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TECENDO AS MANHÃS: Pesquisa participativa e formação de professores de inglês

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Academic year: 2021

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Pesquisa participativa e formação de professores de inglês

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Wilmar Sachetin Marçal Vice-Reitor

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TECENDO AS MANHÃS:

Pesquisa participativa e formação

de professores de inglês (organizadora)

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Daiane Lourenço REVISÃO Kilda Maria Prado Gimenez

PROJETO GRÁFICO Maria de Lourdes Monteiro

EDITORAÇÃO Maria de Lourdes Monteiro

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) T255 Tecendo as manhãs: pesquisa participativa e formação de professores

de inglês / organização de Telma Gimenez – Londrina : UEL, 2007.

181p. : il.

Inclui bibliografia. ISBN 978-85-98196-72-5

1. Língua inglesa – Estudo e ensino 2. Formação de professores – Língua inglesa 3. Formação de professores I. Gimenez, Telma. CDU 802.0:37.02

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APRESENTAÇÃO ... PARTE 1 – A PESQUISA

1 Formadores de professores de inglês como pesquisadores ... Telma Gimenez e Vera Lúcia Lopes Cristovão

2 Crenças sobre ensino de inglês na Prática de Ensino ... Talitha Alonso e Francisco Fogaça

3 A formação de professores durante a Prática de Ensino nos cursos de Letras: foco no trabalho de formadores, suas opções metodológicas e abordagens ... Samantha Mancini Ramos e Gladys Plens de Quevedo Pereira de Camargo 4 Conhecimentos em construção: uma análise de sessões de supervisão de Prática de Ensino de Língua Inglesa ... Alessandra Dutra, Kilda Maria Prado Gimenez e Helena Maria Moura Peres 5 Língua inglesa, formação de professores e cidadania: articulando áreas afins ... Lucas Moreira dos Anjos Santos, Gladys Plens de Quevedo Pereira de Camargo e Vera Lúcia Lopes Cristovão

6 Relação universidade/escola na formação de professores de inglês: primeiras aproximações ... Telma Gimenez e Fabiana Mendes Pereira

PARTE 2 – VINHETAS

1. A causa está na experiência ... 2. A primeira experiência em sala de aula ... 3. A questão do tempo ... 4. A sessão que não houve ... 5. A sombra do caos ... 6. A tarefa e a discussão ... 7. A vaidade em primeiro lugar... 8. Acertando o passo ... 9. Adorável bagunceiro! ... vii 1 23 41 63 73 97 119 120 120 121 121 122 123 124

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11. Aluna-professora roubando a cena ... 12. Conhecendo a escola pública ... 13. Divisão de trabalho ... 14. Dois países, várias aulas e uma mesma questão ... 15. É aula de inglês, não é? ... 16. Elizabeth, a estagiária chiquérrima ... 17. Entre o controle do tempo e o respeito ao ritmo do aluno ... 18. Entusiasmo e receio na preparação de aula... 19. Éramos seis ... 20. Estágio? Oh, my God... ... 21. Interesse(s) ... 22. Minha primeira observação... 23. Mudança de rumo ... 24. Não queremos aula de inglês ... 25. Nunca falou, e quando falou me apavorou ... 26. O estagiário que gostava de dar sermões e o poder da intervenção divina na supervisão do estágio ... 27. O inverno de Nova Iorque e os ipês da UEL... 28. O único pequeno grande problema ... 29. Observação de aula em escola púbica de ensino fundamental... 30. Professor, você trouxe um Halls hoje? ... 31. Puxão de orelha!... 32. Saber ou não saber, eis a questão ... 33. Saudade do livro didático ... 34. Sou chique, bem! ... 35. Temos nossos direitos e queremos respeito... 36. Tempos modernos – a tecnologia a serviço da educação ... 37. Todo primeiro dia de aula ... 38. Try... even if you make some mistakes ... 39. Tudo conforme o planejado. Parabéns! ... 40. Vazio ... 41. “Você tem que parafrasear”. “Para... o quê?” ... Referências bibliográficas ... 126 127 128 129 130 131 132 133 134 135 136 137 138 139 140 141 142 144 145 146 147 148 149 150 151 152 153 154 154 155 156 157 161

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“Um galo sozinho não tece a manhã: ele precisará sempre de outros galos”, nos avisa João Cabral de Melo Neto. Na sua sabedoria de poeta, prenuncia o rumo que um grupo de profissionais da área de língua inglesa tomaria ao se engajar em um projeto de pesquisa interinstitucional. Partindo do pressuposto de que a reflexão sobre a prática é um importante elemento para sua transformação, docentes do curso de Letras de quatro diferentes instituições públicas e particulares de ensino superior do norte do Paraná iniciaram o projeto de pesquisa intitulado O ensino da língua inglesa no Paraná e a formação de professores durante a Prática de Ensino nos cursos de Letras (por nós conhecido como ELIPE). O resultado de suas reflexões se encontra nesta coletânea. Iniciativas recentes de formação continuada do professor de inglês no Estado do Paraná levaram ao envolvimento de instituições de ensino superior e rede privada de ensino e indicaram a necessidade de vinculação entre formação continuada e formação inicial, mediante a criação de uma rede de instituições formadoras que oferecem os cursos de Letras. O 1o. ENFOPLI (Encontro de Formadores de Professores de Língua Inglesa do Paraná) foi realizado em 2003 e contou com 61 representantes de 28 IES públicas e privadas do Estado. Uma das conclusões do evento foi a necessidade de articulação entre os profissionais encarregados das práticas de ensino de inglês de modo a trocar experiências e propor alternativas para a formação inicial de modo a torná-la mais significativa. Para este fim, a pesquisa se coloca como um elemento fundamental, não só para construir conhecimento sobre o que vem sendo feito nas instituições, mas também como forma de desenvolvimento profissional para os próprios formadores. Mais do que procurar harmonizar as práticas é preciso promover espaços para que formadores – eles próprios – possam refletir criticamente sobre suas ações e analisar os efeitos das diversas atividades desenvolvidas nesta etapa de formação.

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Deste modo, em 2005, após reuniões regionais dos integrantes do ENFOPLI do Norte do Paraná, foi decidido que um projeto das instituições participantes seria proposto à Fundação Araucária. Com a aprovação do financiamento, deu-se início, em 2005 às atividades planejadas. A pesquisa foi de natureza qualitativa, com instrumentos comuns a serem utilizados pelos membros da equipe executora. Além de reunir informações atualizadas sobre o quadro de formação de professores de inglês e suas relações com as escolas no que diz respeito às instituições envolvidas, o projeto serviu também para fortalecer as relações institucionais na região norte do Estado.

Adotando-se o conceito de pesquisa-ação crítica (Carr e Kemmis, 1988), iniciou-se um processo participativo com reuniões bimestrais. Ao longo do período foram realizadas 15 reuniões da equipe, nas quais eram discutidos aspectos da coleta, análise e disseminação da pesquisa. Todos os membros da equipe executora, cada um em sua instituição coletou dados da seguinte forma:

1. Todos os alunos de prática de ensino (independentemente do ano em que estão cursando a disciplina) responderam a um inventário de crenças sobre ensino de inglês em dois momentos: no início e no final da disciplina. Este inventário encontra-se no Anexo A. 2. Os três alunos que apresentaram maiores discrepâncias entre o

inventário inicial e final foram entrevistados ao final da disciplina. Para este fim foi utilizado um roteiro de entrevista semi-estruturada construído pela equipe (Anexo B).

3. Foi feito um levantamento das práticas adotadas nas disciplinas de Prática de Ensino de Inglês, nas instituições participantes, mediante questionário (Anexo C).

4. Foram coletadas cópias de documentação como programas de disciplinas e projeto político-pedagógico dos cursos de Letras envolvidos.

5. Cada formador-pesquisador gravou em áudio sessões de supervisão com seus estagiários, tanto na fase de planejamento quanto na fase de “feedback” das aulas ministradas. No caso de uma das instituições, ao invés de sessões de supervisão clínica, foram gravados encontros de grupos de estudos com estagiários.

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6. Os participantes mantiveram diários quinzenais sobre sua atuação como formadores.

7. Os professores colaboradores que trabalharam com os estagiários responderam um questionário (Anexo D) com avaliação sobre a relação universidade/escola.

Por fim, os participantes escreveram vinhetas representativas dos casos vivenciados no período de coleta de dados, de modo a subsidiar oportunidades de formação inicial ou continuada. Estas vinhetas encontram-se na parte 2 deste livro.

Desde seu início até a submissão dos textos que compõem esta coletânea, o projeto desenvolveu uma trajetória que envolveu inclusões e exclusões de participantes, em função de razões pessoais e de mudanças profissionais. Participaram professores da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Fundação Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Mandaguari (FAFIMAN), Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Cornélio Procópio (FAFICOP) e Faculdade de Ciências Contábeis e Administrativas de Rolândia (FACCAR). Estas mudanças foram analisadas em um texto que se encontra no prelo, em livro contendo uma seleção dos trabalhos apresentados no I Congresso Latinoamericano sobre formação de professores de línguas (CLAFPL), realizado em Florianópolis, em 2006. Em função disso, esta coletânea não inclui aquelas reflexões sobre o primeiro ano do projeto mas que são complementares aos textos aqui apresentados.

Além dos formadores (também designados supervisores), o projeto teve também alunos de graduação como bolsistas de iniciação científica. Dada a mobilidade de participação, nem todos os integrantes participaram de todas as fases do projeto e esta disseminação, especificamente, conta com a maioria dos participantes, embora alguns tenham optado por não se envolver nesta etapa do projeto. Suas contribuições, no entanto, estão registradas subliminarmente nos dados analisados. Afinal, eles também foram responsáveis pela coleta e participaram das reuniões da equipe.

Dividimos a coletânea em duas partes: na primeira trazemos textos que procuram dialogar com os objetivos traçados para o projeto

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em sua etapa inicial. Na segunda parte são apresentadas as vinhetas produzidas por formadores e alunos de iniciação científica, num total de quarenta e uma. Na redação dos textos, inevitavelmente, surgiu a dúvida de como retratar os participantes. Embora haja indícios suficientes para a identificação de cada um de nós, sentimo-nos mais confortáveis usando números: assim somos P1, P2, etc.

Iniciamos a apresentação do projeto discutindo o valor da pesquisa como prática de desenvolvimento profissional dos formadores, uma vez que este era um dos propósitos principais do projeto. No capítulo 1, de autoria de Telma Gimenez (UEL) e Vera Lúcia Lopes Cristovão (UEL), são analisadas transcrições das reuniões da equipe, na tentativa de problematizar o caráter participativo da pesquisa e seu potencial para aprendizagem do grupo. Conforme alertam as autoras, “levando-se em conta a definição de Carr e Kemmis (1988) sobre pesquisa-ação crítica, é possível dizer que esta pesquisa atingiu parcialmente suas características. Certamente ela provocou oportunidades de reflexão sobre as práticas, conforme apontado nos relatos de melhoria e aprendizagem decorrentes do projeto. Entretanto, não nos é possível afirmar que conseguimos melhorar as condições objetivas de realização de nossas práticas. Se, por um lado, sob o aspecto das condições subjetivas o projeto se revelou benéfico pela aprendizagem coletivamente gerada, pelo senso de pertencimento criado, por outro lado, mostrou também as dificuldades de incorporação da pesquisa como parte da atividade docente”. A maciça participação da UEL nesta coletânea pode ser exemplo dessas conclusões. Com um histórico de pesquisas e infra-estrutura para sua realização, os formadores dessa instituição encararam, de modo mais natural, a pesquisa como parte integrante de seu trabalho. Podemos dizer que o objetivo de criação de uma rede de pesquisadores foi alcançado, mas sua sustentabilidade apenas parcialmente atingida. Há, no entanto, interesse em continuarmos nos reunindo, ainda que informalmente, para trocar experiências.

A partir do capítulo 2, são trazidos resultados de análises parciais dos dados. As crenças/representações dos futuros professores sobre o

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ensino de inglês são analisadas por Talitha Alonso (que atuou como bolsista de iniciação científica) e Francisco Carlos Fogaça (UEL) em um trabalho que procurou responder ao objetivo geral do projeto de identificar representações sobre ensino de inglês, trazidas por alunos de Letras em diversas instituições do Estado do Paraná, e como estas são reforçadas ou modificadas pelas Práticas de Ensino. Embora analisando um pequeno conjunto dos dados coletados, os autores identificam algumas transformações advindas da observação de aulas em diferentes contextos e de participação em projetos que possibilitam maior vivência na escola. Há ainda muita insegurança com relação ao próprio domínio da língua inglesa e da capacidade em lidar com os problemas da sala de aula, considerados parte de uma prática distante da teoria aprendida no curso de formação.

Identificar as diversas opções metodológicas adotadas por formadores de professores de inglês e suas abordagens na condução da prática de ensino é o objetivo geral discutido por Samantha Mancini Ramos (UEL) e Gladys Plens de Quevedo Pereira de Camargo (UEL) no capítulo 3. Seguindo a literatura sobre modelos de supervisão, as autoras analisam sessões de supervisão e diários de algumas formadoras, concluindo que três modelos são utilizados: o diretivo, não-diretivo e alternativo. Embora sem identificar causas para essas escolhas, elas levantam a hipótese de que essas podem variar de acordo com a atividade realizada. É importante observar que os dados revelam que a supervisão de estágio se dá em moldes centrados na universidade, em que as relações de autoridade estão demarcadas. É uma atividade que se realiza fundamentalmente entre o supervisor (que detém o conhecimento) e o estagiário (que busca esse conhecimento). Isto pode explicar porquê há muitas instâncias dos modelos diretivo ou alternativo.

O capítulo seguinte traz também reflexões sobre as sessões de supervisão, desta vez com o objetivo de avaliar quais os efeitos das opções metodológicas e abordagens na construção de conhecimentos sobre ensino na etapa de formação inicial. Alessandra Dutra (FACCAR), Kilda Maria Prado Gimenez (UEL) e Helena Maria Moura Peres (FAFIMAN) trazem trechos de sessões de supervisão para demonstrar que o conhecimento

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buscado pelo futuro professor está centrado em questões de recursos didáticos e metodológicos. As posições hierárquicas não são problematizadas e o formador, de modo geral, aceita e reforça o papel de provedor desse conhecimento. Embora não tenham analisado todos os dados disponíveis, as autoras salientam a necessidade de formadores também se engajarem em um processo de aprendizagem, ao se tornarem investigadores da própria prática.

A possibilidade de se contar com alunos de iniciação científica e de orientadores está refletida na contribuição do capítulo 5, de autoria de Lucas Moreira dos Anjos Santos com as orientadoras Gladys Plens de Quevedo Pereira de Camargo (UEL) e Vera Lúcia Lopes Cristovão (UEL). Analisando dados de transcrições de sessões de supervisão de duas formadoras da mesma instituição, o objetivo foi verificar se questões de cidadania tinham sido contempladas, buscando também identificar de que forma essas questões foram abordadas. Das duas sessões de uma formadora e três de outra os autores concluíram que houve evidência de comprometimento com questões de cidadania, embora nem sempre de forma explícita. Indagações sobre o valor da explicitação de questões de cidadania são trazidas pelos autores, que advogam que nas Práticas de Ensino o tema deve ser abordado, direta ou indiretamente, tendo em vista os novos papéis para futuros professores de inglês.

O capítulo 6 traz um texto de Telma Gimenez (UEL) e Fabiana Mendes Pereira (bolsista de iniciação científica) e trata do objetivo de verificar as formas de relacionamento entre instituições formadoras e escolas públicas na realização da Prática de Ensino. Mediante análise de questionários enviados a professores colaboradores do campo de estágio em escolas (públicas e particulares), as autoras apontam para aspectos positivos bem como melhorias que poderiam ser introduzidas na relação entre as instituições formadoras e as escolas. Apoiadas em referências no campo das parcerias entre universidades e escolas e projetos em andamento na área de ensino de inglês, em uma das instituições participantes do projeto, elas indicam “inventividade e compromisso” como fundamentais para que novas práticas sejam implementadas.

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Na segunda parte são trazidas as vinhetas produzidas por oito autores, entre formadores e alunos de iniciação científica. Vinhetas são tradicionalmente empregadas como instrumentos de investigação em pesquisas de cunho qualitativo. Neste projeto foram adotadas como  fontes reveladoras das experiências dos participantes e também como geradoras de situações para análises de práticas de formação em nível inicial. As vinhetas se apresentam com potencial para reflexões sobre a prática de ensino, pois foram redigidas em tom pessoal e coloridas pelo olhar do autor. Se os textos da primeira parte têm um formato acadêmico convencional, as vinhetas são espaços para a emoção livre do filtro da análise. Ali podemos abrir pequenas janelas para o que acontece nas aulas observadas, nas sessões de supervisão e nos questionamentos que trazemos; diálogos internos dos quais agora os leitores são testemunhas. Nossas preocupações, aquilo que consideramos mais saliente, as frustrações e sensações de êxito revelam um pouco do mundo da formação inicial. Assim, revelam-se fios, que se vão tecendo nas manhãs (nem sempre ensolaradas) da formação de professores de inglês.

Nessa tessitura se inclui este livro. Agradecimentos são devidos a todos que o tornaram possível: a Fundação Araucária, o CNPq, UEL, FAFIMAN, FAFICOP e FACCAR. Uma autoria coletiva que, reflexivamente, agradece a cada um e todos.

Londrina, setembro de 2007. Os autores

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Introdução

A proposta do professor pesquisador tem ganhado força nas últimas décadas, em função do desencantamento com a racionalidade técnica que marcou a formação e desenvolvimento profissional em épocas anteriores. A atividade de investigação sobre a própria prática traz inúmeras vantagens, muitas delas associadas ao encorajamento da reflexão e potencial para emancipação do profissional de ensino de línguas estrangeiras (MOITA LOPES, 1996; DICKEL, 1998).

No entanto, embora tenha sido cada vez mais comum a proposta de engajamento de futuros professores com a pesquisa, como forma de tornarem-se profissionais mais reflexivos, críticos e analíticos, são ainda recentes as iniciativas de se ter o formador de professores de inglês como foco de investigação. As pesquisas na área de preparação inicial, nos cursos de Letras, realizadas no campo da Lingüística Aplicada, têm se voltado

Capítulo 1

Formadores de professores de

inglês como pesquisadores

Telma Gimenez1 Vera Lúcia Lopes Cristovão

If research is to achieve the concrete transformation of real educational situations, then it requires a theory of change which links researchers and practitioners in a common task in which the duality of the research and practice roles is transcended.2

(Carr & Kemmis, 1988, p. 158)

1 Agradeço ao CNPq (Proc. 305564/2005-6) o apoio para realização de pesquisas. 2 Se a pesquisa tem como objetivo alcançar a transformação concreta de situações educacionais reais ela requer uma teoria de mudança que junta pesquisadores e práticos em uma tarefa comum, na qual se transcende a dualidade entre pesquisa e prática.

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mais para os estagiários e seus conhecimentos/crenças (e.g. VIEIRA-ABRAHÃO, 2006; CASTRO, 2006).

Formadores de professores podem se engajar com a pesquisa-ação de três formas: como orientadores de trabalhos de professores que investigam sua prática nas escolas, eles próprios como pesquisadores de seu trabalho, ou, ainda, como uma mescla dos dois papéis. É exemplo do primeiro caso o trabalho desenvolvido por tutores em um curso de aprimoramento profissional de professores de inglês, em que orientaram pesquisas conduzidas pelos próprios cursistas (GIMENEZ & CRISTOVÃO, 2006). Trabalhos que procuram entender o papel do formador e suas oportunidades de desenvolvimento profissional são ainda raros (vide, no entanto, inter alia, MATEUS, 2005; ORTENZI et al, 2005, ORTENZI, 2007).

Levantamento realizado por Ortenzi (no prelo) com dados do I Congresso Latinoamericano de Formadores de Professores de Línguas (CLAFPL) demonstra que “O formador começa a figurar como elemento importante na compreensão dos processos formativos, como se observa nos trabalhos desse evento e em outros presentes nos meios de circulação de conhecimento no Brasil”.

O projeto aqui relatado se insere nesse quadro, ao ter proposto que um grupo de formadores investigasse suas práticas por meio de uma pesquisa participativa. Dentre os objetivos do projeto destaca-se a necessidade de identificar como os formadores participantes avaliam os resultados decorrentes da realização de pesquisa como uma atividade de seu desenvolvimento profissional. Análises parciais dos dados relatadas em Gimenez, Cristovão, Furtoso e Santana (no prelo), indicam que

Embora as participantes tivessem autonomia para tomar decisões, o que configuraria uma participação transformadora, as mudanças de planos e entraves da pesquisa analisados até o momento constituíram-se em fatores determinantes da dependência de instruções e encaminhamentos de lideranças no interior do grupo.

Os dados discutidos neste trabalho são posteriores aos analisados no estudo citado. Enquanto naquele foram analisadas as 4 reuniões iniciais, realizadas em 2005, neste relato trazemos uma análise das transcrições de reuniões realizadas no final de 2005 e durante 2006, bem como questionário aplicado ao final do projeto (Anexo D). A análise anterior centrou-se em a) contribuições individuais dos participantes; b) mudanças

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e os entraves encontrados na realização da pesquisa e c) percepções dos integrantes da pesquisa sobre seu valor enquanto instrumento de desenvolvimento profissional. No primeiro ano, observou-se heterogeneidade nas formas de participação e insegurança por parte de alguns membros do grupo com relação ao desenho da pesquisa. Neste sentido, os mais experientes puderam contribuir de modo mais direto com sugestões de mudanças no encaminhamento do projeto, que foi objeto de negociação durante aquele período.

Considerando que passada a fase de coleta de dados, o grupo se concentraria na análise, este trabalho tem como objetivo caracterizar a pesquisa como espaço de desenvolvimento profissional, pela identificação de: a) dificuldades ainda vivenciadas no segundo ano do projeto, b) oportunidades para aprendizagem emergentes das reuniões da equipe, c) papéis assumidos que permitissem a caracterização da pesquisa como pesquisa-ação crítica, e d) vozes constitutivas do discurso do formador.

Este texto traz, primeiramente, o referencial teórico da pesquisa-ação para, posteriormente, apresentar os resultados da análise e nossas considerações finais.

A pesquisa no desenvolvimento profissional

A literatura sobre pesquisa-ação ou pesquisa conduzida pelos próprios profissionais em seus contextos de trabalho nos informa que esta traz inúmeros benefícios. Dentre eles são citados: os profissionais se tornam mais informados sobre sua área de atuação, compreendem e tomam decisões melhores sobre suas práticas pedagógicas e aumentam sua auto-confiança, revitalizando seu ensino (LEVIN; ROCK, 2003). Levin e Rock procuraram verificar os custos e benefícios percebidos por professores novatos e experientes ao se engajarem em um projeto de pesquisa-ação colaborativa. Os professores novatos relataram que restrições de tempo foram problemáticas, assim como a dependência de outras pessoas. Outros fatores apontados como cruciais: diálogo compartilhado, persistência e comprometimento. Como resultado positivo, a colaboração foi percebida como capaz de trazer perspectivas, apoio e feedback adicionais. Por outro lado, os professores experientes relataram que seus papéis no projeto exigiram alta dedicação e os desafiaram a testar novos papéis e responsabilidades como professores. Sua principal função foi assessorar os novatos a crescerem como estudantes e professores. Seu envolvimento

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se deu principalmente com feedback verbal, discussões e reflexões conjuntas. No entanto, apontaram que outras responsabilidades fizeram com que seu engajamento fosse diminuído.

Para Levin e Rock (op.cit.) pesquisa-ação envolve professores na investigação de sua prática profissional com a finalidade de compreendê-la, transformá-compreendê-la, além de aprimorar a própria linguagem sobre o trabalho. A pesquisa-ação colaborativa é sugerida como uma oportunidade que pode construir espaços de parcerias pedagógicas produtivas e de estabelecimento de escolas de desenvolvimento profissional3, já que os diferentes colaboradores (professores em formação e professores em exercício, no caso da pesquisa de Levin e Rock) se engajam em diálogos profissionais partilhados e questionamentos críticos sobre ensino-aprendizagem que podem gerar experiências de aprendizagem.

No caso desta pesquisa, formadores de professores de inglês (de diferentes instituições e alunos-professores) se reuniram para a investigação sobre a(s) atividade(s) de formação com a intenção de partilhar o planejamento, a coleta, a análise e as reflexões sobre o trabalho. Nesse sentido, justificamos o foco de investigar o potencial de desenvolvimento profissional gerado pela pesquisa.

O desenho da pesquisa foi orientado por uma concepção de pesquisa-ação crítica com base na definição de Carr e Kemmis (1988):

Pesquisa-ação é simplesmente uma forma de investigação auto-reflexiva, realizada por participantes em situações sociais, a fim de melhorar a racionalidade e justiça de suas próprias práticas, seus entendimentos dessas práticas e as condições nas quais as práticas são realizadas. (p.162). (nossa tradução).

Assim, para eles, “outsiders”4 podem informar ou interpretar essas práticas, mas não as constituem. Por esse motivo têm poder limitado para transformá-las, pois raramente vivem as conseqüências de eventuais transformações. Daí a importância que atribuem aos práticos (“insiders”) para que eles próprios explorem seus entendimentos e busquem descobrir como suas situações são limitadas por condições subjetivas e objetivas, explorando como podem ser modificadas. Carr e Kemmis (1988, p. 158) 3 Escolas de Desenvolvimento Profissional são ações integradas entre instâncias de formação (universidade e escola) que aproximam professores universitários, professores colaboradores e futuros professores (TEITEL, 2003).

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vão além, ao proporem que “se a pesquisa quiser alcançar uma transformação concreta das situações educacionais reais, esta requer uma teoria de mudança que relaciona pesquisadores e práticos em uma tarefa comum no qual se transcende a dualidade dos papéis da pesquisa e prática”. Para eles a pesquisa-ação cria condições para a constituição de comunidades de aprendizagem interessadas em entender os problemas e efeitos de sua ação estratégica, sinalizando uma possível amenização das relações de poder constituídas no interior de pesquisas que envolvem acadêmicos e práticos. Lieberman (1995) se refere ao desenvolvimento profissional como aquele que se ancora no questionamento, na reflexão e na experimentação participante. Também defende que para uma abordagem privilegiar o desenvolvimento, ela deve considerar os conhecimentos trazidos pelos participantes, suas dificuldades, seus problemas, as características constitutivas de seu contexto, a necessidade de tempo e de instrumentalização para o trabalho e deve proporcionar espaço para a construção de novos conhecimentos, além da fundamental colaboração, parceria e trabalho em rede.

Daí considerarmos relevante identificar as dificuldades, as oportunidades de aprendizagem e os papéis desempenhados pelos participantes na execução da pesquisa.

Procedimentos de análise

A metodologia de pesquisa adotada durante todo o projeto está descrita na Introdução deste livro. Nesta seção descrevemos apenas os procedimentos de análise empregados para elaboração deste texto.

Reuniões da equipe realizadas no período entre dezembro de 2005 e outubro de 2006 foram gravadas e transcritas. Adicionalmente, em abril de 2007, foi pedido aos participantes que respondessem a um questionário, avaliando os resultados da pesquisa. Embora comentários sobre o projeto tivessem ocorrido de forma contínua, pelas contribuições e observações dos integrantes durante as reuniões, o questionário permitiu corroborar as análises a partir das percepções dos próprios participantes.

As transcrições das reuniões listadas no quadro 1, a seguir, e as respostas de 9 participantes ao questionário foram submetidas a um processo de análise de conteúdo, de modo a contemplar as perguntas de pesquisa. Seguindo uma metodologia exploratória, foram identificados segmentos reveladores de dificuldades durante o período selecionado, oportunidades de aprendizagem e papéis desempenhados.

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Quadro 1 – Síntese das reuniões da equipe

A fim de aprofundar a análise, foi adotado um procedimento complementar por meio da exploração das vozes constitutivas do discurso dos participantes nas reuniões e nas respostas ao questionário. O objetivo foi verificar a responsabilidade enunciativa das asserções. A necessidade de se discutir a responsabilidade enunciativa se justifica pela interação das representações que um agente produtor tem, e que aciona em suas produções, com as representações dos outros. Assim, ao acioná-las, elas já assumem um caráter dialógico. Nessa emergência das representações, haveria um confronto entre as representações individuais do agente e dos outros, criando um espaço mental coletivo. De acordo com Bronckart (1999, p. 323)

“Essa instância coletiva está necessariamente implicada no conjunto das operações que sustentam a infra-estrutura e os mecanismos de textualização, intervindo mais diretamente nos mecanismos enunciativos propriamente ditos, no caso, na gestão das vozes e das modalizações.”

Para tratar do gerenciamento das vozes enunciativas, aquele autor primeiramente define vozes como “as entidades que assumem a responsabilidade do que é enunciado”. Essas vozes podem se apresentar de forma direta ou indireta. Quando for direta, o discurso é interativo e as vozes se constituem nos turnos de fala. Quando indiretas, podem aparecer em qualquer tipo de discurso e se constituem por expressões como ‘segundo o autor’. Desse modo, podemos dizer que todo texto é polifônico, mas sua polifonia pode estar explícita ou implícita.

5ª. Reunião

13/12/2005 6ª. Reunião 14/02/2006 8ª. Reunião 25/05/2006 11/10/2006 9ª. reunião Objetivo Avaliação das

atividades realizadas em 2005 e planejamento de 2006. Discussão de leituras, levantamento de dados já coletados e planejamento da análise. Apresentação das análises e dúvidas sobre encaminhament os. Apresentação de resultados de análise por dois

sub-grupos e relato de bolsistas sobre sua participação no Encontro Anual de Iniciação Científica. Participantes 10 formadores e 3

alunos IC alunos IC e uma 6 formadores, 4 colaboradora 7 formadores, 4 alunos e uma colaboradora 7 formadores, 4 alunos e uma convidada

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Resultados e discussão Dificuldades

A escassez de tempo e o excesso de trabalho foram apontados como principais entraves para a realização da pesquisa, mencionados por 7 dos 9 integrantes5. Isto impediu que os formadores se encontrassem com maior freqüência e trocassem informações sobre como fazer pesquisa. A divisão de trabalho adotada durante essa fase de análise dos dados foi organizada de modo que se formassem subgrupos para analisar os dados em função dos 5 objetivos do projeto.

Podemos exemplificar essas dificuldades com o excerto abaixo:

P11: ...Inicialmente as pessoas que haviam escolhido o mesmo objetivo que o meu não dispunham de tempo para encontrar o grupo e discutir as ações que iríamos realizar: o que cada um iria fazer, como os dados seriam analisados, que referencial iríamos utilizar, quem escreveria o quê, e assim por diante. Alguns dos membros do grupo moravam em outra cidade e o deslocamento para Londrina era difícil às vezes. O grupo era composto por alunos de iniciação científica e por professores, mas mesmo os alunos não encontravam tempo para os encontros. Finalmente o trabalho se desenvolveu, mas sem a participação efetiva de todos os membros iniciais do grupo. (questionário)

Embora a coleta de dados tenha sido planejada de modo a não trazer encargos adicionais a seus membros, a fase de análise revelou que seria necessário recorrer a outros para ajuda. Daí a organização em subgrupos e envolvimento de alunos. Uma das participantes contou com o auxílio de seus alunos para a transcrição dos dados, avaliando positivamente a experiência:.

P3: Falando um pouco nesta questão de dificuldade, nessa semana agora que foi uma correria, formatura, eleição e mais e mais. As alunas que eu entrevistei depois elas falaram: “professora, quer que eu transcreva isso?” Então elas gostaram, elas leram, teve uma outra que me ajudou a fazer a comparação, que não é da sala. Então eu achei que esse foi um ponto importante pra eles saberem o quanto a gente tem que fazer, e pra eles verem que dentro desse trabalho, eles também podem crescer, né? (5ª. Reunião).

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A participação de alunos de iniciação científica no projeto foi fundamental para que transcrições fossem realizadas, tanto das reuniões da equipe quanto das entrevistas com os estagiários. Entretanto, nem todos os participantes contaram com esse tipo de auxílio, o que revela condições diferenciadas para os membros realizarem a pesquisa. Este fator pode ter influenciado as formas de participação de cada um, conforme apontado no questionário.

Além do tempo e excesso de trabalho, a pouca familiaridade com pesquisa pode ter sido responsável pela percepção de uma outra participante, que assim expressou sua dificuldade:

P4: Eu tenho tido muita dificuldade, então eu estou assim penando porque eu não sei pedir nada pra ninguém, então as minhas coisas estão aí acumuladas, todas à mão. Eu não consigo raciocinar na frente do computador e eu estou tendo uma dificuldade imensa por falta de organização. (5ª. Reunião)

P4: Os entraves são de nível pessoal, ou seja, minha própria dificuldade de organização e de escrita acadêmica (questionário).

Tendo em vista que o projeto teve duração de dois anos e meio, a participação dos membros foi irregular, conforme já apontado em Gimenez, Cristovão, Furtoso e Santana (no prelo). Imprevistos de ordem pessoal e outras prioridades definidas ao longo do período resultaram em não engajamento total com o projeto. A fase de coleta foi permeada por dificuldades dessa natureza, mas foi na fase de análise que os problemas de coleta apareceram de modo mais explícito:

P7: Eu acho que na hora de coletar ou produzir os diários, as pessoas não tinham muito os objetivos em mente. (questionário)

P3: É, também! Isso também pode ter acontecido... (8ª. Reunião) P1: É que agora eu vejo mais claramente o projeto e os objetivos do que quando eu estava coletando dados. Se eu soubesse, se eu tivesse tudo mais claro, talvez eu tivesse dado outro jeito. (8ª. Reunião)

P1: Acho que deveríamos ter refletido mais tempo na hora da discussão sobre a coleta de dados e, principalmente, sobre os rumos que tomaria a análise. Aquele foi o momento mais importante da pesquisa, na minha opinião. Foi o momento em que decidimos o que cada grupo faria. Eu gostaria de ter discutido mais naquele momento. (questionário)

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P8: Acho que reduziria a diversidade dos dados, mas ampliaria o período longitudinal de coleta. (questionário).

P3: Talvez a diversidade dos dados tenha ficado muito ampliada, e os dados de algumas gravações ficaram diversificados e difíceis de serem confrontados. Mais explicitação na hora da realização de coletas de dados. Estamos sentindo isso no nosso trabalho (questionário).

A falta de clareza sobre os objetivos do projeto demonstra que nem todas as suas fases foram, de fato, participativas, a despeito de ter surgido de uma reunião do grupo e visto como uma forma de aprendizagem conjunta. Essa falta de senso de “propriedade” do projeto se revela no predomínio de um moderador, cuja análise será tratada na seção 3. Por outro lado, isto resultou também em aprendizagem, pois as reconstruções do projeto envolveram sugestões de mais discussão nesta fase:

P9: Se tivesse tempo hábil, faria várias reuniões para a elaboração do projeto, pelo menos, no que diz respeito aos objetivos e à metodologia. Acho que eles não refletiram as expectativas de todos, embora tenhamos tido a oportunidade de fazer sugestões. (questionário).

Assim, o modo como o projeto foi concebido provocou a necessidade de constante negociação na fase de análise, resultando em dificuldades adicionais, mas também proporcionando oportunidades de aprendizagem, a serem tratadas na seção seguinte.

Oportunidades de aprendizagem: um exemplo

Além da pouca identificação com o projeto na sua fase de elaboração, a assimetria de conhecimentos e experiência na realização de pesquisa se tornou visível durante o período analisado, ampliando seu potencial de aprendizagem, conforme já apontado.

No entanto, há o reconhecimento de que o próprio desenrolar do projeto possibilitou essa compreensão:

P1: E tem uma coisa também, o amadurecimento aqui das reuniões, das descobertas, das reflexões, assim, foi muito melhor do que a leitura do projeto que fizemos inicialmente. Nós lemos o projeto, discutimos, mas como não estávamos nos reunindo ainda, não tínhamos ido à prática propriamente dita, pra mim ficou um pouco abstrata, né? Eu falei: não, eu entendi e vou fazer isso. Depois, com as reuniões, que eu percebi.

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A opacidade de um dos objetivos do projeto para um dos subgrupos serviu, no entanto, para gerar contribuições por outros integrantes do grupo, no momento em que resultados preliminares estavam sendo discutidos. A seqüência abaixo, extraída da 8ª. reunião exemplifica um dos momentos em que a participante P1 procura confirmação para sua análise preliminar:

P1: Deixa eu te dar um exemplo: numa sessão de supervisão a aluna coloca,... ela apresenta sua opção metodológica ao mostrar interesse em trabalhar com textos, realizar interpretação na língua inglesa explorando a cultura do país e valorizando isso. Ela traz isso consigo, é parte dela, é representação dela. Esse interesse pode ter sido ou não construído na etapa de formação inicial. Ela pode trazer isso com ela, uma representação dela...

A participante P10 responde com uma afirmação categórica e procura explorar a resposta da formadora:

P10: Isso não importa. O que a supervisora dela faz quando ela faz isso? P1: A supervisora incentiva. Diz “é isso mesmo, se esforça, que é por esse caminho mesmo”...

A esta resposta a participante P9 atribui uma justaposição com um dos outros objetivos do projeto, uma questão que já vinha sendo levantada em outras reuniões e que pode ter se agravado pela separação em subgrupos para análise de um conjunto de objetivos concebidos como um todo:

P9: Aí já entra no objetivo dois ((falam simultaneamente)) P9: O que a formadora fez...

P10: Ela não desafiou – ela reforçou, legitimou aquilo que ela falou, tinha como proposta.

P1: Por que isso também vem ao encontro do que a formadora pensa, no que ela acredita.

A formadora P1 procura então encontrar uma explicação para esta opção, ou seja, atribui ao sistema de crenças da formadora a decisão de desafiar ou legitimar a proposta trazida pelo estagiário. Nesta reunião foram vários os momentos em que os demais participantes (e não

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apenas os do subgrupo responsável pelo objetivo) contribuíram com suas sugestões sobre como realizar a análise:

P1: [...] só pra eu entender melhor, então, que relação isso tem entre a opção metodológica e o conhecimento que o aluno tem?

P10: Não é a opção metodológica do aluno, não é o aluno falando “eu vou entrar na leitura desse jeito”. A opção metodológica é a do formador: vai ser prescritivo, vai ser colaborativo, vai ser reflexivo, o que ela vai ser.

A uma possível interpretação equivocada do objetivo do projeto P10 procura esclarecer, afirmando ser referente à opção do formador. Neste ponto parece ficar mais evidente que o enquadramento de abordagens de formação não é compartilhado por todos os membros do grupo. A dúvida agora se volta para um outro aspecto do objetivo, quando P7 questiona se houve construção de conhecimento, cujo sentido parece continuar obscuro quando ela mesma pergunta “mas é legitimação de uma crença ou um construir conhecimento”? ao que P10 responde com outra pergunta, atrelando a resposta à continuidade da ação do supervisor.

P7: Mas aí foi construído um conhecimento ou não? P9: O aluno não vai questionar mais.

P3: Você falou colaborativo, reflexivo, prescritivo.

P7: Mas vai ter uma continuação do conhecimento prévio ou construção, é uma legitimação de uma crença ou é um construir conhecimento? P10: Aí eu não sei, ela disse isso e o professora disse o quê? Tem aí a fala do supervisor? O que a supervisora disse “é isso mesmo minha filha, você está certa”?

As sugestões apresentadas, no entanto, começam a fazer sentido para a participante P4, quando esta devolve para o grupo seu entendimento para ser corroborado, ainda na mesma reunião:

P4: Deixa eu verificar o que estou entendendo. Estou lembrando de uma que eu analisei, minha própria. Se eu for dividir em partes a minha sessão, eu vejo assim: primeira parte “a supervisora pede ao aluno que apresente o que ele pensa em fazer na próxima aula”. Se o aluno expõe o plano dele; aí eu passo pra um segundo ponto, uma segunda parte, que eu começo a questionar o porquê de ele estar fazendo aquilo. Nessa segunda parte, analisando esse momento, eu consigo identificar a opção dele, o conhecimento que ele tem. Até existe um momento que eu falo “aqui ele

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esta trazendo o conhecimento de vida dele, a história de vida dele como aprendiz de uma língua estrangeira”, porque ele diz assim: “eu resolvi dar esse exercício aqui”, e eu pergunto por quê? Ele fala “eu sempre fiz assim e acho legal”. Essa fala dele “eu sempre fiz um exercício assim, eu já fiz um exercício desses há um tempo atrás” - eu acho interessante fazer essa interpretação - que a história de vida como aprendiz da língua é um conhecimento que ele está trazendo, não é uma coisa que eu tive influência. É a própria história dele..

P9: O que você faz com isso é que é a sua opção metodológica. O que você fez com isso que ele trouxe?

P4: Aí entra num terceiro momento que eu começo a refutar tudo aquilo que ele está trazendo, tudo que ele esta sugerindo pra fazer. Aí começo eu a dizer “por que você não faz assim, vai ficar muito difícil isso, seus alunos lá não vão conseguir responder”. Então, sou eu agora impondo a minha opção metodológica, é isso?

P10: Não, eu acho que você está dando uma abordagem alternativa. Você está colocando pra ele uma outra alternativa. Este texto que a gente esta distribuindo hoje, do Gebhard, fala sobre modelos de supervisão.

Ao questionamento de P4, P9 responde (O que você faz com isso é sua opção metodológica) e coloca outro questionamento (O que você faz com isso que ele trouxe?) fazendo com que P4 continue sua descrição da prática adotada. P4 procura confirmação para tentar tornar menos ambíguo o sentido de “opção metodológica”, ao que P10 responde negativamente, afirmando ser alternativa e não prescritiva a abordagem adotada. Menciona, ainda, um texto que poderia ajudar a compreender melhor as opções citadas. Neste sentido, P10 coloca sua possível interpretação sobre o dado apresentado e sugere uma fonte externa que poderia auxiliar na análise. Como podemos ver nos capítulos 3 e 4, essa referência foi, de fato, utilizada.

Outras oportunidades de aprendizagem foram reveladas pelo questionário. A participação no projeto foi apontada como benéfica por todos os participantes. Dentre seus resultados positivos são representativos os citados por P11 em sua resposta ao questionário:

A possibilidade de compartilhar os mesmos dados com outros formadores; A oportunidade de discutir os dados e o andamento da pesquisa com os demais pesquisadores;

A flexibilidade e abertura que esta pesquisa nos deu; os objetivos, o referencial e a metodologia eram amplos o suficiente para que pudéssemos buscar uma identificação e um compromisso com os resultados; A possibilidade de verificar como a formação de professores se dá em outras instituições de ensino;

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Comparar diferentes perspectivas e condições de trabalho; A participação em eventos para divulgação dos resultados;

O sentimento de pertencer a um grupo que compartilha dos mesmos anseios.

Como resultado de aprendizagem a capacidade de refletir mais sobre a prática foi apontada como principal conseqüência da participação no projeto, que serviu também para proporcionar embasamento teórico para as práticas adotadas:

P1: Hoje as minhas aulas são muito diferentes. Sempre dizia que tinha muitos estagiários que não dava tempo. Hoje tento fazer o tempo dar. Estou mais reflexiva, estou diferente do que era. Acho que mudei para muito melhor.

P9: [...] Antes desta experiência, o entendimento da abordagem de formação de professores adotada por mim e pelos colegas de minha instituição (abordagem reflexiva) parecia algo rígido e engessado e agora, consigo explorar e me posicionar um pouco mais perante esse “modelo” e outros, sem necessariamente me sentir “culpada” ou “traidora” do meu discurso.

A seguir apresentamos um quadro sintético das auto-avaliações dos participantes

Quadro 2: Percepções sobre a aprendizagem gerada pelo projeto

Participante A pesquisa proporcionou

P1 Mudança na própria prática. Adequação do tempo a uma abordagem reflexiva.

P3 Visão positiva de pesquisa e mudança da prática com maior compartilhamento com alunos

P4 Maior embasamento teórico para prática como supervisora de estágio

P5 Mudança na prática, ouvindo mais os alunos e enriquecimento teórico-prático

P7 Maior consciência de sua atuação

P8 Tomada de consciência das dimensões do trabalho como formadora e da dinâmica da pesquisa participativa

P9 Olhar mais crítico sobre sua própria orientação no estágio P10 Reflexão sobre trabalho coletivo e desafios de constituição de

uma comunidade de formadores

P11 Conhecimento das práticas de colegas e percepção de dificuldades dos alunos

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Observa-se que todos perceberam ganhos com a realização do projeto, apesar das dificuldades já mencionadas. Seis dos nove participantes ressaltaram o impacto da pesquisa em sua prática. Os outros três ressaltaram diferentes aspectos, quais sejam: a) a experiência com pesquisa participativa; b) a diversidade das atividades que envolvem o trabalho do formador; c) a possibilidade de conhecer tal diversidade, bem como as situações críticas reveladas pelos alunos; d) o trabalho coletivo e, finalmente, os ganhos com a experiência vivida para a comunidade de formadores de professores de inglês do Paraná.

Papéis

Considerando as observações de Carr e Kemmis sobre os perigos do predomínio de um moderador6, esta seção explora de que modo os papéis desempenhados pelos integrantes podem ter resultado na manutenção de “insiders” e “outsiders” no interior das ações empreendidas pelo grupo. Para isto, serão distinguidas as várias fases do projeto, a saber: elaboração, coleta de dados, análise, disseminação em congressos e publicações.

Na fase de elaboração, houve predomínio da coordenadora, que tomou a iniciativa de montar a primeira versão do projeto para referendo do grupo. Esta foi uma fase em que não foi possível quebrar com a hierarquia implícita, em virtude das ações que precisavam ser tomadas em relação ao encaminhamento burocrático do projeto. No entanto, o não engajamento de todos durante esta fase provocou posteriormente questionamentos sobre os objetivos, ocasionando várias negociações na fase de coleta e análise. Talvez por esse mesmo motivo, a mesma participante repete constantemente para o grupo os objetivos do projeto, como se vê no excerto abaixo:

P10: E eu acho que a própria trajetória do projeto, não é? Como que a gente resolveu fazer esse projeto? Nós tiramos essa idéia de uma reunião de Enfopli, né? Nós todos dissemos que é uma coisa que vale a pena fazer como um conjunto de pessoas, onde a gente vai conhecer um pouco mais da realidade do outro, que a gente vai tentar olhar pra nossa própria prática e o que a gente pode fazer de diferente a partir da experiência do outro, através das leituras e das discussões né? Acho que essa é a idéia, é uma

6 Qualquer predomínio freqüente de um “moderador” será destrutivo para a responsabilidade colaborativa do grupo pelo seu próprio processo de auto-reflexão. (p. 205)

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coisa dinâmica que está pensando em se sistematizar a partir de um conjunto de dados pra que a gente possa olhar pra isso com mais rigor. Porque eu posso sentar numa mesa de bar e falar sobre isso, mas é diferente de pegar uma sessão minha com meus alunos e olhar para aquilo e falar: ‘opa, eu faço isso’? Então isso traz uma nova percepção sobre o que eu faço e pode levar a uma mudança do que eu faço. Essa é a idéia de pesquisa-ação né, eu vou olhar um pouco, tentar entender um pouco do que é isso que eu estou fazendo. As dificuldades têm que ser expostas pra gente ver se elas são contornáveis (5ª. Reunião).

Note-se a tentativa de minimização de sua própria atuação, mediante o uso de “a gente” para denotar o caráter participativo da pesquisa e o projeto como propriedade de todos. Na reunião seguinte o assunto volta a ser tratado e colocado em pauta pela coordenadora:

P10: Então, como eu estava dizendo, eu assumi uma posição meio centralizadora no projeto, eu acabei assumindo o papel de fazer algumas coisas que acabou centralizando muito, eu acho, as coisas que a gente estava fazendo. Eu não sei como que vocês vêem isso. Já que a gente tem esse ano agora pra fazer a análise e tudo mais, vamos pensar se é possível a gente mudar isso; se é uma coisa que nós gostaríamos que acontecesse. Por exemplo, hoje de manhã alguém falou o “projeto da P10”, daí eu fiquei pensando: mas o projeto não é da P10, é o projeto de todo mundo. Então como que a gente pode tornar o projeto da P10 no projeto de todo mundo? Acho que essa é umas das questões que nós temos que discutir. (6a. Reunião)

Durante a fase de coleta de dados foi sentida a necessidade de um participante na posição de ‘cobrador’ das atividades, conforme relatado em Gimenez, Cristóvão, Furtoso e Santana (op. cit), papel esse assumido também pela coordenadora. Embora “insider”, a participante com predomínio de turnos foi alçada à categoria de “outsider” pelos próprios integrantes do projeto, situação que procurou rejeitar, sem sucesso. Dadas as limitações de tempo e espaço, este é um aspecto que poderá ser melhor explorado em trabalhos futuros.

Para a fase de análise, foi sugerido que outra participante assumisse a coordenação das reuniões, o que acabou acontecendo durante o ano de 2006. No entanto, a coordenadora retoma a posição ao especificar os objetivos da 8ª. reunião, deslocando a figura da moderadora. O uso de “na verdade” parece sugerir uma correção ao que havia sido posto pela responsável por coordenar o encontro:

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P10: Na verdade, hoje seria mais uma reflexão sobre esse processo todo - e como a análise está nos ajudando ou não está nos ajudando a pensar melhor nas nossas práticas! ( 8ª. Reunião)

As contribuições individuais ao processo de análise foram discutidas na seção 3.3. Ali se verifica a participação de mais vozes procurando contribuir para as reflexões trazidas pelo olhar para os dados coletados. Pode-se imaginar um “crescendo” de maior apropriação do projeto e aprendizagem à medida que se avançava da análise para a disseminação. A apresentação dos trabalhos no I Congresso Latinoamericano sobre Formação de Professores de Línguas (CLAFPL) foi percebida como um importante momento para uma apreciação global dos resultados e suas interligações. Seguiu-se a isso a redação de vinhetas como etapa final do projeto, além da produção de textos que compõem este livro. Essas tarefas foram realizadas durante o primeiro semestre de 2007. Nesta fase, o grupo serviu como leitor dos trabalhos, caracterizando, de modo mais claro, a participação.

Se levarmos em conta o que nos diz Carr e Kemmis (op. cit) sobre papéis, é possível salientar que houve predomínio de um participante especialmente nas fases de elaboração e coleta de dados. A partir dali, os papéis foram mais distribuídos e resultaram em situações de aprendizagem em que maior número de integrantes teve participação.

Vozes

Enquanto participantes de uma formação discursiva, as reuniões abriram espaço para a manifestação das múltiplas subjetividades, de representações coletivas e individuais e seus confrontos, de discursos sócio-histórica e ideologicamente construídos e afetados pelas interações nas relações sociais reguladas, organizadas e mediadas pela linguagem. Dada a sua importância e a fim de explorarmos os sentidos construídos sobre pesquisa pelos participantes, aprofundamos o levantamento dos temas (no sentido bakhtiniano do termo, ou seja, apreciação de valor que se tem sobre uma questão) nos enunciados orais das reuniões e das respostas escritas ao questionário distribuído/coletado. O Quadro 3 traz exemplos de enunciados produzidos em reuniões:

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Quadro 3: Exemplos de vozes que constituem representações dos participantes sobre o trabalho de formador

vozes Exemplo

Dos alunos P7: Aí ele falou assim: o meu sonho é um dia a [nomes de formadoras] irem dar a primeira aula pra gente, pra gente ver como é que dá aula. Aí eu falei assim: “mas o que você quer dizer com isso? Você quer ter um modelo? Ou você quer rebater o nosso discurso?” Daí ele falou assim: “não, não é modelo não, é pra rebater o seu discurso”. Daí eu falei: “ah, achei interessante, fale mais sobre isso”. (5ª. reunião)

Bolsista: Olha, eu posso - do ponto de vista de aluna do segundo ano do curso de Letras, me engrandeceu muito no sentido que – eu vejo pelo contato com os outros colegas que eles não tem uma visão como eu tenho de formação. Muitas coisas eu já vi que eu quero aplicar quando eu começar a trabalhar em sala de aula, porque é assim: dentro da sala de aula a gente vê muita teoria, eles focalizam a gramática do inglês, a gramática do português e não sabem trabalhar muito bem o relacionamento que você vai ter com o aluno e com a instituição. O contato com a experiência de vocês eu vi e aprendi muito em relação a isso, saber me comportar futuramente diante de uma situação, não apenas profissionalmente, mas também social e institucionalmente. (9ª. reunião)

Do formador P1: É, todo início de ano nós vamos até as escolas e fazemos uma reunião com os professores e com os supervisores e, muitas vezes, com o diretor,... (5ª. reunião) Do professor P8: Até pela facilidade de contactá-las, né. Enfim, porque os outros estagiários já

estão em “outro planeta”. E a outra coisa é que eu fiz, em função de tempo, na realidade eu fiz uma – entrevista.(5ª. reunião)

Da instituição (sistema de ensino) P8: Então se todo mundo se inscreve aumenta a demanda e aumenta, portanto, a possibilidade de receber bolsa. (5ª. reunião)

Do sistema educacional P10: É nos estamos falando aqui dos textos que saíram dos parâmetros curriculares do Ensino Médio de Espanhol, que a finalidade é fundamentalmente educativa e não instrumental, né – os objetivos da Língua Espanhola é alargar os horizontes, permitir a identificação cultural do aluno [...] (5ª. reunião) De teóricos e pesquisadores P7: Aí eu lembrei de P10, falando que indisciplina é o que se vê, mas a gente tem

que procurar por trás. Aí eu levei o texto do Moita Lopes, que fala sobre as interações e analisa as interações problemáticas. Na outra semana ele leu Coracini, daí, na outra na aula ele chegou e falou: não, não era indisciplina, foi a minha falha de estabeler padrões interacionais adequados. (5ª. reunião) P10: Eu estou propondo Wallace e Gebhard, não sei se alguém tem outras... o Wallace pra definição das abordagens e o Gebhard pra falar dos modelos de supervisão. (8ª. reunião)

Do coletivo mais amplo P8: Nós da UEL, todos – que estão aqui fizeram uso dos Roteiros, né? ( 5ª. Reunião) Do pesquisador P4: [...] então eu estou assim penando, porque eu não sei pedir nada pra

ninguém, então as minhas coisas estão aí acumuladas, todas à mão. Eu não consigo raciocinar na frente do computador e eu estou tendo uma dificuldade imensa por falta de organização. Então a minha permanência aqui no projeto por causa disso, porque eu acho que eu não estou rendendo como eu deveria. Então, eu nem sei como fico. ( 5ª. reunião)

P9: Por isso que tem esse monte de não tem, não tem ((risos)) Então fica uma coisa desagradável né, e não é por falta de... No começo talvez tenha sido por faltado de eu ter me apertado: não eu tenho que fazer agora porque depois eu não vou fazer. Mas ao mesmo tempo foi um momento difícil né, final de gravidez etc... ( 5ª. reunião)

Do grupo de pesquisadores P10: Nós todos dissemos que é uma coisa que vale a pena fazer como um conjunto de pessoas, onde a gente vai conhecer um pouco mais da realidade do outro, que a gente vai tentar olhar pra nossa própria prática e o que a gente pode fazer de diferente a partir da experiência do outro, através das leituras e das discussões. ( 5ª. Reunião)

Da professora colaboradora P8: peguei aqui da professora que respondeu “você vê algum outro papel para o estagiário diferente dos que desempenhou neste ano? Sim, acompanhar mais a rotina do professor e ser um colaborador do professor em todas as suas tarefas diárias.” (5ª. Reunião)

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Os efeitos discursivos que cada enunciado traz parecem orientar o interactante a considerar as vozes que estão constituindo cada segmento de texto. Pode-se observar que os diferentes sistemas (educacional, de ensino e didático), bem como as diversas dimensões constitutivas do trabalho do professor vão tecendo as apreciações feitas e promovendo ecos ideológicos fortemente marcados pelos contextos em que os participantes atuam, o contexto macro no qual nos inserimos, bem como os conhecimentos prático, técnico, político-profissional que compartilhamos durante as reuniões.

Os enunciados retomam sentidos que circulam no espaço social de cada profissional. Todos os exemplos que selecionamos revelam discursos povoados por outros dizeres que vão constituindo o professor pesquisador e vão refutando ou confirmando representações que circulam em seus espaços sociais sobre o papel do formador. Cada perspectiva de vozes sociais presentes/reveladas parece descobrir as redes tecidas por formadores em sua atividade profissional.

No processo de pesquisa, a discussão e a reflexão sobre a prática e sobre os papéis assumidos pelos participantes deste espaço profissional são recorrentes e provocativos. Ora a discussão é iniciada, mas não resolvida, ora ela é alimentada a fim de se fazer emergir os sentidos dados pelos sujeitos e gerar espaço para novas construções. O excerto seguinte ilustra um momento em que os questionamentos sobre o papel do estagiário no contexto de ensino trazem à tona duas percepções: a) necessidade da colaboração ser, minimamente, uma via de mão dupla na escola (campo de estágio); b) participação do aluno no contexto da escola como um assistente para o professor.

P8: Então, mas é isso que a professora está falando, dele colaborar – então quer dizer, estou eu lá como supervisora dele de terceiro ano e está o professor, como professor regente daquele, e o aluno não está no papel só de, sei lá, ah eu venho aqui ver se as paredes estão pintadas e etc, ela está sugerindo essa professora, ele podia ser um colaborador, um monitor por exemplo, eu que estou dando essa palavra, ela não deu colaborador. P2: Então, aquele modelo aposentado de participação

P8: Qual modelo aposentado?

P10: 10 horas de participação, 10 horas de observação e 10 horas de regência.

P2: corrigindo prova, corrigindo caderno... P10: Mão-de-obra barata.

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P2: Ué, mas ele está tendo uma tarefa, assim vamos dizer, não é a do professor, mas ele está fazendo alguma coisa que é de verdade não é? P11: Teve uma escola que eu liguei para fazer contato que a professora disse que só aceitaria estagiários assim, se ele participasse, XX ((comentários indistintos))

P3: XX... que nós tivemos uma visita da R. que faz parte do conselho e eles falam muito nisso agora, de acompanhar desde o projeto político-pedagógico e possa um professor ou até dois professores lá da escola e ele vai, onde o professor vai ele vai atrás. (5ª. Reunião)

As diferentes percepções são verbalizadas, entram em choque, mas não são resolvidas. P8 faz uma proposição que P2 e P10 interpretam como um retrocesso para a prática, ao passo que P11 adiciona que já fora contatado por escolas que desejam o estagiário no modelo de monitor. P8 não argumenta favorável ou contrariamente e o assunto é desviado, desvio este que pode ser interpretado como proposital para que o conflito não se instaure nem seja alimentado, ou como o rumo mais desejado pelo grupo. O próximo excerto revela uma interação em que a colaboração e a negociação são priorizadas para que a compreensão sobre procedimentos de análise sobre os inventários de crenças seja construída.

P1: Porque se for fazer por instituição é fácil você discutir isso, você falar que inicialmente você tinha lá trinta e cinco e depois... Mas se for juntar todos aí enviesa os dados eu acho.

P10: É, porque os dados quantitativos são – e o próprio instrumento é questionado. É mais no sentido de você ter um panorama geral.

P2: É só com o primeiro você tem esse mapa de como o aluno chega, de como ele vem pensando no começo do ano né? Daí pra fazer a outra parte comparativa X que não tem par, então ele não resolve o problema. P7: Então, mas daí a análise inicial perde o seu valor.

((falam simultaneamente))

P1: É então, mas no meu caso que são só dois é fácil X eu identifiquei só dois que não responderam na fase final, mas no caso dela sete é muito, né, pra descartar. Eu acho que o certo seria justificar. (5ª. Reunião)

Nesta reunião alguns procedimentos de análise foram propostos e discutidos em termos de validade, adequação em relação às perguntas de pesquisa e coerência com a fundamentação até então considerada.

P7 Então tem que ter ... uma análise quantitativa dos inventários. P8 Análise de conteúdo, né? chamando assim ou de ordem semântica, enfim, né?

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P10: Agora a idéia é, todo mundo faz tudo isso ou vamos, entendeu, compartilhar as tarefas, ou a gente decide isso lá na frente? (5ª. Reunião)

P7 enuncia, servindo-se da modalização lógica, provavelmente, tomando por base que inventários iniciais e finais devam ser tabulados e comparados. P8 complementa a fim de sugerir procedimentos de natureza qualitativa para serem utilizados. Em outro segmento podemos observar que em resposta a um questionamento também sobre procedimento de análise, P10 afirma que diferentes procedimentos com base em diversas perspectivas teórico-metodológicas poderiam ser adotados:

P11: Pretende fazer uma análise lingüística dessas entrevistas? P10: É possível, diferentes olhares. (5ª. Reunião)

Em relação aos questionamentos críticos sobre ensino-aprendizagem e sobre a própria natureza de uma pesquisa que se postula ser crítica, um participante recoloca a preocupação com o estatuto de pesquisa participativa questionando que, para ser participativa, outros sujeitos deveriam estar colaborando também em fases do projeto que não a coleta de dados.

P5: Agora P8, você já pensou, em relação a essa mesma questão que você fez, como dar esse retorno?.

P8: É, não só dar o retorno, eu tô dizendo, por exemplo, eu estou fazendo a pergunta pra nós todos, inclusive pra mim. É – quando a P9 falou assim: “nós não estamos fazendo análise com nossos alunos”, e aí eu lembro de uma pergunta que eu mesma coloquei na primeira e na segunda reunião: mas espera aí, nossos alunos são co-participantes? Eles não estão aqui todos, com exceção dos alunos de iniciação científica, esses meus alunos que preencheram questionários, que foram de alguma forma sujeitos a estarem lá nas gravações, enfim – que foram entrevistados, por que que eles não podem? Por que que eles não podem participar das nossas reflexões em cima dos dados que eles também geraram? E essas escolas que são nossas parceiras, quer dizer, não é só – eu não tô fazendo uma pergunta só de como é que nós vamos voltar isso pra eles, para os alunos e para os professores, mas se essa pesquisa está fazendo com que eu repense na própria relação e se na prática eu estou fazendo alguma coisa pra que isso seja desacomodado, né?

P5: e num universo de 47 alunos, 11 fizeram a pergunta: “professora, aquela pesquisa que – aquele questionário que vocês aplicaram X que eu entrevistei, o que deu?”- mas eu acho importantíssimo dar o retorno para que não fique naquele nível da pesquisa informante. Na pesquisa participativa, na pesquisa ação que você tem que dar o retorno ao

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participante que você não só vai buscar informação - aquele texto muito bom que a gente trabalhou aqui, traz uma junção das duas, da pesquisa participativa.

P10: Então, mas eu acho que a P8 tá fazendo é uma pergunta que deve voltar no sentido de como que esse projeto – ter participado desse projeto impactou ou não impactou é - a nossa prática. Isso aí é uma coisa que cada um de nós vai poder responder, é – e essa questão do envolvimento dos alunos, eu acho que não nessa reunião até por conta da questão do espaço físico e de habilidade de participação nesse sentido, nada impede, nada e isso eu disse desde o começo – e aí isso é uma questão de - vai ter implicação pra forma de como a gente vai estar envolvendo o aluno ou não nas pesquisas, ou vai ter repercussão ou não no modo de como a gente está propondo a idéia de professor investigador, né? É uma idéia que queremos continuar sustentando com que ressalva, com que encaminhamento? Então eu acho que isso vai ser uma coisa que a gente vai//

P9: // eu acho que isso vai ter um impacto inclusive nessa X que eu vou continuar pensando – depois dessa pesquisa eu continuo pensando que o professor tem que ser professor pesquisador, em função de todas essas coisas, acho que isso é importante, depois da participação desse projeto vai ser importante nesse sentido, porque falar né, que tem que ser pesquisador. E quando eu disse também que nós não estamos fazendo análise com os nossos alunos eu não estou querendo dizer que nós não tínhamos essa abertura, eu só estava pensando na relação que nós temos né, quão parte do nosso trabalho diário esse projeto está fazendo. Na minha opinião ele teve muito mais parte na coleta do que na análise, não que a gente não tivesse esse passo de fazer a análise com os alunos, eu não me lembro de ninguém ter falado de fazer, eu também não fiz e ninguém está fazendo. XX. Então porque provavelmente essa análise não faz parte nesse momento do nosso programa lá, das nossas disciplinas, a coleta fazia, independente de estar no projeto ou não, claro que algumas coisas surgiram. (9ª. Reunião)

As pesquisadoras do excerto se posicionam em dois sentidos: a) da pesquisa ser integrante do trabalho e não um conhecimento a ser disseminado; b) do engajamento dos alunos na pesquisa. Adotando a definição de colaboração de John-Steiner et al (1998, apud LEVIN & ROCK, 2003)7, os autores concluíram que um trabalho preparatório 7 Os princípios em colaboração efetiva representam domínios complementares. Como colaboradores, eles não apenas planejam, decidem e agem em conjunto, eles também pensam juntos, combinando esquemas conceituais independentes para criar situações originais. Além disso, na colaboração efetiva há o compromisso com o compartilhamento de recursos, poder e talento: nenhum ponto de vista individual domina, a autoridade para decisões e ações reside no grupo, e o resultado final emerge das contribuições de todos os participantes. Reconhecemos que grupos colaborativos diferem no enquadramento a este perfil e que grupos podem exibir algumas dessas características apenas de modo episódico ou apenas após longo período de convivência. (p. 776).

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deveria ter sido feito, de modo a possibilitar maior simetria na participação. Ao apontar a questão de simetria, podemos nos referir tanto ao estatuto dos participantes que parecem ter revelado posicionamentos diferentes em relação à sua participação e ao desenvolvimento de suas tarefas quanto à possibilidade de inserir nossos alunos na prática de pesquisa. O excerto da 9ª. Reunião revela a preocupação contínua com a pesquisa como constitutiva de nossa prática.

Considerações finais

Levando-se em conta a definição de Carr e Kemmis (op. cit) sobre pesquisa-ação crítica, é possível dizer que esta pesquisa atingiu parcialmente suas características. Certamente ela provocou oportunidades de reflexão sobre as práticas, conforme apontado nos relatos de melhoria e aprendizagem decorrentes do projeto. Entretanto, não nos é possível afirmar que conseguimos melhorar as condições objetivas de realização de nossas práticas. Se, por um lado, sob o aspecto das condições subjetivas o projeto se revelou benéfico pela aprendizagem coletivamente gerada, pelo senso de pertencimento criado, por outro lado, mostrou também as dificuldades de incorporação da pesquisa como parte da atividade docente. Exemplificamos, por meio de excertos, vozes que constituem nossas representações sobre nosso trabalho: do coletivo de trabalho, dos pesquisadores, das instituições que formam sistemas de ensino, do sistema educacional, dos alunos-professores, da comunidade local, regional e nacional, entre outras. A maneira como lidamos e interpretamos nossas representações pode contribuir para cristalizá-las ou transformá-las. Nossas análises apontam para certa situação desacomodada pelas reflexões e discussões feitas no âmbito do projeto. As percepções sobre a aprendizagem gerada revelam tal provocação/desacomodação. Nossos questionamentos e conflitos contribuíram para esse desequilíbrio necessário para nosso próprio desenvolvimento.

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Introdução

Este trabalho procura investigar quais crenças sobre o ensino de inglês os alunos-professores exibem ao iniciarem as disciplinas consideradas práticas, e como essas são modificadas pelas práticas de ensino. Analisa também as percepções que os alunos-professores têm em relação à sua formação e à prática de ensino de inglês.

A primeira parte traz o conceito de crenças e representações e sua importância no processo de formação de futuros professores. A segunda parte explica as condições nas quais ocorreu a pesquisa, o contexto, os instrumentos de coleta de dados, os sujeitos de pesquisa, as categorias e os procedimentos de análise. A terceira parte traz a análise dos dados obtidos a partir de um inventário de crenças e de uma entrevista semi-estruturada. Em seguida, são apresentadas as principais conclusões da pesquisa e considerações finais.

Crenças e representações

Experiências passadas e recentes convergem e estabelecem os significados que atribuímos para as coisas. Desde os primeiros dias do desenvolvimento humano, nossas atividades adquirem um significado próprio em um sistema de comportamento social (VYGOTSKY, 1987). Tal sistema, construído coletivamente, faz surgir nossas crenças e representações em relação ao mundo e sobre como percebemos a realidade.

Capítulo 2

Crenças sobre o ensino

de inglês na prática de ensino

Talitha Alonso Francisco Carlos Fogaça

Referências

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