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CAPÍTULO IV MÉTODO

4.7 INSTRUMENTOS PARA A COLETA DE DADOS

4.7.2 A observação

Nas abordagens teóricas etnográficas, a observação mostra-se um dos instrumentos que permitem o estudo de comportamentos complexos em seu locus de gênese. Wallon ([1943] 2007, p. 15) esclarece que ―Embora amplos domínios do conhecimento tenham visto a experimentação suplantar a simples observação, o papel da observação continua sendo preponderante em grandes partes da psicologia‖. Percebe-se que, além da psicologia, a observação também tem papel preponderante para a pesquisa em educação, especialmente – como no caso desta investigação – para os estudos ligados à relação entre educação e desenvolvimento humano, uma vez que permite a apreensão do todo no conjunto de suas partes.

Ou seja: trata-se de técnica que favorece a verificação da materialização do discurso emocionado dos colaboradores de pesquisa nas suas práticas, hábitos, condutas. Para Borg (1967), a técnica da observação permite a inserção em ambientes diferentes ao do pesquisador, que se lança a compreender a complexidade de determinados comportamentos e a relação entre esses comportamentos e o discurso relativo a eles.

Nessa perspectiva, a educação mostra-se campo extremamente complexo – portanto, alvo rico para a observação do pesquisador. Apesar disso, deve-se tomar cuidado para que a observação não se encaminhe para a identificação de fatores de pouca de relevância; e para que o grau de influência que a presença do observador pode causar nos observados seja minimizado. Por conta dessas questões, a observação deve se apoiar em fundamentos teóricos consistentes e ao observador não basta apenas ―olhar‖ a realidade; deve saber ver, saber identificar e saber descrever o que observou. Desse modo, exige mais tempo e maior observação pessoal do pesquisador.

Tran Thong ([1984] 2007, p. 10), ao abordar a observação em Wallon, acrescenta que ―Para Wallon, a observação não é uma compilação de dados brutos. É uma interrogação do real, uma antecipação racional, uma expectativa apoiada por hipóteses maduramente

refletidas, conscientemente formuladas em empregadas‖. Nesse sentido, cabe ao observador colocar-se na posição de questionador da realidade que está sendo observada e não na posição de mero ―constatador‖ do que se desenrola naquela realidade à sua frente. Tendo em vista a ancoragem teórica em Wallon que esta investigação abraçou, as observações realizadas nas escolas seguiram esse espírito: de questionamento constante – estaria a afetividade presente nas práticas dos professores colaboradores da pesquisa? Seria a afetividade fator de influência nos bons resultados alcançados pelas instituições nas avaliações de larga escala – ainda que essas avaliações não considerem a questão da afetividade em seu processo de elaboração / aplicação? Questões essas que foram iluminadas – mas não esgotadas – no processo de análise dos dados coletados.

A análise de estudos de Grinnell (1997), Patton (1980) e Jorgensen (1989) permite delimitar, segundo indicações de Sampieri et all (2006), os seguintes objetivos para a observação qualitativa:

a) explorar ambientes, contextos, subculturas e a maioria dos aspectos da vida social;

b) descrever comunidades, contextos ou ambientes, e as atividades que se desenvolvem neles, as pessoas que participam em tais atividades e os significados das atividades;

c) compreender processos, inter-relações entre pessoas e suas situações ou circunstâncias;

d) identificar problemas;

e) gerar hipóteses para futuros estudos.

No que se refere a esta pesquisa, mostraram-se extremamente relacionados à compreensão do lugar da afetividade na prática profissional das professoras colaboradoras do estudo os objetivos ―b‖ e ―c‖.

Deve-se ter em mente que a observação, como instrumento de pesquisa, não se limita à simples ―contemplação‖ de ambientes, processos e pessoas. É, antes de qualquer coisa, uma implicação ativa na dinâmica das relações estabelecidas entre o meio e as pessoas pesquisadas, a fim de se compreender como se estabelece tal dinâmica. Ressalte-se que implicação ativa não deve ser confundida com interferência do pesquisador no ambiente que está sendo observado, mas sim sua disponibilidade – como investigador – em absorver ao máximo o ambiente que está sendo observado, em todas as suas nuances.

Em razão disso, o observador deve cumprir um papel decisivo durante o processo. Para isso, é necessário que ele se coloque em diferentes posições, para que possa descortinar o maior número de detalhes dos eventos e das pessoas que estão sendo alvo de sua análise.

De acordo com Grinnell (1997), as anotações cumprem importante papel no processo de observação. Em razão disso, organizam-se em quatro tipos fundamentais, conforme se lê a seguir:

a) Anotações da observação direta: descreve-se exatamente o que se vê, a partir de uma organização cronológica.

b) Anotações interpretativas: comentários pessoais sobre o que se vê, de forma que se determine a interpretação do pesquisador perante o que foi observado.

c) Anotações temáticas: conclusões preliminares a respeito do que se vê e que permitam a construção de ideias e hipóteses, organizadas tematicamente, acerca da teoria.

d) Anotações pessoais: visão particular de sentimentos e sensações do observador em relação ao que está sendo observado.

Nesta investigação, optou-se por anotações da observação direta em conjunto com anotações interpretativas das atividades desenvolvidas nas salas de aula. A observação direta permitiu a análise dos eventos em seu meio histórico-cultural, sem possíveis ―maquiagens‖, ao passo que as anotações interpretativas permitiram ao pesquisador demarcar apontamentos ligados à teoria que se faziam presentes nos eventos. Isso auxiliou para que a construção dos núcleos de significação e sentido pudesse ser realizada de forma mais rica.

Uma boa forma de se construir uma observação é a partir de uma espécie de ―diário‖, buscando os tipos de anotações a respeito do evento alvo de pesquisa. O que se deve ter em mente é que não se pode deixar passar espaço de tempo entre o evento e a anotação, sob pena de se perder a essência de um dado de pesquisa que esteja sendo construído. Nas observações desta investigação, foi construído um diário das observações; esse diário era escrito a mão, durante as atividades escolares e, depois, foi digitado pelo próprio pesquisador, seguindo sempre a estrutura Anotações de observação direta + Anotações

Interpretativas.

Após as anotações, os dados foram utilizados para a leitura flutuante, tendo-se sempre como princípio norteador os objetivos de pesquisa; desse modo, as informações encontradas serviram para balizar a investigação empreendida, bem como a produção dos núcleos de significação e de sentido.

De acordo com a técnica empregada, as observações podem ser estruturadas ou semiestruturadas. As observações totalmente estruturadas ocorrem em laboratório e, em geral, partem da pré-construção de hipóteses. Procuram testar hipóteses, o que exige instrumentos próprios e padronizados. O controle é maior. Já as observações de campo são semiestruturadas, têm lugar em um contexto natural e não buscam dados quantificáveis. O pesquisador ―vê o mundo‖ por intermédio da perspectiva dos sujeitos da observação. Nesta investigação, foi utilizada a observação semiestruturada.

Para o alcance de bons resultados com o emprego da observação, Viana (2007) define nove fases que balizam o trabalho com essa técnica. Essas fases seriam:

a) Definir os objetivos do estudo.

b) Decidir sobre o grupo de sujeitos a observar. c) Legitimar sua presença junto ao grupo a observar. d) Obter a confiança dos sujeitos a observar.

e) Observar e registrar notas de campo durante semanas.

f) Gerenciar possíveis crises que possam ocorrer entre os sujeitos e o observador. g) Saber retirar-se do campo de observação.

h) Analisar os dados.

i) Elaborar um relatório sobre os elementos obtidos.

A observação é superior a outros instrumentos para a coleta de dados de comportamento não verbal, pois possibilita a análise do comportamento em um meio natural. Além disso, o pesquisador pode observar mais longamente os acontecimentos, determinando suas tendências.

No entanto, como toda técnica qualitativa, a observação apresenta suas limitações (VIANA, 2007). Uma delas seria o fato de o meio natural nem sempre permitir que o observador controle certas variáveis irrelevantes para a situação e que podem afetar os dados. Outro ponto seria o fato de as observações oferecerem grande quantidade de dados e, quando se quer codificar ou classificar de forma sistemática tais dados, dificuldades aparecem. Também não se pode perder de vista que um estudo observacional longo pode perder sua confiabilidade. E, por fim, existem as limitações impostas por terceiros à prática do observador.

Nesta pesquisa, foram realizadas quinze (15) sessões de observação, distribuídas nas três escolas ao longo do primeiro semestre de 2014. No Centro de Ensino Fundamental,

foram realizadas cinco (5) sessões; no Colégio de Ensino Médio, seis (6) sessões; e, na Escola Classe, quatro (4) sessões. Além das anotações realizadas no Diário de Campo, o pesquisado gravou em áudio cada uma das sessões; esses áudios foram transcritos posteriormente, servindo como ―lembretes‖ ao investigador do evento analisado.

O quadro a seguir ilustra o procedimento de geração e de análise dos dados desta pesquisa, a partir das observações de atividades escolares que envolviam os alunos e os professores colaboradores, bem como das entrevistas e dos grupos focais. No próximo capítulo deste estudo, a análise aqui apresentada está detalhadamente aprofundada.

Figura 02 – Fluxograma de Coleta/Geração e Análise dos dados da Pesquisa

Fonte: elaborado pelo próprio pesquisador.

CONTATO COM AS ESCOLAS E PROFESSORES

INSERÇÃO DO PESQUISADOR NO CONTEXTO ESCOLAR

OBSERVAÇÕES GRUPOS FOCAIS ENTREVISTAS

COLETA DOS DADOS DE PESQUISA

LEITURA FLUTUANTE

IDENTIFICAÇÃO DOS TEMAS

AGLUTINAÇÃO DOS TEMAS

ORGANIZAÇÃO DOS NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO E SENTIDO

COMPARAÇÃO DOS DISCURSOS PRODUZIDOS PELOS DOCENTES / DISCENTES