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A instrução como escultora da sociedade: a construção do estado nacional brasileiro em seu primeiro momento de autonomia política 1822-1831

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A INSTRUÇÃO COMO ESCULTORA DA SOCIEDADE:

A Construção do Estado Nacional Brasileiro em seu Primeiro

Momento de Autonomia Política

1822-1831

A

SSIS

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A INSTRUÇÃO COMO ESCULTORA DA SOCIEDADE:

A Construção do Estado Nacional Brasileiro em seu Primeiro

Momento de Autonomia Política

1822-1831

A

SSIS

2006

Dissertação apresentada a Faculdade de Ciências e Letras – Universidade Estadual Paulista – para obtenção do título de Mestre em História (área de conhecimento História e Sociedade)

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A Instrução como Escultora da Sociedade:

A Construção do Estado Nacional Brasileiro em seu Primeiro

Momento de Autonomia Política

1822-1831

COMISSÃO EXAMINADORA

__________________________________________________________________ Dissertação apresentada a Faculdade de Ciências e Letras – Universidade Estadual Paulista – para obtenção do título de Mestre em História (área de conhecimento História e Sociedade)

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Aos meus pais e meu irmão querido Pessoas que amo e admiro profundamente…

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Estudos, sonhos, trabalho, pesquisa, risos, preocupações, um café na hora certa...Encontros marcados e desmarcados, horas de sono, horas sem sono, e pessoas que em meio a tudo isso ajudaram a delinear mais esta etapa de minha vida. Agradeço a todos que me rodearam neste tempo, amigos e amigas, amizades rápidas e trocas de experiências. A todos e quem eu puder lembrar, os colegas de turma de graduação e da pós-graduação, minhas amigas inseparáveis que acreditaram neste esforço, meus pais que financiaram boa parte deste sonho e meu noivo que me ajudou e me apoiou com suas sugestões, seus livros... e ainda bem que também ele faz mestrado!!!

Agradeço aos meus professores de graduação na Universidade Estadual de Londrina, pessoas que se dedicam a ensinar sobre História. Lembro dos que mais marcaram a minha vida acadêmica e tornaram-se os meus grandes exemplos: as professoras Sílvia Martins, Edméia Ap. Ribeiro, Maria de Fátima da Cunha e Enezila de Lima; e os professores Gilmar Arruda, Francisco Queiroz, William Reis Meirelles e Jozimar Paes de Almeida. Suas contribuições foram importantes, assim como as horas de conversas, risadas, indicações bibliográficas e os bons momentos que marcaram toda esta experiência.

Aos professores do programa de pós-graduação da Universidade Estadual Paulista/ Assis, em especial à Célia Reis Camargo, Milton Carlos da Costa e Áureo Busseto, pelas aulas e contribuições feitas ao trabalho no exame de qualificação.

Meus amigos Richard Gonçalves André, Daniela Moscato e Jaime Estevão dos Reis, pessoas que convivi durante o cumprimento dos créditos e mantenho profunda admiração pelo esforço e a amizade que construímos. Minhas amigas Carina, Aline, Patrícia, Helen e Luciana pessoas que fazem parte da minha infância e hoje trilham caminhos diferentes, mas conseguem manter a mesma energia para viver e construir a cada dia seus sonhos.

Aos colegas Marcio Luiz Carreri, Marisa Noda, Alfredo Moreira Jr, Pedro Bonotto, Roberto Carlos Massei, Aécio Rodrigues de Mello, Cássia E.P.Rocha Faleiros, Ivone Sócio Monteiro, Reinéro Antônio Lérias, Marcus Selonk e Mateus Luiz Biancon, Guido Claret, Valéria Jorge, Thissiane Fioreto e Marcio Gentil. Minha gratidão pelas horas de estudos e trabalhos, conversas e indicações bibliográficas.

Agradeço também ao meu orientador Paulo Henrique Martinez. Um amigo que conviveu com minhas incertezas com relação à elaboração do trabalho. Por sua orientação segura e rigorosa, e toda a sua atenção e generosidade com relação as minhas dúvidas. Tenho profunda admiração e respeito principalmente porque me ajudou a enfrentar obstáculos e me engajar na disciplina histórica através das leituras e discussões que fizemos nos grupos de estudos e do seu exemplo enquanto professor e pesquisador assíduo. Contigo Paulo, vivenciei experiências muito importantes na minha vida profissional e acadêmica, momentos que definiram as escolhas que ora em diante passo a desenhar. Obrigado pelo apoio e por ter acreditado em mim!

E ao meu querido Reinaldo Nishikawa. Amigo, companheiro, namorado, noivo e historiador. Ao seu lado consigo me sentir segura e sua força faz com que eu não desista nunca.

Cida e Celso! Palavras não descrevem a importância que vocês têem na minha vida. Obrigada por me ajudar em tudo, por sorrir comigo a cada etapa vencida. Seu carinho e sua

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Tiago meu irmão. Sua garra, seu esforço, sua sede de vitória! Tudo isso contribuiu para que eu me espelhasse em você. Sempre me senti em uma maratona, que nadar, pedalar e correr, se traduziram, em ler, pensar e escrever. Obrigado por tudo.

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Ao ser humano só foi dada uma ou outra faísca de verdade, mas não a plena luz; mas todos devem buscá-la sincera e zelosamente. José Bonifácio

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CONCEIÇÃO, Taíse Ferreira. A Instrução como Escultora da Sociedade: A Construção

do Estado Nacional Brasileiro em seu Primeiro Momento de Autonomia Política 1822-1831. 2006. Dissertação (Mestrado em História e Sociedade) Faculdade de Ciências e

Letras “Júlio Mesquita Filho” Universidade Estadual Paulista/ Assis.

Seguindo o debate iluminista, a instrução, funcionaria como “escultor” da nova sociedade. Cabe ao “povo” gerir e proteger a “Nação”, e à escola é transferida a tarefa de legitimar este processo de adesão ao Estado, a fim de formar uma sociedade calcada nos princípios patrióticos, ou seja, na formação de homens que saibam lutar pela liberdade e a felicidade de sua pátria. Verificando a trajetória da Educação nos países europeus, com o surgimento de novas abordagens sobre a pedagogia, decorrente das profundas transformações que ocorrem neste período, a educação se torna o centro da vida social. Nela se organizam os processos de conformação das normas coletivas, se opera a continuidade da cultura, onde os indivíduos superam sua individualidade se integrando à coletividade, e recebem instrumentos que conferem o dinamismo de suas ações para a resolução dos problemas vivenciados na sociedade.Com o objetivo de discutir a Formação do Estado Nacional Brasileiro, através do estudo das práticas de ensino primário secundário e superior, apresentamos o estudo sobre a instrução pública dirigida aos habitantes das províncias brasileiras no período de 1822 a 1831. Também verificamos a eficácia deste novo ideal atribuído às práticas educacionais, através da visualização dos métodos de ensino adotados e sua distribuição por todo o Estado e implantação dos cursos jurídicos em São Paulo e Olinda. As fontes que fundamentam esta pesquisa são as Leis e Decisões do Império do Brasil, que através da quantificação dos dados e mapeamento das localidades em que são atribuídas as cadeiras de ensino, fornecem informações sobre a instrução no Brasil e os procedimentos tomados pelo governo a fim de promovê-la nacionalmente.

Palavras-Chave: Instrução pública, reformismo ilustrado, cadeiras de ensino, cursos

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Autonomy 1822-1831. 2006. Dissertation (Master in History and Society) Faculty of

Sciences and Letter “Júlio Mesquita Filho” State University native of São Paulo/ Assis.

Following the illuminist debate, the instruction, would function like the “sculptor” of the new society. It falls to the “people” manage and protect to “Nation”, and to the school is transferred the task of legitimize this process of adhesion to the State, in order to form a society compressed in the patriotic beginnings, otherwise, in the formation of men that are going to fight to the liberty and the happiness of its homeland. Verifying the path of the Education in the European countries, with the sprouting of new approaches about the education, resulting of the deep transformations that occur in this period, the education becomes the social life center. On it the trials of the collective norms conformation are organized, the continuity of the culture is operated, where the individuals exceed their individuality being integrated to the collectivity, and receive instruments that confer the dynamism of their actions for the resolution of the problems lived in the society. With the objective to discuss the Brazilian National State formation, through the study of the practices of primary, secondary and superior teaching, we present the Public instruction study driven to the inhabitants of the Brazilian provinces in the period of 1822 to 1831. We also verify the efficacy of this new ideal attributed to the educational practices, trough the viewing of the educational approaches adopted and its distribution by the whole State and the implantation of the legal courses in São Paulo and Olinda. The sources that substantiate this research are the Laws and Decisions of the Empire of Brazil, that through the data quantification and mapping localities that are attributed the educational chains, supply information about the instruction in Brazil and the procedures taken by the government in order to promote it nationally.

Key-words: Public Instruction; Illustrated Reforming; Education Chairs; Legal Courses;

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1. Decisões de Governo sobre a Educação Formal e Não formal de 1822-1831...P.71

Quadro 2. Distribuição das Decisões do Governo sobre a Educação Formal e Não Formal através dos ministérios do Império do Brasil (1822-1831)...P. 77

Quadro 3. Distribuição das decisões de governo por províncias do Império do Brasil (1822-1831)...P. 79

Quadro 4. Número de Decisões do Governo sobre a implementação de Escolas de Primeiras Letras: ...P.106

Quadro 5. Distribuição espacial das Decisões do Governo – Criação e Proviomentos de Escolas de Primeiras Letras por província do Império do Brasil (1822-1831)...P.107

Quadro 6. Distribuição das Decisões de Governo sobre as cadeiras de primeiras letras (1822-1831)...P.108

Quadro 7. Cadeiras de primeiras letras – Atos do Poder Legislativo...P.115

Quadro 8. Índice de Determinações sobre os Ordenados das Cadeiras de Primeiras Letras – Poder Legislativo...P.116

Quadro 9. Cadeiras de Primeiras Letras – Atos do Poder Executivo...P.124

Quadro 10. Índice de Determinações sobre a Criação das Cadeiras de Primeiras Letras – Poder Executivo...P.129

Quadro 11. Índice de determinações sobre os ordenados das cadeiras de primeiras letras – Poder Executivo...P.131

Quadro 12. Índice de determinações sobre os Cursos Jurídicos – Atos do Poder Executivo...P.135

Quadro 13. Índice de determinações sobre os Cursos Jurídicos – Atos do Poder Legislativo...P.136

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Quadro 15. Cadeiras de Gramática Latina, Filosofia, Retórica e Línguas Estrangeiras – Atos do Poder Executivo...P.148

Quadro 16. Cadeiras de Gramática Latina, Filosofia, Retórica e Línguas Estrangeiras – Atos do Poder Legislativo...P.149

Quadro 17. Determinações sobre os Cursos Jurídicos – Decisões de Governo...P.157

Quadro 18. Distribuição das Decisões do Governo sobre a regulamentação dos cursos jurídicos através dos ministérios do Império do Brasil (1822-1831)...P. 157

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2. A Instrução como “Escultora da Sociedade”: Debates sobre o Iluminismo Europeu e as Especificidades das Reformas Portuguesas…...P.24

2.1 O Tema da Educação: Transformações Ocorridas Durante o Século XVIII e suas Influências nas Práticas Educacionais do Império Brasileiro...P. 24

2.2 O Sentido da Independência do Brasil: A historiografia tradicional e os novos rumos para a análise sobre o Primeiro Reinado...P.39

2.3 Codificando Dados e Constituindo Material de Análise – Leis decretos e Decisões de governo: Instrumentos de Investigação e organização da Documentação...P.68

3. Para uma “Educação Nacional” - Garantindo aos cidadãos a “Instrução Gratuita”: Leis educacionais do Período Joanino e as Mudanças Ocorridas no Primeiro Reinado...………...P.82

3.1 A Instrução nos Tempos da Corte Portuguesa 1808-1822...P.82

3.2 As atividades educativas no Primeiro Reinado: As escolas de Primeiras Letras e os Cursos Jurídicos...P. 91

3.3. As Escolas de Primeiras Letras: “Benefícios para o aproveitamento dos Habitantes de Cada Província”...P.99 3.4 As Decisões de Governo: Visualização Geral da Implantação de Cadeiras e

Escolas de Primeiras Letras ...P.105

3.5 Criação de Cadeiras e Escolas de Primeiras Letras...P.109

3.6 Provimentos, Ordenados e Relatórios das Cadeiras de Primeiras Letras: A Organização após a Lei de 15 de outubro de 1827 – o poder Legislativo...P. 114

3.7 Decretos Governamentais: A Incidência das Resoluções sobre o estabelecimento das Escolas e Cadeiras de Primeiras Letras nos atos do Poder Executivo...P.123

3.8 Os Decretos e as Criações de Cadeiras de Primeiras Letras...P.129

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de jurisconsultos brasileiros enriquecidos de doutrinas luminosas e úteis”...P.141

5. As Decisões de Governo, Leis e Decretos como Objeto de Reflexão: Análise da

Ação do Estado para a Organização do Império do Brasil, Considerações Finais...………...………P.162 6. Fontes referentes à pesquisa sobre a Educação no período de 1808 a

1831...………...P.171 7. Bibliografia...………...P.175

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1. INTRODUÇÃO:

No início do século XIX, período que Portugal vivencia os impactos da entrada

de novas idéias e ideais que configuraram o Reformismo Ilustrado, as tentativas de reorganização

das finanças e das políticas foram conduzidas na medida em que o Estado reuniu esforços para

assegurar a permanência da união com suas colônias. O programa de reformas instituído

pautou-se na modernização da administração política do império e das colônias, para o aspautou-seguramento da

estabilidade política de Portugal, porém ocorre a manutenção das bases da estrutura política

através da monarquia de caráter absolutista. O Estado português torna-se pólo dinamizador das

relações comerciais e políticas, através da naturalização da união entre Metrópole e suas demais

colônias, conferindo a todos os portugueses, europeus e de além mar, o pertencimento à nação

lusa. 1

Dentro das principais bases a serem modificadas, o programa de reformas

proporcionou a reorganização da instrução, de caráter pragmático, utilizando o saber como meio

de direcionar os anseios da sociedade. Assim, à instrução destina-se a formação dos quadros

administrativos do Estado, tornando-se fator importante para a aplicação das reformas. 2 No

entanto, com as mudanças ocorridas no plano internacional, promovidas pela expansão do

império napoleônico, a política de reformas sofre intensas complicações. Destaca-se entre elas, a

fuga da família real para a colônia americana, fato que proporcionou o esforço dos órgãos

políticos em constituir uma imagem positiva da monarquia que buscou, através de sua retirada

estratégica, salvar os domínios coloniais, em defesa do reino português.

1

LYRA, Maria de Lourdes Viana. A Utopia do Poderoso Império: Portugal e Brasil: Bastidores da Política

1798-1822. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1994. P. 66-82. 2

O Seminário de Olinda, fundado neste período (1876) na colônia americana, destaca-se pela sua função política, demarcando o caráter pragmático do Reformismo Ilustrado Português. LYRA, op. cit., P. 89.

(15)

A colônia brasileira, como sede para a monarquia portuguesa, recebe

incrementos político-administrativos, porque acolhe também todo o aparelhamento do Estado,

com os ministérios e conselhos, passando a ser centro dinamizador estrategicamente instalado no

Rio de Janeiro. 3 E, para a manutenção das políticas reformistas, foi necessário conter os levantes

revolucionários de emancipação no interior da colônia, promovendo o progresso sem alterar a

ordem social e a estrutura do poder absoluto. Neste sentido, a instrução, ministrada através dos

cursos de Economia Política e Estudos Matemáticos, a instituição da Real Academia Militar, da

Academia de Guardas Marinhas e Academias Médico Cirúrgicas, correspondem ao projeto

reformista, para a formação dos quadros administrativos do Império. E, ao lado destas medidas

administrativas, também integra o quadro da instrução do reino do Brasil, a abertura de cadeiras

de ensino de primeiras letras e demais disciplinas, para a difusão dos valores e ideais da nação

portuguesa aos portugueses de além mar. 4

Este contexto singular, que configura a adaptação das medidas reformistas à

realidade da ex-colônia brasileira, torna-se alvo de investigação. O Brasil, que a partir de 1808 é

elevado a reino, sede da monarquia européia, e centro dinamizador das práticas administrativas

do Império Português, também se configura como o centro dinamizador da unidade que constitui

o Novo Império. A instrução, neste sentido, funciona como a amalgama que sedimenta o

sentimento de pertencimento à nação lusa, reconhecendo as potencialidades do Império.

Evento articulado e planejado pelos políticos ilustrados da época, a fim de

conseguir proteger as maiores riquezas de Portugal, juntamente com a defesa da coroa, a

transferência da corte para a colônia no continente americano, correspondeu a mais uma das

3

A instalação da Corte no Rio de Janeiro corresponde a intenção de manter definitivamente na colônia a metrópole no Novo Mundo, através da aplicação das políticas reformistas, adaptadas às novas circunstâncias. Idem. Taltos. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1994. P. 131.

4

(16)

atitudes que demonstram a articulação das políticas ilustradas de Portugal para a emergência de

um “Poderoso Império no Novo Mundo”. De acordo com as práticas reformistas empregadas a

partir do século XVIII, que dentre elas, as reformas da administração portuguesa frente aos seus

domínios coloniais, ficaram acertadas as políticas de arregimentação dos laços entre as colônias e

a metrópole, através do projeto de reestruturação do Reino Português. 5

Com os acontecimentos ocorridos em Portugal, face à permanência da corte

portuguesa no Brasil, que acarretaram o retorno de D. João VI para Portugal, o reino ficou aos

cuidados do príncipe regente D. Pedro, que deveria resguardar a união e integridade do Império

lusitano. A manutenção das políticas reformistas demonstradas através dos esforços dos

representantes portugueses para a continuidade da dependência política e econômica dos

domínios coloniais, reitera-se nas reivindicações por parte dos representantes das Cortes de

Lisboa, que almejavam ter Portugal novamente como o centro das decisões políticas e

administrativas.

O processo iniciado pelas discussões sobre o retorno do imperador D. João VI

para Portugal e a retomada das rédeas do Império, esclarece as diferenças regionais da colônia

portuguesa agora reino do Brasil, e da metrópole, e levanta os interesses de cada uma das partes,

desmontando a ideologia do vasto império. 6 Rebeliões no reino do Brasil de um lado, e as

defesas nacionalistas por parte dos portugueses que visualizam a colônia portuguesa no

continente americano, como uma de suas mais ricas possessões. E frente aos debates nas Cortes

5

A mudança da corte portuguesa para uma de suas mais “ricas possessões”, não foi uma solução pensada por acaso. Nas situações em que a coroa portuguesa se vê pressionada pelos poderes externos e mais fortes é recorrente a opinião do refúgio para uma de suas colônias. Destacam-se os fatos que acompanharam o momento de fragilidade do reino português como em 1580, com a invasão da Espanha e a conseqüente união dos dois reinos; Com a guerra de restauração no período de 1640-1668; No reinado de D. João V em 1707-1750; Enfim, constatamos que em todas estas ocasiões em que a transferência foi cogitada a fim de salvaguardar os bens da coroa portuguesa, esta atitude vem acompanhada da vontade de transformar o Reino Português no mais rico Império do Ocidente. Idem. Taltos.

Rio de Janeiro: Sette Letras, 1994. p. 107 e 108. 6

(17)

de Lisboa, o desentendimento com relação à representatividade dos deputados brasileiros. Seriam

eles representantes das províncias do reino do Brasil ou da nação portuguesa? 7

A independência do Brasil vincula-se neste processo de negociação e conflito

de interesses, em decorrência da adesão das diversas províncias no projeto de ruptura com a

metrópole lusa, aliado à figura do regente D. Pedro. As cortes portuguesas ao não atenderem às

reivindicações das cortes brasileiras, definiram a radicalização do conflito entre os interesses dos

portugueses e dos brasileiros, caminhando, deste modo, para a ruptura entre os dois reinos.

Assim, ao lado das transformações ocorridas durante a permanência da corte

portuguesa no Reino do Brasil, alia-se a todo este processo, este momento de intensas

conturbações políticas e de grandes contradições que deflagraram a independência do Brasil e

marcaram o primeiro instante de autonomia que configurou o Estado Nacional brasileiro como

Império independente. Tais debates se destacam no campo historiográfico, e privilegiam este

momento, buscando analisar os detalhes importantes da trajetória de emancipação política do

Brasil:

A nossa historiografia levou muito tempo para admitir que a trajetória histórica que resultou nos Estados e Nação brasileiros foi mais complexa e contraditória do que a realização de um roteiro preestabelecido. Como acontece com todas as obras humanas, a construção desse Estado, e da Nação que em seu interior tomou forma, implicou um processo social de ensaio e erro, de confrontações e negociações, de acumulação de experiência política que permitiu a formulação de alternativas para um statu quo cuja legitimidade e operacionalidade perdiam vigência. (...)

A independência foi a resultante de uma crise profunda, cuja abrangência ultrapassava os limites desta América então no seu conjunto convulsionava. 8

O Primeiro Reinado, período politicamente construído e recortado como o

primeiro momento de autonomia política do Brasil, liderado pela figura central de D. Pedro I,

7

BERBEL, Márcia Regina. A Nação como Artefato: Deputados do Brasil nas Cortes Portuguesas 1821-1822. São Paulo: HUCITEC, 1999.

8

(18)

demarca o rompimento das amarras da já idosa ordem do Antigo Regime, configurando-se como

um período renovador que instituiu o Estado nacional brasileiro através da superação do seus

status de colônia. A Independência, marco inaugural deste rompimento configura e legitima todo

este processo. Do ponto de vista do evento, temos um período que se descola do processo político

no qual se insere o contexto de 1822 9, e que, portanto necessita de uma abordagem crítica, que

leve em consideração os aspectos sociais, políticos e econômicos.

O contexto da independência do Brasil revela as dimensões da crise existente

entre reino e metrópole, os interesses políticos imbricados neste contexto e a dimensão dos

interesses locais engendrados no Brasil durante os anos de colonização. Tal afirmação torna

impossível eleger este evento como o marco fundamental da unidade nacional, posto que durante

o Primeiro Reinado, políticas serão realizadas em prol da unidade, sendo a educação um dos

fatores pensados para a legitimação do Estado Nacional unificado e liderado pela figura central

do monarca D. Pedro I.

O esforço da manutenção do príncipe português no Brasil, como estratégia para

assegurar a união do reino, através das províncias, e de um governo monárquico, no contexto de

reorganização das políticas republicanas do mundo americano pelas emancipações, demonstra a

continuidade das políticas do reformismo ilustrado. Não ocorrem transformações estruturais com

a independência no campo político neste momento. Ela é a solução ideal para a “acomodação de

9

O evento da independência do Brasil, durante alguns anos tornou-se fato importante para a consolidação de práticas que o evidenciam como o marco inaugural da vivência brasileira, através da mitificação da persona de D. Pedro I e a exaltação de sua ação heróica como fator marcante para a unidade nacional. Como afirma Maria Odila Leite da Silva, a independência não coincide com a unidade nacional e muito menos foi marcada por um movimento nacionalista ou revolucionário que se confunde com a idéia da tradicional luta entre a colônia e a metrópole. Daí a atitude de historiadores que procuraram desvendar novos horizontes para o estudo do processo de emancipação do Brasil. DIAS, Maria Odila da Silva. A Interiorização da Metrópole e Outros Estudos. São Paulo: Alameda, 2005. p. 7.

(19)

interesses divergentes, para possibilitar a formação de um Estado monárquico constitucional e a

conseqüente continuidade de edificação do “Poderoso Império” do novo mundo”. 10

A “ruptura da unidade luso-brasileira” 11 conduziu o término do sonho da

construção do Império Atlântico, em contrapartida, inicia-se o encaminhamento das discussões

sobre a construção do Estado nacional brasileiro, regido pelo imperador D. Pedro I. O Primeiro

Reinado apresenta um quadro educacional interessante, na medida em que são incorporadas

novas idéias com relação aos métodos de ensino, culminando nas leis de 182712, mas que também

apresenta a conservação da estrutura política implantada pela corte portuguesa através da

manutenção do governo regencial que posteriormente se torna governo do Império do Brasil. Tais

permanências são visualizadas principalmente no que tangem os aspectos da política reformista e

o desempenho de suas características para a formação do Estado Nacional.

A instrução pública recebe atenção pela sua importância no desenvolvimento do

Estado e da nação brasileira, pois ela estaria sendo evocada, pelos conteúdos explícitos na

documentação, como algo “infalível” e “fecundo”, com “vantagens” que se somariam à política,

para a unificação e organização do Brasil neste primeiro momento de autonomia política. É

comum encontrar nos textos das Decisões de Governo e dos Decretos a exaltação da instrução

como a fonte da organização do Estado Nacional e como um dos objetos da atenção particular de

D. Pedro I.

10

LYRA, op. cit., p. 207.

11

Expressão utilizada por Maria de Lourdes Viana Lyra para demonstrar este momento de discussões, negociações e conflitos em torno da continuidade do ideal reformista da construção do Poderoso Império Lusitano e a constituição do Império do Brasil nos trópicos. Ibidem.

12

Lei de 11 de agosto de 1827 que cria dois cursos jurídicos um na cidade de Olinda e outro na cidade de São Paulo e a lei de 15 de outubro de 1827 que manda que em todas as províncias, vilas e povoações sejam implantadas escolas de Primeiras Letras pelo método de ensino mútuo. In: Coleção das Leis do Império do Brasil de 1827. Rio de Janeiro: tipografia Nacional, 1880.

(20)

Assim, ao buscar compreender os elementos que ajudaram a constituir o Brasil

como Estado e Nação, trazemos a instrução pensada a partir das resoluções governamentais,

através da análise da política adotada no âmbito do governo, e os objetivos que foram traçados

para a unificação, organização e adesão ao Estado Imperial. As decisões de governo, leis, cartas

imperiais e decretos que incidem diretamente sobre a questão da educação no Brasil tangenciam

o poder Executivo e a partir de 1826 o poder Legislativo, formam o corpo documental que

fundamenta esta análise. Assim, são encontradas várias determinações legais focadas na instrução

primária, no ensino secundário e para o ensino de nível superior.

Como única experiência monárquica do “Novo Mundo”, o Brasil se configura

segundo os princípios do reformismo ilustrado, base que sustenta os princípios dos grupos

políticos brasileiros e portugueses, que mesmo em divergência sobre a condição do Brasil perante

Portugal, debatem e delineiam os fatos políticos que acarretaram a “ruptura da unidade” entre

Portugal e Brasil. 13 Este estudo levanta as discussões historiográficas sobre o iluminismo

português, sua materialização através das reformas iniciadas no século XVIII e aplicação na

colônia americana. Suas manifestações na política do Império brasileiro após a emancipação, no

que tangem os aspectos da política para a educação. Também perpassa o período em que a corte

portuguesa se instalou no Brasil, elevando-o a reino, e os debates em torno da emancipação

política do reino do Brasil a partir de 1821.

O processo de independência do Brasil e as discussões políticas sobre a posição

do Brasil face à metrópole portuguesa recebem atenção. Afinal, com a volta do rei para Portugal,

em 1821, continuaria o Brasil reino ou retornaria ao posto de colônia? A historiografia reitera

13

Maria de Lourdes Viana Lyra expõe que o Brasil como a única monarquia dos trópicos, fundou-se com base na experiência de grupos políticos formados segundo os princípios do reformismo ilustrado, que por seguinte configurou a experiência da política de acomodação de interesses divergentes para a legitimação do poderoso império do novo mundo. LYRA, op. cit., p. 207.

(21)

todo este contexto, através da investigação dos debates políticos das Cortes extraordinárias de

Lisboa, do levantamento da situação de cada localidade que constitui o reino e desmistifica a

questão da unidade nacional ligada à D. Pedro I. Ele, enquanto príncipe regente era guardião da

estabilidade política e da união entre os dois reinos. No entanto, com os rumos tomados pelas

discussões a cerca do estatuto político do Brasil, agentes políticos se empenham para o

encaminhamento de uma política de acomodação de interesses divergentes para possibilitar a formação de um Estado monárquico constitucional e conseqüente continuidade de edificação e da formação do “poderoso império” do novo mundo.14

Porém todo este percurso realizado tem o objetivo de verificar no Império do

Brasil de 1821 a 1831, as continuidades do reformismo ilustrado português através das

determinações políticas que visaram à formação do Estado nacional brasileiro, neste primeiro

momento de autonomia política que marca o Primeiro Reinado figurado por D. Pedro I. Assim

leis e decisões de governo que incidem sobre a instrução foram selecionadas e quantificadas para

este estudo, em meio a uma vasta coleção de determinações políticas que configuram o material

da Coleção de Leis e Decisões de Governo do Reino do Brasil e do Império do Brasil, desde 1821

até 1831.

E neste sentido conformamos o interesse da pesquisa pela história da política

educacional do Brasil pela vertente da história política, com o objetivo de contribuir com o

entendimento da possibilidade de ser a história da educação um campo de investigação histórica:

A história da educação está sendo entendida aqui enquanto um campo de investigações em que se torna cada vez mais necessário dar visibilidade aos seus diferentes objetos: a escola, o professor, os alunos, materiais escolares, processos e formas de aprendizagem, entre tantos outros. Nesse sentido, também se torna cada vez mais necessário dar

14

(22)

visibilidade aos procedimentos metodológicos e referenciais teóricos que produzem tais objetos como objetos da história cultural, política, econômica e social. 15

A análise da política para a educação durante o Primeiro Reinado evidencia o

interesse em constituir rapidamente uma nacionalidade através da “instrução da mocidade” e da

adoção do método de ensino mútuo, ou método lancaster – “achando-se admitidas em todas as

nações civilizadas... para imprimir na mocidade os primeiros conhecimentos”16 – assim, o estudo

das cadeiras de Primeiras Letras e o método serão alvos desta investigação. Também os cursos

jurídicos de Olinda que demarcaram num primeiro momento, o reduto do pensamento reformista

da ilustração portuguesa e, no Primeiro Reinado, foi reavivado juntamente com a criação de um

outro curso, estrategicamente inaugurado em São Paulo, para atender as necessidades da

formação do corpo administrativo do império pelo direcionamento intelectual dos estudantes. A

visualização das normas políticas e da regulamentação da instrução no Brasil, desde a sua

autonomia evidencia a possibilidade do estudo sobre a

organização do Estado brasileiro, como desenvolveram-se as práticas políticas de institucionalização dos saberes elementares, no sentido de observar em que medida rompem ou continuam as práticas anteriores; ou ainda, de que maneira é possível compreender a organização escolar no período como componente da organização do Estado e das novas configurações das relações de poder.17

A história da educação neste trabalho é entendida como um campo de

investigação que nos permite tecer algumas observações sobre as práticas políticas engendradas

na adoção dos métodos e na aplicação das cadeiras de ensino e na viabilização dos cursos

superiores em instituições responsáveis pela formação dos quadros administrativos do Império.

História das políticas educacionais no Primeiro Reinado, este é o alvo deste trabalho, visando,

15

VEIGA, Cyntia Greive. História Política e História da Educação. IN: História e Historiografia da Educação no

Brasil. Belo Horizonte/MG: Autêntica, 2003. P. 19. 16

BRASIL. Império. Nº 182 de 22 de agosto de 1825. Manda promover nas províncias a introdução e o estabelecimento de escolas públicas de primeiras letras pelo método de ensino Mútuo lancasteriano. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1885.

17

(23)

como afirma René Remond, o estudo dos poderes públicos que foram levados a legislar e

regulamentar sobre a difusão da cultura e demais atribuições governamentais. 18

18

REMOND, René (org). Por Uma História Política. Tradução de Dora Rocha. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1996. P. 24.

(24)

2. A INSTRUÇÃO COMO “ESCULTORA DA SOCIEDADE”: DEBATES SOBRE O ILUMINISMO EUROPEU E AS ESPECIFICIDADES DAS REFORMAS PORTUGUESAS

2.1 O TEMA DA EDUCAÇÃO: TRANSFORMAÇÕES OCORRIDAS DURANTE O SÉCULO XVIII E SUAS INFLUÊNCIAS NAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS DO IMPÉRIO BRASILEIRO:

O tema Educação, neste recorte temporal em que se inserem as discussões a

cerca da formação do Estado Nacional brasileiro e, por conseguinte o Primeiro Reinado está

relacionado com as novidades dos debates da ilustração européia desde o século XVIII. Os

homens, “cidadãos”, tomam novo lugar na configuração política, emergem como soberanos e

formam o espírito público, e visavam na “cidadania” a sustentação de toda a sociedade, imbuído

de uma ideologia de igualdade entre os homens, que conferia a todos oportunidade de

desenvolver seus talentos naturais. 19 Neste aspecto, o estudo da política para a Educação no

Primeiro Reinado prima pela discussão das decisões políticas aliadas às práticas educacionais, e

assim, entendemos que educação e política,

enquadrar-se-iam como estruturas complementares de um mesmo objeto, revelando o movimento pendular que induz a escola pelo signo social”, que é capaz de transformar o homem através dos preceitos educacionais. 20

A partir deste ponto de vista, entendemos que a educação institucional

ministrada através, das cadeiras de ensino mútuo, dos cursos e das instituições militares, assim

como as festas cívicas, religiosas, os feriados nacionais, a produção de monumentos artísticos,

funcionavam como um mecanismo pedagógico de sedimentação das tradições, recriadoras de

hábitos, costumes e valores. Porém reiteramos a ênfase sobre leis e decisões de governo que

19

BOTO, Carlota. A Escola do Homem Novo: entre o Iluminismo e a Revolução Francesa. São Paulo: UNESP, 1998.

20

(25)

determinam sobre a educação formal, ministradas nas escolas e cadeiras de ensino e dos cursos

de nível superior.

No Brasil, todo o período colonial foi marcado pela pedagogia proveniente das

escolas jesuíticas. Embora houvesse uma sustentável homogeneidade na organização do sistema

jesuítico, o ensino ficou limitado à população local, uma vez que poucos foram aceitos pelas

ordens régias. 21 Até 1759, a Companhia de Jesus se estabeleceu como o principal agente da

educação, onde os colégios, seminários e universidades se tornaram focos de irradiação cultural.22

Após esta data, o Marquês de Pombal, iniciou uma fase de reformas

educacionais, que tinham o objetivo de responsabilizar o Estado sobre a instrução escolar,

trazendo um modelo educacional que visava medidas pragmáticas do conhecimento científico. As

Reformas Pombalinas, um dos exemplos da ilustração portuguesa, ocorreram a partir de uma

série de medidas políticas a fim de reorganizar as finanças e as responsabilidades do Estado

Português, mas como um traço da ilustração lusa, se configura como um momento que oscila

entre a modernização das idéias e a repressão à liberdade de expressão. 23

Entre a expulsão dos jesuítas, marcada a partir de 1759 e a vinda da corte para o

Brasil em 1808, temos um período de tentativas de implementação de um novo “sistema

educacional”, angariado pelas iniciativas pombalinas. Reformas na Universidade de Coimbra, e a

introdução de Aulas Régias na colônia – “destinadas ao ensino das primeiras letras, de Gramática

Latina, de Filosofia e de Grego” 24 – aliadas a abertura de cadeiras de ensino de Engenharia,

Geometria prática, Aritmética, Francês, Desenho e Instrução Primária não produziram os efeitos

21

AZEVEDO, F. A Transmissão da Cultura. São Paulo: Melhoramentos, 1976. P. 61.

22

VILLALTA, L. C. “O que se Fala e o que se Lê: Língua, Instrução e Leitura”. In: História da Vida Privada no

Brasil. VI. São Paulo: Cia das Letras, 1999. P. 349. 23

SCHWARCZ, L. M. A Longa Viagem da Biblioteca dos Reis: Do Terremoto de Lisboa a Independência do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. P. 100.

24

(26)

desejados. Enfim, houve uma redução no número de escolas e não adaptação ao novo “sistema”,

demonstrado pelas queixas de professores e alunos. 25

A pedagogia jesuítica, conhecida pelo Ratio Studiorum, possuía como uma de

suas prerrogativas mais importantes, a formação da criança pautada numa vigilância constante, e

rigoroso isolamento do mundo exterior, educando através de um ambiente dissociado da

realidade, encerrando o aluno em um mundo ideal. O Latim, a História das Antiguidades e um

conjunto de regras, gestavam o tempo e o espaço escolar, racionalizavam os estudos e formavam

os alunos semelhantes uns aos outros.26

A educação jesuítica se desenrola no contexto da modernidade, em que há um

rompimento com os padrões feudais, que constituiram uma sociedade centralizada e com o poder

regido pelas mãos do monarca. Neste sentido, educação recebe renovada importância, pois

concentra a legitimação de conhecimentos e comportamentos

que se articula em torno da didática, da racionalidade da aprendizagem dos diversos saberes, e em torno da disciplina, da conformação programada e das práticas repressivas (...) Com a instituição do colégio... terá início um processo de reorganização disciplinar da escola e de racionalização e controle de ensino, através da elaboração de métodos de ensino/educação... 27

No estado português a instituição da prática pedagógica das escolas jesuíticas,

revela a aproximação entre o “saber” e o “poder” e as articulações com a “fé” e o “Estado”. A

aplicação do modelo jesuítico educacional correspondeu, até certo momento, à política colonial,

mas, sobretudo, suas práticas vinculam-se ao período turbulento da Contra Reforma, que fez com

que padres se engajassem neste movimento. A escola torna-se elemento eficaz para a organização

25

NISKIER, loc. cit.

26

BOTO, op. cit., p. 50

27

(27)

social e conformação dos comportamentos sociais em prol do controle social e da instauração de

lugares santificados. 28

Em Portugal, durante praticamente duzentos e vinte anos, a prática da

pedagogia jesuítica nas instituições educacionais tornou-se exclusivo. Estabelecimentos de ensino

e universidades – o enfraquecimento da Universidade de Coimbra, a emergência da Universidade

de Évora, o Colégio das Artes – e toda a instrução superior e secundária ficaram aos cuidados da

Companhia de Jesus com aval do Estado, constituindo a ordem através da disseminação do

ensino em nível nacional.29

As discussões concernentes aos ideais iluministas fornecem uma crítica sobre a

prática pedagógica das instituições jesuíticas e passam a valorizar a infância como uma etapa

específica da condição humana - o ser infantil como o “homem do amanhã” – e a pensar uma

política desvinculada das pressões exercidas pelos poderes religiosos. Educação e política, neste

sentido, formariam estruturas complementares para a transformação do ser social, visando à

formação laica da sociedade, que não pese sobre o “bom cristão”, mas sobre o cidadão, sujeito e

agente social. Para Jean Jacques Rousseau, um dos pensadores do século XVIII que lançou

críticas aos jesuítas, “não se trata mais de ensinar-lhes as ciências, mas de dar-lhe o gosto para

amá-las e os métodos para apreendê-las. Esse é com certeza um princípio fundamental de toda a

boa educação”. 30

28

NEVES, Luiz Felipe. O Combate dos Soldados de Cristo na Terra dos Papagaios: Colonialismo e Repressão

Cultural. Rio de Janeiro: Forense-Universitária. 1978. P. 27-28. 29

De acordo com D. Antonio Costa a introdução da Companhia de Jesus data do ano de 1540. Em 1555 colégio das artes com a direção de todas as escolas de humanidades foi entregue por D. João III aos jesuítas. Contra a Universidade de Coimbra ergue-se em 1559 a Universidade de Évora. Tal “dominação” instalou o ensino em nível nacional, abrangendo as classes populares e abastadas “abrangendo todo o ciclo da instrução”. COSTA, D. A. “Os Jesuítas”. In: História da Educação Popular em Portugal. Porto: Editor Antonio Figueirinhas, 1900. P. 75-127.

30

ROUSSEAU, apud Boto, C. A Escola do Homem Novo: Entre o Iluminismo e a Revolução Francesa. São Paulo: Ed. UNESP, 1996. P. 29.

(28)

Seguindo o debate iluminista, a instrução, funcionaria como “escultor” desta

nova sociedade. Cabe ao “povo” gerir e proteger a “Nação”, e à escola é transferida a tarefa de

legitimar este processo de adesão ao Estado, a fim de formar uma sociedade calcada nos

princípios patrióticos, ou seja, na formação de homens que saibam lutar pela liberdade e a

felicidade de sua pátria:

O tema da Educação passa então a ser discutido sob a lógica de um controle estatal, regulador... trata-se da adequação do modelo escolar... para os interesses dos Estados Nacionais em vias de fortalecimento. 31

Verificando a trajetória da Educação nos países europeus, com o surgimento de novas abordagens

sobre a pedagogia, decorrente das profundas transformações deste período, percebe-se que a

educação se torna o centro da vida social. Nela se organizam os processos de conformação das

normas coletivas, se opera a continuidade da cultura, onde os indivíduos superam sua

individualidade e se integram à coletividade, e recebem instrumentos que conferem o dinamismo

de suas ações para a resolução dos problemas vivenciados na sociedade. 32

A reflexão sobre os caminhos da história da educação moderna e

contemporânea, pela análise da ruptura da educação em relação ao tradicionalismo das

instituições educativas da Idade Média, ajuda a compreender a própria mudança engendrada no

seio das pedagogias aplicadas na Europa. A modernidade significa uma abertura para novos

parâmetros e transformações radicais, em que se observa o “nascimento e desenvolvimento de

um sistema organizativo social que tem como eixo o indivíduo”. E as idéias pedagógicas que vão

surgindo em decorrência das transformações estão estritamente ligadas com a “eficiência do

trabalho e o controle social”. 33

31

BOTO, op. cit., p. 51.

32

CAMBI, loc. cit.

33

(29)

Assim, deslocamos o foco das Revoluções Intelectuais que estão acontecendo

na Europa, para Portugal, passamos a refletir sobre os aspectos do Iluminismo português e suas

implicações sobre a colônia americana. Uma série de autores envolvidos nas análises sobre o

reformismo ilustrado português ressaltam suas especificidades, suas características e

principalmente a sua forma de organização através da acomodação dos ideais iluministas vindos

do restante da Europa com o absolutismo português.

O reformismo ilustrado luso brasileiro, de acordo com a análise de Fernando

Novais, caracteriza-se pela importação das idéias, na tentativa de superação do atraso intelectual

em relação à Europa; possui caráter moderado em que visa à integração da tradição com as

inovações, tanto no plano político, com a manutenção da monarquia, quanto no plano econômico,

através da “modernização” da administração mercantilista. Destaca-se o ecletismo na adoção das

idéias e um ajuste dos esquemas teóricos importados e o pragmatismo através da sua implantação

na conjuntura política portuguesa. 34

Todo este processo do reformismo ilustrado português, segundo o autor,

efetivou o caráter laico da instrução, pela crença na cientificidade e na razão, estimulando a

produção intelectual, o contato com instituições do Velho Mundo, a criação de Academias, como

a Academia Real das Ciências de Lisboa, a reforma na Universidade de Coimbra e organização

de museus e bibliotecas. Providências que visavam à propagação das luzes:

Aos intelectuais - os “filósofos” – cumpria investigar a realidade, com as luzes da razão; aos agentes do poder (ministros educados no poder soberano) implantar as

34

Na tentativa de conter o atraso político, econômico e intelectual de Portugal frente aos demais países europeus, Marques de pombal, em 1750, inicia as reformas ilustradas. As características acima apontadas indicam o “clima geral do movimento ilustrado”, decisivas para entender todo o processo que se inicia no século XVIII e culmina com a transferência da corte para a colônia americana. O estudo de todo este processo revela a continuidade do reformismo iniciado no reinado de D. José I, passando pelo reinado de D. Maria I e conseqüente regência de D. João. NOVAIS, op. cit., p. 106.

(30)

reformas: assim se dominaria a natureza e regeneraria a sociedade voltando a Idade do Ouro. 35

Francisco Falcon adverte, no entanto, sobre os problemas da historiografia com

relação à época de Pombal, que se torna um objeto construído e cristalizado numa tradição que

olha e interpreta o reformismo Ilustrado. A análise empregada pelo autor sobre a “face brasileira”

das reformas pombalinas, é cometida através do diálogo com a historiografia das reformas

pombalinas que ressaltaram quatro aspectos importantes:

1 – inventário... dos textos legais que consubstanciam as reformas a serem aplicadas à colônia; 2 – uma interpretação das práticas pombalinas do ponto de vista da retórica das autoridades da Metrópole; 3 – o freqüente desprezo pelas especificidades da colônia... pluralidade de ”espaços” e a diversidade dos “tempos”; 4 – o silêncio... a respeito da “recepção” das reformas no ambiente colonial...” 36

O panorama da situação do sistema educativo colonial e a análise das

transformações estruturais e organizacionais, nos campos políticos e econômicos, ocorridas pelo

objetivo de transformar os estudos e os métodos de ensino unem-se à tentativa de entender a

própria condição colonial. As reformas econômicas e a inserção do Brasil colonial na rota da

produção econômica levantam três aspectos: o fomento das práticas pombalinas administrativas

para a produção metropolitanas; o incremento do monopólio comercial e do pacto colonial; e a

questão monetária e fiscalista na arrecadação do ouro das minas do Brasil. 37 As reformas

políticas e administrativas e o empenho em modernizar a administração metropolitana fizeram

com que a colônia mais do que engatasse os rumos da administração, incrementasse os sistemas

de representação social e política no interior das províncias.

35

Ibidem. P. 107.

36

FALCON, Francisco Calazans. Pombal e o Brasil. In: TENGARRINHA, José (org). História de Portugal. São Paulo/ Bauru. UNERSP/EDUSC/Instituto Camões, 2000. P. 149-166. P. 149 e 150.

37

(31)

Lilia Moritz Schwarcz, disponibiliza um estudo sobre a trajetória da Biblioteca

Real desde o terremoto que assolou a cidade de Lisboa em Portugal até a independência do

Brasil. Nesta ampla reflexão encontram-se dados importantes sobre o caráter do Reformismo

Ilustrado português e suas limitações. Ao que tange a “era pombalina”, a autora afirma que com a

expulsão das ordens régias das colônias, tanto para o ensino primário quanto para o ensino

secundário, passou a se propagar uma educação nacional,

nas vilas e comarcas foram instituídos lugares de mestres de Literatura Latina, Retórica, Gramática Grega e também Língua Hebraica. ...já em 1761 foi criado em Lisboa o Colégio dos nobres, que tinha por objetivo proporcionar aos descendentes das famílias aristocráticas uma formação mais moderna, com novo elenco de matérias, afastado do modelo jesuítico. 38

priorizando a integração do indivíduo ao Estado, e a reforma da Universidade de Coimbra, no

qual são formados os homens letrados que atuariam na esfera pública brasileira após a

independência:

Também nesse ano são promulgados os novos estatutos da Universidade de Coimbra. A reforma pombalina na universidade foi bastante radical, tanto na definição de métodos de ensino e da filosofia que regeria a instituição. Afinal, a essência dessa renovação consistia na introdução de novo método que priorizava a observação e não a autoridade; sobrepunha a razão à fé. 39

Fernando de Azevedo demonstra a origem das Instituições escolares desde a

expulsão dos Jesuítas em 1759, perpassando pelas instituições que surgem no decorrer da estadia

da Corte portuguesa no Brasil até a Independência. O autor ressalta as influências das idéias

européias nas revoltas que configuraram este período, o papel da imprensa régia, das bibliotecas

criadas durante a permanência da família real e dos cursos fundados. Este tipo de análise ajuda a

perceber a ação da educação, e a sua presença mesmo em momentos de indefinições e a

38

SCHWARCZ, Lilia Moritz. A Longa Viagem da Biblioteca dos Reis: do Terremoto de Lisboa à Independência do

Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. P. 105. 39

(32)

continuidade das ações educativas nos períodos posteriores, que neste caso encerra a nossa

análise. 40

Porém destacam-se algumas críticas quanto à forma escolhida por Azevedo ao

delinear o panorama educacional do Brasil desde a colonização. Neste sentido, Marta Maria

Chagas de Carvalho, ao escrever sobre a “configuração da historiografia educacional brasileira”,

retoma os escritos de Azevedo e ressalta as concepções da corrente educacional escolanovista, do

qual os autores em que escrevem no período em que Azevedo tece a sua análise buscam

consolidar no campo educacional a organização da cultura educacional brasileira. Na análise da

autora, as representações articuladas em suas obras estruturam-se “monumentalmente como obra

de síntese” em que a “memória dos renovadores é erigida em conhecimento histórico.”41

Silvia Figuerôa também apresenta um estudo sobre a História das ciências na

América Latina. Sua análise visa à superação de uma visão científica somente européia, onde a

América Latina teria sido por muito tempo somente um objeto de interesse científico, deslocando

o olhar para os empreendimentos científicos que colaboraram com a implantação de instituições

que buscavam estudar as riquezas próprias da América, mais precisamente do Brasil:

O eurocentrismo historiográfico subjacente fazia que os esforços que se realizaram desde o século XIX para construir a história da América Latina estivessem apoiados em um quadro conceitual que, curiosamente, negava ex hipothesi a América Latina (...) Isto ilustra bem a marginalidade a que forma reduzidos os países que não tomaram parte da Revolução Científica e que, não obstante tiveram os últimos quatro séculos e meio um desenvolviment9 científico próprio e original, apoiado nos grandes avanços europeus emoldurado por eles. 42

40

AZEVEDO, Fernando. A Transmissão da Cultura. São Paulo: Melhoramentos, 1976.

41

CARVALHO, Marta Maria C. de. A Configuração da Historiografia Educacional Brasileira. IN: FREITAS, Marcos Cezar de. Historiografia Brasileira em Perspectiva. São Paulo: Contexto, 2001. P. 331.

42

FIGUERÔA, Silvia (org). Um Olhar sobre o passado: História das Ciências na América Latina. Campinas,Sp: UNICAMP, 2000. P. 13-14.

(33)

Gilberto Luiz Alves em sua análise sobre o “pensamento burguês no Seminário

de Olinda”, retoma os ideais da Revolução Francesa, partindo do pressuposto que tal evento

correspondeu, “classicamente”, a uma ruptura de dois sócios do Antigo Regime, a nobreza e o

clero. Em sua obra, Alves procura pensar a formação de uma escola que tinha um projeto

pedagógico nitidamente burguês, pensado no interior da igreja católica, por um idealizador muito

diferente do livre pensador francês. O seminário de Olinda, sediado na província de Pernambuco,

nasceu em terras coloniais e fez parte da singularidade do pensamento ilustrado português. 43

Com a independência do Brasil, com a formulação da constituição, com os

debates travados no campo político entre parlamentares do Império, representantes de suas

províncias e cidades, e com as formulações de Leis, Decretos e Decisões de Governo que incidem

diretamente na promoção da instrução pública aos habitantes do Brasil, estaria à educação

evocando um sentido mais amplo para a sua aplicação? Ou seja, as aulas mútuas, as cadeiras de

ensino, as instituições militares, os gestos cívicos, as festas nacionais, os feriados nacionais e

todos os atributos pedagógicos, poderiam ser utilizados para a eficácia da consolidação da adesão

do “povo brasileiro” à sua Nação?

O processo educacional que se desenrola desde a segunda metade do século

XVIII em Portugal, nos indica algumas possibilidades para entender a Educação no Brasil no

início do século XIX. A partir do reformismo ilustrado português, período que em boa parte foi

marcado pela administração do Marquês de Pombal, reconhecemos algumas especificidades e

manifestações na “face brasileira”, caracterizadas pelas reformas econômicas,

43

ALVES, Gilberto Luis. O Pensamento Burguês no Seminário de Olinda 1800-1836. Campo Grande, Ms: Autores Associados, 2001.

(34)

administrativas, culturais e educacionais. 44 O caráter de importação e o descompasso entre a

“teoria” e a “prática” ao lado do pragmatismo e do caráter moderado da ilustração portuguesa

incidem diretamente sobre a sua colônia e mais para frente terá incidência sobre a própria

trajetória da independência do Brasil. 45

A historiografia que verifica as ações do pensamento ilustrado no Brasil,

acompanha as mudanças que ocorrem no período empreendido pelas reformas pombalinas. Mas é

justo não fazer do reformismo ilustrado português uma teia que desenrolada tece somente o fio

demarcado pelas ações de um homem: o Marquês de Pombal. É inegável a sua participação que

cooperaram para uma modernização e transformação dos setores administrativos de Portugal e do

Brasil, mas

As reformas Pombalinas foram, muito mais um denominador comum de opiniões do que a expressão de uma vontade única, que impusesse, de cima para baixo, intransigentemente, feita e acabada. (...) Pretenderam alguns historiadores ver na época de Pombal um esforço de renovação cultural e política, situado historicamente entre um período de obscurantismo beato e de reação policial... A administração pombalina seria... um intervalo iluminado da história portuguesa...46

O Reformismo Ilustrado Português foi uma época marcada pela adoção de

idéias modernizantes e reformadoras e em contrapartida segue na manutenção de setores

tradicionais. Desta forma, o discurso reformista priorizava a união “natural” entre Portugal e

Brasil, em detrimento aos outros Estados Nacionais, que, segundo este discurso, criou um vínculo

“artificial” entre a metrópole e suas possessões, e se rompe na luta pela independência de seus

domínios coloniais. A união entre Portugal e Brasil, desta forma, se deve pela posição geográfica

44

FALCON, op. cit., p. 14.

45

NOVAIS, op.cit., p. 105.

46

(35)

do Estado português na Europa, mas como sabemos, ela é produto da própria história da

colonização. 47

No setor educacional, entretanto, as reformas foram empreendidas no sentido de

uma transformação das práticas educacionais, tendo como momento decisivo à expulsão dos

jesuítas, com a regularização e a organização do sistema. As reformas ocorrem na adoção de

currículos e métodos pedagógicos de acordo com os valores modernos e ilustrados. Desde 1759,

foram abolidas as escolas jesuíticas estabelecendo-se nas “Aulas e Estudos das Letras uma Geral

Reforma”. Em 1772, seguiu-se a reforma na Universidade de Coimbra, “traduzindo um esforço

de integração da ideologia iluminista na vida intelectual portuguesa do século XVIII”. 48

Mas as reformas nos setores educativos tinham o objetivo de afastar o poder

eclesiástico das instituições educacionais, escolas e universidades, criadas e mantidas pelas

instituições religiosas juntamente com o apoio dos setores políticos da sociedade portuguesa nos

séculos anteriores. Com a substituição do sistema educativo vigente e arraigado, com estruturas

importantes que se consolidaram até o período pombalino num “autêntico monopólio da

instrução secundária”, as reformas priorizaram a introdução do pensamento moderno,

representado pelo reflexo das idéias iluministas que pulsavam pela Europa, como a introdução da

filosofia moderna e das ciências da natureza. 49

Com a retirada das instituições educacionais administradas pelos jesuítas,

principalmente com a expulsão da Companhia de Jesus, o ensino vivenciou um período de crise e

sucessão de fracassos, angariados pela falta de pessoal especializado, desmantelando o ensino e a

sua organização em Portugal e no Brasil. Editais e alvarás foram expedidos para remediar a

47

FALCON. op. cit., p. 111-115-116.

48

CARVALHO. op. cit., p. 172.

49

(36)

situação provocada pela extinção da pedagogia jesuítica dos currículos nacionais e coloniais.

Aulas régias foram introduzidas, mas não produziram os mesmos efeitos das escolas

administradas pelas instituições eclesiásticas. Contudo, as reformas colaboraram com a

reformulação dos estatutos da Universidade de Coimbra, orientadas pelas idéias da ilustração

européia, e assim, houve uma valorização das ciências naturais, a implantação de faculdades,

adoção do método experimental na medicina e a impressão da história e da hermenêutica nas

faculdades de Teologia, Cânones e Leis. 50 Além do avanço dos cursos jurídicos no direito

natural, história do direito romano e pátrio, civil e canônico , numa atitude de valorização dos

princípios racionais do direito e sua história. 51

Porém, ressalta a historiografia tradicional que após o embate travado pelo

Marquês de Pombal às ordens régias, a instrução ficou deficiente pois

Entre a expulsão dos jesuítas em 1759 e a transplantação da corte para o Brasil em 1808, abriu-se um parênteses de quase meio século, um largo hiatos que se caracteriza pela desorganização e decadência do ensino colonial. Nenhuma organização institucional veio, de fato, substituir a poderosa homogeneidade do sistema jesuítico, edificado em todo o litoral latifundiário, com ramificações pelas matas e pelo planalto, e cujos colégios e seminários foram, na colônia os grandes focos de irradiação da cultura. 52

Mas o que aqui encontramos é a tentativa de demonstrar a grande obra de desagregação

infringida pelo Marquês, que anulou o intento de unificação da cultura nacional e de todo o

sistema educacional jesuítico. 53

Desde a segunda metade do século XVIII, Portugal e Brasil estão sofrendo

transformações importantes, no sentido de racionalizar e melhorar a situação da metrópole lusa,

fortalecendo os laços administrativos da colônia portuguesa. Após a saída de Pombal do poder -

que como ministro de Estado, instalou políticas de limitação do alcance da nobreza, tendo como

50

Idem.

51

CARVALHO, op. cit., p. 179.

52

AZEVEDO, op. cit., p. 61.

53

(37)

base uma política repressiva, cujo objetivo foi à domesticação e o domínio dos representantes

nobres da sociedade portuguesa; expulsou os jesuítas, que se configuraram durantes os anos de

sua permanência, como uma ordem praticamente independente no reino, chegaram a ser os

confessores da Família Real e educadores dos príncipes; estabeleceu durante vinte e dois anos

uma “ditadura”, determinando prisões sem uma acusação específica, contra os que se colocavam

em oposição ao governo pombalino 54 – não houve uma política que favorecesse uma ruptura aos

tempos de Pombal. A política de D. Maria I se impunha pela oposição às práticas pombalinas, no

entanto, foram dados novos incentivos para os estudos sobre a colônia brasileira, no sentido de

favorecer as análises mais pragmáticas da natureza das colônias, racionalizar a administração

para gerar cada vez mais lucros, sem abrir mão do exclusivo colonial.” 55

Neste processo de “implementação do programa reformista”, Portugal

enfrenta um momento grave para a manutenção de sua soberania e preservação da Monarquia.

Com o efeito das pressões externas – o bloqueio continental francês, que exigia a adesão dos

países europeus contra a Inglaterra, a dependência econômica de Portugal em relação à Inglaterra

- o reino lusitano precisou unir esforços para encontrar uma saída que garanta tanto a manutenção

de seus domínios coloniais e a sua coroa. 56

O discurso da ilustração portuguesa, sempre se pautou pela preservação da

unidade entre o império e a colônia, numa relação de parceria recíproca para a defesa de

interesses comuns. Neste sentido a transferência da corte para o Brasil, solução encontrada pelos

intelectuais e estadistas da época, após muitas discussões que retomariam o mito do quinto

54

BOXER, Charles R. A Ditadura Pombalina e suas conseqüências (1875-1825). In: O Império Marítimo Português

(1415-1825). Tradução: A. O. B. Barreto. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. P. 190-245. 55

SCHWARCZ, op. cit., p. 164.

56

(38)

império57, formulado pelo padre Antônio Vieira58, significou uma mudança nos planos do

reformismo, expresso principalmente pela veiculação do termo “novo império”, que significou

uma estruturação do Império e a renovação da imagem da monarquia portuguesa.59

Contudo apesar do “hiato”, vazio educacional, apontado pela historiografia, o

que presenciamos através da documentação foi que a partir de 1759, houve a propagação de aulas

régias 60, a fundação de sociedades literárias, e a conseqüente secularização do ensino. Entretanto,

não podemos afirmar que as tentativas de Pombal firmaram uma substituição do sistema erigido

pelos clérigos, pois como todos os aspectos que cercavam a instrução, tanto em Portugal quanto

no Brasil, estavam a cabo das instituições jesuíticas, havia um grande obstáculo a ser vencido:

a ausência de um elemento indispensável à realização de seus grandes desígnos. Não existia nem em Portugal , nem em seus domínios, um número suficientemente grande de pessoas seculares aptas para o ensino primário e, muitas vezes, nem mesmo para o ensino elementar. 61

Educação e política como podemos rapidamente visualizar constituem duas

instâncias que interagem o tempo todo para a conformação dos interesses da manutenção do

57

“Quinto império do Mundo Esperança de Portugal”. Assim seria chamado na formulação do Pe. Antônio Vieira, em relação aos impérios egípcio, assírio, persa, e romano.

58

“Como há de ser Portugal um tão grande império, posto que tem como já vindo todo o reino que era (...) um novo império, ao qual pelas razões que se verão a seu tempo, chamamos de quinto” “Porque a melhor parte dos venturosos futuros que se esperam e a mais gloriosa deles será não só a própria nação portuguesa, senão única singularmente sua...por ser o centro, o princípio e fim destas maravilhas e instrumento prodigioso delas, os portugueses aqueles que ergueriam o Quinto Império.” Fala de um dos conselheiros do regente D. João que retoma o a crença mistificadora do Padre Vieira, demonstrando a existência de uma identidade gloriosa portuguesa. Vieira, Antônio apud LYRA, op. cit. p. 120.

59

Maria de Lourdes Viana Lyra ainda ressalta a importância de se entender a transferência do corte portuguesa para o Brasil não como um fato que desencadeia “naturalmente” todo o processo da independência da colônia americana. É necessário entender as particularidades deste processo histórico que configura a formação do Estado brasileiro. “A ênfase acentuada aos recursos da colônia que passava imediatamente nomeada de Império, nos instiga ao alargamento da investigação para a melhor entender a dimensão histórica, seja das conseqüências da transferência da metrópole para o Rio de Janeiro, seja da concepção do império do Brasil.” Idem, P. 116.

60

As aulas régias constituíam os ramos do ensino primário e secundário, conhecidos como Estudos Menores e primeiros Estudos. Os dois níveis correspondiam à formação básica dos alunos, como o aprendizado da leitura, escrita e contas, conhecidas como as Primeiras Letras e aulas de humanidade, com as cadeiras de gramática latina, língua hebraica, retórica, poética, filosofia moral e racional. CARDOSO, Tereza Fachada Levy. As Aulas Régias no Brasil. In: STEPHANOU, Maria & BASTOS, Maria Helena Câmara. Histórias e Memórias da Educação do no

Brasil. Séculos XVI-XVIII. Petrópolis, Rio de Janeiro, 2004. P. 182. 61

ALMEIDA, José Ricardo Pires de. Instrução Pública no Brasil (1500 – 1889). Tradução: Antônio Chizzotti. São Paulo: EDUC, 2000. P. 29.

(39)

corpo político português através da formação dos quadros administrativos do reino, pelas cadeiras

de ensino técnico e superior, e da instrução pública, como via de sedimentação dos laços

sentimentais que unem o cidadão à sua pátria.

2.2 O SENTIDO DA INDEPENDÊNCIA DO BRASIL: A HISTORIOGRAFIA TRADICIONAL E OS

NOVOS RUMOS PARA A ANÁLISE SOBRE O PRIMEIRO REINADO

A historiografia, por muito tempo ligou o processo de independência à

instalação da corte no Brasil. Autores afirmavam que com a transferência havia se instaurado

praticamente o processo de formação do Estado brasileiro em vias de sua emancipação política. É

claro que se deve levar em conta as singularidades deste processo, em que a transferência da corte

torna-se um dos fatores que colaboraram no processo de independência do Brasil, todavia, é

mister a atenção para os diversos acontecimentos e o contexto histórico no interior da própria

colônia.

A permanência da corte portuguesa no Reino do Brasil, durante a primeira

década do século XIX, modificou as bases das estruturas sociais e políticas, pelo aparelhamento

administrativo e a abertura dos portos às “Nações amigas”, que trouxeram novos ares à

economia, com a quebra do pacto colonial. A tarefa da corte portuguesa era criar um Estado,

através da organização burocrática, instituindo as estruturas administrativas e econômicas. 62

Ministérios foram implementados pelo estadista D. Rodrigo de Souza

Coutinho, no sentido de reproduzir a estrutura administrativa portuguesa no Brasil. Foram

implementados os ministérios da Guerra, Estrangeiros, Marinha e Fazenda; também o

62

FAORO, Raimundo. Os Donos do Poder Formação do Patronato Político Brasileiro. São Paulo: Globo; Pubifolha, 2000.

Referências

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