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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP RENAN DE CARVALHO PINTO MOY

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

RENAN DE CARVALHO PINTO MOY

O panorama do debate conceitual em torno dos

indicadores de desenvolvimento sustentável

MESTRADO EM ECONOMIA POLÍTICA

São Paulo

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

RENAN DE CARVALHO PINTO MOY

O panorama do debate conceitual em torno dos

indicadores de desenvolvimento sustentável

MESTRADO EM ECONOMIA POLÍTICA

São Paulo

2011

(3)

BANCA EXAMINADORA 

______________

______________

(4)

Dedico este trabalho

À minha família, pelo carinho e apoio de sempre.

(5)

Em relação a todos os atos de iniciativa e de criação, existe uma verdade fundamental cujo desconhecimento mata inúmeras idéias e planos esplêndidos: a de que no momento em que nos comprometemos definitivamente, a providência move-se também. Toda uma corrente de acontecimentos brota da decisão, fazendo surgir a nosso favor toda sorte de incidentes e encontros e assistência material que nenhum homem sonharia que viesse em sua direção. O que quer que você possa fazer ou sonhe que possa, faça. Coragem contém genialidade, poder e magia. Comece agora.

(6)

AGRADECIMENTOS

Agradeço, em primeiro lugar, à minha família. Especialmente à minha mãe, ao meu pai e ao Luiz, pelo amor e pelo incentivo. Aos meus irmãos, especialmente João e Diva, pela paciência e pelo apoio.

Ao Prof. João Machado Borges Neto, por sua dedicação cuidadosa. O seu estímulo intelectual e as suas contribuições foram essenciais para a finalização deste trabalho.

A todos os professores do programa de pós-graduação que contribuíram na minha formação. Especialmente ao professor Ladislau, que me incentivou e me ajudou ao longo desta jornada, e à professora Rosa, por seus ensinamentos e por sua atenção carinhosa.

Aos funcionários da PUC e, em especial, à querida Sônia que me acolheu nesta instituição.

À CAPES pelo apoio financeiro.

Aos amigos de longe e de perto, os antigos e os novos. Aos amigos da PUC, particularmente Adalberto Silva, Camila Ugino, Marcelo Depieri e Patrick Andrade, meu agradecimento especial pelas longas discussões e pelas experiências compartilhadas durante o curso de mestrado.

À Laiz Leão, pela companhia e pelo incentivo na fase final.

(7)

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo analisar o debate atual realizado em torno dos indicadores de desenvolvimento sustentável. O debate teve início a partir do final da década de 60 e início da década de 70, quando diversos artigos destacando os problemas do crescimento econômico começaram a aparecer com maior destaque. A crítica ao crescimento descuidado levou a ataques contra o seu principal indicador, o Produto Interno Bruto. Tanto impactos negativos no bem-estar atual, como problemas ambientais futuros, foram levantados. No entanto, somente quase 20 anos depois é que o debate retomou com força, juntamente com várias propostas de indicadores de progresso alternativos. A apresentação da discussão será estruturada em quatro partes, sendo o primeiro capítulo dedicado a analisar o debate sobre as diferentes abordagens da ideia de desenvolvimento sustentável. No segundo capítulo será apresentado um breve histórico do debate sobre os indicadores de progresso. Além disso, será aprofundada a discussão sobre os problemas do PIB e as possíveis soluções para a medição do bem-estar econômico. Finalmente, o terceiro e quarto capítulos apresentam a discussão realizada em torno dos indicadores de qualidade de vida e de sustentabilidade, respectivamente. Dado o grande abismo metodológico entre as diferentes linhas de estudo do desenvolvimento sustentável, assim como os desafios significativos em termos metodológicos no desenvolvimento de indicadores, conclui-se que um possível consenso, embora importante, está longe de ser conquistado.

(8)

ABSTRACT

This study aims to analyze the current debate held on indicators of sustainable development. The debate began at the end of the 60s and early 70s, when several articles highlighting the problems of economic growth began to appear with more emphasis. The criticism about careless growth also led to attacks against its main indicator, the Gross Domestic Product. Both negative impacts on current welfare and future environmental problems were raised. However, only almost 20 years later the debate returned emphatically, along with several proposals for alternative progress indicators. The presentation of the discussion will be structured in four parts, the first chapter dedicated to examining the debate over different approaches to the idea of sustainable development. The second chapter contains a brief history of the debate on progress indicators. Also, the problems of GDP and the possible solutions for the measurement of economic welfare will be further discussed. Finally, the third and fourth chapters present the discussion held on indicators of quality of life and sustainability, respectively. Given the large methodological differences between the lines of study of sustainable development, as well as significant challenges in terms of methodology in the development of indicators, it appears that a consensus, while important, is far from being conquered.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

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LISTA DE TABELAS

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANS Adjusted Net Savings

CEO Chief Executive Officer

EF Ecological Footprint

EPI Environmental Performance Index

ESI Environmental Sustainability Index

FIB Felicidade Interna Bruta

IDH Índice de Desenvolvimento Humano

IISD International Institute for Sustainable Development

INSEE Institut National de la Statistique et des Études Économiques

IRBEM Indicadores de Referência de Bem-Estar no Município

ISEW Index of Sustainable Economic Welfare

ISS Índice de Saúde Social

JCCI Jacksonville Community Council Inc.

MEW Measure of Economic Welfare

NBER National Bureau of Economic Research

OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico

ONU Organização das Nações Unidas

PIB Produto Interno Bruto

PIL Produto Interno Líquido

PNL Produto Nacional Líquido

RDH Relatório de Desenvolvimento Humano

SEEA System of Integrated Environmental and Economic Accounting

SMEW Sustainable Measure of Economic Welfare

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SS Strong Sustainability

WCED World Commission on Environment and Development

WTP Willingness-to-pay

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...1

1. INSTRUMENTAL, CONCEPÇÕES E DESDOBRAMENTOS: UMA COMPARAÇÃO DAS DIFERENTES ABORDAGENS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL...3

1.1 Introdução...3

1.2 As diferenças instrumentais entre as duas teorias...4

1.3 A evolução das concepções básicas...15

1.3.1 Valor e riqueza: qual a relação?...15

1.3.2 A Economia do Bem-Estar: a satisfação como fim...20

1.3.3 Eficiência e bem-estar: um novo propósito para a economia...22

1.4 Sustentabilidade e o problema ambiental...26

1.5 Crescimento vs Desenvolvimento...31

1.5.1 Crescimento Econômico...31

1.5.2 Desenvolvimento Sustentável...33

1.5.3 Capacidades...35

1.6 Conclusão...38

2. INDICADORES: UM POUCO DE HISTÓRIA E A SITUAÇÃO DO PIB NO DEBATE...40

2.1 Introdução...40

2.2 Breve Histórico...41

2.3 PIB: de fluxo de mercadorias a bem-estar...50

2.3.1 Mudanças de qualidade e impacto tecnológico...55

2.3.2 O papel do valor e dos preços como medida de preferências...56

2.3.3 Despesas defensivas...58

2.3.4 O problema das imputações...58

2.4 Medindo o bem-estar econômico...61

2.4.1 Enfatizar outros indicadores já estabelecidos ao invés do PIB...62

2.4.2 Enfatizar a visão do domicílio...64

2.4.3 Considerar aspectos distributivos...65

(14)

2.4.5 Considerar atividades não previstas nas contas nacionais e reconsiderar

atividades já existentes...68

2.5 Conclusão...73

3. INDICADORES DE QUALIDADE DE VIDA...76

3.1 Introdução...76

3.2 Bem-Estar Subjetivo...78

3.3 Capacidades...84

3.4 Bem-estar Econômico...88

3.5 Comentários em relação às três abordagens...90

3.6 Assuntos transversais...92

3.6.1 Desigualdade...92

3.6.2 Vínculos entre as dimensões...94

3.6.3 Agregando as dimensões...96

3.7 Conclusão...100

4. INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE...103

4.1 Introdução...103

4.2 Dashboards...103

4.3 Índices compostos...105

4.4 PIB ajustado...106

4.5 Poupança ajustada líquida e a visão de estoque da sustentabilidade...107

4.6 Indicadores físicos...110

4.7 O conflito entre índices sintéticos e indicadores multidimensionais...113

4.8 O conceito de riqueza e bem-estar intertemporal...115

4.8.1 Incertezas comportamentais e técnicas...116

4.8.2 Incertezas normativas: sustentabilidade de quem e do que?...118

4.9 Questões transnacionais...119

4.1 Conclusão...122

CONSIDERAÇÕES FINAIS...127

(15)

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo compreender a situação do debate que ocorre em torno dos indicadores de desenvolvimento sustentável, tema que tem ganhado cada vez mais importância, especialmente a partir de década de 80, após a legitimação da ideia de desenvolvimento sustentável.

No entanto, a ideia do desenvolvimento “que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras de atenderem as suas próprias necessidades” (WCED, 1987) foi recebida por públicos com base teórica diversificada, o que acabou por gerar diferentes concepções do que seria desenvolvimento sustentável.

Enquanto os adeptos da teoria econômica neoclássica têm compreendido esta ideia como “manter padrão de vida ao longo do tempo”, em que padrão de vida se resume a capacidade de consumir em termos de valores monetários, os estudiosos da chamada Economia Ecológica entenderam que o conceito trata de um princípio ético que envolve, entre outras coisas, preservar elementos específicos do meio ambiente. O que está por trás é um entendimento muito diferente do significado de desenvolvimento, e de como ele se dá. Por isso, o primeiro capítulo foca exatamente nas origens da discrepância das concepções de desenvolvimento sustentável da teoria neoclássica com aquelas vindas da Economia Ecológica. Veremos que os diferentes arcabouços metodológicos que envolvem estas duas correntes impactarão na compreensão do conceito.

Desde o final da década de 60, diversos trabalhos destacavam o problema de focar no crescimento sem levar em consideração os impactos que ele causava em fatores que não estavam presentes no mercado. A literatura acabou por designar esta conseqüência de externalidades, e envolvia tantos aspectos do bem-estar atual como impactos ambientais que gerariam problemas futuros.

(16)

Os efeitos destas críticas acabaram por gerar esforços em dois caminhos diferentes: enquanto alguns têm buscado formas de “consertar” o PIB, por meio da revisão da forma de cálculo e adição de imputações que visam aproximar o PIB de um retrato mais real do bem-estar econômico, outros têm direcionado esforços para o desenvolvimento de indicadores alternativos. O mais famoso deles atualmente, o Índice de Desenvolvimento Humano, foi apresentado no primeiro Relatório de Desenvolvimento Humano, em 1990.

O segundo capítulo, que no início apresenta um breve histórico sobre o desenvolvimento de novos indicadores, foca essencialmente no primeiro caminho seguido, ou seja, nos ajustes no PIB que visam aproximá-lo de uma medida de bem-estar econômico. Os novos indicadores são tema do terceiro e quarto capítulos, sendo o terceiro dedicado a indicadores de bem-estar ou qualidade de vida, e o quarto voltado a indicadores de sustentabilidade. Esta divisão se mostrou necessária porque, em primeiro lugar, pode haver indicadores muito diferentes para estas medidas. E em segundo lugar, conforme veremos, apesar de o desenvolvimento sustentável necessariamente requerer indicadores de qualidade de vida e de sustentabilidade, é recomendável que eles sejam acompanhados de forma separada, uma vez que elementos causadores de um maior bem-estar atual podem gerar problemas de sustentabilidade, e vice-versa.

É importante ressaltar que a pesquisa se concentrou mais nas discussões conceituais que no debate sobre o tratamento estatístico dado aos novos indicadores. Esta decisão foi tomada porque, apesar de relevante, uma pesquisa voltada aos diferentes métodos estatísticos iria requerer uma literatura bastante diferente daquela pretendida aqui.

(17)

1. INSTRUMENTAL, CONCEPÇÕES E DESDOBRAMENTOS: UMA COMPARAÇÃO DAS DIFERENTES ABORDAGENS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

1.1. Introdução

O objetivo deste capítulo é apresentar as concepções da vertente neoclássica da economia para riqueza, valor e bem-estar, e compará-las com a visão proposta pelos estudos do ecodesenvolvimento1, ou desenvolvimento sustentável, que normalmente são atribuídos à Economia Ecológica. Tal apresentação visa destacar como os diferentes entendimentos sobre essas concepções levam a uma compreensão dissonante do significado de desenvolvimento e das propostas para atingí-lo.

Para realizar este trabalho, será apresentado como as ideias de riqueza, valor e bem-estar se relacionam na economia neoclássica. Partiremos de autores da chamada Revolução Marginalista, a fim de demonstrar sua influência nos primeiros estudos da Economia do Bem-Estar. A compreensão desta dinâmica é importante porque a evolução desta linha teórica dentro da economia neoclássica, a Nova Economia do Bem-Estar, irá estabelecer os critérios de desejabilidade dos arranjos econômicos propostos para o desenvolvimento. Sua apresentação será seguida pela discussão das principais críticas a estes critérios, incluindo desde o argumento contrário à utilização do conceito de utilidade, uma das bases do pensamento neoclássico, até a rejeição da ideia de eficiência como o critério básico de desejabilidade.

A comparação das duas vertentes de pensamento segue com uma exposição da compreensão do significado de sustentabilidade, componente importante na discussão sobre o desenvolvimento sustentável. O objetivo é facilitar a exposição das posições antagônicas que essas duas linhas têm sobre o que é desenvolvimento e quais as formas de obtê-lo. Estas diferenças irão reverberar na discussão sobre os indicadores de desenvolvimento, tema do segundo capítulo.

      

1 O termo ecodesenvolvimento foi enunciado por Maurice Strong, secretário-geral da Conferência das

(18)

O fato de o estudo sobre desenvolvimento sustentável estar em seus estágios iniciais e, ainda, a Economia Ecológica se tratar de uma linha de estudo transdisciplinar, torna evidente que nem sempre há unanimidade de pontos de vista. Neste caso, buscou-se aprebuscou-sentar na análibuscou-se aqueles conceitos e ideias que aprebuscou-sentam maior grau de uniformidade e aceitação dentre os estudiosos desta linha.

As concepções de riqueza e bem-estar da economia neoclássica possuem uma importante relação com o que esta vertente entende por escopo do estudo da Economia, e o instrumental analítico e metodológico que este deve utilizar. Por isso, faz-se importante expor brevemente as ideias gerais sobre estes temas. É o que será feito a seguir.

1.2. As diferenças instrumentais entre as duas teorias

Marshall, um dos pioneiros da teoria neoclássica, anunciou o escopo do que viria a ser chamado de Economics. Ele definiu que Economia é uma parte do estudo do

homem, mais especificamente, o estudo que examina a “ação individual e social em seus aspectos mais estreitamente ligados à obtenção e ao uso dos elementos materiais do bem-estar” (MARSHALL, 1996, p.77). Assim, para o autor, a Economia deve focar nos elementos materiais do bem-estar, que por sua vez, estariam intimamente ligados com a riqueza. De certo, o estudo da Economia visa o aumento do bem-estar, mas somente aquele que é baseado em elementos materiais que, conforme veremos, são formados pelo conjunto de produtos reprodutíveis. Por que Marshall não considerou outros elementos causadores de bem-estar, principalmente aqueles decorrentes dos serviços da natureza?

(19)

Jevons, outro autor central da chamada revolução marginalista que deu origem à teoria neoclássica, defende que é a maximização do prazer o ponto central em torno do qual gira o estudo econômico:

O prazer e o sofrimento são indiscutivelmente o objeto último do cálculo da Economia. Satisfazer ao máximo as nossas necessidades com o mínimo de esforço — obter o máximo do desejável à custa do mínimo indesejável — ou, em outras palavras, maximizar o prazer, é o problema da Economia (JEVONS, 1996, p.69).

Numa outra passagem sobre o escopo da Economia, Jevons relaciona prazer e felicidade, como sendo sinônimos; maximizar o prazer significaria maximizar a felicidade. Conforme veremos, essa associação de felicidade e prazer e, posteriormente, como outros autores neoclássicos fazem, a relação de felicidade e prazer com bem-estar, é um ponto importante da crítica a essa teoria.

Finalmente, os teóricos desta vertente decidiram por utilizar um nome comum a este grupo de conceitos (felicidade, prazer, bem-estar) que a economia deve buscar maximizar: a utilidade. E diferentemente dos utilitaristas que os inspiraram, como Bentham, que se preocupavam com a utilidade total das coisas, os autores da Revolução Marginalista focaram no conceito de utilidade marginal, ou seja, nos acréscimos (ou decréscimos) de utilidade que cada escolha geraria.

Outro ponto importante é entender qual a forma central em que ocorrerá a discussão teórica. Neste ponto, Jevons (1996) é diz de forma direta que o fato de a ciência em questão trabalhar com quantidades faz com que ela deva ser uma ciência matemática. Para este autor, os conceitos importantes da economia, como prazer, sofrimento, trabalho, utilidade etc. são certamente passíveis de quantificação, mesmo que esta seja feita de forma indireta, como no caso do montante de prazer ou de sofrimento que nos induz a comprar e vender, trabalhar e repousar. Por meio dos efeitos quantitativos, poder-se-ia chegar aos montantes comparativos.

(20)

capaz de fazer previsões corretas, então ele é válido. Só teríamos problemas quando as premissas simplificadoras levam o modelo a dar resposta erradas sobre a questão que ele se propõe a resolver2.

Outra característica da teoria neoclássica é o fato de basear-se na análise do comportamento do indivíduo para resolver problemas (inclusive) de cunho social. Assim, as respostas de uma sociedade melhor vêm da análise do que é melhor para um indivíduo, pois acredita-se que “as formas gerais das leis da Economia são as mesmas no caso de indivíduos e nações; e, na realidade, é uma lei operando no caso de grande número de indivíduos que dá origem ao conjunto, representado nas transações de uma nação” (JEVONS, 1996, p.54).

Finalmente, era preciso determinar parâmetros de comportamento para os indivíduos, de forma que fosse possível encaixá-los nos modelos matemáticos. A teoria neoclássica parte da premissa que as pessoas agem de maneira racional e auto-interessada, visando sempre à maximização da utilidade. Apesar da ideia do indivíduo racional estar presente na teoria econômica muito antes do nascimento da teoria neoclássica, esta levou o conceito ao extremo ao assumir que as pessoas agem somente desta forma (SCREPANTI E ZAMAGNI, 1995). Sumarizando, a teoria neoclássica se calca em estudos que (1) maximizam a utilidade (2) do indivíduo que (3) age de forma racional e auto-interessada a partir do (4) uso de linguagem e de modelos matemáticos. Conforme veremos, os estudiosos do desenvolvimento sustentável pela linha da Economia Ecológica criticam estes quatro fundamentos.

Em seu livro Sobre Ética e Economia (1999), Sen se atém à crítica da caracterização do comportamento real que está contido no instrumental analítico que permite o uso de funções de utilidade. Para ele, tal caracterização passa pelo processo de (1) identificar o comportamento real como comportamento racional e (2) especificar a natureza do comportamento racional em termos muito restritos. Mesmo se as pessoas fossem realmente racionais, elas poderiam não se portar como tal, pois sabe-se que as pessoas frequentemente erram, experimentam, confundem-se e assim por diante: “Os tipos friamente racionais podem povoar nossos livros didáticos, mas o mundo é mais rico.” (SEN, 1999, p.27). Outro problema, para o autor, é que a suposta utilidade que aparece nas escolhas de um indivíduo não pode ser vinculada tão diretamente a algum

      

2 Tal ideia se encontra mais desenvolvida no artigo de Milton Friedman, “

(21)

sentido definido de forma independente (como satisfação de desejo ou felicidade). Não há nada que nos indique o que realmente está sendo maximizado.

Sen argumenta que é a posição de agente das pessoas que as levam a ter ações que não necessariamente visam maximizar seu bem-estar. Nesta posição, as pessoas consideram e respeitam sua capacidade de estabelecer objetivos, comprometimentos, valores etc. E só podemos considerar a ações do indivíduo quando este realiza seu papel de agente se rompemos “a camisa de força do auto-interesse” postulado pela teoria neoclássica3 (SEN, 1999). Indo mais além, principalmente quando consideramos que a condição de agente tem uma importância em si mesma, temos argumentos para rejeitar o comportamento auto-interessado, assim como quando consideramos abordagens éticas que dão ênfase aos direitos e liberdades.

A partir desta última crítica, o autor coloca a importância de considerar motivações éticas nas escolhas das pessoas. A teoria dominante, ao colocar a irracionalidade em tudo o que não é auto-interesse rejeita totalmente ações tomadas em função da ética.4 Conscientemente “não ética”, ela se desvirtuou historicamente de suas origens, quando fazia parte de um ramo da ética, tradição ligada a Aristóteles. A economia (a preocupação com a riqueza) era associada aos fins humanos, e a política era a “arte mestra” (SEN, 1999). Sen afirma que uma das questões cruciais e especialmente básica para a economia é “o problema da motivação humana ligado à questão amplamente ética “Como devemos viver?”” (SEN, 1999, p.19). Obviamente, isto não significa dizer que as pessoas sempre agirão em linha com o que defendem moralmente, mas apenas que as deliberações éticas devem ser levadas em consideração para o comportamento humano real.

Em relação à utilização da utilidade como eixo principal dos problemas econômicos, a literatura econômica fornece uma quantidade importante de críticas5. Veremos algumas delas com maior detalhe quando discorrermos sobre bem-estar, mas,

      

3 Para Sen, o papel de agente e a busca pelo bem-estar do indivíduo estão claramente relacionados, mas

não são a mesma coisa. Há uma relação de interdependência.

4 Evitando ser mal interpretado, Sen relativiza o papel da ética nas ações humanas, afirmando que “negar

que as pessoas sempre se comportam de modo exclusivamente auto-interessado não equivale a afirmar que elas sempre agem com altruísmo. Seria extraordinário o auto-interesse não ter um papel

importantíssimo em numerosas decisões e, de fato, as transações econômicas normais entrariam em colapso se o auto-interesse não desempenhasse um papel substancial em nossas escolhas... a verdadeira questão é se existe ou não uma pluralidade de motivações ou se unicamente o auto-interesse rege os seres

humanos” (SEN, 1999, p.35).

5 Uma das frentes mais recentes e, a meu ver, interessantes de crítica da utilidade e seus postulados vem

(22)

em linhas gerais, a crítica principal dos “economistas ecológicos” recai sobre a restrição imposta em se considerar apenas a utilidade objetivo final do cálculo econômico e esquecer-se, por exemplo, dos impactos que uma maximização de utilidade pode ter sobre o ecossistema, ou da importância de um arcabouço ético dentro do qual a economia se localiza. Por exemplo, Viveret (2006) defende que o fato de a economia (referindo-se à teoria neoclássica) rejeitar qualquer distinção moral causa um afastamento desta com a política (e assim, afastando-se das decisões normativas que ponderam sobre as boas e más ações), ao mesmo tempo que sujeita o mundo a sua própria lei, calcando-se apenas no indivíduo, no desejo e no comportamento racional a serviço desse desejo.

Dowbor (2010) cita Edward Wilson para reforçar a ideia de que a economia deve se sujeitar em última instância às questões éticas:

Como no caso de todas as grandes decisões, a questão é moral. A ciência e a tecnologia fazem parte do que podemos fazer; a moral é aquilo que concordamos que deveríamos ou não deveríamos fazer. A ética que é fonte das decisões morais é uma norma ou referência de comportamento que apóia um valor, e o valor por sua vez depende dos objetivos. Os objetivos, sejam pessoais ou globais, surgidos da consciência ou gravados em escrituras sagradas, expressam a imagem que temos de nós mesmos e da nossa sociedade. Em resumo, a ética evolui por passos, da auto-imagem para o objetivo, para valores, para preceitos éticos e raciocínio moral (WILSON apud DOWBOR, 2010,

p.75).

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[...] as primeiras formas de poluição industrial e exploração de trabalhadores até a falha de contenção de esgoto tóxico na Hungria; a contaminação de petróleo no golfo pela BP e os crescentes custos em vida e destruição ecológica da mineração de carvão; a volatilidade de Wall Street por causa dos negócios programados; a derrocada financeira de 2007-2008; o “flash-crash” de 6 de maio e as novas revelações sobre as fraudes nas hipotecas americanas e suas execuções (HENDERSON, 2010).

Sen (1999) também criticou as premissas restritivas de maximização da utilidade. Denominando de “abordagem da engenharia” o estudo que utiliza as concepções acima apresentadas, afirma que esta se preocupa apenas com questões logísticas, esquecendo-se de objetivos maiores calcados na ética, como buscar entender como se pode trazer o “bem para o homem” ou “como devemos viver”. O autor argumenta que para ocupar-se de questões apenas logísticas (ou alocativas), a abordagem de engenharia caracteriza o comportamento humano de forma simplista, em que os fins são facilmente identificáveis por meio deste comportamento. Ideia similar é apresentada por Veiga (2006), que destaca que a economia só pode se tornar ciência por meio da adoção de premissas restritivas para chegar à noção do que hoje se entende por “sistema econômico”. Os problemas de maior complexidade vindos da ideia de desenvolvimento sustentável, então, levam a uma tentativa de ampliar o escopo do estudo econômico a um campo que não é o seu. Num outro momento, o mesmo autor reforça que a ideia de se buscar um ótimo para o sistema econômico ignora a união deste como os sistemas bióticos, além de não dar importância à existência de limites naturais.

O questionamento da restrição imposta pela teoria dominante, pelo objetivo único da maximização da utilidade individual, está diretamente relacionado ao outro ponto de discordância entre as duas frentes de pensamento, que é o foco no indivíduo vis-à-vis o foco no grupo de indivíduos, a sociedade e, em última instância, no meio ambiente. Veiga (2006) coloca que um argumento importante contra o posicionamento do indivíduo no centro do estudo está no fato de que tal atitude leva a considerar principalmente análises de curto e médio prazo, e que certamente não oferecem respostas para problemas de longo prazo6. Sachs (2004), assim como Veiga, analisa que       

6 Veremos mais adiante também que focar no indivíduo não significa tratá-los de forma igual dentro do

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o conceito de desenvolvimento sustentável tem embutido a ideia de longo prazo, de gerações futuras, e de múltiplas escalas de tempo e espaço, que impedem a utilização do ferramental do economista convencional.

O estudo do desenvolvimento sustentável é incipiente. Apesar disso, é importante mencionar que, certamente, não trilhará por caminhos estritamente matemáticos. Muito pelo contrário, por ser diretamente influenciado pela Economia Ecológica, um campo teórico transdisciplinar (CAVALCANTI, 2010), e envolver conhecimentos das ciências sociais, biologia, ecologia, antropologia e outras áreas de estudo, ela necessitará de outras formas de exposição e análise. Sachs, destacando o dinamismo do aprendizado neste campo de conhecimento, dá ênfase numa maior importância da política, uma vez que “as ciências sociais, em particular no campo que aqui nos interessa, têm antes de tudo um papel heurístico. Servem para fazer as perguntas certas, para alimentar o debate de sociedade. As respostas, de seu lado, vêm da práxis política.” (SACHS, 2009, p.352). A ideia é compartilhada por Norton e Noonan (2007), que defendem que os problemas sociais devem ser resolvidos por meio da construção de modelos que recebem de forma positiva o envolvimento dos interessados, num processo contínuo de aprendizado através da ação em si. Num mundo complexo de opções múltiplas e, em alguns casos, contraditórias, a política ganha cada vez mais importância, ocupando o espaço das decisões apenas baseadas em argumentações objetivas, cientificamente estabelecidas.

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analisando o sistema econômico “assumindo que é um sistema social concreto, com uma história, e utilizando modelos mais modestos e menos abrangentes. É começar a partir de um modelo em que as falhas de mercado são parte dela” (PEREIRA, 2010, p.14).

Para diversos autores aqui comentados, utilizar estritamente modelos matemáticos tem como objetivo identificar os estudos econômicos como uma ciência mais próxima das ciências físicas e naturais do que das ciências sociais. Veiga afirma que a noção de sustentabilidade, sendo uma questão principalmente ética, não é “de natureza precisa, discreta, analítica, ou aritmética” (VEIGA, 2006, p.88), colocando grandes desafios para a ciência positiva e afastando-se do enquadramento de uma ciência exata. Já o Relatório de Desenvolvimento Humano de 2010 (RDH daqui em diante) afirma logo no início que “o desenvolvimento humano é uma ideia em evolução – não um conjunto de preceitos fixos e estáticos – e, à medida que o mundo muda, as ferramentas e os conceitos analíticos evoluem” (RDH, 2010, p.1). Por isso, na introdução deste relatório, Sen defende a inclusão da sustentabilidade no conceito de desenvolvimento humano:

[...] a abordagem do desenvolvimento humano é suficientemente flexível para ter em conta as perspectivas futuras da vida humana no planeta, incluindo as perspectivas das características do mundo que valorizamos, estejam elas relacionadas com a nossa prosperidade ou não (por exemplo, podemos estar empenhados na sobrevivência de espécies animais ameaçadas de uma forma que transcenda o nosso próprio bem-estar) (RDH, 2010, p.VI).

Pereira (2010) coloca que:

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homens e mulheres que fizeram escolhas sob incerteza. Se os agentes econômicos são tomadores de decisão racionais, não otimizadores, você não pode desenvolver uma ciência hipotética-dedutiva como os matemáticos fazem, ou teóricos sobre decisões (PEREIRA, 2010, p.13).

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sobre o sistema, e sobre o que ele valoriza” (NORTON e NOONAN, 2007, p.670). Por isso, Norton e Noonan acreditam que apenas com novas analogias e interpretações é que é possível utilizar o conceito de ecossistema nas situações do mundo real, pois aí tem-se vários modelos parciais, mas complementares, que são concebidos por meio de diversos pontos de vista, valores e propostas.

A pluralidade também está presente na defesa de Bresser Pereira (2010) de uma economia modesta e heterodoxa que não seria ciência pura, e que seria crítica às injustiças sociais e ao desenvolvimento insustentável. Para ele:

[...] em particular nas ciências sociais, não há espaço para ortodoxias. Elas são, por definição, erradas, porque propõem apenas uma abordagem para uma realidade complexa que deve ser vista e analisada sob diferentes pontos de vista. Em vez de uma ortodoxa, o que é necessário é uma economia heterodoxa ou economia plural ou economia política. Em vez do produto do método hipotético-dedutivo, o resultado do método histórico-dedutivo (PEREIRA, 2010, p.15).

É interessante notar que apesar de continuar buscando legitimidade como uma verdadeira ciência, o estudo da economia por meio da metodologia neoclássica tem sofrido diversos ataques até mesmo dentro da chamada linha dominante. Pereira (2010) e Davis (2007) argumentam que a teoria neoclássica cooptou diversos estudos a fim de se legitimar e manter-se na ortodoxia. No entanto, todos estes novos estudos que incluem: a economia comportamental e experimental, nova economia institucional, teoria dos jogos, “neuroeconomics” e economia evolucionária, “mantém premissas fundamentais em conflito com a ortodoxia neoclássica, e, portanto, devem ser vistas como heterodoxia” (DAVIS, 2007, p.22).

Ainda mais importante que a técnica de análise na qual a ideia de desenvolvimento sustentável estará inserida, é o questionamento de alguns autores sobre a possibilidade de se obter tal tipo de desenvolvimento na economia em que vivemos, a capitalista7. Ao discorrer sobre o desenvolvimento de uma teoria sobre desenvolvimento sustentável, Veiga (2006) cita o historiador Hobsbawn e sua análise sobre o sistema econômico, na qual afirma que a solução para o impasse de se definir uma taxa de

      

7 Interessante notar que a teoria neoclássica é criticada, por outras frentes de pensamento, como a

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desenvolvimento sustentável não se dá por meio de ciência e tecnologia, e sim da política e mobilização social. De qualquer forma, essa taxa seria incompatível com a busca ilimitada por lucro, fazendo com que do ponto de vista ambiental, o autor argumenta, o futuro da humanidade com certeza não será capitalista.

Autores desta vertente mencionados acima - Sachs (2009), Viveret (2006) e Cavalcanti (2010) - também compartilham opiniões similares sobre a adequabilidade do sistema capitalista frente ao desafio imposto pelo desenvolvimento sustentável. Assim, vemos uma dissonância também em como considerar o estudo econômico. De um lado, a teoria neoclássica supõe que seus modelos, apesar de nem sempre incluírem a economia capitalista e sua forma institucional como premissa, servem para tirar conclusões a respeito deste tipo de economia8. Pereira discorda disto profundamente:

É verdade que o desempenho econômico dos 30 anos neoliberais do capitalismo (1979-2008) era substancialmente inferior àquela dos últimos 30 anos dourados do capitalismo (1949-1978). É verdade que as crises financeiras, que quase desapareceram nos países ricos e tinham diminuído nos países em desenvolvimento durante os anos bem regulados de Bretton Woods, em que a economia keynesiana era mainstream. É verdade que nos 30 anos seguintes a instabilidade financeira aumentou significativamente nos países em desenvolvimento assim como nos países ricos, e foram "coroados" com a crise financeira mundial de 2008. É verdade que esta crise não foi tão grave como foi a Grande Depressão da década de 1930 porque os governos em todos os lugares aprovaram políticas monetária e fiscal radicalmente heterodoxas para cercá-la, e porque em alguns países grandes de renda média como a China ou a Índia novas políticas desenvolvimentistas mostraram-se eficazes para a volta de elevadas taxas de crescimento (PEREIRA, 2010, p.2).

Do outro lado, os estudiosos do desenvolvimento sustentável pela linha da Economia Ecológica questionam se o sistema econômico em questão é o mais adequado para a resposta de uma das perguntas mais fundamentais para o ser humano: “Como devemos viver?” Os diferentes arcabouços metodológicos apresentados claramente influenciam o entendimento do que as linhas de pensamento supracitadas vão ter sobre conceitos importantes para o desenvolvimento. Veremos a seguir como são adotadas as ideias de valor, riqueza e bem-estar para cada frente.

      

8 Pereira afirma que “O principal resultado do individualismo metodológico foi o modelo de equilíbrio

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1.3. A evolução das concepções básicas

1.3.1. Valor e riqueza: qual a relação?

Conforme discutido anteriormente, a utilidade foi o conceito que substituiu prazer, felicidade e outros conceitos referentes ao objetivo último de um indivíduo no pensamento dominante. Por que focar na utilidade somente? Para Jevons (1996), o homem é influenciado apenas por prazer e sofrimento. É a partir desta observação que se chega à ideia de que o valor (e, desta forma, o preço) depende da utilidade. Mais especificamente, o valor representa a utilidade marginal e, portanto, não está relacionado a uma massa de bens, e sim ao grau de prazer gerado por um bem, que varia de acordo com a quantidade já possuída deste determinado bem. A utilidade marginal é, portanto, a representação da intensidade da necessidade que temos por um bem, de forma a satisfazer nossos desejos ou aumentar nosso prazer. O valor (e o preço) que damos a um bem está diretamente relacionado à utilidade marginal que ele proporciona. No caso de Marshall (1996), o raciocínio é o mesmo, com a diferença que o autor utiliza a utilidade como substituta do desejo ou necessidade (e não do prazer). Uma vez que a utilidade não pode ser medida diretamente, a Economia se utiliza do preço que uma pessoa se dispõe a pagar para satisfazer seu desejo como instrumento indireto de medida.

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referência do aumento de prazer ou satisfação de uma necessidade que um bem é capaz de oferecer.

Uma vez relacionados utilidade e valor, a definição de riqueza aparece de forma natural como o conjunto de objetos que possuem valor, e consequentemente geram utilidade, que saciam desejos, aumentam o prazer e a felicidade. Mas aqui é importante lembrar que tal definição contempla apenas bens transferíveis e apropriáveis, ou seja, que o valor de um bem também é dado por sua qualidade de ser escasso. O valor, isto é, o valor de troca de uma coisa em termos de outra num lugar e tempo qualquer, é a quantidade da segunda coisa que pode ser obtida ali na ocasião dada, em troca da primeira. Assim, o termo valor é relativo e exprime a relação entre duas coisas num lugar e tempo determinados (MARSHALL, 1996).

A definição de Jevons (1996) também aponta a relação do valor e da riqueza com objetos escassos, transferíveis e portadores de utilidade. No entanto, é Marshall quem nos dá uma definição precisa de riqueza, consistindo em bens desejáveis, os quais podem ser divididos em duas classes. A primeira consiste no grupo de bens materiais sobre o quais se tem direitos de propriedade privada, que são transferíveis e permutáveis. Aqui se inclui não somente solo, casa, móveis, maquinaria, mas também ações, debêntures, hipotecas e outras obrigações. A segunda classe consiste de bens imateriais que também podem ser propriedade privada, e que permitem a aquisição de bens materiais. Basicamente, inclui os bens de um negócio próprio. As dívidas que se tem com outras pessoas são consideradas redutores da riqueza e devem ser subtraídos para a apuração da riqueza líquida. Essa riqueza apresenta duas características:

[...] incluem todas as coisas extrínsecas ao homem, que (a) lhe pertencem, e não pertencem igualmente aos seus vizinhos, e pois são nitidamente suas; e (b) são diretamente capazes de medida em dinheiro — medida que de um lado representa os esforços e sacrifícios pelos quais elas vieram à existência e, por outro lado, as necessidades que satisfazem (MARSHALL, 1996, pp.121-122).

Temos então que a riqueza é composta por tudo aquilo que é apropriável por um indivíduo e que tem valor, que pode ser medido em dinheiro.9 Desta forma, os ingressos

      

9 Num momento posterior, Marshall amplia sua definição de riqueza para incluir os bens públicos ou de

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de dinheiro, ou a renda monetária, servem como medida da prosperidade da nação, dado que medem o grau de acúmulo de riqueza (ainda que haja falhas nesta concepção, pois, por exemplo, a renda pode ter sido gerada por empréstimos, que contam como riqueza negativa).

Finalmente, a definição proposta por Walras, que, conforme veremos, servirá de base aos estudos da Nova Economia do Bem-Estar, apresenta modificações sutis, porém importantes, na conceituação de utilidade e riqueza. A primeira mudança importante refere-se ao conceito de utilidade. Para ele, esta deve se desconectar da moralidade, e, desta forma, de seus vínculos com o desejo, satisfação, necessidade etc. Tudo se resume agora a ser mais ou menos útil. “Que uma substância seja procurada por um médico para curar um enfermo, ou por um assassino para envenenar sua família, é uma questão muito importante sob outros pontos de vista, mas completamente desprezível sob o nosso” (WALRAS, 1996, p.45). Buscando simplificar a definição de riqueza, o autor inclui coisas materiais e imateriais, de forma que aquilo que a caracteriza é a sua utilidade e sua escassez. Para fazer parte da riqueza social, temos as coisas úteis limitadas em quantidade e que são apropriáveis. Coisas inúteis não são apropriadas porque ninguém pensa em ter coisas que não possam servir para nenhum uso. Já as coisas úteis que estão disponíveis em quantidade ilimitada não são apropriáveis e não podem ser consideradas como parte da riqueza social.

O meio ambiente, na qualidade de ser útil, mas de ser encontrado de forma a não fazer falta a ninguém, não faz parte da riqueza social para Walras. Ser apropriável e raro é importante porque é por meio destas características que as coisas podem ser trocadas e, em última instância, possuírem valor (de troca). Por isso, para o autor, a riqueza social se resume à produção industrial, ou à indústria.

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transferência não implica na perda do mesmo. Por isso, “em termos sociais, portanto, a sociedade do conhecimento acomoda-se mal da apropriação privada: envolve um produto que, quando socializado, se multiplica” (DOWBOR, 2010, p.56).

Outro movimento mais recente, dados a importância dos bens apropriáveis para a teoria do desenvolvimento econômico tradicional, e a espetacular expansão de capital disponível nas últimas décadas, foi a tendência de tornar rentáveis coisas que a principio eram gratuitas. Riquezas naturais têm sido patenteadas ou então apropriadas de forma a gerar receitas (ou, na verdade, de transferir riquezas). Dowbor coloca que:

[...] os condomínios de praia fecham o acesso a um pedaço de mar, e nas publicidades nos "oferecem", como se as tivessem criado, as suas maravilhosas ondas. O acesso gratuito ao mar não enche os bolsos de ninguém. Fechemos pois as praias...Assim o capitalismo gera escassez, pois a escassez eleva os preços. Nesta lógica do absurdo, quanto menos disponíveis os bens, mais ficam caros, e mais adquirem valor potencial para quem os controla. Nada como poluir os rios para nos obrigar a um "pesque-pague", ou a nos induzir a comprar água “produzida” (DOWBOR, 2010, p.60).

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Para os autores da linha da Economia Ecológica, é importante considerar que o valor (chamado de valor comercial) se subordina a um conjunto mais elevado de valores. Para se descobrir a importância de tais valores, deve-se fazer o exercício de simular sua perda. Viveret (2006) afirma que dentro deste conjunto há valores de laços políticos, afetivos e simbólicos, e que o mercado não pode assumir a organização do fluxo deles. Levar em conta que o valor comercial está contido em um conjunto maior de valor é importante pelo fato de que, ao focarmos somente nos valores que possuem sentido econômico, podemos ir de encontro com valores mais fundamentais. Para Viveret, valor deve ser definido como aquilo que nos faz ter vontade de viver e de dar seguimento à humanidade, por meio da geração de filhos e netos. O autor utiliza como referência para hierarquizar os valores as paixões dos seres humanos diante da morte. Neste momento, o que se sobressai são o sentido (e o conhecimento) e o amor (ou o reconhecimento). Assim, a riqueza, no sentido material, se caracteriza por ser um representante de um valor inferior. Basear-se no sentido de valor da teoria neoclássica, portanto, é passar de “um universo em que aquilo que realmente tem valor não tem preço para um outro universo, que vemos instalar-se diante de nossos olhos, no qual aquilo que não tem preço não tem realmente valor” (VIVERET, 2006, p.51).

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1.3.2. A Economia do Bem-Estar: a satisfação como fim

A teoria da Economia do Bem-Estar tem como um dos seus principais nomes Pigou. Screpanti e Zamagni (1995) afirmam que o critério proposto por Bentham, baseado na maximização da soma das utilidades individuais, encontrou sua aplicação mais desenvolvida nos trabalhos de Pigou. Seguindo a tradição utilitarista, a base da utilidade é o desejo (ou mais precisamente, sua intensidade), que indicaria de forma indireta a satisfação na posse de determinado objeto. Além disso, o autor destaca que o bem-estar econômico é a parte do bem-estar gerado nas relações de troca que tem o dinheiro como medida. Desta forma, conforme discutido anteriormente, estuda-se a parte do bem-estar em que o uso da ciência econômica (dentro do arcabouço metodológico defendido) traz mais vantagens.

Inicialmente, entende-se que o estudo do bem-estar econômico não significa o estudo do bem-estar total. Este último poderia ser caracterizado sucintamente por ser resultado apenas de estados de consciência, e não de posse de coisas materiais, que podem apenas contribuir para alguns estados. No entanto, Pigou (1920) argumenta que, apesar de o bem-estar econômico não ser um bom índice para o bem-estar total, sabe-se que a mudança em uma parte sempre afeta a mudança no todo na sua quantidade total, e é justamente essa alteração no bem-estar total decorrente de uma variação do bem-estar econômico que a Economia do Bem-Estar se propõe a estudar.

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uma contribuição importante para o bem-estar econômico. Apesar disso, o mesmo autor reforça que o mesmo aumento na renda gera cada vez menos satisfação, dada a “lei dos retornos decrescentes”, ou seja, é necessário cada vez mais capital (mais coisas não consumidas com intuito de proporcionar prazer) para gerar determinada quantidade de produto adicional (ou prazer adicional).

É exatamente desta forma que ainda hoje se relaciona bem-estar com renda. Entende-se, pela teoria neoclássica, que nível de renda é equivalente ao conceito de nível de vida. Por isso, como veremos mais adiante, o estudo do crescimento econômico é vital, dado que o crescimento do produto per capita significa o crescimento dos salários reais e o aumento dos níveis de vida (SAMUELSON e NORDHAUS, 1993, p.630). Em última análise, assim como preços refletem satisfação de desejos, o nível de vida possui grandes implicações no bem-estar. Nível de vida aqui, nada mais é que poder de compra, acesso à quantidade e diversidade de produtos:

As economias avançadas seguem a via da especialização e da divisão do trabalho, a qual aumenta a produtividade dos seus recursos. Os indivíduos e os países trocam depois voluntariamente os produtos em que se especializaram por outros produtos, aumentando grandemente a variedade e quantidade do consumo e aumentando o nível de vida de todos (SAMUELSON e NORDHAUS, 1993, pp. 34-35).

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deste raciocínio, a satisfação dos desejos dificilmente pode ser considerada um objeto de valor, e não deveria ser considerado na avaliação de bem-estar ou padrão de vida.

Por último, é importante destacar que, como Jevons acreditava que a utilidade poderia ser medida, se poderia chegar à conclusão de que transferências de ricos para pobres aumentariam a soma agregada de satisfação, e de bem-estar, graças à lei da utilidade decrescente. Tal constatação seria verdadeira desde que não afetasse o produto e sua variação (PIGOU, 1920, p.52). Dois elementos importantes estão contidos nesta ideia. Primeiro, como já apresentado, a ideia de que a utilidade marginal pode ser medida. Segundo, que o ganho agregado de utilidade só pode ser verdadeiro se não afetar a progressão do PIB.10 Estes dois elementos foram aspectos centrais no desenvolvimento da Nova Economia do Bem-Estar, que é o que veremos a seguir.

1.3.3. Eficiência e bem-estar: um novo propósito para a economia

Screpanti e Zamagni (1995) afirmam que a cardinalidade da utilidade, ou seja, a possibilidade de medi-la, não era clara em alguns dos teóricos da revolução marginalista, como por exemplo, Jevons. Sen (1989) lembra que Pigou, ao encontrar dificuldade em utilizar a utilidade para a determinação do padrão de vida, acabou por sugerir que este fosse baseado em critérios de opulência, ou seja, quantidade de determinados produtos e serviços.

No final do século XIX, outra concepção de utilidade começou a ganhar terreno: a utilidade como expressão de preferências e, portanto, de escolha individual. Assim, a Nova Economia do Bem-Estar foi uma reação às ideias de Pigou. Os desenvolvimentos de Pareto foram importantes para a consolidação desta nova visão da utilidade, que ficou conhecida por utilizar critérios de ordinalidade, e não de cardinalidade. Esta linha baseava-se no princípio da impossibilidade de se obter medidas da utilidade, e desta forma, impossibilitar comparações interpessoais de utilidade (SCREPANTI e ZAMAGNI, 1995).

      

10 Assim como seu aluno Pigou, Marshall tentou reconciliar o laissez-faire com o fato de que aumentos de

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Os estudos de bem-estar começaram então a se calcar num critério chamado de ótimo de Pareto. Uma alocação Pareto-ótima é aquela em que não há possibilidade de organizar a produção e distribuição de bens de maneira a melhorar ou aumentar a utilidade de uma pessoa sem piorar a utilidade de outra (MAS-COLELL, WHINSTON e GREEN, 1995). Neste contexto “todas as referências de felicidade e satisfação de necessidades precisam desaparecer, enquanto as motivações por trás das escolhas perdem importância” (SCREPANTI e ZAMAGNI, 1995, p.225), ou seja, não há espaço nem possibilidade de se fazer comparações interpessoais de utilidade. Dentro deste contexto, Robbins argumentou que, uma vez que a utilidade não pode ser observada e nem medida, qualquer afirmação sobre os efeitos de medidas redistributivas no bem-estar coletivo carece de fundamento científico (SCREPANTI e ZAMAGNI, 1995).

O mesmo autor considerou então que o objetivo da economia seria estudar a alocação de recursos escassos para necessidades diferentes. Por isso, Screpanti e Zamagni (1995) assinalam que a aceitação dos critérios de ordinalidade corresponde a uma mudança de objetivo da investigação econômica. O novo objetivo é o de buscar resolver o problema de como melhorar o bem-estar do homem para solucionar problemas de eficiência alocativa, tendo para isso como elemento central a teoria dos preços. Assim, o conceito psicológico da utilidade marginal, como vimos, relacionado com o bem-estar, pôde ser trocado por um conceito “comportamental”: a taxa marginal de substituição.

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O resultado fundamental de Pareto é a demonstração que cada alocação associada com um equilíbrio competitivo é um ótimo social no sentido acima11. Hoje, o critério de “ótimo de Pareto” é utilizado como argumento para analisar a desejabilidade do resultado de algum modelo. Romer, ao analisar se modelos de crescimento chegam a um resultado desejável, afirma que: “o primeiro teorema fundamental do bem-estar da macroeconomia nos diz que se os mercados são competitivos e completos e não há externalidades (e se o número de agentes é finito), então o equilíbrio descentralizado é eficiente.” (ROMER, 2006, p.65). Infere-se aqui que, se o resultado é Pareto-eficiente, então é desejável.

Por uma série de motivos, a tentativa de utilizar o sistema paretiano para o desenvolvimento de políticas públicas foi problemática. Uma das críticas importantes a esse instrumental veio de Arrow, ao demonstrar que preferências individuais, quando agregadas, podem apresentar curvas de preferência que não respondem aos quesitos de racionalidade (GOWDY, 2003; MAS-COLELL, WHINSTON e GREEN, 1995). Sen (1999) complementa afirmando que é difícil aplicar o resultado de que o melhor de todos os estados deve ser no mínimo Pareto-ótimo pelo fato de ser difícil obter as informações necessárias (principalmente as informações completas sobre as preferências das pessoas). Finalmente, ele acaba concluindo que a adoção do ótimo de Pareto como único critério de julgamento, aliado ao comportamento auto-interessado como única base da escolha econômica, reduziu muito a capacidade da economia do bem-estar de dizer algo interessante.

O que se infere no ótimo de Pareto é apenas que os recursos estão sendo utilizados sem desperdício. Mas não se pode concluir daí que tal condição eficiente seja a melhor para a sociedade (MAS-COLELL, WHINSTON e GREEN, 1995). Os “economistas ecológicos” recorrem principalmente a este argumento para criticar a Nova Economia do Bem-Estar. Sachs (2004) faz uma crítica contundente à visão de que esta eficiência, chamada de alocadora, combinada com o ótimo social descrito acima, seja desejável na realidade. Ele afirma que essa visão da economia assume que males sociais e ambientais são um preço inevitável de um progresso econômico em que a eficiência alocativa se torna um fim em si mesmo. A economia capitalista de mercado,

      

11Assim, o modelo Walrasiano de equilíbrio geral atende a esse tipo de otimalidade, pois trocas

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com sua eficiência, mais do que compensaria o desemprego maciço, o subemprego e as desigualdades sociais, inerentes ao sistema capitalista. No entanto, Sachs afirma que há outras eficiências, além da alocadora (inovadora, keynesiana, social e ecoeficiência), que são essenciais para o conceito de desenvolvimento sustentável.

Veiga, reforçando o aspecto não mecânico, não exato da sustentabilidade, também critica a visão de uso ótimo dos recursos:

Por evocar, em última instância, uma espécie de “ética de perpetuação da humanidade e da vida”, a expressão “sustentabilidade” passou a exprimir a necessidade de um uso mais responsável dos recursos ambientais. O que só pode ser complicado para qualquer corrente de pensamento que se fundamente no utilitarismo, individualismo e equilíbrio, como é o caso da economia “neoclássica”. Isto é, numa racionalidade da maximização das utilidades individuais com a resultante determinação do uso “ótimo” ou “eficiente” dos recursos em equilíbrio (VEIGA, 2006, p.88).

Sen (1999), de forma similar, critica a ideia de eficiência e enfatiza a necessidade de considerar, sobretudo, a ética nos estudos econômicos. Para ele, a concepção da realização social relacionada à ética não pode ficar restrita a um objetivo arbitrário de “satisfazer a eficiência”. A avaliação tem de ser mais inteiramente ética e adotar uma visão mais abrangente de “bem”. Consonante com esta ideia, o RDH (2010) apela por:

[...] uma nova economia de desenvolvimento humano. O objetivo desta nova estrutura passaria pelas metas relacionadas com o bem-estar. O crescimento e outras políticas seriam avaliados e perseguidos vigorosamente, desde que melhorassem o desenvolvimento humano no curto e no longo prazo (RDH, 2010, p. 120).

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o autor, quando se considera a liberdade no cálculo das vantagens individuais, as abordagens que se concentram exclusivamente na realização, como o utilitarismo e o “welfarismo”, devem ser rejeitadas.

1.4. Sustentabilidade e o problema ambiental

Para o RDH (2010), “talvez o maior desafio à manutenção do progresso do desenvolvimento humano venha da insustentabilidade dos padrões de produção e consumo” (RDH, 2010, p.7). No entanto, se existe um tema em que as diferenças entre as duas linhas de pensamento ficam bastante evidentes, este tema é o da problemática ambiental, uma vez que para aqueles da frente neoclássica tal problema não é tão grave quanto parece. Marshall (1996) já colocava que a satisfação global de uma sociedade só aumentaria com o aumento da produção per capita se não houvesse grandes dificuldades no suprimento de matérias-primas e uma superpopulação que gerasse insatisfações de ordem física e moral decorrentes da falta de ar puro e de outras condições sociais e ambientais. No entanto, o marginalismo pós-Marshall, juntamente com a evolução da teoria do consumidor criada por ele (baseada na premissa de que os consumidores maximizam sua satisfação de acordo com a renda), deixaram de seguir suas recomendações e se tornaram bem mais imprudentes. Gowdy (2003) coloca que estes dois elementos, a revolução marginalista e a teoria do consumidor, facilitaram uma postulação sobre o bem-estar em que a maior preocupação era devotada às possíveis falhas de mercado que poderiam impedir que o sistema de preços revelasse o verdadeiro valor social de produtos e serviços. A questão ambiental, por exemplo, ficou a mercê dos vários adendos da teoria predominante, que cuidam das “falhas de mercado”: poder de mercado, bens públicos e externalidades. Para esta linha de pensamento, o maior problema das questões ambientais está na ausência de um mercado para elas (HENDERSON, 2010).

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ideia do valor, ou seja, o mercado pode precificar a escassez. O preço do recurso natural indica a importância do bem na produção. Não haveria espaço para ação governamental. Como se acredita que esteja havendo efeito de substituição, uma vez que a participação dos recursos naturais e terra na renda vem diminuindo, esta linha não vê grandes desafios em relação a este tipo de bem, mesmo que estejam se tornando cada vez mais escassos.

No caso de bens não passíveis de direitos de propriedade, há externalidades, e neste caso há espaço para ação do governo. Se o Produto fosse calculado corretamente, a poluição, por exemplo, deveria aparecer como produção negativa. E mesmo com o Produto sendo calculado incorretamente, a produção pode cair (por conta de, por exemplo, catástrofes naturais). Sem um mercado regulamentado, é possível que estes fatores gerem externalidades negativas ao máximo. Neste caso, os governos poderiam então taxar (a poluição, por exemplo), mas como é muito difícil responder a perguntas como qual o nível ideal de taxação, e são grandes as chances de o governo errar na dose, a ação do Estado pode prejudicar mais o bem-estar do que se não houvesse a imposição de taxas. Desta forma, a teoria neoclássica, com sua já discutida preferência por eficiência alocadora, defende inicialmente que “a melhor política é não ter política”, isto é, deve-se deixar que o sistema de mercado resolva todos os problemas de alocação dos recursos. Teríamos uma excessão quando estivéssemos tratando de recursos que não possuem mercado desenvolvido e um correspondente sistema de preços de mercado (SCREPANTI e ZAMAGNI, 1995). No entanto, como não há como provar que os ajustes do Estado não causarão desajustes maiores que os do mercado (uma vez que não se tem as informações de preferências de todos os indivíduos), no final a solução acaba sendo deixar o mercado como está, ou seja, mesmo para bens não passíveis de direitos de propriedade, “a melhor política é não ter política”. Como não há preço de mercado para estes fatores, a melhor alternativa para avaliar a gravidade dos problemas são as evidências científicas. Neste caso, Romer (2006) afirma que estudos mostram que o impacto no crescimento é pequeno, no máximo moderado, causado por questões ambientais.

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sustentabilidades (social, cultural, ecológica, ambiental, territorial, econômica e política) e eficiências (de alocação, de inovação, a keynesiana, a social e a ecoeficiência), por meio do planejamento e gerenciamento do dia-a-dia da economia e da sociedade.

Veiga (2006) e Stiglitz, Sen e Fitoussi (2009) afirmam que o tratamento dado pela linha neoclássica da economia aos bens naturais, chamado de “sustentabilidade fraca”, é baseado na ideia de que o estoque de recursos naturais pode ser exaurido, desde que sejam substituídos pelos outros dois grandes fatores produtivos: trabalho e capital. Esta ideia começou a ser lançada nos anos 70, ainda sem a terminologia de sustentabilidade, por meio da inclusão na teoria neoclássica de crescimento, como fator de produção, dos recursos naturais não renováveis. Entre os nomes de destaque neste período estão Solow, 1974, Dasgupta e Heal, 1974 e Hartwick, 1977 (DIETZ e NEUMAYER, 2007, p.618). O conceito central da sustentabilidade fraca é que não é necessário buscar a conservação de recursos naturais específicos se o que se busca é manter a utilidade per capita entre gerações (SOLOW, 1974). Se o custo social do esgotamento de um recurso for compensado com investimentos em capital produzido ou no desenvolvimento de novas tecnologias, é possível manter ou até mesmo aumentar o nível de bem-estar das pessoas. Para Howarth (2007), esta visão assume que os bens produzidos podem efetivamente substituir os serviços proporcionados pelo capital natural.

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PIB. Isto ocorreu, por exemplo, na extração de minério de ferro, bauxita, níquel e cobre no período de 1990 a 2007.

Outro argumento comum que corrobora o otimismo de alguns economistas é a ideia de que, a partir de determinada renda per capita, o crescimento econômico não mais prejudicaria o meio ambiente, uma vez que as pessoas estariam cada vez mais dispostas a “pagar” por um ar mais limpo, ou por técnicas produtivas menos agressivas ao meio ambiente.12 O que está embutido nesta hipótese é que se os indivíduos tiverem acesso à informação perfeita, serão capazes de precificar o valor que dão a bens que não possuem mercados. É desta forma que, por exemplo, são feitos os cálculos sobre os valores da existência de espécies em extinção (STIGLITZ, 1999; VEIGA, 2006). No entanto, Veiga (2006) e Mueller (2008) argumentam que nem sempre a estimativa de preços para bens naturais consegue persuadir, pois, por exemplo, o preço do ozônio em rarefação ou o preço de uma função como a regulação térmica do planeta dificilmente poderiam ser calculados por indivíduos bem informados. Desta forma, dificilmente a preservação da diversidade biológica e cultural poderia ficar na dependência do aperfeiçoamento dessas tentativas de simular mercados. Também é importante lembrar que aquilo considerado no sistema econômico tradicional, isto é, bens produtíveis e apropriáveis, representam parcela muito pequena do universo formado por todos os seres vivos e objetos que compõem a biosfera.

Em oposição à concepção fraca da sustentabilidade, os autores da Economia Ecológica propõem uma visão chamada de “sustentabilidade forte”. Tal visão considera que o legado para as futuras gerações não deve ser calcado no capital total, e sim no capital exaurível, o natural. O principal ponto de discórdia entre aqueles que defendem a sustentabilidade fraca vis-à-vis os que apóiam a visão de sustentabilidade forte se centra no fato de que os recursos naturais não são substitutos aos demais capitais, e sim mais ou menos complementares e insubstituíveis. Se dividirmos o capital natural em quatro categorias relacionadas às suas funções, quais sejam: primeiro, como provedor de matérias-primas para produção; segundo, como assimilador dos resíduos da produção e consumo; terceiro, como provedor de serviços locais que aumentam o bem-estar humano, como as paisagens; quarto, como provedor do suporte básico de que a vida dos seres humanos (comida, água, ar respirável e clima estável, por exemplo), assim como       

12 Por remeter à ideia geral de que, quando tivermos alta renda, os problemas econômicos se reduziriam,

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as outras três categorias anteriores, depende. Este último serviço seria o valor primário que pode ser entendido como uma “cola” que une tudo, enquanto que as outras categorias teriam um valor secundário, e, quase certamente, não pode ser substituído (DIETZ e NEUMAYER, 2007, p.618). Dietz e Neumayer (2007) e Mueller (2008) afirmam que o chamado capital natural “crítico”, relacionado à quarta categoria mencionada, deve ser mantido intacto, pelo menos até que a ciência compreenda melhor as relações ecológicas a ponto de podermos intervir neste tipo de capital sem afetar sua resiliência, uma vez que alguns estragos podem ser irreversíveis. Neste argumento de Dietz e Neumayer, está claro que há um princípio da precaução que envolve o argumento também de vários outros autores da sustentabilidade forte. Sob esta ótica, pode até haver substitubilidade entre alguns recursos naturais não-renováveis e capital produzido, mas este não é o ponto mais importante (DIETZ e NEUMAYER, 2007; MUELLER, 2008).

Mesmo sob o ponto de vista estritamente da produção, esta complementaridade, ou melhor, esta não-substitubilidade total do capital natural também pode ser defendida pela segunda lei da termodinâmica, a entropia. Sucintamente, a segunda lei da termodinâmica implica que o processo de transformação absorve recursos de baixa entropia para gerar produtos de alta entropia. Durante este processo, parte do calor é perdida e/ou transformada em resíduos que são mais difíceis de serem transformados em processos produtivos. Assim, não é possível haver reciclagem total dos materiais produzidos, e não é possível substituir os recursos naturais, pelo menos não totalmente, pois são estes que possuem baixa entropia.13 Por isso, os objetivos da sustentabilidade em sua visão “forte”, no que se refere às dimensões ecológicas e ambientais, “formam um verdadeiro tripé: 1) preservação do potencial da natureza para a produção de recursos renováveis 2) limitação do uso de recursos não renováveis 3) respeito e realce para a capacidade de autodepuração dos ecossistemas naturais” (VEIGA, 2006, p.96).

A expressão “desenvolvimento sustentável” é relativamente recente. Foi empregada pela primeira vez em 1979, no Simpósio das Nações Unidas sobre as Inter-relações entre Recursos, Ambiente e Desenvolvimento. No entanto, sua legitimação ocorreu na Assembléia Geral da ONU de 1987, quando Gro Harlem Brundtland, presidente da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a

      

13 O autor que colocou a entropia dentro dos estudos econômicos foi Nicholas Georgescu-Roegen, através

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caracterizou como “conceito político”. Na seção seguinte discutiremos como a ideia evoluiu, e como ela se coloca em relação ao conceito de “crescimento econômico”.

1.5. Crescimento vs Desenvolvimento

1.5.1. Crescimento Econômico

Como vimos anteriormente, para a teoria neoclássica o aumento de renda é elemento causador de aumentos no padrão de vida e bem-estar da população. Isto se dá basicamente pelo aumento de produtos e serviços ofertados. É por isso que o crescimento econômico é assunto da maior importância para esta linha de pensamento. Para Samuelson e Nordhaus, “o destino político, social e militar dos países depende fundamentalmente do sucesso econômico e nenhuma área da economia é actualmente mais vital do que o sucesso de um país no seu desempenho macroeconômico.” (SAMUELSON e NORDHAUS, 1993, p.462). O crescimento econômico é, na visão dos autores, o fator individual mais importante para o sucesso econômico de uma nação, e por isso os países o têm como objetivo econômico e político central.

Dornbusch, Fischer e Startz, outros autores que sintetizaram o pensamento macroeconômico de corte neoclássico, afirmam que quando se estuda a teoria do crescimento, analisa-se o efeito da causalidade da acumulação dos fatores na elevação do padrão de vida e que, para termos um melhor padrão de vida, “tudo o que nos interessa é com que rapidez a economia cresce em média.” (DORNBUSCH, FISCHER e STARTZ, 2003, p.6). Aqui entende-se que o crescimento da economia é a variação positiva do PIB ao longo do tempo, e que tal variação é o condicionante suficiente para um aumento do padrão de vida da população.

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desenvolvidos: analisando os fatores de produção e os efeitos de sua acumulação. Samuelson e Nordhaus se referem à terra, ao capital, aos recursos humanos e à tecnologia. Ou seja, o desenvolvimento econômico se dá pura e simplesmente por meio do crescimento econômico, não necessitando de alguma política ou atividade adicional.

Como coloca o Relatório de Desenvolvimento Humano de 2010:

A economia do crescimento e a sua relação com o estudo do desenvolvimento exige uma reformulação radical. Existe uma vasta literatura teórica e empírica que, de uma forma quase uniforme, equaciona o crescimento econômico com o desenvolvimento econômico. Os seus modelos teóricos geralmente presumem que as pessoas só se importam com o consumo e a análise de políticas ideais segue o mesmo caminho. A tendência é alargada à econometria do crescimento, em que as estimativas dos efeitos do crescimento das políticas são a base das recomendações políticas. O pressuposto, muitas vezes explícito, é que a maximização do crescimento deveria ser o objetivo do decisor político (RDH, 2010, p. 119).

Até 1970, a ideia de que o desenvolvimento estava atrelado ao progresso material era quase inquestionada na economia (VEIGA, 2006). Os estudos sobre as causas do crescimento econômico ganharam grande relevância na área, e por muito tempo identificou-se a capacidade instalada de bens de capital como o principal, ou um dos principais geradores do crescimento. Veiga (2006) argumenta que a visão focou-se nos estoques (de capital), deixando de lado o fato de a produção ser um processo, um fluxo de relações que produz coisas, e que o crescimento do produto não é simplesmente resultado da posse de bens considerados infra-estrutura: barragens, escolas, tratores e outros.

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Tabela 1: Componentes do Índice de Saúde Social
Gráfico 1 – Índice de Saúde Social e Produto Interno Bruto nos Estados  Unidos, 1959-1996, a preços de 1996

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