• Nenhum resultado encontrado

A Economia do Bem-Estar: a satisfação como fim

1. INSTRUMENTAL, CONCEPÇÕES E DESDOBRAMENTOS: UMA

1.3 A evolução das concepções básicas

1.3.2 A Economia do Bem-Estar: a satisfação como fim

A teoria da Economia do Bem-Estar tem como um dos seus principais nomes Pigou. Screpanti e Zamagni (1995) afirmam que o critério proposto por Bentham, baseado na maximização da soma das utilidades individuais, encontrou sua aplicação mais desenvolvida nos trabalhos de Pigou. Seguindo a tradição utilitarista, a base da utilidade é o desejo (ou mais precisamente, sua intensidade), que indicaria de forma indireta a satisfação na posse de determinado objeto. Além disso, o autor destaca que o bem-estar econômico é a parte do bem-estar gerado nas relações de troca que tem o dinheiro como medida. Desta forma, conforme discutido anteriormente, estuda-se a parte do bem-estar em que o uso da ciência econômica (dentro do arcabouço metodológico defendido) traz mais vantagens.

Inicialmente, entende-se que o estudo do bem-estar econômico não significa o estudo do bem-estar total. Este último poderia ser caracterizado sucintamente por ser resultado apenas de estados de consciência, e não de posse de coisas materiais, que podem apenas contribuir para alguns estados. No entanto, Pigou (1920) argumenta que, apesar de o bem-estar econômico não ser um bom índice para o bem-estar total, sabe-se que a mudança em uma parte sempre afeta a mudança no todo na sua quantidade total, e é justamente essa alteração no bem-estar total decorrente de uma variação do bem-estar econômico que a Economia do Bem-Estar se propõe a estudar.

O autor destaca ainda que seria problemático, então, se os ganhos de bem-estar econômico fossem cancelados por uma geração indireta de efeitos negativos ao bem- estar total. Caso isso acontecesse, as conclusões do estudo da economia baseados na utilidade seria inútil. Obviamente sua posição é a de que em geral, (1) a direção do impacto de um evento econômico no bem-estar econômico e total é a mesma, (2) a geração de efeitos não econômicos ao bem-estar total gerados por ações econômicas é pequena (3), e que a necessidade de se ter constantes aspectos não-econômicos (como ambiente político e religioso) para generalizar os efeitos das causas econômicas é atendida na Europa Ocidental. Assim como Marshall, Pigou entende que as causas que geram o aumento do produto nacional, dado que levam a um aumento de poder de compra, e, desta forma, ampliam a capacidade das pessoas de elevar sua satisfação, são

uma contribuição importante para o bem-estar econômico. Apesar disso, o mesmo autor reforça que o mesmo aumento na renda gera cada vez menos satisfação, dada a “lei dos retornos decrescentes”, ou seja, é necessário cada vez mais capital (mais coisas não consumidas com intuito de proporcionar prazer) para gerar determinada quantidade de produto adicional (ou prazer adicional).

É exatamente desta forma que ainda hoje se relaciona bem-estar com renda. Entende-se, pela teoria neoclássica, que nível de renda é equivalente ao conceito de nível de vida. Por isso, como veremos mais adiante, o estudo do crescimento econômico é vital, dado que o crescimento do produto per capita significa o crescimento dos salários reais e o aumento dos níveis de vida (SAMUELSON e NORDHAUS, 1993, p.630). Em última análise, assim como preços refletem satisfação de desejos, o nível de vida possui grandes implicações no bem-estar. Nível de vida aqui, nada mais é que poder de compra, acesso à quantidade e diversidade de produtos:

As economias avançadas seguem a via da especialização e da divisão do trabalho, a qual aumenta a produtividade dos seus recursos. Os indivíduos e os países trocam depois voluntariamente os produtos em que se especializaram por outros produtos, aumentando grandemente a variedade e quantidade do consumo e aumentando o nível de vida de todos (SAMUELSON e NORDHAUS, 1993, pp. 34-35).

Referindo-se a Jean Gadrey, Viveret conclui que “a pretensa economia do “bem- estar” era, na realidade, uma economia do “muito possuir”...” (VIVERET, 2006, p.54). Sen é um crítico importante da visão de bem-estar destacada na literatura econômica por Pigou. Em seu livro Standard of Living (1989) ele afirma que nenhuma das interpretações de utilidade define claramente bem-estar ou padrão de vida, seja como objeto de valor, seja como métodos de valoração. Apesar de estarem relacionados, utilidade e padrão de vida, “são primos de segundo grau ao invés de irmãos.” (SEN, 1989). De forma sucinta, seu argumento é de que o desejo como uma atividade tem um aspecto de valoração, porém a relação entre valorar e desejar é complexa; normalmente desejar é uma consequência de se valorizar algo (não são a mesma coisa). Desta forma, o desejo não pode ser uma boa base para valoração. Por exemplo, a ausência de desejo pode não refletir deficiência em valoração, mas sim ausência de esperança. Além disso, os desejos podem ser ajustados em linha com o que é viável conquistar. Também dentro

deste raciocínio, a satisfação dos desejos dificilmente pode ser considerada um objeto de valor, e não deveria ser considerado na avaliação de bem-estar ou padrão de vida.

Por último, é importante destacar que, como Jevons acreditava que a utilidade poderia ser medida, se poderia chegar à conclusão de que transferências de ricos para pobres aumentariam a soma agregada de satisfação, e de bem-estar, graças à lei da utilidade decrescente. Tal constatação seria verdadeira desde que não afetasse o produto e sua variação (PIGOU, 1920, p.52). Dois elementos importantes estão contidos nesta ideia. Primeiro, como já apresentado, a ideia de que a utilidade marginal pode ser medida. Segundo, que o ganho agregado de utilidade só pode ser verdadeiro se não afetar a progressão do PIB.10 Estes dois elementos foram aspectos centrais no desenvolvimento da Nova Economia do Bem-Estar, que é o que veremos a seguir.