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(1)1. UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO. IGREJA DE CRISTO PENTECOSTAL NO BRASIL fundação, re(d)ação e teologia no contexto brasileiro de 1934 a 1986. Wallace de Góis Silva. São Bernardo do Campo 2015.

(2) 2. IGREJA DE CRISTO PENTECOSTAL NO BRASIL fundação, re(d)ação e teologia no contexto brasileiro de 1934 a 1986. Wallace de Góis Silva. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo, como requisito parcial para a obtenção de grau de Mestre. Área de concentração: Linguagens da Religião Linha de Pesquisa: Teologia das religiões e cultura Orientador: Prof. Dr. Helmut Renders. São Bernardo do Campo 2015.

(3) A dissertação de mestrado intitulada: “IGREJA DE CRISTO PENTECOSTAL NO BRASIL: FUNDAÇÃO, RE(D)AÇÃO E TEOLOGIA NO CONTEXTO BRASILEIRO DE 1934 A 1986” foi apresentada e aprovada em 28 de abril de 2015, perante banca examinadora composta por Prof. Dr. Helmut Renders (Presidente/UMESP), Prof. Dr. Lauri Emilio Wirth (Titular/UMESP) e Prof. Dr. Edin Sued Abumanssur (Titular/Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião).. __________________________________________ Prof. Dr. Helmut Renders Orientador e Presidente da Banca Examinadora. ________________________________________ Prof. Dr. Helmut Renders Coordenador do Programa de Pós-Graduação. Programa: Pós-Graduação em Ciências da Religião Área de Concentração: Linguagens da Religião Linha de Pesquisa: Teologia das Religiões e Cultura.

(4) 4. Dedico este trabalho à memória dos saudosos pioneiros da ICPB; Ao povo pentecostal, gente guiada pelo “Espírito que renova a face da terra”; Aos que lutam pela unidade, pela justiça e pela paz no Brasil e no mundo..

(5) 1. Agradecimentos. Agradeço ao Deus da vida, que é amor e luz, e em quem encontrei motivação, forças, orientação e descanso. À minha família, amigos/as e irmãs/ãos de fé; de perto e de longe, pelo incentivo, companhia, conversas, compreensão, confiança, paciência e apoio incondicionais. À Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil, sua diretoria geral e pastores que me deram apoio na coleta de materiais e informações para este trabalho. À International Pentecostal Church of Christ (Ohio, EUA) e ao Bp. Clyde M. Hughes que permitiram, em 2012, acesso irrestrito ao arquivo pessoal do pioneiro Chester Miller, de onde coletei preciosíssimo material de pesquisa. Ao professor Helmut Renders pelo ensino orientador, fundamental para esta pesquisa e para a vida acadêmica. Aos integrantes do Grupo de Pesquisa Teologia no Plural – Umesp, e seu coordenador, Prof. Dr. Claudio de Oliveira Ribeiro, pelo espaço de discussão e crescimento. À Rede Latinoamericana de Estudos Pentecostais (Relep Brasil), por proporcionar o contato e a o intercâmbio com ricas experiências e pesquisas sobre o pentecostalismo no continente. À Universidade Metodista de São Paulo e ao Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião, na pessoa de seus professores/as, demais funcionários/as e colegas por se dedicarem a fazer dessa instituição uma casa do saber. À Rede Ecumênica da Juventude (Reju), espaço de convivência, aprendizado e reflexão sobre os temas da religião e das políticas públicas para um mundo mais justo, plural e de todos/as. Agradeço à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e ao Instituto Ecumênico de Pós-Graduação pelo apoio fundamental para os estudos e a realização deste trabalho.. Minha eterna gratidão..

(6) Meu pai, Horace Ward, partiu novamente para o Brasil depois do meu 12º aniversário. Exceto para visitas breves, ele permaneceu a maior parte do tempo plantando igrejas no Brasil. Não assistiu a nenhum dos meus eventos especiais. Graduações e casamamento aconteceram sem sua presença. Sou feliz, porém, pelos amigos que tenho no Brasil, inclusive através das redes sociais, e me sinto fortalecido com o trabalho de resgatar a história, como o que tem sido feito por Wallace Góis. O último pedido de Horace foi: “Garotos, cuidem da mãe de vocês”, e seu maior desejo era o de que Carolyn, minha mãe, fosse igualmente reconhecida por seu ministério. Wallace tem feito isso.. James Paul Ward, Greensboro, North Carolina, USA 14 de fevereiro de 2015, via Facebook.

(7) SILVA, Wallace de Góis. Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil: fundação, teologia e re(d)ação no contexto brasileiro de 1934 a 1986. 2015, 190 f. (Dissertação de Mestrado) – Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo.. Resumo. O objetivo desse trabalho é investigar a compreensão do papel da Igreja e do fiel no mundo segundo as publicações da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil (ICPB) e interpreta os resultados em diálogo com o contexto social, cultural, econômico, político e religioso do Brasil da época. Como recorte temporal propõem-se os anos 1934-1986, o que contempla a época da chegada dos/as fundadores/as, Horace e Carolyn Ward, Chester e Rachel Miller e Annie e Russel Frew, vindos dos Estados Unidos; a época de Ernst Grimm, um pregador estoniano; e a época de José Pinto de Oliveira, primeiro brasileiro eleito superintendente geral. A ênfase nestas personalidades se torna também plausível por serem durante este tempo os principais escritores da igreja, autores e autoras dos textos a serem interpretados neste trabalho. A hipótese desse trabalho é que, paralelo à ascensão da liderança brasileira, ocorre uma crescente sensibilização para questões sociais, apesar de que esta dinâmica seja interrompida com o surgimento da ditadura militar a partir de 1964, mas, retomada já na década setenta do século passado. Como método propõe-se a analisar o ensino teológico-doutrinário encontrado em publicações oficiais da ICPB, tais como os seus jornais oficiais, brasileiro e estadunidense, as suas edições da revista da Escola Dominical, as suas atas de convenções gerais, bem como livros e anotações e rascunhos de autoria dos/as pioneiros/as acima mencionados/as. Concluase que as teologias e análises do contexto encontradas nas publicações, justificam uma compreensão mais diversificada: por um lado, evidencia-se, em termos religiosos e políticos, uma maior proximidade entre as posições defendidas pelos autores e as correntes mais conservadoras (ou até reacionárias) do país. Por outro lado, transparecem ao lado desse discurso dominante abordagens dissonantes e com o potencial de servirem de ponto de partida para uma atuação da ICPB e da sua membresia mais relevante na sociedade, inclusive a denuncia da injustiça socioeconômica, e que estes respectivos discursos são encontrados mais entre lideranças nacionais. Palavras-chave: Brasil; pentecostalismo brasileiro; Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil (ICPB); pentecostalismo e sociedade; pentecostalismo e Ditadura Militar..

(8) SILVA, Wallace de Góis. Pentecostal Church of Christ in Brazil: foundation, theology and re(d)action in the Brazilian context from 1934 to 1986. 2015, 190 s. (Master’s Dissertation) – Methodist University of São Paulo, São Bernardo do Campo.. Abstract. The proposal of this study is to investigate the understanding of the role of the Church and its faithful in the world, according to the publications of the Pentecostal Church of Christ in Brazil (ICPB) and to interpret the results in dialogue with the social, cultural, economical, religious and political context of Brazil at the time. As period we propose the years 1935-1986, which includes the time of ministry of the founders, Horace and Carolyn Ward, Chester and Rachel Miller and Annie and Russel Frew, from the United States; the time of Ernst Grimm, an Estonian preacher; and the time of José Pinto de Oliveira, the first Brazilian elected general superintendent. The emphasis in these personalities also becomes plausible as they have been during the timespan under investigation the main church writers or authors of the texts to be interpreted in this work. The hypothesis of this work is that a growing awareness for social issues can be related to the rise of a Brazilian leadership. Although this dynamic is interrupted with the emergence of the military dictatorship in 1964, it is resumed in the late seventies of the last century. As method we propose to analyze the theological and doctrinal teaching found in official publications of the ICPB, such as their official journals, Brazilian and American, its book editions, Sunday School material, minutes of its general conventions and books and notes or drafts written by the pioneers above mentioned. We conclude that the theologies and context analyzes found in the publications, justify a more diverse understanding: first, it can be shown, in religious and political terms, that existed a greater proximity between the views expressed by the authors and more conservative (or even reactionary) currents of the country. On the other hand, we identified aside of this dominant discourse a dissonant approach with the potential to serve as a starting point for a more significant engagement in the society by the ICPB and its membership, including the denunciation of socioeconomic injustice, and that the respective discourses are pronounced more among national leaders. Keywords: Pentecostal Church of Christ in Brazil (ICPB); Government; Church and Society; Brazilian Pentecostalism; Pentecostalism and Society..

(9) 9 Introdução ______________________________________________________________ 10 Capítulo 1 O surgimento de uma igreja nacional: origens, fundação e características da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil _________________________________________ 15 1 Os pentecostalismos e a Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil __________________ 15 1.1 Aspectos gerais da denominação no Brasil _______________________________ 16 1.2 Pentecostalismos e questões raciais, socioeconômicas, políticas e religiosas _____ 20 1.3 Produção bibliográfica sobre a Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil ___________ 28 2 John Stroup e Pentecostal Church of Christ: raízes históricas e teológicas da ICPB _ 34 2.1 Trajetória religiosa e teológica de John Stroup ____________________________ 35 2.2 John Stroup e a organização da Pentecostal Church of Christ _________________ 42 3 A Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil: personagens e testemunhos na construção da sua história ___________________________________________________________ 48 3.1 Personagens de destaque na história da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil ____ 48 3.2 Historiografia inicial e tipologia a partir do testemunho dos pioneiros __________ 60 Capítulo 2 A igreja e o contexto brasileiro na perspectiva dos/as pioneiros/as _________ 71 1 Desenvolvimento e relação da igreja no contexto socioeconômico, cultural e religoso 71 1.1 Crescimento e reação diante do contexto socioeconômico ___________________ 71 1.2 Presença e reação dos/as missionários/as diante dos desafios socioeconômicos e culturais da igreja e do Brasil _____________________________________________ 84 1.3 Relação com outras igrejas, grupos ou movimentos religiosos ________________ 92 1.4 Papel das mulheres e da juventude _____________________________________ 101 1.5 Projetos socioeducativos e educação teológica na ICPB ____________________ 104 1.6 Tensões eclesiais e administrativas internas ______________________________ 107 2 Opinião dos missionários sobre política, sociedade e teologia e a prática da igreja _ 109 2.1 Discurso sobre a política e a sociedade da época __________________________ 109 2.2 Excertos de teologia nos textos dos/as missionários/as _____________________ 117 2.3 A relação da igreja no Brasil com os políticos e a política___________________ 120 Capítulo 3 Cosmovisão e teologia nas revistas de escola dominical: Igreja, sociedade e governo (1959-1986) _____________________________________________________ 122 1 Época da redação estrangeira (1959-1970): Ernst Grimm _____________________ 123 1.1 Época do Golpe Militar de 1964: denúncia silenciosa? _____________________ 123 1.2 Período de 1967 a 1970: santificação e trabalho __________________________ 125 2 Época da redação brasileira (1971-1986): José Pinto de Oliveira _______________ 144 2.1 Período de 1971 a 1986: religiosidade ética ______________________________ 144 2.2 Edição de 1975: voz profética contra a injustiça socioeconômica _____________ 178 Considerações Finais _____________________________________________________ 182 Referências Bibliográficas ________________________________________________ 185.

(10) 10. Introdução. Nossa aproximação à igreja, que se tornaria o objeto de estudo dessa pesquisa, se deu na infância, quando começamos a fazer parte de uma pequena comunidade de fé ligada à Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil (daqui pra frente, ICPB). Em 2006 fomos convidados pela secretaria de publicações da igreja em âmbito nacional e passamos escrever lições esporadicamente para a escola dominical. O interesse por conhecer a história da igreja, com seus erros, acertos e ambiguidades, aconteceu naturalmente e, consequentemente, o desejo de entender a história do movimento pentecostal e sua interação com os demais setores do protestantismo e a sociedade. Essa busca se intensificou mediante o contato e convivência com outras confissões de fé, e se tornou uma trajetória também de autoconhecimento. Em 2008, durante o último ano da gestão do Rev. João Batista Guimarães como superintendente geral da igreja, e do Prof. Ademir Teixeira de Freitas como secretário de publicações, aceitamos a proposta de ajudar a revisar o manuscrito do livro da história da ICPB, que vinha sendo compilado já há alguns anos. Nosso trabalho acabou sendo mais do que simplesmente ler e ajustar o texto: demandou a consulta às fontes históricas como jornais antigos e atas.1 Muitas dúvidas surgiram, deparamo-nos com questões complexas que envolvem a prática, as narrativas e a doutrina da igreja publicadas em seus órgãos oficiais e, com isso a paixão por estudar o tema cresceu. Em 2009 o Rev. Daniel Aparecido Silva foi eleito o novo superintendente, e após vários ajustes e adaptações, sua nova equipe lançou, em 2012, por ocasião dos 75 anos da denominação no Brasil, o livro ICPB um sonho americano, uma realidade brasileira. Nossa história.2 Este é resultado da revisão final e adaptação ao público da igreja e representa, consequentemente, redução de conteúdos e a inserção de informações que faziam menção às personalidades de destaque que ainda estavam em atuação naquele novo momento da igreja. O ano de 2012 coincide com a nossa graduação em Teologia, pela Universidade Metodista de São Paulo, e a monografia tratou da argumentação bíblico-teológica da ICPB na época do golpe militar e ensaiou uma proposta de reflexão teológica em torno dos temas da 1. SILVA, Agenivaldo Almeida; MATTOS, Joel Francisco; SILVA, Wallace de Góis. A história da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil: 1937-2010: A trajetória de homens e mulheres que se doaram à causa do Senhor Jesus e fizeram diferença através da ICPB. 140 f. Trabalho não publicado. 2 SILVA, Agenivaldo Almeida; SILVA, Wallace de Góis; SOUSA, Marcio Amorim. ICPB um sonho americano, uma realidade nossa. Nossa História: Histórico da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil. Monte Sião: SEREP, 2012. 150 p..

(11) 11 missão e da justiça para os dias atuais.3 Inicialmente procuramos, no presente trabalho, focar numa investigação a respeito da postura da ICPB com relação ao Golpe e ao Regime Militar e aos acontecimentos sociopolíticos da época. Para isso, pensamos, inicialmente, em estudar as publicações da Igreja entre 1962-1988, isto é, de dois anos antes até dois anos depois do início e do fim da ditura militar, para identificar eventuais mudanças de ênfases, argumentações teológicas, análises de conjuntura e posturas. O tema da ditadura militar se faz relevante por fatores como o aniversário de 50 anos do dia em que o Golpe foi desferido (1964-2014); a atuação da Comissão Nacional da Verdade; as lutas dos movimentos sociais e grupos religiosos ou não que se lançam em defesa dos direitos humanos e da justiça, bem como, em contrapartida, dos setores reacionários que defendem o retorno à ditadura e/ou levantam propostas conservadoras na política e na religião. Entendemos que este estudo se justifica também pelo número ainda pequeno de pesquisas dessa natureza com relação às igrejas pentecostais em geral, e da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil em especial. A ausência de investigações científicas sistemáticas e abrangentes esconde, provavelmente, que também há complexidade e dissonâncias sobre o temas nas as igrejas pentecostais tanto quanto há para as igrejas protestantes e para a Igreja Católica: não houve total omissão ou total resistência aos fenômenos socioeconômicos, políticos e culturais. Resta saber como se deu essa multifacetada relação. Nesse sentido, ideias unilaterais de que “as igrejas pentecostais não se posicionaram diante da didatura militar” representam simplicificações inadequadas. Em relação à ICPB, é fator de interesse que em suas publicações oficiais tenhamos encontrado um discurso que destoa de muitas outras vozes pentecostais que apoiaram o golpe e a ditadura militar. Outro aspecto relevante dessa pesquisa é que ela apresenta um estudo de uma igreja pentecostal em vagaroso, mas constante crescimento, de quase oitenta anos, e apesar de uma presença relativamente pequena no âmbito nacional brasileiro, tem representação em todos os estados da nação. O material usado como fonte de pesquisa como as revistas de escola dominical, livros , anotações pessoais dos/as pioneiros/as, cartas e artigos em jornais e as atas da igreja formam uma base ampla de textos que justifica a esperança de construir uma compreensão mais ampla da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil. 3. SILVA, Wallace de Góis. Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil na época do golpe militar de 1964: uma análise teológica de sua revista de Escola Dominical. 2012. 35 f. Monografia (Bacharel em Teologia) – Faculdade de Teologia da Igreja Metodista – Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2012..

(12) 12. A leitura sistemática dos textos nos levou a perceber, porém, ao longo da pesquisa, que ao lado do contexto político e das suas mudanças, no caso, de uma democracia para uma ditadura, houve outros aspectos relevantes e determinantes quanto aos posicionamentos da igreja em relação à sociedade: a relação das lideranças com esse contexto e a sua leitura dele. De fato, eram justamente essas lideranças, como veremos, também os principais autores das publicações e assim construtores das posições da igreja. Dessa forma surgiu ao lado da pergunta inicial principal – “Qual era a postura da ICPB com relação ao Golpe Militar e aos acontecimentos sociopolíticos da época?” – uma nova pergunta: “Quem eram os articuladores da postura da ICPB com relação ao Golpe Militar e aos acontecimentos sociopolíticos da época e quais eram seus argumentos e as suas posturas?”. Se, inicialmente, a pergunta foi sobre o impacto do contexto social sobre as igrejas, inclusive sobre a ICPB, a resposta parece ser a de que, a partir dos seus textos, ela jamais tenha se mostrado imune ao impacto performativo do seu contexto socioeconômico, político e cultural. Concomitantemente, ficou cada vez mais evidente a importância das lideranças da igreja na condução do seu posicionamento público. Isso nos levou, depois de certo tempo de leituras, à reformulação da nossa hipótese de trabalho: a postura da ICPB com relação ao Golpe Militar e aos acontecimentos sociopolíticos da época explicam-se de melhor forma pelo impacto performativo do seu contexto socioeconômico, político e cultural às suas lideranças, e também pela força da origem nacional delas expressas nos comentários a respeito desse contexto. Como isso ocorre de forma detalhada passou, então, a ser nossa pergunta principal. Tudo isso nos levou também a reconsiderar o recorte cronológico. Como o objetivo dessa pesquisa era ajudar a entender melhor a complexa relação das igrejas pentecostais em termos gerais e, da ICPB em termos específicos, com a sociedade e o governo, inclusive na ditadura militar no Brasil que ocorreu durante os anos de 1964-1985, partimos primeiro do ano 1964, que além de ser o ano de uma grande guinada política na história do país, foi o mesmo em que a convenção da ICPB decidiu se tornar autônoma em relação à sua igreja-mãe, sediada nos Estados Unidos da América. Pelo menos ao que consta nas publicações, isso ocorreu com a aprovação tanto dos obreiros convencionais brasileiros, como da liderança norteamericana. Na ocasião foi eleito o primeiro brasileiro para o cargo de superintendente geral, o Rev. José Pinto de Oliveira, de origem na Igreja Assembleia de Deus, porém, de formação teológica batista. Ele foi o autor das lições de escola dominical a partir de 1971. Esses momentos históricos foram escolhidos por se tratar de uma fase histórica que marcou a política e a sociedade no Brasil, e durante a qual a ICPB já estava em atuação e relativa expansão..

(13) 13. Na busca por verificar como se deram as relações da ICPB com o regime, fomos às fontes oficiais. O processoi de fundação da denominação se deu entre 1935 e 1937. Na pesquisa anterior, focamos na análise da revista de Escola Dominical. Ela foi editada a partir de 1959 por um casal norte-americano, Russel e Annie Frew, ambos enviados pela igreja estadunidense. Ao lado do casal, atuou também um pastor estoniano, Ernst Grimm, que se filiou à ICPB por volta dos anos 1950. Percebemos inicialmente alguma abertura para questões sociais, articulada pela ênfase no amor ao próximo. À medida que se aproximava o ápice da intervenção militar em 1964 o discurso ganhava outro rumo, no sentido de legitimar o direito do governo em intervir “pelo bem da sociedade” e o dever de orar pelos governantes. Para este trabalho, porém, ampliaremos o período estudado, que passará a compreender do ano da partida do missionário Horace Ward, fundador da igreja no Brasil, até a morte de José Pinto de Oliveira, ou seja, de 1934 a 1986. A igreja foi fundada em 1937, e os registros mais antigos de seu desenvolvimento datam a partir 1943, e consistem em cartas e relatórios que os/as missionários/as envivam à sede norte-americana e ela publicava no seu periódico, The Pentecostal Messenger. Oliveira faleceu em pleno exercício de seu mandato, que se extendia desde a sua eleição em 1964. Assim chegamos à conclusão que nosso recorte deveria ainda prestar especial atenção ao ano de 1964 e nos acontecimentos ao redor dele, porém, também considerar o tempo entre 1934 e 1986 para compreender a ICPB de forma mais ampla em sua relação com a sociedade, em termos teológicos, práticos e ideológicos. Este trabalho se organiza em três capítulos. Em “O surgimento de uma igreja nacional: origens, fundação e características da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil” apresentaremos aspectos gerais da denominação e suas raízes históricas e teológicas, desde o fundador do movimento que daria origem à Pentecostal Church of Christ nos Estados Unidos, o exmetodista John Stroup, até às pessoas que seriam pioneiras da obra no Brasil e receberam destaque na literatura oficial: os norte-americanos Horace (fundador) e Carolyn Ward, Chester e Rachel Miller, Annie e Russel Frew; o estoniano Ernst Grimm e o brasilerio José Pinto de Oliveira. Nessa parte não tencionamos fazer uma análise crítica das narrativas, mas um levantamento delas. É importante compreender que, nas falas dos/as pioneiros/as, aspectos subjetivos como as experiências religiosas (conversão, santificação, batismo com Espírito Santo, visões, profecias) são colocados na mesma prateleira dos aspectos mais objetivos, isto é, os que são possíveis se comprovar pelos registros do ponto de vista histórico, político, social, institucional, econômico. A visão de mundo e a leitura teológica dessas persona-.

(14) 14 gens é baseada nesses “fatos”, que parecem legitimar uns aos outros, e são eles que, a nosso ver, norteiam as ações da igreja. No segundo capítulo, “A igreja e o contexto brasileiro na perspectiva dos/as pioneiros/as” investigaremos as cartas e artigos publicados pelas personagens apresentadas acima (predominantemente norte-americanas), e como elas se relacionaram com o contexto socioeconômico, cultural, religioso e político do Brasil. Nesse momento a nossa análise se torna academicamente crítica e os discursos são organizados de modo a compará-los com os acontecimentos simultâneos de dentro e de fora do contexto da igreja. Deve-se ressaltar que os autores dos textos são as lideranças da igreja e que suas opiniões estão sujeitas a toda expectativa e intenções que envolvem um discurso destinado aos veículos de comunicação da denominação. Por fim, em “Cosmovisão e teologia nas revistas de escola dominical: Igreja, sociedade e governo (1959-1986)” articulamos o conteúdo desse material doutrinário/teológico com relação ao papel da igreja (inclua-se aqui os fiéis) no tocante à sociedade e ao governo. Isso se dá em dois momentos: na época da redação estrangeira, protagonizada por Ernst Grimm e, na época da redação brasileira, quase exclusiva de José Pinto Oliveira. Esperamos com isso trazer ao debate as considerações que julgamos mais importantes e nortear reflexões feitas no passado e que tocam temas da teologia e da religião ainda vigentes na atualidade..

(15) 15. Capítulo 1 O surgimento de uma igreja nacional: origens, fundação e características da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil. 1 Os pentecostalismos e a Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil Este capítulo tenciona apresentar uma visão panorâmica e introdutória da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil (ICPB) com base em documentos históricos arquivados no escritório central da International Pentecostal Church of Christ ou IPCC (London, Ohio, Estados Unidos da América) e na sede administrativa da ICPB no Brasil (Mogi Guaçu, São Paulo), ambos localizados nos respectivos centros de convenções A maior parte desses documentos são fontes nunca antes consultadas ou utilizadas em pesquisas acadêmicas, e aqui serão tomadas para serem apresentadas ao mundo acadêmico e demais leitores/as, não intenção, neste momento, de analisa-las criticamente ou de apresentar uma reflexão teológica. Procurou-se aqui remontar os fatos (objetivos ou subjetivos) que formam a narrativa fundante da igreja e que situam o trabalho no contexto do pentecostalismo em geral e no Brasil para que os capítulos posteriores se desenvolvam Algumas das fontes primárias estavam ainda na condição de rascunhos e manuscritos pessoais do Rev. Chester Miller, que foi bispo/superintendente da Igreja no Brasil e nos EUA. Miller desejava escrever um livro sobre o fundador do movimento que deu origem à ICPB, o Rev. John Stroup e sobre a história da igreja. Porém, partiu desta vida sem concretizar seu sonho. O capítulo também levanta pistas para uma compreensão do pensamento teológico da ICPB, tomando como ponto de partida os textos de suas lideranças, pois são as únicas disponíveis. Visualizar a maneira com que a teologia e as experiências religiosas são abordadas poderá ser fundamental para explicar sua reação (em forma de redação) diante do contexto em que ela se insere..

(16) 16. 1.1 Aspectos gerais da denominação no Brasil A Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil caminha para os seus 80 anos (1937-2017), e sua igreja mãe nos EUA já se aproxima do centenário (1917-2017). A ICPB é uma denominação evangélica originada nos Estados Unidos e trazida ao Brasil na década de 1930 por missionários estadunidenses, dos quais o primeiro foi Horace Singleton Ward (1906-1993). Desenvolveu-se a partir do nordeste brasileiro e hoje está presente em todos os estados brasileiros. A ICPB e a IPCC atualmente mantém missões nacionais e internacionais no Sudão do Sul, Quênia, Senegal, Venezuela, Argentina, Filipinas, Itália, México, Uruguai, Guiana Francesa, Colômbia e Chile. Os dados oficiais da Secretaria Nacional da igreja4 apontam que se somam no Brasil cerca de 600 igrejas e filiais e 30 mil membros, dos quais, aproximadamente dois mil são obreiros (pastores, presbíteros, missionárias/os, evangelistas, diaconisas e diáconos), supervisionados por 15 Diretorias Regionais.5 Essas são as únicas estatísticas disponibilizadas pela igreja e não foram encontradas outras fontes que pudessem confirmar ou contestar os dados. No Brasil, o diaconato é o primeiro cargo ordenado oficialmente da escala de ascensão ministerial. Para este cargo não é mais exigida a condição de ter recebido o batismo com o Espírito Santo com a evidência de falar em línguas, como em outros tempos o foi. No entanto, para ter acesso a algum posto superior na hierarquia da igreja, deve ter tido aprovação de sua conduta e ter atendido aos requisitos do estatuto, o que inclui o batismo pentecostal e se possível ter exercido o diaconato por pelo menos um ano. A ordem imediatamente acima do diaconato é composta pelos seguintes cargos: presbítero, missionário ou evangelista, os três tem os mesmos direitos e poder de voto nas convenções. As diaconisas podem ser apenas missionárias. Para ambas as ordens há uma cerimônia de consagração, com imposição de mãos e juramento de fidelidade diante à Bíblia e ao Estatuto e doutrina da igreja. A título de comparação é importante tomar conhecimento que a IPCC (sigla da igreja norte-americana) trabalha com categorias diferentes: há três degraus na escala ministerial, e só o último estágio é a ordenação: Evangelista, Pregador Licenciado e Ministro Ordenado.6 Não há presbíteros nem diáconos. Pastor é aquele que pastoreia uma igreja local, e não precisa ter sido ordenado. Missionários são aqueles que atuam em trabalhos distantes, enviados pela igre4. Disponível em < https://www.facebook.com/photo.php?fbid=590057964402958&set=a.110351695706923.16639.100001962786 826&type=1> Acesso em 24/01/2014 5 Conforme o Art. 27 da Constituição e Estatuto Geral da ICPB, uma “Região compreende uma área geográfica composta de cinco ou mais Campos organizados”. 6 Disponível em < http://ipcc.cc/Credentials.htm> Acesso 20 novembro 2014.

(17) 17. ja. É digno de nota que não há restrição constitucional para a ordenação de mulheres, e as regras são as mesmas aplicadas aos homens. Atualmente a IPCC têm pastoras. Existe ainda a categoria de Ministro Cristão Leigo, que trabalha na igreja local, em hospitais, presídios, escolas, e que, logicamente, opta por não participar da ascenção ministerial. A estrutura administrativa da ICPB é uma mescla dos modelos congregacional e presbiteriano, sistema que prevaleceu apesar da origem metodista (episcopal). Porém, sua principal estrutura administrativa se dá em duas instâncias: local (Campo) e nacional (Geral). O campo ou Igreja sede é uma “comunidade”7 regida pelo Estatuto de Campo que é baseado num modelo previsto no próprio Estatuto Geral. Os campos, que têm personalidade jurídica, são compostos por uma ou mais filiais que são denominadas igrejas locais ou congregações. A denominação de cada campo será sempre a de IGREJA DE CRISTO PENTECOSTAL NO BRASIL EM... (nome da cidade, bairro, distrito, etc. em que a sede está localizada). A Igreja sede é presidida pelo Pastor Presidente, sua diretoria (vice-presidente, secretários/as e tesoureiros/as), e pelo Ministério de Campo (obreiros/as ordenados/as do campo). A presidência do campo deve ser assumida em tempo integral por um presbítero, missionário ou evangelista, e recebe a nomeação (com ou sem consulta à membresia) pela diretoria regional, para um período indeterminado na função de Pastor de campo. O pastor deve ser casado, formado em teologia e ter comprovada aptidão prática para o cargo. Não há ordenação ou consagração de pastores, embora, após deixarem a direção de campos, sejam recebidos nas igrejas como pastores-auxiliares, mas com as atribuições de presbíteros. Mulheres não assumem a presidência de campos nem recebem a titulação de pastora, embora a possibilidade faça parte das discussões.8 Os ocupantes dos demais cargos da diretoria são eleitos na Convenção de Campo, ocasião em que, ordinariamente se nomeiam os pastores e aprovam-se a ordenação de outros/as ministros/as. Entre as decisões que cabem à convenção está a prebenda do pastor, calculada de acordo com as condições financeiras da igreja. A instância soberana na denominação é sua Convenção Geral, realizada de quatro em quatro anos, composta pelo ministério nacional. Participam dela os pastores de campo, os membros da diretoria geral, os secretários das secretarias nacionais como educação religosa e. 7. ICPB. Constituição (2012). Constituição da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil. Mogi Guaçu: SEREP, 2012. Arts. 39-42 8 A última Convenção Geral, em julho de 2013 delegou ao Conselho de Doutrina e à Comissão Estatutária a tarefa de emitir parecer sobre uma proposta que visa o reconhecimento do ministério pastoral das mulheres, desde que com reconhecida vocação e que seja esposa de pastor. A proposta, depois de apreciada, será encaminhada à próxima Convenção Intermediária, agendada para setembro de 2015, para ser votada. Este trabalho foi concluído antes da convenção..

(18) 18. publicações, missões e ação social, e os/as obreiros/as de todo o Brasil com exceção de diáconos e diaconisas. Na ocasião se decidem alterações na constituição, aprovação de medidas administrativas, discutem-se aspectos doutrinários e teológicos e é eleito o Superintendente Geral e seus dois vices, que não podem ser da mesma região do Brasil. O superintendente deve ser um pastor de campo há no mínimo quatro anos, membro da convenção há oito, e se não for bacharel em teologia (caso tenha se tornado pastor antes dessa exigência), deve estar matriculado num curso ou se comprometer a fazê-lo dentro do seu mandato, que é de quatro anos, podendo ser reeleito para tantos mandatos quanto ele se candidatar. A função não lhe dá plenos poderes, mas tem o dever de representar a ICPB dentro e fora dela e executar decisões previstas em convenção ou na constituição. A fórmula de tratamento dispensada (e, na prática, exclusivamente) ao superintendente é a de “Reverendo”, mas, não há nada previsto sobre isso na Constituição ou documento oficial. Para se autodefinir teológica e doutrinariamente, e acalmar debates que surgiram nos seminários teológicos da instituição, a ICPB criou em 2005 uma comissão que elaboraria um pequeno manual de doutrina.9 Este foi publicado como adendo no Estatuto da igreja. Nele se afirmam doutrinas fundamentais e secundárias marcadamente protestantes, de tendência arminiana e pentecostal. Considerados verdades bíblicas fundamentais por influenciarem na salvação, listam-se os seguintes temas: a Bíblia como palavra e revelação de Deus; Deus é trindade; nascimento virginal e “sobrenatural” de Jesus Cristo, o salvador; regeneração, justificação, santificação e eleição condicional dos crentes [em Cristo], ressaltando-se a soberania de Deus, mas em consonância com o livre-arbítrio; ressurreição e julgamento de todos; a segunda vinda de Cristo. Entre as verdades secundárias estão recomendações advindas da própria Bíblia ou da tradição, mas que não afetam a salvação: a definição eclesiológica como comunidades de salvos; as ordenanças do batismo por imersão e a participação na ceia apenas para pessoas batizadas; o dízimo; a atualidade dos dons espirituais listados por Paulo; a segunda vinda de Cristo como arrebatamento, e localizada historicamente como pré-tribulacionista e pré-milenista. Um manual mais amplo, baseado no formato da Confissão de Westminster está sendo preparado para ser lançado na próxima convenção. A igreja mantém hoje o Seminário Teológico Pentecostal do Brasil (SETEPEB), sediado em Mogi Guaçu, e com uma extensão no ABC Paulista, que oferece, dentre outros, o Curso Livre de Bacharel em Teologia e a Pós-Graduação em Pastoral, em modalidade presencial 9. ICPB. Constituição (2012). p. 87-95.

(19) 19. e à distância. A ETO, Escola de Treinamento de Obreiros, forma jovens em regime de internato para o serviço missionário ou pastoral por um período de um ano, com aulas de teologia básica, atividades laborais e evangelismo. Através da Secretaria de Educação Religiosa e Publicações (SEREP) edita as revistas de Escola Dominical para adultos, jovens e adolescentes, além de produzir outros materiais impressos como o Hinário Cristão Pentecostal. Recentemente inaugurou a Editora Pentecostal, com gráfica própria para atender a demanda da denominação. A Secretaria Nacional de Evangelização e Missões (SENEMI) investe em plantação de igrejas no Brasil e sustento de missionários/as no exterior. Por meio da Secretaria de Ação Social (SAS) mobiliza eventos assistenciais Assuntos específicos são tratados pelo Conselho de Doutrina, Culto e Liturgia, pelo Conselho de Ética e Disciplina e pelo Conselho Deliberativo Nacional. As mulheres se organizam na Sociedade Auxiliadora Feminina Pentecostal (SAFP) e a juventude na Ala Jovem Pentecostal (AJOVEP). O nome da igreja no Brasil mudou duas vezes. Primeiro era simplesmente Igreja de Cristo Pentecostal [de Serra Talhada], 1937-1949. Depois passaria a ser Igreja de Cristo Pentecostal do Brasil, 1949-1978.10 A autonomia oficial veio em 1964, mesmo ano em que a ditadura militar se iniciou no Brasil. Por fim, o nome que permanece até hoje é Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil. O entendimento geral foi o de que este último parece expressar melhor que a igreja está presente em diversos países, inclusive no Brasil. O nome da igreja, porém, não agrada a todos. Alguns criticam a tradução e defendem que a forma mais correta de traduzir Pentecostal Church of Christ seria Igreja Pentecostal de Cristo, e assim evitaria também o mal entendido com o adjetivo “Pentecostal”: ele se refere ao Cristo ou à Igreja de Cristo?11 Porém, essa questão parece não ter chamado muita atenção da igreja em geral, e em parte expressa algum desconhecimento da ideia do fundador, John Stroup que, baseado numa revelação, acrescentou o conceito de “Pentecostal” ao título bíblico “Igreja de Cristo” – preferível, segundo ele, a “Igreja de Deus” (outra denominação contemporânea). Outros ainda, como o atual secretário nacional de missões, têm sugerido que o nome (e o logotipo, cujo centro carrega um mapa do Brasil) deveria acompanhar o processo de expansão da igreja por outros paí-. 10. O ano de 1949 data a mudança interna e consensual do nome. Legalmente, a alteração viria tardiamente, em 5 de fevereiro de 1954, junto com a oficialização da união com a Igreja Pentecostal de Cortês. Até então, a nomenclatura era Igreja de Cristo Pentecostal de Serra Talhada. Seria adotado o estatuto da ICPB registrado em cartório em 23 de setembro de 1941. O registro foi publicado no Diário Oficial do Estado de Pernambuco, ano XXXI, n. 32, de 10/02/1954, p. 617. 11 Em publicações mais antigas a grafia do nome da igreja aparecia assim: “Igreja de Cristo, Pentecostal do Brasil”. Intuímos que o uso da vírgula talvez indicasse uma preocupação por estabelecer um entendimento menos ambíguo. Por motivos igualmente desconhecidos, o uso do sinal de pontuação caiu..

(20) 20. ses e, quem sabe, adotar um só logotipo e uma só neomeclatura: Igreja de Cristo Pentecostal Internacional. O argumento para a mudança se constrói em torno da ênfase no crescimento da igreja e também marcaria uma reaproximação (ao menos identitária) com a igreja-mãe norteamericana, denominada International Pentecostal Church of Christ (IPCC) desde os anos 1970. A sugestão apareceu no boletim missionário da ICPB para o primeiro trimestre de 201512 com ar de proposta para a próxima convenção. Não há como avaliar ainda como a possível proposta será recebida pela comunidade e pelo ministério. Fato é que as instituições, sociedades e culturas estão em constante movimento. Um novo nome representa uma nova identidade e expressa a realidade do momento a que ele representa. A ICPB não escapa a essa lógica.. 1.2 Pentecostalismos e questões raciais, socioeconômicas, políticas e religiosas Para uma compreensão geral do pentecostalismo, e especialmente do objeto de pesquisa deste trabalho, segue-se uma breve apresentação de textos de abrangências, locais de origem e enfoques diferentes, preferencialmente de autores ligados aos movimentos pentecostais.. 1.2.1 Pentecostalismo moderno e segregação sociorracial A começar por uma narrativa de origem norte-americana, destaca-se o livro O século do Espírito Santo [1901-2001]13, do historiador pentecostal Vinson Synan, que provê um panorama do pentecostalismo nos Estados Unidos (de onde veio a ICPB), trabalhando a partir da perspectiva histórica e teológica das origens do pentecostalismo moderno, ligando suas raízes desde os movimentos de santidade wesleyana e holiness, até ao movimento da Rua Azusa. Synan trata principalmente da influência de William J. Seymour (1870-1922), o pastor negro, filho de ex-escravos, cego de um olho e semianalfabeto, que em tempos de intensa segregação racial e social se destacaria como o principal líder do movimento que alavancaria o pentecostalismo moderno, situado no início do século 20. Seymour, por ser negro, assistiu do corredor às aulas da escola de Charles Fox Parham (1873-1929), em Houston, Texas. Parham é considerado o primeiro sistematizador da doutrina do batismo com Espírito Santo com a ênfase da 12. ICPB. Missões em foco. 1º trimestre de 2015. Mogi Guaçu: SENEMI. p. 1. SYNAN, Vinson. O século do Espírito Santo: cem anos do avivamento pentecostal e carismático. São Paulo: Vida, 2009. 608 p. 13.

(21) 21. evidência inicial de falar em línguas (glossolalia). Na primeira escola de Parham, instalada numa velha mansão de pedra em Topeka, estado do Kansas, a primeira pessoa a falar em línguas foi uma mulher, Agnes Ozman, estadunidense, que falou chinês por três dias. O fenômeno ocorreu na emblemática virada do ano 1900 para 1901. Dessa forma, Synan destaca a presença de afrodescendentes, mulheres e hispânicos, esquecidos pelos historiadores do movimento. Diz-se que o primeiro convertido da Rua Azusa foi um católico latino-americano, que antes da conversão doou o piso que foi usado na reforma do velho galpão onde as reuniões aconteciam. Sua conversão marcou o início da expansão de Azusa entre os povos de fala espanhola. Da mesma forma a participação feminina foi fator de grande impulso no crescimento do movimento, e o próprio Seymour só teria ministrado e recebido o batismo com Espírito Santo quando teve a ajuda de Jennie Moore. O fato de a Missão da Fé Apostólica ser uma igreja “supraracial”, no entanto, não impediu que o pentecostalismo se polarizasse entre igrejas de negros e brancos, representadas respectivamente pela Igreja de Deus em Cristo e as Assembleias de Deus.14 A perspectiva de Synan, uma exceção, é favorável às aproximações ecumênicas e defende um senso de cooperação entre as denominações cristãs, inclusive com o movimento carismático católico. Uma análise mais centrada na perspectiva racial do movimento é feita na obra A religião mais negra do Brasil: Por que mais de oito milhões de negros são pentecostais?, de Marco Davi de Oliveira. Ele trata exatamente da opção que os negros fazem pelo pentecostalismo, e da abertura do movimento para receber afrodescentes. O texto, embora com alguma limitação histórica, busca conscientizar sobre a injustiça em torno de questões raciais e, ao mesmo tempo, mostrar que a segregação se faz presente mesmo nas religiões cristãs. Exemplo disso é a rejeição histórica das igrejas tradicionais com relação às classes menos favorecidas, evidentemente demonstradas em suas áreas de missão, na liturgia e na ordenação de ministros. Em contrapartida, o acolhimento quase total delas pelo pentecostalismo, que por sua linguagem simples e acessível (até mesmo influenciada pela religiosidade negra) alcançou grande crescimento. Oliveira aponta ainda que o pentecostalismo clássico teve seu período de maior crescimento numérico a partir dos anos 1950, e importantes expressões do movimento foram crescendo em plena ditadura militar. Porém, apesar da postura evidentemente profética com rela-. 14. ALENCAR, Gedeon Freire de. Matriz pentecostal brasileira: Assembleias de Deus (1911-2011). Novos Diálogos: Rio de Janeiro, 2013. p. 58..

(22) 22. ção ao racismo e à exclusão de pessoas por causa de sua condição social, o pentecostalismo de um modo geral não entrou para a categoria dos “subversivos”, pois pesou-lhe mais o aspecto místico de sua religiosidade. Aos olhos do governo era um movimento prática e ideologicamente inofensivo.. 1.2.2 Pentecostalismos na América Latina Foram trazidos também para este diálogo textos que tratam do pentecostalismo indicando suas características teológicas em relação à sociedade e à política. O livro do teólogo pentecostal latino-americano Bernardo Campos, De la reforma protestante a la pentecostalidad de la iglesia, apresenta uma descrição histórica e teológica do movimento, e propõe passos para, não somente descobrir mas aperfeiçoar o senso de “pentecostalidade”, isto é, o princípio ordenador e estruturante das práticas pentecostais (pentecostalismos), que nasce da dinâmica da pneumatologia em dialética com o contexto sócio-econômico em que está inserida. A partir dessa consciência, é possível compreender a importância das igrejas pentecostais no contexto da América Latina e, como objetivo ideal, traçar um caminho ecumênico e de atuação relevante na sociedade. O movimento é predominantemente de pobres e suas comunidades são movidas pela dinâmica da presença viva do Espírito. Se por um lado se pode sugerir certa alienação em termos políticos, é percepctível também, por exemplo, aspectos sociais como a inclusão e empoderamento dos/as marginalizados/as. Outra obra de sua autoria, Experiencia del Espíritu: Claves para una interpretación del pentecostalismo,15 procura fazer uma amostra de sistematizatização da teologia pentecostal a partir do contexto latino-americano e principalmente peruano que, sem embargo, tem muitos pontos em comum com o pentecostalismo brasileiro. Aproveitou-se para esta dissertação a descrição de cada fase do desenvolvimento da mentalidade do pentecostalismo peruano de Campos, e serve de complemento na reflexão e compreensão do movimento no Brasil e, em especial, no caso da ICPB: implantação (1909-1930); consolidação (1930-1959); expansão (1960...). Sua definição do movimento – que apesar da objetividade, nãod eixa de ser “de dentro” – pode se resumir da seguinte forma: el pentecostalismo no es um simples fenómeno socio-religioso, o un mero producto del expansionismo político-religioso del capitalismo financeiro americano. Para los pentecostales el pentecostalismo es la consecuencia reli15. CAMPOS, Bernardo. Experiência del Espíritu: Claves para uma interpretación del pentecostalismo. CLAI: Quito, 2002. p. 4..

(23) 23. giosa y de fe de la Acción de Dios por su Espíritu Santo que irrumpió em Pentecostés en el siglo I de la historia Cristiana (Hechos 2.4; Lucas 2.47-49; Joel 2.27-32) y se estendió de Oriente al Occidente.16. Campos assinala que a primeira fase do pentecostalismo (1909-1930s) foi basicamente apologética, e o desenvolvimento de seu pensamento seguiu esta ordem: primeiro antiromanista (oposição a todas as formas de catolicismo romano ou “paganismo”, apesar da convergência de pensamentos com o catolicismo popular, igualmente rechaçado), depois anticomunista e, por fim, antiecumênico.17 Num segundo momento (1930-1959), a segunda geração de pentecostais experimentou “aspiraciones de clase media” e tendia a imitar as igrejas dos missionários norte-americanos. Isso em meio a um crescente interesse pela educação secular e o estabelecimento de Institutos Bíblicos, onde missionários estrangeiros com formação teológica mediana lecionavam. Esta segunda fase marcou outra mudança de mentalidade: o movimiento via a si mesmo como o poder dos pobres, a quem os católicos e demais protestantes não conseguiam alcançar. Politicamente, a despeito da fama de ser despolitizado, o pentecostalismo latinoamericano “asumía conscientemente una posición política de corte populista y más afín con la ideología del Imperio.”18 Além disso, procurou estudar e compreender o catolicismo como um movimento religioso do qual se deveria converter os fiéis e, ao mesmo tempo, se distanciou de suas semelhanças com o catolicismo popular. Por último, mas não finalmente, a terceira fase (1960 em diante), vem representando uma grande concorrência com outras linhas cristãs. Há jovens universitários e um contingente de pastores e missionários, em pleno contexto de militarização da América Latina, engajados em ideologias políticas anticomunistas compartilhadas a partir dos púlpitos e do rádio. As mentalidades se dividiam em dois pólos: conservadores e libertários, tanto em termos políticos como teológicos. Entre diálogos ecumênicos e o alinhamento ao discurso de teleevangelistas dos EUA, os pentecostalismos latinoamericanos tomaram diferentes rumos, desde a preocupação com as desigualdades sociais à aliança estratégica com o catolicismo ultraconservador.19. 1.2.3 Pentecostalismo e engajamento ou transformação social. 16. Id. Ibidem, p. xi. Id. Ibid. p. 4-7. 18 CAMPOS. Experiência del Espíritu, 2002. p. 8. 19 Id. Ibid. p. 8-11. 17.

(24) 24 O texto Global Pentecostalism: The New Face of Christian Social Engagement,20 de Donald E.Miller e Tetsunao Yamamori, é o resultado de uma pesquisa de quatro anos feita na África, Ásia, América Latina e Europa, e que buscou registrar o trabalho diário de envolvimento de igrejas em franco crescimento, principalmente pentecostais/carismáticas, e que estivessem envolvidas em ações diretamente ligadas à promoção humana, enfrentamento à pobreza, cuidado com menores em situação de risco, recuperação de usuários de drogas, etc, sem necessariamente estarem associadas a uma ideologia ou movimento político social ou a alguma teologia progressista, embora o trabalho se proponha a ser uma pesquisa sobre o pentecostalismo progressista. Elas são, para os autores, progressistas na prática, embora não proponham transformações estrturais. O texto procura mostrar que, em parte, o engajamento político ou social de pentecostais não é exatamente tão tímido ou alienado como se diz. Conforme defendem os autores, os programas de formação religiosa e a inclusão em atividades cúlticas/artísticas e na experiência fervorosa do pentecostalismo dão nova perspectiva de vida e afastam as pessoas de seus vícios, de alguns riscos sociais como a gravidez na adolescência, o aliciamento ou abuso de crianças, a criminalidade. Do Brasil, destacou-se o a Igreja Apostólica Renascer em Cristo com seu programa de reabilitação de adictos, ao lado de suas manifestações públicas como as marchas para Jesus e os cultos vibrantes de louvor. Outro texto ainda contribui com este trabalho: o artigo intitulado The Social Conscience of Stanley Horton21, publicado pela revista anual Heritage, editada pelo Flower Pentecostal Heritage Center, um instituto localizado na sede das Assembleias de Deus nos EUA, Springfield, Missouri, que faz o trabalho de resgatar e preservar fatos e materiais históricos do movimento em geral e principalmente das AGs, fornece importantes informações para esta pesquisa. Horton é um dos mais influentes teólogos do pentecostalismo nos EUA e no mundo, e sua atitude diante de duas questões como a guerra e o racismo são dignas de notas. No primeiro caso, optou pelo pacifismo, em geral defendido pela denominação, mas avançou na reflexão e fez alguns opositores. Um de seus conselhos era o de que se procurasse postos em que não se pegasse em armas como dirigir ambulâncias ou caminhões. Além disso, incentivava o trabalho evangelístico entre os soldados. Sobre o racismo, sua atitude de receber um aluno negro e dar-lhe apoio foi significativa em meio a um contexto de segregação (num seminário em que todos os outros eram brancos), e também acabou indiretamente fortalecendo os movimentos 20. MILLER, Donald E.; YAMAMORI, Tetsunao. Global Pentecostalism: The new face of Christian social engagement. Los Angeles: UC Press, 2007. E-book. 21 MITTELSTADT, Martin William; PAUGH, Matthew. The Social Conscience of Stanley Horton. Assemblies of God Heritage. Springfield: Gospel Publishing House, 2009. p. 15-19..

(25) 25. negros da época. O texto aponta questões discutidas internamente no pentecostalismo e propõe uma reflexão para os diálogos atuais. No Brasil, a obra Pentecostais e Transformação Social,22 de cunho acadêmico, é fruto do primeiro encontro da Rede Latinoamericana de Estudios Pentecostales (Relep) no país, procurou, em suma, compreender o movimento (a partir da fala de seus próprios integrantes) e propor uma leitura da Bíblia, da teologia e da sociedade que representasse um avanço ainda maior rumo a uma atuação mais presente e relevante.. 1.2.4 Pentecostalismo e Ecumenismo Apesar de todos os esforços iniciais de Azusa e do movimento que trouxe o “milagre de Memphis”,23 as igrejas pentecostais enfrentaram muito desentendimento interno e perseguições externas, bem como foram agentes de perseguição e de divisão. No âmbito cristão, as fortes bandeiras doutrinárias e evangelizadoras acirraram o afastamento do catolicismo romano e também do protestantismo histórico. O diálogo com outras religiões é impensável para a grande maioria dos pentecostais. As raras aproximações com os movimentos ecumênicos são bastante tímidas e frequentemente marcadas pela crítica dos setores mais conservadores das denominações. Magali do Nascimento Cunha e Cláudio de Oliveira Ribeiro tratam do tema em um capítulo do livro O rosto ecumênico de Deus.24 O artigo mostra momentos históricos em que o movimento ecumênico (e o Ecumenismo) encontrou semelhanças e diferenças com o movimento pentecostal (e o Pentecostalismo). Ambos os movimentos tanto são gerados quanto dão origem à teologia, conceito e ação dos seus respectivos “ismos”, mas não se restringem a eles e nem podem ser definidos levando-se em conta a forma com que se apresentam hoje. O movimento pentecostal está para além do Pentecostalismo, e o movimento ecumênico para além do Ecumenismo. Os movimentos têm em comum a dinâmica do vento do Espírito que sopra para a unidade, a superação de barreiras, a construção de um espaço para todos. Ambos nasceram no protestantismo. Mas, o andar da história trouxe separação por razões sociais, teológicas e ideológicas. Vez por outra se encontram. Seja por tentativas de reaproximação, seja pela essência de ambos que continuam agindo a despeito das tendências para o que os desvituam. 22. OLIVEIRA, David Mesquiati de (Org.). Pentecostalismos e transformação social. São Paulo: Fonte Editorial, 2013. 226 p. 23 Cerimônia simbólica de reconciliação racial entre as Assembleias de Deus e a Igreja de Deus em Cristo em Memphis, Tennessee, EUA, no ano de 1994. 24 RIBEIRO, Cláudio de Oliveira; CUNHA, Magali do Nascimento. O rosto ecumênico de Deus: reflexões sobre ecumenismo e paz. São Paulo: Fonte Editorial, 2013. p. 208-233..

(26) 26. Entre pentecostais que se aproximaram de alguma forma do movimento ecumênico (não sem pagar o preço) aparecem: Amos Young (Ásia), Donald Gee (Grã-Bretanha), J. Roswell Flower (EUA), David du Plessis (África do Sul), todos das Assembleias de Deus; e o brasileiro Manoel de Mello, fundador da Igreja O Brasil Para Cristo. O próprio Conselho Mundial de Igrejas (CMI) tem um Grupo Consultivo para diálogo com pentecostais. Na América Latina, algumas igrejas pentecostais são membros do CMI: Iglesia Pentecostal de Chile, Misión Iglesia Pentecostal, Iglesia Cristiana Bíblica, Iglesia de Misiones Pentecostales de Chile, todas chilenas; e a Iglesia de Dios da Argentina. A O Brasil Para Cristo foi membro até os anos 1990, quando o fundador faleceu. A Comissão Pentecostal Latino-Americana (Cepla), que representa diversas igrejas pentecostais, inclusive no Brasil, é membro do CMI e do CLAI. “Fruto da Cepla é a Relep, Rede Latinoamericana de Estudios Pentecostales, fundada em 1999 por teólogos pentecostais para ser um espaço de produção teológica pentecostal em diálogo interdisciplinar com todas as ciências”.25 Uma das explicações possíveis para a dificuldade do diálogo ecumênico com pentecostais é a ligação com o “pentecostalismo branco”, que tem maior aproximação com as linhas protestantes conservadoras e evangelicais.. 1.2.5 Expressões dos pentecostalismos no Brasil O maior grupo pentecostal brasileiro e talvez do mundo são as Assembleias de Deus. É preciso entender, no entanto, que elas não foram o primeiro grupo pentecostal a se manifestar no Brasil embora as narrativas da própria denominação atribuam a si mesma o status de pioneira, inclusive entre as Assembleias no mundo. Tradicionalmente se reconhece a fundação das ADs em 18 de junho de 1911, quando se organizou a Missão da Fé Apostólica, a partir de um grupo de ex-batistas em Belém, PA. Mas, somente em 1918 o grupo adotou oficialmente o nome de “Assembleia de Deus”, nomenclatura já utilizada nos Estados Unidos (1914), na Guatemala (1916) e no México (1917). Nos EUA as ADs foram organizadas em uma conferência por um grupo de pentecostais brancos para fazer frente à Igreja de Deus em Cristo, composta de pentecostais negros. Gedeon Freire de Alencar defende que as raízes dos pentecostalismos (no plural mesmo, para expressar o aspecto multifacetado do movimento) no Brasil são ainda anteriores à vinda dos suecos Daniel Berg e Gunnar Vingren, fundadores das ADs no Brasil. A começar pelas religiosidades indígenas e africanas, Alencar defende que elas já manifestavam características que seriam encontradas no pentecostalismo como o uso do corpo no 25. Id. Ibid. p. 230..

(27) 27. culto e as frequentes manifestações extáticas, de transe e de possessão. Entre os cristãos, menciona igrejas como metodistas livres, batistas letos, grupos holiness e o contexto do movimento místico e político de Antônio Conselheiro. Considere-se ainda a Igreja Evangélica Brasileira, fundada sob a égide de restaurar o ato de ouvir a voz de Deus. 26 Alencar procura desconstruir o mito fundante das ADs que as coloca como pioneiras ou mesmo exclusivas representantes do pentecostalismo, mas ainda assim reconhece a sua contribuição ao cenário evangélico e pentecostal em termos de números, relevância social e faz profundo estudo sobre a formação do que chamou de Matriz Pentecostal das ADs em cem anos do grupo (1911-2011). Outro texto que ajuda a compreender o desenvolvimento do movimento no Brasil foi o livro produzido como resultado da 8ª Conferência Mundial Pentecostal, realizada de 18 a 23 de julho de 1967, no então Estado da Guanabara, atual Rio de Janeiro, também figura como importante fonte de consulta sobre o movimento no Brasil.27 O tema do evento foi O Espírito Santo glorificando a Cristo. Ao que consta, milhares de pessoas estiveram presentes nos estádios Maracanã e Maracanãzinho, e o encerramento foi prestigiado por 150 mil pessoas. O texto foi reimpresso pela CPAD (Casa Publicadora das Assembleias de Deus), reproduzindo fielmente sua formatação, e no encarte externo, consta a informação de que em 2016 a conferência será em São Paulo. Nitidamente se percebe o protagonismo das ADs no evento. Alguns fatos relativos ao tema de religião e política apresentados nessa obra são importantes para essa pesquisa: 1. A presença do Governador do então Estado de Guanabara (1965-1970) e embaixador Francisco Negrão de Lima, que aparece ao lado do Pr. Paulo Leivas Macalão, importante líder na história das ADs, na primeira foto grande do livro, fez a abertura solene da Conferência. Lima era membro do PTB, e fez oposição ao regime militar. Seu nome é citado com destaque e a expectativa por sua chegada também é registrada no livro. O governador do Rio de Janeiro (1967-1971), descrito como pastor evangélico, Dr. Geremias de Mattos Fontes também. 2. Parte da Conferência foi dedicada a comemorar os 410 anos do primeiro culto protestante em terras brasileiras, e a comemoração justamente no local de onde os primeiros mártires evangélicos foram atirados: o forte da baia de Guanabara. À época da comemoração, o forte já pertencia à Marinha do Brasil, que segundo os textos, desconhecia o histórico religioso do local. Os nomes de oficiais da marinha são mencionados em forma de agradecimento. 26. ALENCAR. Matriz pentecostal brasileira, p. 50-59. CONDE, Emílio (Coord.). O Espírito Santo glorificando a Cristo: Anais da Oitava Conferência Mundial Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 1967. 198 p. 27.

(28) 28. Além da constante ênfase no poder e na obra do Espírito Santo, o tema da Cristologia, como o próprio nome já diz, foi bastante explorado. Entre os preletores estavam o então superintendente das Assembleias de Deus nos EUA, Thomas F. Zimmerman, que tratou do tema “O Espírito Santo unificando a Igreja”, e uma das críticas mais contundentes que faz sobre os esforços ecumênicos é o que ele chama de “construir uma organização mundial de igrejas na base da inteligência humana”28 e não com base no ensino das Escrituras, principalmente no que se refere à cristologia. Sua definição de unidade não inclui os ideais do movimento ecumênico, mas centraliza tudo na crença em Jesus Cristo como Senhor e Salvador.29 Outro conferencista, o Dr. Nathaniel M. Van Cleave, pastor da Igreja Quadrangular em Oregon, USA, trata do tema “O Espírito Santo glorificando a Cristo através da Palavra de Deus” evidenciando reservas em relação às teologias modernas, influenciadas pelo liberalismo teológico.30 Ambos os temas, ecumenismo e modernismo, foram contemplados na literatura da ICPB e com abordagem semelhante. Em suma, a cristologia pentecostal, tema do evento, enfatiza a obra de Cristo, resumida em preferencialmente quatro pontos (no Brasil), mas podendo ser até cinco: Jesus salva, [santifica], batiza com o Espírito Santo, cura e em breve voltará.. 1.3 Produção bibliográfica sobre a Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil Reuniram-se aqui as principais literaturas não publicadas pela ICPB e que mencionam a denominação no Brasil ou nos EUA. Elas serviram também de fonte de consulta para a compreensão do objeto de pesquisa. O Dicionário do Movimento Pentecostal31, de ampla divulgação, publicado pela CPAD, faz um breve resumo histórico da ICPB com base em informações fornecidas pela própria denominação através de sua secretaria de educação religiosa e publicações, e cita brevemente a bibliografia de seu pioneiro, o missionário Horace Singleton Ward, enfatizando sua atuação entre as Assembleias de Deus. A versão em inglês, na qual o dicionário da CPAD foi inspirado, o The New International Dictionary of Pentecostal and Charismatic Movements, apresen28. Id. Ibid. p. 69 Conforme David Bundy, Zimmerman foi um opositor ao ecumenismo. (RIBEIRO; CUNHA: 2013. p. 224). 30 CONDE. O Espírito Santo glorificando a Cristo, 1967. p. 119. 31 ARAÚJO, Israel de. Dicionário do Movimento Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2007. 946 p. 29.

(29) 29. ta a International Pentecostal Church of Christ (IPCC), com sede em London, Ohio, EUA, como uma “Organização pentecostal wesleyana”,32 resultado da união de duas igrejas: International Pentecostal Assemblies e da Pentecostal Church of Christ em 1976. A primeira está ligada ao proeminente pregador pentecostal G. B. Cashwell, e a segunda ao Rev. John Stroup. O historiador e missionário pentecostal Carlos Boaventura publicou o livro O Brazil Pentecostal33, onde resgata, sem grandes aprofundamentos, a história esquecida de denominações menores que as igrejas mais famosas, mas que também se destacam entre as primeiras a se instalarem por aqui. A começar pela Igreja do Calvário Pentecostal, o terceiro movimento pentecostal a chegar em terras tupiniquins e que mais tarde se uniria à Igreja de Deus e seria considerada a sua primeira filial no Brasil. Sua fundadora, Mathilda Paulsen, chegou ao país em agosto de 1934, aportando no Rio de Janeiro, onde trabalhou ao lado da AD Madureira. Em 1936, partiu para Catalão, Goiás. O contexto machista a impediria de ser ordenada a qualquer ministério. Em segundo lugar, Boaventura, aponta a ICPB como sendo o quarto movimento pentecostal a se instalar no Brasil, com a chegada de Horace Ward em janeiro de 1935, enviado pela Igreja de Cristo Pentecostal que fora oficialmente fundada nos Estados Unidos em 1917. A igreja brasileira seria inaugurada em janeiro de 1937, na cidade de Serra Talhada, cidade natal de Virgulino, o Lampião, em Pernambuco. Uma análise sob o ponto de vista das ciências sociais está em Os deuses do povo34, de Carlos Brandão, onde faz estudo de caso dos principais grupos religiosos, inclusive de uma congregação da ICPB em Itapira, SP. A pesquisa, realizada por volta dos anos 1970, procurou analisar a forma com que os líderes religiosos das três principais religiões mais populares: católica, evangélica e mediúnica, lidavam com o povo e vice versa, na tarefa de produção de sentido e influência no comportamento social. A ICPB não é classificada como as “pentecostais tradicionais” (ADs e a CCB), mas entra para a categoria de “seitas novas” ou “movimentos de cura” ou ainda “formas novas de pentecostalismo”. Estas são religiões típicas da periferia. Os fundadores dos três pequenos grupos pentecostais de cura divina são também pessoas do município. Converteram-se na própria cidade, onde re32. WARNER, W. E. International Pentecostal Church of Christ. BURGESS, Stanley M.; MAAS, Eduard M. van der (Edit.). The new International Dictionary of Pentecostal and Charismatic movements: revised and expanded edition. Grand Rapids: Zondervan, 2002. p. 797-798. 33 BOAVENTURA, Carlos. O Brazil Pentecostal: Uma análise da história. 2ª ed. Juiz de Fora: New Hope Publisher, 2013. p. 124-126. 34 BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Os deuses do povo: Um estudo sobre religião popular. 2ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1986. 307 p..

Referências

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