de larga escala (SAEB/ENEM) e de que maneira ela interfere na prática docente, na aprendizagem dos alunos e impacta os resultados obtidos pelas instituições nos exames aplicados pelo Governo Federal?

Esse problema central dá abertura aos seguintes questionamentos correlatos:

a. Os professores consideram a afetividade como um dos elementos que pode influenciar diretamente sua prática pedagógica?

b. Os professores acreditam que, por meio das trocas vinculares e afetivas, a relação de seus alunos com os objetos de conhecimento pode ser influenciada?

c. Os alunos conseguem perceber, na prática de seus professores, a presença do componente afetivo? De que maneira?

d. De que forma professores e alunos acreditam que o componente afetivo influencia o resultado obtido pelas instituições nos exames de larga escala aplicados pelo governo federal?

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1.3 TESE

O componente afetivo positivo exerce influência decisiva nos bons resultados obtidos pelas escolas pesquisadas em exames de larga escala aplicados pelo Governo Federal. Em nossa pesquisa de Mestrado pudemos verificar que a afetividade – e o manejo dessa dimensão psíquica feito pelo docente na interação com os alunos – exerce papel fundamental na relação dos educandos com a aprendizagem. A aprendizagem desenvolver-se-á tanto e mais qualitativamente na medida em que for reconhecida como um dos constituintes da totalidade da pessoa como ser concreto. No entanto, grande parcela dos professores, por ter concepções contraditórias sobre afetividade e não perceber a associação dos aspectos emocionais e dos sentimentos na interação com o aspecto cognitivo, tem dificuldade em relacionar a presença da afetividade com o aprendizado dos alunos, embora seja fácil verificá-la em suas práticas profissionais. Desse modo, os professores não se dão conta de que os alunos, por serem pessoas concretas, possuem em sua estrutura psíquica os dois componentes, que influenciarão na relação estabelecida com os objetos de conhecimento e com o processo de aprendizagem. Os alunos, por sua vez, costumam apontar a importância do aspecto afetivo para o bom desempenho que eles obtêm nos referidos exames, ao mesmo tempo em que deixam entrever a importância da afetividade na mediação entre educandos e objetos do conhecimento.

1.4 OBJETIVOS

1.4.1 Objetivo geral

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1.4.2 Objetivos específicos

a. verificar a concepção que os professores-colaboradores das escolas pesquisadas têm em relação à afetividade;

b. identificar o papel que os professores-colaboradores atribuem ao aspecto afetivo na relação professor-aluno;

c. pesquisar o lugar que a afetividade ocupa no discurso e nas práticas profissionais dos professores-colaboradores das escolas pesquisadas; d. analisar de que modo os alunos das escolas pesquisadas percebem a

presença do componente afetivo nas práticas de seus professores;

e. interpretar se há relação entre práticas profissionais permeadas pela afetividade e o sucesso obtido pelas escolas pesquisadas nas avaliações de larga escala;

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CAPÍTULO II – A AFETIVIDADE NA PERSPECTIVA WALLONIANA

O desenvolvimento da inteligência, na criança, está ligado ao desenvolvimento de sua personalidade total.

Henri Wallon

Wallon, ao estudar a pessoa em sua concretude e completude, defendia que o ser humano deveria ser analisado em seus aspectos motor, afetivo e cognitivo. Quando se estuda a dimensão afetiva que constitui a pessoa, por vezes, há uma confusão conceitual: há uma grande tendência em se considerar os termos ―afetividade‖ ou ―afeto‖ como sinônimos para ―emoção‖. Na perspectiva walloniana, é fundamental que se compreenda que tais conceitos não devem ser compreendidos de forma sinônima; a emoção e o sentimento – em conjunto com a paixão – são os três elementos que possibilitam a constituição de um conjunto funcional que engloba esses três elementos: o conjunto funcional da afetividade.

O próprio Wallon ([1941] 2007) deixa claro que ―afetividade‖ e ―emoção‖ não são conceitos sinônimos, quando afirma que ―As emoções, que são a exteriorização da afetividade; enseja mudanças que tendem a reduzi-las. [...] Mas, à medida que sua significação fica mais precisa tornando-os mais autônomos, separam-se da própria emoção‖ (p. 124). É com esse desenvolvimento que a afetividade, progressivamente, vai se distanciando do aspecto orgânico, aproximando-se, sempre e mais, de uma base social (ALMEIDA, 2007).

A afetividade é um elemento intrínseco à pessoa; não é possível que se compreenda a pessoa em sua concretude e completude se não se considerar, em sua constituição, o componente afetivo. Nessa perspectiva, é fundamental que se busque compreender em que medida – e de que forma – o aspecto afetivo comparece na dinâmica escolar, tendo em vista ser a escola o ambiente em que a criança e o adolescente estabelecerão trocas relacionais com adultos (professores) e entre si. Essas trocas, de maneira acentuada, influenciarão nas conquistas empreendidas pelos indivíduos-aprendentes no seu processo escolar.

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Atualmente, temos percebido a existência objetiva de uma crise epistemológica no que se refere à Psicologia da Educação e à sua relação com a Pedagogia. Não é preciso ir muito longe para se constatar que essa disciplina aplicada tem ficado à deriva, exercendo, muitas vezes, uma função decorativa nos cursos de formação de educadores, quando poderia ser um de seus eixos centrais.

Observa-se que, ao longo do tempo, a discussão da Psicologia da Educação, nos cursos de formação de professores, está reduzida a uma apresentação de teorias e abordagens desenvolvimentistas. Esses conceitos são apresentados de forma desarticulada e não vivencial, o que faz com que o futuro docente não tenha condições reais de compreender a relevância dos conceitos da Psicologia para sua práxis educacional.

Em razão disso, reforça-se a compreensão de que a escola seja um ambiente exclusivamente da ordem do cognitivo, o que leva a um entendimento ―recortado‖ da pessoa, vista apenas em seu aspecto cognitivo. Fica de lado, nessa abordagem, o aspecto afetivo dessa pessoa, o qual irá interferir, decisivamente, nos rumos que serão tomados quando da consolidação da aprendizagem. Dessa forma, esquece-se que, em uma visão dialética, toda pessoa é constituída por afetividade e cognição, elementos que se influenciarão mutuamente nos processos de interação do indivíduo com o mundo.

Essa interação da pessoa com o seu meio, a partir de uma perspectiva afetiva, e que contribuirá para a aquisição de conceitos cada vez mais abstratos, é assim explicada por Wallon ([1951] 1973): ―O resultado da expressão emocional [...] provoca uma espécie de simbiose afectiva entre a criança e o seu meio ambiente‖ (p. 91). Ou seja, é a partir de uma relação intrínseca com seu meio – e calcada nos aspectos afetivos e emocionais – que o indivíduo formará sua personalidade e constituirá seus processos de aprendizagem

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Ao se pretender a investigação da presença do componente afetivo na prática de professores de escolas bem-sucedidas em exames de larga escala, este estudo apresenta como base conceitual a teoria desenvolvimentista de Henri Wallon. Nesse sentido, parte-se do pressuposto de que a relação entre afetividade e cognição é dialética, haja vista essa concepção dialética estar na base da compreensão walloniana a respeito de seus conceitos fundamentais. Wallon ([1951] 1973, p. 92), ao falar da evolução da personalidade na pessoa, já deixa essa vinculação filosófica bem explicitada, quando afirma

O meio mais importante para a formação da personalidade não é o meio físico, mas o meio social. Alternadamente ela confunde-se com ele e dele se dissocia. A sua evolução não é uniforme, mas feita de oposições e de identificações. É dialéctica.

Desse modo, buscar a compreensão de como a afetividade comparece nos bons resultados obtidos pela escola pesquisada exigirá o entendimento da teoria walloniana em sua perspectiva dialética; e, também, uma compreensão propriamente dialética da pessoa.

2.1 WALLON E A TEORIA DA PESSOA CONCRETA

Wallon iniciou seus estudos em um curso destinado à formação de professores, no qual recebeu sólida educação filosófica, estudando os pressupostos que iam de Kant a Hegel e viveu em um turbulento período histórico, marcado por duas guerras mundiais, pela ascensão do comunismo e do nazi-facismo como formas de governo fortes, bem como pela acentuação da polarização entre capitalismo e comunismo, a chamada ―Guerra Fria‖, no período posterior ao final da Segunda Guerra Mundial.

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Na dialética walloniana, o caráter tem origem biológica, embora ―filiação‖ não signifique ―causalidade‖. Defende, também, que as influências sociais, culturais e históricas culminarão na personalidade. Nesse sentido, observa-se que Wallon não era organicista, uma vez que buscava pautar seus estudos a partir da contínua inter-relação entre o aspecto biológico e psicológico que constituem a pessoa. Isso fica evidente quando, ao discorrer sobre o estudo com crianças deficientes, afirma que ―Na verdade, se forneceram um material de estudos ao anatomista e ao neurólogo, foram as psicoses do adulto e do adolescente que atraíram a atenção quase exclusiva do psicólogo‖ (WALLON, [1925] 2007, p. 43).

Vê-se que, junto a uma base biológica, há uma base psicológica calcada no social, confirmada na afirmação de que ―as transformações do ser afetivo [...] acarretam o deslocamento das categorias mentais, onde o ser social que todo homem é deve distribuir seus estados de consciência‖ (WALLON, op. cit. p. 43-44, grifo nosso).

A análise da biografia de Wallon mostra que sua produção intelectual e seus pressupostos teóricos estão intimamente ligados a concepções filosóficas e a acontecimentos históricos relevantes que marcaram, decisivamente, a constituição desse pesquisador enquanto pessoa; e é justamente em função da solidez de sua formação e de suas vivências que Wallon conseguiu produzir uma teoria que se mostra atual e relevante até os dias de hoje.

Ao descrever os estágios de desenvolvimento da criança, Wallon mostra que a transição entre os diferentes estágios se dá por mecanismos de alternância e preponderância funcional, ora com ênfase a aspectos emocionais, ora a aspectos cognitivos. Depois que supera a oposição entre o mundo real e concreto, a criança volta-se à tarefa de construir-se a si. Surge aí a crise do personalismo, quando a criança passa a efetuar a diferenciação entre si e o outro. Vencida tal crise, a criança volta-se ao ambiente externo: surge o estágio categorial.

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Em sua teoria da pessoa concreta, Wallon considera que a pessoa se constitui a partir de dois movimentos claros: a integração entre os quatro conjuntos funcionais (afetividade, motor, cognição e pessoa); e a relação do organismo com o meio. A esse respeito, Wallon ([1953] 1973) afirma que ―A existência do homem manifesta-se entre as exigências do seu organismo, que lhe são comuns juntamente com outras espécies, e as da sociedade, que são específicas da sua espécie‖ (p. 110). Desse modo, há uma constante relação de solidariedade, de complementaridade entre o aspecto biológico e o aspecto social.

Essa integração entre homem e meio permite a compreensão de que a pessoa se desenvolve a partir de demandas biológicas que sua própria espécie solicita. No entanto, além dessas demandas biológicas, estão presentes, também, demandas de ordem social, que irão interferir nas etapas do desenvolvimento de cada pessoa.

Percebe-se, nesse sentido, que a noção de pessoa concreta, em Wallon, vai além da relação entre os quatro conjuntos funcionais. É vital que se compreenda que as relações com o meio serão de extrema importância para que o indivíduo possa se constituir em uma pessoa concreta, total, completa. Nessa constituição, faz-se presente o componente emocional (que está na gênese do conjunto funcional da afetividade), como elemento que propicia a união entre o indivíduo e a vida social, a partir de uma existência biológica (WALLON, [1953] 1973).

É essa inter-relação entre ―social‖ e ―biológico‖ que moldará o indivíduo em uma pessoa concreta, já que o próprio Wallon ([1941] 2007) não concebe a dissociação entre o biológico e o social. E o faz justamente por considerar que ambos seriam complementares na constituição da pessoa desde seu nascimento, o que faz com que exista uma relação de reciprocidade entre esses elementos.

2.2 A AFETIVIDADE EM WALLON

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vista que o estudo dos conjuntos funcionais não pode, jamais, esquecer-se de que o desenvolvimento da criança ocorre de maneira muito rápida, o que leva a um processo de imbricação desses conjuntos.

É justamente a partir dessa imbricação que os diferentes domínios funcionais (afetividade, ato motor, conhecimento e pessoa) realizarão trocas e adaptações recíprocas, que desaguarão em uma maneira muito particular de se analisar cada pessoa.

A partir da Psicologia Genética, Wallon defende a possibilidade de se conhecer o adulto por meio da criança e, em uma postura dialética nesse estudo, observa que não se pode pensar em uma dicotomia entre razão e afetividade; cada estágio do desenvolvimento humano, alternadamente, se alimenta ora de aspectos afetivos, ora cognitivos, incorporando toda a carga de conhecimentos advindos da etapa anterior, com vistas a preparar o que a pessoa ainda virá a ser, em uma postura dialética (WALLON, [1941] 2007, p. 93).

Dessa forma, para se compreender a afetividade em Wallon, faz-se necessária a compreensão dos conjuntos funcionais que constituem as diversas etapas do desenvolvimento humano. No estudo da teoria walloniana, a pessoa, para constituir-se em adulto, passa por uma série de estágios de desenvolvimento. Nesses estágios, há alternância de predomínio de determinados conjuntos funcionais, sendo que a própria pessoa em si se apresenta como o quarto domínio funcional.

Deve ficar claro, no entanto, que essa predominância de um conjunto funcional em cada estágio do desenvolvimento não compreende a anulação ou desaparecimento dos demais conjuntos; o que ocorre é uma reorganização, em função dessa predominância.

Os estágios de desenvolvimento, na perspectiva walloniana, organizam-se do seguinte modo: impulsivo-emocional (0 a 01 ano); sensório-motor e projetivo (01 a 03 anos); personalismo (03 a 06 anos); categorial (06 a 11 anos); puberdade e adolescência (11 anos em diante) – sendo que este último deságua na constituição da pessoa adulta, representação do pleno equilíbrio de todos os domínios. Ressalte-se que as idades apresentadas aqui têm função didática, não representando paradigmas rígidos para o início e o término de um estágio do desenvolvimento humano.

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afetivas, mais próximas da racionalidade, como o cuidado com o outro, o interesse pelo seu sucesso, a apreensão de valores.

Wallon ([1956] 1973) descreve que, nesse estágio, formam-se grande número de trocas afetivas e de sinalizações expressivas, que serão assumidas pelas reações condicionadas. Nesse período, a criança vale-se da emoção a fim de representar para o adulto suas necessidades. É a partir do choro, da sensação de saciedade ao ser amamentada, por exemplo, que ela estabelece um processo comunicativo com seu meio circundante, um processo comunicativo enraizado na emoção e que, posteriormente, se transformará em linguagem.

Trata-se de uma etapa vital para o psiquismo da criança; por meio de seus gestos, ela consegue demandar o outro, em um processo de ―osmose‖ com o meio humano (WALLON, [1941] 2007). É um período, portanto, em que já se estabelece a troca com o outro, que será o responsável por dar sentido a tudo que a criança comunica por intermédio do campo das emoções.

O estágio sensório-motor e projetivo se inicia quando a criança desenvolve o andar e a linguagem. Contudo, há um abalo no equilíbrio do comportamento da criança que, em função da aquisição da marcha, passa a ser capaz de afirmar de forma mais clara sua pessoa (WALLON, [1941] 2007). É um período em que a criança se coloca a descortinar o mundo que a rodeia. O domínio cognitivo é preponderante, tendo em vista o fato de que há uma disponibilidade do indivíduo em compreender o mundo a seu redor, à medida que dele vai se diferenciando.

Esse processo de descoberta do mundo que a rodeia só é possível à criança em função da sistematização de exercícios sensório-motores, uma vez que ―Mediante eles, os movimentos se ligam aos efeitos perceptivos que deles podem resultar‖ (WALLON, [1941] 2007, p. 194).

Nessa fase, a sensibilidade da criança é exteroceptiva; trata-se de um período em que ganha ênfase a exploração do meio, dos objetos e das pessoas que circundam a criança. A afetividade, desse modo, passa por uma reorganização, já que a ativação do outro não mais se dá pela força impulsiva da emoção, mas sim por meio da exploração desse outro, que a criança, no entanto, ainda não consegue perceber diferente dela.

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emoção, para o uso da palavra. Ressalte-se, no entanto, que essa ―palavra‖ visa a uma investigação objetiva do mundo que circunda a criança.

A aquisição da marcha permite que a criança possa identificar-se com esse meio que a circunda. Nesse processo, ela parece ―misturar-se‖ ao próprio ambiente, ao mesmo tempo em que se prepara um novo salto para o estágio seguinte, no qual ocorrerá uma contração resistente da criança com esse meio (WALLON, [1956] 1973).

É a partir da crise da oposição que surge o estágio do personalismo, no qual o indivíduo já apresenta condições de se reconhecer diferente das outras crianças e do adulto. Em função disso, é um período marcado por três momentos singulares: oposição e inibição, como em um esforço para se reconhecer, de fato, diferente do outro; encantamento, que se manifesta em uma espécie de ―idade da graciosidade‖, em que a criança ativa o outro a partir de uma espécie de encantamento; e imitação, momento no qual a criança tende a manifestar sua percepção do meio a partir da observação e imitação do outro.

A criança ―Na época em que quer se manifestar distinta do outro, mostra-se gradualmente cada vez mais capaz de distinguir os objetos e selecioná-los segundo sua cor, forma, dimensões, qualidades táteis, seu cheiro‖ (WALLON, [1941] 2007, p. 195). Wallon nos mostra que é nessa fase, também, que surge na criança uma necessidade de ―camaradagem‖, possível justamente pelo fato de a pessoa perceber-se como diferente do outro.

Conforme avança o estágio do personalismo, a percepção do infante já se torna cada vez mais abstrata e, assim como nos demais estágios, todas as conquistas feitas voltam a se reorganizar para o estágio seguinte, mas não somente em um processo de conquistas, mas, sobretudo, de ―vir a ser‖, já que a criança, em si, é a síntese do que já conquistou e do que virá a ser, encerrando em si, dialeticamente, a oposição entre esse ser e esse vir a ser.

O findar do personalismo leva ao estágio categorial, no qual o sincretismo da pessoa e da inteligência será resolvido, dando lugar a diferenciações necessárias (WALLON, [1956] 1973).

No estágio categorial, a pessoa processa sua diferenciação do outro de forma mais nítida. Corresponde à fase em que o processo ensino-aprendizagem mostra-se mais sistematizado, mais voltado a uma apreensão de conceitos cada vez mais abstratos:

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atividade tem algo de exclusivo, ela é incapaz de fazer evoluções rápidas entre os objetos ou as tarefas (WALLON, [1941] 2007, p. 195-196).

É o período em que a criança passa a ter condições de lidar com o mundo físico a partir de um processo de exploração mental; a própria palavra ―categorial‖ remete ao sentido de ―categorização‖, ou seja, de ―classificação‖; a criança passa a ser capaz de hierarquizar os conceitos que recebe, organizando-os de maneira sistematizada. Wallon enfatiza que ―As coisas e a pessoa vão pouco a pouco deixando de ser os fragmentos de absoluto que se impunham sucessivamente à intuição. A rede das categorias faz irradiar sobre elas as mais diversas classificações e relações‖ ([1941] 2007, p. 197).

Nesse estágio, a afetividade se reveste no interesse demonstrado na execução de determinada tarefa e na forma como a criança se agrupa com seus pares, sempre tendo em vista o que irá realizar. Wallon é claro a esse respeito quando afirma que a criança deixa para trás o simples adestramento e passa a realizar atividades de acordo com seus próprios interesses. Em razão disso, a criança aprende a se reconhecer como uma personalidade polivalente, tendo a capacidade de ter, de si mesma, um conhecimento mais preciso e mais completo de si mesma (WALLON, [1956] 1973).

O estágio categorial se inicia em conjunto com o processo de consolidação da alfabetização; e tem seu final marcado pela transição do 5º para o 6º ano do ensino fundamental. De acordo com Mahoney e Almeida (2005), trata-se de um estágio longo, em que o predomínio é da razão. A aprendizagem se faz a partir do contraponto entre diferenças e semelhanças entre elementos. De acordo com Wallon ([1956] 1973), a percepção do conhecimento evolui de maneira considerável, já que as diferenças entre objetos e situações passam a ser manejadas pela criança de forma diferenciada, a partir de comparações, assimilações e distinções; com isso, fica para trás a confusão entre conceitos que ocorria até então, em função do sincretismo entre pessoa e inteligência.

Nessa fase, o professor apresenta-se como a pessoa que mediará, para o aluno, o processo de aquisição e, por que não, de descoberta do conhecimento. Essa descoberta, no entanto, deve ser organizada em um crescente grau de dificuldade, que se mostre possível de ser superado pelo discente, a fim de que a frustração não se instale; é fundamental, portanto, que se abra espaço para a valorização do erro como um momento de aprendizagem, que poderá ser substituído por uma aprendizagem plena e eficaz.

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Quando a amizade e as rivalidades cessam de se fundar na comunidade ou no antagonismo das tarefas empreendidas ou por empreender, quando tentam justificar-se por afinidades ou repulsões morais, quando parecem interessar mais a intimidade do ser do que colaborações ou conflitos efetivos [...].

Nas palavras do próprio autor, a infância dá provas de que já foi ―minada‖ pela puberdade, etapa em que, como na crise dos três anos, as exigências fundamentais para a formação da personalidade passam a ter primazia na constituição do sujeito.

Já no estágio puberdade e adolescência, a pessoa volta-se para si, buscando explorar a própria constituição identitária. A relação com o adulto, que se mostrava estável no estágio categorial, é quebrada de forma brusca e a temperatura emocional se eleva, na relação que o adolescente estabelece com o meio em que está inserido.

É o período em que se busca a autoafirmação, a autonomia. Passa a ter grande valor, nesse período, a relação com os pares e a busca de uma diferenciação não do outro (adulto), mas dos valores que ele representa. Nesse período, passam a ter grande importância os intercâmbios estabelecidos com os amigos, já que será esta a forma encontrada para se avaliarem (WALLON, [1941] 2007). Trata-se, também, de um período marcado por grandes exigências pessoais, no qual terá grande destaque a ambivalência de sentimentos presentes no jovem (PEDROZA, 2005).

O domínio funcional torna a ser o da afetividade, voltada para uma compreensão de si, do outro e na busca de valores fundamentais para tal compreensão. Marca esse período, também, uma inquietude típica, dando a impressão de que o adolescente estivesse com constante ansiedade de vir a ser. E, conforme Pedroza (1993, p. 102-103),

Mais uma vez o equilíbrio é rompido e, de maneira mais ou menos repentina e violenta, a pessoa encontra-se numa crise comparada à dos três anos. Com a diferença de que, neste momento, as outras pessoas são menos visadas e as exigências da personalidade, passada para o primeiro plano, entram em conflito com os costumes, hábitos de vida e relações da sociedade.

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acentuada e visível. O adolescente, concretamente, carrega em si o que foi, o que é e o que será; e é justamente esse ―embate‖ que, por vezes, não é compreendido da maneira como se deve pelos que o cercam.

Não se pode perder de vista que o adolescente passa por transformações corporais acentuadas nessa fase, transformações essas que marcarão a diferença entre os corpos femininos e masculinos e, diretamente, interferirão nos papéis que cada um dos gêneros passa a ter que assumir socialmente. Observa-se, desse modo, a delicada relação intrínseca que Wallon defende entre o biológico e o social.

À medida que mudanças fisiológicas vão ocorrendo no corpo do adolescente (como a maturação dos caracteres sexuais, crescimento não proporcional de braços e pernas em relação ao resto do corpo, amadurecimento da capacidade sexual), observa-se a utilização desse corpo – por vezes um ―desconhecido‖ para o rapaz e para a moça – para a expressão dos sentimentos pelos jovens. A movimentação ganha um lugar de destaque, pois, por vezes, é por meio dela que o jovem tem condições de externalizar o prazer que está sentindo na realização de uma dada atividade (DÉR; FERRARI, 2004).

Trata-se de uma fase em que a ambivalência de sentimentos mostra-se acentuada; o adolescente sente-se deslocado em relação a seu passado, pois não mais se reconhece e encerra em si a dialética entre o não-ser e o vir-a-ser (WALLON, [1956] 1973). O envolvimento do adolescente com o conhecimento torna-se mais intenso; no entanto, o foco de interesse, por vezes, vai na contramão do que a escola define como sendo o essencial para sua formação. Instala-se, por vezes, uma crise entre o jovem e a instituição escolar, uma vez que o adolescente compreende que a escola não é capaz de lhe satisfazer nos seus interesses pela busca do conhecimento. É necessário, pois, nesse período, que a instituição escolar seja capaz de mostrar ao adolescente a relevância dos conhecimentos que ela lhe apresenta, para, dessa maneira, ser legitimada por esse jovem.

Mahoney e Almeida (2005) apresentam que a afetividade em prol da aprendizagem, nessa fase, permite que se discutam as diferenças, ao mesmo tempo em que serão levadas em consideração. No entanto, reiteram que isso somente será possível se forem respeitados os limites que determinam relações solidárias.

Os conceitos até aqui propostos enfatizam que, na relação ensinar-aprender, não se pode perder de vista que a afetividade do aluno se apresenta como

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afetividade enquanto educador, considerado na função de professor ou de pai, ou seja, na condição de educador, em seu estatuto de adulto (ALMEIDA, 1993, p. 41).

O estudo dos estágios de desenvolvimento propostos por Wallon mostra que essas etapas estabelecem entre si uma ―unidade solidária‖; e que, no estudo da pessoa concreta, não se pode tratar a criança de maneira fragmentada, posto que ela, conforme o próprio autor afirma, é um ―todo indissociável e original‖ (WALLON, [1941] 2007, p. 198), uma pessoa feita de contrastes, mas apta a passar por novas experiências que a humanizarão mais e mais, dia a dia.

O estudo dos estágios do desenvolvimento mostra que, na teoria walloniana, motricidade, cognição e afetividade se alternam, como foco de maior relevância, em cada uma das etapas do desenvolvimento da pessoa. Deve-se ter bem claro que o que ocorre é uma reorganização de cada um dos conjuntos funcionais em virtude das relações que são estabelecidas entre a pessoa e o meio em cada uma das etapas do desenvolvimento.

É importante, também, apontar a diferença que há entre ―afetividade‖ e ―emoção‖, de acordo com a teoria walloniana. Wallon ([1941] 2007, p. 122) afirma que

É inevitável que as influências afetivas que rodeiam a criança desde o berço tenham sobre sua evolução mental uma ação determinante. Não porque criam peça por peça suas atitudes e seus modos de sentir, mas precisamente, ao contrário, porque se dirigem, à medida que ela desperta, a automatismos que o desenvolvimento espontâneo das estruturas nervosas contém em potência, e, por intermédio deles, a reações de ordem íntima e fundamental. Assim, o social se amalgama ao orgânico (grifo nosso).

Observa-se que há um componente que se relaciona diretamente ao ambiente externo da pessoa e que será responsável pela disposição do ser humano em ser afetado – positivamente ou negativamente – por esse ambiente. Esse componente é a afetividade que tem em sua conformação a emoção, que será a representação plástica, externa desse componente afetivo. A inter-relação – e a consequente diferenciação entre afetividade e emoção torna-se muito clara quando Wallon, a partir do exemplo do choro do recém-nascido, explica que não há como reduzir esse choro a ―um simples fato muscular. [...] Ele pertence a todo um complexo vital. Ao espasmo está ligado o choro, mas também um conjunto de condições e de impressões simultâneas que se exprimem no espasmo bem como no choro‖ (WALLON, op. cit., p. 118).

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sensações ligadas a tonalidades agradáveis ou desagradáveis‖ (p, 17). Nesse aspecto, o conjunto funcional da afetividade não estará vinculado apenas a impressões positivas motivadas pela interação com o ambiente externo. Ao contrário, muito comuns são as relações afetivas negativas, construídas, por exemplo, a partir de uma má adaptação a uma dada situação. Exemplo concreto disso na prática educativa pode ser identificado quando o aluno não valida uma determinação escolar e a ela passa a se opor de forma mais ou menos sutil. Partindo desse exemplo, há um componente externo que ativa na pessoa sensações de tonalidade desagradável, às quais, de forma mais ou menos direta, o educando irá criar resistência. É muito pertinente, nesse aspecto, que o educador não apenas tente compreender as interferências da afetividade nas relações escolares, mas que tenha condições de verificar a prevalência de manifestações afetivas de tonalidade negativa ou positiva, a fim de que possa envidar meios de incentivar as de tonalidade positiva e de abrir espaço para que se discutam as de tonalidade negativa, para que sejam atenuadas ou transmutadas em afetos positivos.

Já a emoção ―é a exteriorização da afetividade, é sua expressão corporal, motora. Tem um poder plástico, expressivo e contagioso; é o recurso de ligação entre o orgânico e o social: estabelece os primeiros laços com o mundo humano e, através deste, com o mundo físico e cultural‖ (ALMEIDA; MAHONEY, op. cit., p. 17).

A emoção é o primeiro vínculo que se estabelece entre os indivíduos. Em sua interação com o ambiente, a pessoa articula aspectos emocionais, orgânicos (WALLON, [1941] 2007). Observe-se que, na concepção do estudioso, a emoção tem uma base orgânica, biológica; não pode ser, sozinha, considerada afetividade. A afetividade, nessa visão, englobaria emoções e sentimentos, ou seja, componentes biológicos e psicológicos, que se complementam.

O estudo da teoria walloniana mostra, claramente, que as emoções estão presentes desde as primeiras manifestações ―comunicativas‖ que faz o bebê para interagir e para ser compreendido com o meio que o circunda; é por meio da análise das manifestações emocionais da criança que o adulto transforma a emoção em linguagem (ALMEIDA, 1993). Nessa interação, portanto, vê-se que a emoção está na raiz da formação mental e sensório-motora.

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Figura 01  –  Fluxograma das Avaliações que compõem o SAEB
Figura 02 – Fluxograma de Coleta/Geração e Análise dos dados da Pesquisa
Figura 03 – Fluxograma das Etapas de Composição dos Núcleos de Significação e Sentido
Figura 04 – Esquema de Análise de Núcleo de Significação e Sentido
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Referências

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